(Antonio Augusto/SCO/STF/Flickr)
Instituto Millenium
Publicado em 26 de setembro de 2025 às 15h34.
Por Gustavo Fernandes, vice-presidente do Instituto Liberdade
É necessário mudar a forma como pensamos o nosso conflito com a Suprema Corte do país. Veja-se: aqui não significa aprovar o que faz a Corte ou negar a existência de um conflito, mas sim criar uma saída digna para o cenário que se desenha.
Em certa medida, a maturidade de um país passa pela sua capacidade de superar crises com o menor custo humano e institucional possível. O Brasil de hoje, infelizmente, se encontra em um beco sem saída. A inviabilização das relações humanas através do conflito político está chegando a níveis insustentáveis, e algumas conversas maduras serão necessárias para tranquilizar o processo eleitoral e institucional, de modo a recompor um arranjo funcional que goze da confiança do povo brasileiro.
Dito isso, não é apenas elegendo novos presidentes ou parlamentares que isso será concretizado. Por outro lado, buscar ciclos de impeachment de ministros da Suprema Corte ou rupturas inspiradas em ações americanas são soluções que cobram um preço alto do nosso povo, ainda bastante miserável socioeconomicamente. Veja-se: encontramo-nos em um impasse. É necessário tentar encontrar soluções que permitam uma reordenação institucional em termos que não sejam de destruição, e pode ser que essa solução não seja óbvia ou intuitiva para liberais. Confesso que tal reflexão me ocorreu quando li sobre o julgamento do Tema 1.178, no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Trata-se da Corte que tem competência para julgar muitos dos temas delicados da nossa sociedade e que, data máxima vênia, faz o trabalho menos glamoroso enquanto o Supremo se permite participar de forma relevante na política nacional, consolidando-se como a segunda Corte mais importante do país. O STJ é composto por 33 ministros, o triplo do Supremo — cenário que estremece a espinha de qualquer liberal contemporâneo, dada a preocupação legítima com o gasto público.
Comicamente, quando li sobre o referido julgamento, iniciei torcendo o nariz para o resultado. Prevaleceu o entendimento do ministro Og Fernandes, no sentido de que critérios objetivos não podem fundamentar o indeferimento automático da gratuidade da justiça – hipótese em que a sociedade paga as custas do processo privado de alguém. Claramente, tal situação expande o gasto público e estimula a litigiosidade; naturalmente, um liberal como eu olharia com desconfiança.
Contudo, outra virtude liberal, mais clássica, é o ceticismo. Lembremos de Popper: “Nosso conhecimento só pode ser finito, enquanto nossa ignorância é necessariamente infinita.” Fui ler a fundamentação do voto. O ministro, dentre outras razões, sustentou que não era possível utilizar tais critérios por parte dos juízes, visto que não havia previsão legal. Em outras palavras, deferiu ao legislador. Admito que certo estava o ministro. Pouco importava o custo ou o contexto ideológico frente ao que se estabeleceu ali. Trata-se da postura que queremos do Judiciário: respeito ao Parlamento, ao voto popular e, acima de tudo, deferência ao legislador. E mais: houve duas divergências na oportunidade — uma de argumento econômico-racional e outra de enfoque social mais agressivo.
Divergência é salutar nas instituições e, talvez, devêssemos custear um pouco de divergência no STF, reduzindo o poder de cada ministro. Trata-se de apequenar as pessoas enquanto aumentamos a Corte. É bem verdade que seria caríssimo, mas, frente aos custos atualmente postos, não seria tão relevante. Obviamente, não seria possível fazer isso submetendo tal escolha apenas ao presidente; o Parlamento teria que equacionar esse elemento procedimental, garantindo participação justa e representativa do mosaico brasileiro. Em todo caso, a solução pode se mostrar muito mais barata do que a manutenção do atual conflito e do revanchismo.
Por vezes, quando um veneno acomete alguém, aplica-se um torniquete, causando um dano adicional para evitar um mal maior. No caso, estamos fazendo o mesmo: pagaremos ainda mais, mas desta vez para criar um arranjo melhor. Temos muitas amarras — em tese, legítimas — para atacar o STF, mas não para reformá-lo. Aumentar o número de ministros apequena as pessoas, diminui o conluio e promove a República. Isso auxilia na responsabilização, distanciando os pares e tornando a relação entre eles menos pessoal e, portanto, mais suscetível aos interesses difusos da sociedade. Como diria o próprio Sowell, não existem soluções, apenas trade-offs — e talvez este seja um trade-off melhor do que os demais que vêm sendo aventados.