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A resposta está nas mãos do presidente

A expectativa é que na decisão de Lula sobre a regulação da geração elétrica offshore, o interesse público prevaleça sobre a captura por lobbies

Senado aprovou PL da energia eólica offshore na semana passada  (Edilson Rodrigues/Agência Senado)
Fernando Pieroni

Especialista em parcerias público-privadas

Publicado em 19 de dezembro de 2024 às 12h32.

A regulação econômica é central na discussão sobre o papel do Estado na sociedade, especialmente quando se trata de como seu poder coercitivo é usado para incentivar ou prejudicar determinados setores. A questão chave é: quem, de fato, se beneficia ou sofre com essa regulação, e como grupos organizados conseguem capturar esse poder para interesses próprios? Este é um tópico muito estudado na Economia e no Direito, tendo resultado em alguns prêmios Nobel, caso de George Joseph Stigler (1911-1991), economista americano, expoente da teoria da captura regulatória. Resgatar o legado de Stigler é sempre válido, mas por que lembrá-lo agora?

Na semana passada, vimos mais uma evidência clara de como a influência dos lobbies de setores específicos pode resultar em normas que produzem efeitos perversos para a sociedade. O exemplo é a recente aprovação no Congresso do marco regulatório para a exploração de energia elétrica offshore (PL 576/2021), que, na versão final, incluiu uma série de "jabutis" — emendas sem relação com a proposta original — beneficiando interesses específicos às custas do bem-estar público e da responsabilidade ambiental.

O projeto de lei em questão tem como objetivo regulamentar a instalação e operação de parques eólicos offshore, aproveitando os ventos fortes e estáveis do alto-mar para gerar energia elétrica. Ele também busca incentivar a produção de hidrogênio verde, um combustível sustentável obtido pela eletrólise da água, desde que a eletricidade utilizada venha de fontes renováveis, como a energia eólica.

A relação entre a energia eólica e o hidrogênio verde é simples: ao utilizar o vento, que seria desperdiçado sem a devida infraestrutura, é possível produzir um combustível limpo que pode vir a substituir os combustíveis fósseis mais poluentes. Na sua versão original, o projeto representava uma excelente oportunidade para atrair investimentos em tecnologias que poderiam ajudar no combate ao aquecimento global, viabilizando a redução da pegada de carbono da matriz elétrica brasileira.

Entretanto, ao longo da tramitação do PL, diversas emendas desconectadas da proposta original foram adicionadas, distorcendo os objetivos iniciais. Entre elas, destacam-se a prorrogação do prazo de operação de usinas térmicas a carvão mineral e a exigência de contratação mínima de energia proveniente do gás natural. Essas regras favorecem a geração de energia a partir de combustíveis fósseis, poluindo a matriz elétrica brasileira e aumentando os custos para os consumidores.

Cálculos da Frente Nacional dos Consumidores de Energia (FNCE) estimam que tais “jabutis” vão gerar um aumento da conta de luz em 9%, em média, com despesa adicional de R$ 21 bilhões por ano até 2050, totalizando cerca de R$ 545 bilhões. Segundo a FNCE, o impacto do PL das eólicas offshore equivale a 51,7% do orçamento anual da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), um dos principais encargos do setor elétrico, que é de R$ 40,6 bilhões.

Alguns especialistas do setor vão além e estimam que, caso as novas regras sejam implementadas, o aumento da tarifa de energia elétrica pode chegar a 11%. Há críticos que, inclusive, questionam a eficiência de se criar uma reserva de mercado para a energia eólica offshore, caso ela não se mostre competitiva frente a outras fontes renováveis. O que dizer então de fazê-lo para os combustíveis fósseis? Um grande passo na direção errada.

Mas o fato é que os grupos de interesse destes setores têm grande influência política, e a conta de luz é veículo efetivo para socializar os custos dessas medidas, uma vez que consumidores e processos produtivos dependem da energia elétrica. Pelo menos, de imediato, não há para onde escapar: se não se paga a conta, a energia é cortada.

Há de se considerar ainda que o Brasil atravessa um momento em que se prepara para sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas em 2025, e acaba de aprovar uma lei para instituir o mercado de carbono, segundo o qual as empresas precisarão reduzir suas emissões, o que dependerá, entre outros aspectos, da qualidade das fontes de energia utilizadas nas cadeias produtivas.

O desafio é que, como Stigler bem colocou, "a política é algo imponderável, uma mistura constantemente mutável e imprevisível de forças das mais diversas naturezas, compreendendo atos de grande virtude moral e da mais vulgar venalidade, levando a resultados que inclusive confrontam a racionalidade".

Com a aprovação no Congresso, o projeto segue agora para a sanção presidencial, onde ainda existe a oportunidade de se vetar as emendas problemáticas e preservar o objetivo inicial em favor de fontes renováveis e alinhadas com as metas de redução das emissões de gases de efeito estufa. A responsabilidade está nas mãos do presidente e esperamos que o interesse público prevaleça sobre a captura da regulação, evitando a vitória dos lobbies de interesses menores.

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A regulação econômica é central na discussão sobre o papel do Estado na sociedade, especialmente quando se trata de como seu poder coercitivo é usado para incentivar ou prejudicar determinados setores. A questão chave é: quem, de fato, se beneficia ou sofre com essa regulação, e como grupos organizados conseguem capturar esse poder para interesses próprios? Este é um tópico muito estudado na Economia e no Direito, tendo resultado em alguns prêmios Nobel, caso de George Joseph Stigler (1911-1991), economista americano, expoente da teoria da captura regulatória. Resgatar o legado de Stigler é sempre válido, mas por que lembrá-lo agora?

Na semana passada, vimos mais uma evidência clara de como a influência dos lobbies de setores específicos pode resultar em normas que produzem efeitos perversos para a sociedade. O exemplo é a recente aprovação no Congresso do marco regulatório para a exploração de energia elétrica offshore (PL 576/2021), que, na versão final, incluiu uma série de "jabutis" — emendas sem relação com a proposta original — beneficiando interesses específicos às custas do bem-estar público e da responsabilidade ambiental.

O projeto de lei em questão tem como objetivo regulamentar a instalação e operação de parques eólicos offshore, aproveitando os ventos fortes e estáveis do alto-mar para gerar energia elétrica. Ele também busca incentivar a produção de hidrogênio verde, um combustível sustentável obtido pela eletrólise da água, desde que a eletricidade utilizada venha de fontes renováveis, como a energia eólica.

A relação entre a energia eólica e o hidrogênio verde é simples: ao utilizar o vento, que seria desperdiçado sem a devida infraestrutura, é possível produzir um combustível limpo que pode vir a substituir os combustíveis fósseis mais poluentes. Na sua versão original, o projeto representava uma excelente oportunidade para atrair investimentos em tecnologias que poderiam ajudar no combate ao aquecimento global, viabilizando a redução da pegada de carbono da matriz elétrica brasileira.

Entretanto, ao longo da tramitação do PL, diversas emendas desconectadas da proposta original foram adicionadas, distorcendo os objetivos iniciais. Entre elas, destacam-se a prorrogação do prazo de operação de usinas térmicas a carvão mineral e a exigência de contratação mínima de energia proveniente do gás natural. Essas regras favorecem a geração de energia a partir de combustíveis fósseis, poluindo a matriz elétrica brasileira e aumentando os custos para os consumidores.

Cálculos da Frente Nacional dos Consumidores de Energia (FNCE) estimam que tais “jabutis” vão gerar um aumento da conta de luz em 9%, em média, com despesa adicional de R$ 21 bilhões por ano até 2050, totalizando cerca de R$ 545 bilhões. Segundo a FNCE, o impacto do PL das eólicas offshore equivale a 51,7% do orçamento anual da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), um dos principais encargos do setor elétrico, que é de R$ 40,6 bilhões.

Alguns especialistas do setor vão além e estimam que, caso as novas regras sejam implementadas, o aumento da tarifa de energia elétrica pode chegar a 11%. Há críticos que, inclusive, questionam a eficiência de se criar uma reserva de mercado para a energia eólica offshore, caso ela não se mostre competitiva frente a outras fontes renováveis. O que dizer então de fazê-lo para os combustíveis fósseis? Um grande passo na direção errada.

Mas o fato é que os grupos de interesse destes setores têm grande influência política, e a conta de luz é veículo efetivo para socializar os custos dessas medidas, uma vez que consumidores e processos produtivos dependem da energia elétrica. Pelo menos, de imediato, não há para onde escapar: se não se paga a conta, a energia é cortada.

Há de se considerar ainda que o Brasil atravessa um momento em que se prepara para sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas em 2025, e acaba de aprovar uma lei para instituir o mercado de carbono, segundo o qual as empresas precisarão reduzir suas emissões, o que dependerá, entre outros aspectos, da qualidade das fontes de energia utilizadas nas cadeias produtivas.

O desafio é que, como Stigler bem colocou, "a política é algo imponderável, uma mistura constantemente mutável e imprevisível de forças das mais diversas naturezas, compreendendo atos de grande virtude moral e da mais vulgar venalidade, levando a resultados que inclusive confrontam a racionalidade".

Com a aprovação no Congresso, o projeto segue agora para a sanção presidencial, onde ainda existe a oportunidade de se vetar as emendas problemáticas e preservar o objetivo inicial em favor de fontes renováveis e alinhadas com as metas de redução das emissões de gases de efeito estufa. A responsabilidade está nas mãos do presidente e esperamos que o interesse público prevaleça sobre a captura da regulação, evitando a vitória dos lobbies de interesses menores.

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