O agronegócio brasileiro precisou lidar com problemas de safra causados pelas condições climáticas (Alexis Prappas/Exame)
Instituto Millenium
Publicado em 1 de outubro de 2025 às 21h50.
*Yuri Quadros, Diretor de Formação do Instituto de Formação de Líderes de Belo Horizonte e conselheiro da Rede Liberdade
“São Paulo produz açúcar e etanol; Mato Grosso produz soja; Minas, algodão; Brasília, dificuldades.” A frase de Antônio Cabrera, ex-Ministro da Agricultura, — dita num jantar com empresários do agro e com Bjørn Lomborg, presidente do Copenhagen Consensus Center, em 15 de setembro de 2025 — resume o impasse nacional: quem planta colhe; quem regula precisa parar de travar e começar a habilitar.
O contexto é inequívoco. O agronegócio não é um setor, é um terço da economia. Pelas estimativas Cepea/CNA, a fatia do agro pode chegar a 29,4% do PIB em 2025, contra 23,5% em 2024. Nas vendas externas, respondeu por 48,9% das exportações entre janeiro e novembro de 2024, segundo o Ministério da Agricultura. Não é exagero dizer: quando a política climática erra o alvo no Brasil, não erramos só uma meta, erramos o motor da economia.
Tese. A melhor política climática para o agro brasileiro não é empilhar portarias e metas “net zero” genéricas. É aplicar custo-benefício: (1) segurança de propriedade para investir no longo prazo; (2) P&D e difusão tecnológica; (3) infraestrutura de baixo carbono (ferrovias, hidrovias, armazenagem). Estado menos intervencionista, mais habilitador.
Comecemos pela infraestrutura, onde a física ajuda. O Plano Nacional de Logística (PNL) mostra que reequilibrar a matriz de transportes para trilhos e hidrovias reduz em aproximadamente 14% a emissão de CO₂ e economiza R$ 54,7 bilhões/ano em custos logísticos, a partir de 2025. No caso da Ferrogrão (EF-170), a própria ANTT registra que o corredor alivia a BR-163 e tem “alto potencial” de corte de emissões. Em 2021, a avaliação do governo federal estimou 77% menos CO₂ na comparação trem x caminhão, ressalvada a necessidade de licenciamento robusto. A lógica é sólida: emissões por tonelada-quilômetro no trem são várias vezes menores que no caminhão, como apontam a Agência Europeia do Ambiente e guias técnicos (≈ 17–25 gCO₂/tkm no trem versus ~100 gCO₂/tkm no rodoviário típico).
O segundo pilar é P&D. Em política climática, “baratear o futuro” funciona melhor que subsidiar o presente. Lomborg insiste, e tem razão, em priorizar pesquisa e desenvolvimento para derrubar o custo das tecnologias limpas e permitir adoção voluntária em escala; seu sumário recente sugere multiplicar o investimento global em P&D verde, com ordens de grandeza ainda modestas perto do gasto com metas mal calibradas. No Brasil, isso significa acelerar genética e manejo de baixo metano, irrigação eficiente, bioinsumos e digitalização — agenda compatível com a vocação produtiva descrita no Millennium Papers (edição 35).
Terceiro pilar: segurança de propriedade. Políticas que titulem e deem previsibilidade rendem muito. A literatura é clara: onde a posse é frágil — terras públicas não designadas, em especial — o desmate é maior; quando há direitos definidos (públicos ou privados), cai o desmatamento e sobe o investimento produtivo. O próprio ecossistema do Copenhagen Consensus tem destacado segurança fundiária entre intervenções de alta relação benefício-custo para desenvolvimento, exatamente a lógica que deveríamos aplicar às políticas ambientais.
Críticos podem vir a dizer que “o agro se beneficia de externalidades climáticas e deve pagar”. Mesmo que isso fosse uma verdade absoluta, a boa resposta não é um emaranhado de portarias que encarecem diesel, energia e crédito sem medir resultado; é sinal correto de preço e priorização. Se US$ 9,2 trilhões/ano forem necessários globalmente para cumprir net zero 2050, como estimou a McKinsey, precisamos alocar cada real onde evita mais CO₂ e gera mais bem-estar — logística limpa, P&D e adaptação vencem.
A adaptação — quase sempre esquecida — protege gente e renda. Seguro rural com tarifa espelhando risco, zoneamento de risco climático atualizado e irrigação eficiente evitam perdas sem destruir competitividade. Em mercados, convém lembrar que distância nem sempre é vilã: no caso de hortifrutis, estudos mostram que o modo de produção frequentemente pesa mais que os “food miles”; até um melão nordestino exportado pode ter pegada menor que um local, dependendo do sistema de cultivo e da energia usada.
Há, ainda, um dado que costuma sumir do debate: 66,3% do território brasileiro permanece com vegetação nativa destinada/ocupada por diferentes categorias de proteção e uso. Isso não absolve ninguém de cumprir a lei; só lembra que o Brasil tem espaço para crescer com conservação, se trocar metas vistosas por boas escolhas.
Quais seriam, então, as medidas de maior benefício por real?
Política climática que ignora custo-benefício não salva o clima nem o emprego no campo. Se Brasília trocar metas difusas por trilhos, títulos e tecnologia, o produtor produzirá mais — e o clima agradecerá com menos caminhões, menos CO₂ e mais futuro.