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A Uber precisa de uma regulação inteligente, não de mais do mesmo

Revolução trazida pela Uber e empresas similares vai além da concorrência com atores já existentes

Uber: rrevolução trazida pela Uber e empresas similares vai além da concorrência com atores já existentes (SOPA Images/Getty Images)
Uber: rrevolução trazida pela Uber e empresas similares vai além da concorrência com atores já existentes (SOPA Images/Getty Images)

Em 2014, sob protestos de alguns grupos, chegava ao Brasil um novo modelo de transporte urbano que ficou conhecido pelo nome da principal empresa do setor, a Uber. Toda inovação  – e a Uber é apenas parte disto – não é aceita pela sociedade se os benefícios agregados não forem maiores do que seus custos.  

O início das operações da empresa no Brasil foi, portanto, turbulento. Taxistas – que hoje operam sob aplicativos alternativos, quando não o da própria Uber – chegaram a fazer protestos violentos com agressões físicas a motoristas do aplicativo e mesmo a consumidores que compareceram a audiências públicas. Isto aconteceu em Belo Horizonte, mas com o fim do Estudantes Pela Liberdade, a notícia se perdeu, mas o leitor pode verificar o uso da violência naquele período em outras notícias como, por exemplo, esta. 

Como muito bem explicado por Todd Henderson e Salen Churi em um livro de 2019, a revolução trazida pela Uber e empresas similares vai além da concorrência com atores já existentes. Trata-se de uma nova forma de cooperação entre consumidores e produtores de bens e serviços. Obviamente, inovações trazem consigo dois gérmens regulatórios: (a) o do desprezo pela inovação e; (b) o que abraça a inovação. O primeiro deles conta sempre com o apoio daqueles que temem a inovação porque estimam que perdem mais do que ganham com ela.  

“Abraçar” a inovação significa compreender que o regulador, assim como os demais seres humanos, não é onisciente e, portanto, é tão incapaz de prever todos os possíveis desdobramentos da regulação quanto eu, você ou o juiz da sua comarca. Deste modo, a melhor abordagem para a regulação seria aquilo que Fernando Meneguin e Ana Paula Andrade de Melo chamaram de soft regulation, em um artigo publicado na Revista do Serviço Público, em 2022. Em suas palavras: 

A soft regulation não detém uma só forma para todos os fins e não é uma panaceia para todo problema que carece de intervenção estatal. A forma é funcional e adaptável ao caso concreto por meio de medidas não intrusivas que podem anteceder, substituir ou complementar a regulação tradicional ou ser um fim em si mesmas. 

Sob este arcabouço, a regulação tende a evitar os excessos que podem, no limite, gerar desemprego e incentivar, no longo prazo, uma mentalidade medíocre, não-inovadora que, se dominante na sociedade, estimula um crescimento mais lento da produtividade, para dizer o mínimo.  

A propósito, uma das consequências trazidas por estes aplicativos de transporte é mostrar os benefícios da flexibilidade do mercado de trabalho. Motoristas veem vantagem em trabalharem em uma escala de horários sobre a qual têm maior controle. Outro ponto positivo é o impacto positivo na diminuição de desigualdades. Em um trabalho acadêmico de 2021, Andrew Castleman encontrou indícios de um ganho salarial para motoristas pouco qualificados (low skilled) e também para motoristas mulheres em cidades dos EUA. 

Sobre a desigualdade de gênero, aliás, um relatório de 2018 da International Finance Corporation em parceria com a Accenture usando dados da Uber para alguns países (Indonésia, Egito, Méexico, África do Sul e Reino Unido) mostra que mulheres também têm motivações bem concretas para trabalharem como motoristas de aplicativos. Dados para São Paulo mostram que o número de motoristas mulheres de aplicativos tem aumentado (veja também esta notícia, para Belo Horizonte). 

Uma regulação soft no setor deve ser capaz de fazer com que a sociedade capture os benefícios da inovação trazida por empresas como Uber e similares. Garantir a competição no setor, neste sentido, tende a gerar ganhos para os consumidores, na forma de preços mais baixos. Além disto, a flexibilidade intrínseca no modus operandi destas plataformas permite que alguns indivíduos, geralmente desfavorecidos no mercado de trabalho tradicional, encontrem maiores oportunidades de melhorarem suas vidas e a de seus familiares.  

De modo mais geral, reguladores, legisladores e juízes devem entender que regulações são incentivos, que incentivos têm consequências e que nem todas as consequências podem ser previstas. Claro, é preciso que os reguladores apresentem estudos de impacto cientificamente bem embasados, por exemplo, para propostas de alterações regulatórias ou decisões judiciais. Mais importante, decisões precisam ser mais ágeis. A hesitocracia da regulação tradicional precisa ser evitada. 

O abraço à inovação é a melhor forma de avançar a prosperidade sócio-econômica, principalmente para aqueles que mais dela precisam.