Colunistas

A pueril e persistente dependência do herói

Acordar do mundo fantástico importa, em assuntos de política, em um exercício por parte dos eleitores de avaliar e selecionar

Empreendedor/executivo com capa de super-herói (Thinkstock)

Empreendedor/executivo com capa de super-herói (Thinkstock)

Amanda Flavio
Amanda Flavio

Colunista

Publicado em 30 de janeiro de 2025 às 15h45.

Lula, Trump, Bolsonaro e Macron podem ser considerados curiosos exemplos de heróis da contemporaneidade. Seus admiradores, tão diferentes uns dos outros, convergem entre si na crença singela da capacidade desses homens de preservar e lutar pelo bem comum, defendendo a sociedade dos tenebrosos males que a ameaçam.

Nada que diferencie esses “adultos” politizados de seus filhos menores de idade: mudam-se os personagens, mas no fim do dia está todo mundo agarrado à “Liga da Justiça” que lhe convém, seus caçadores, justiceiros, vingadores. É apenas uma versão para maiores de 18 do que Theodore Dalrymple denuncia como uma “longa história de credulidade deplorável da humanidade diante da autoridade”.

O fato é lamentável por múltiplas razões.

Uma delas é o fato que, essas figuras, alçadas ao ponto de salvadores da pátria, são apenas seres humanos. Isso significa que nem de longe elas possuem os grandiosos poderes do mundo da fantasia. São falíveis, são erráticos, são limitados, como todo ser humano. Entretanto, apaixonados como seus discípulos se revelam, eles tendem a ignorar, justificar, ou pagar pelos erros que elas eventualmente cometem. Relembre-se que os atos públicos dessas autoridades projetam-se no ambiente macro, e as consequências das ações desses “salvadores da pátria” espraiam-se por toda uma coletividade, às vezes, global.

A atitude pueril da confiança em super-heróis fake também revela a simplicidade de pensamento que atribui a pessoas humanas a característica de ser perfeito e virtuoso. Nesses casos, é inevitável concordar com Millor Fernandes: “Como são valorosas as pessoas que não conhecemos tão bem”. Mas não é só. Humanos que são, essas pessoas se movem por racionalidade decisória, e, conforme ensina a Economia, adotam atitudes que as convêm, no seu particular exercício de custo e benefício. A equação então se desequilibra: da parte delas, racionalidade. Da parte de seus discípulos, paixão.

Acordar do mundo fantástico importa, em assuntos de política, em um exercício por parte dos eleitores de avaliar e selecionar, entre os candidatos, aqueles cujos perfis revelarem melhores gestores, e abandonar o pendor para a expectativa de identificar um líder benevolente. Presidência da república, no fundo, é apenas mais uma profissão, para o qual deveríamos selecionar currículos, não promessas.

Mas, no fundo, há um fator emocional a ser equacionado, para o qual é difícil saber se temos instrumental na contemporaneidade, dado o rumo que as políticas públicas foram tomando em quase todo o mundo ocidental. É a tal da fuga do real, da tendência de se acreditar em protetores, da armadilha do conforto do colo do cuidador, de que parece padecer uma geração inteira de homens e mulheres feitos. Não à toa, Deirdre McCloskey vem defendendo a instalação de uma era de adultismo, em que pessoas assumam suas atitudes e a responsabilidade por elas e por suas próprias vidas. Individualmente, amadurecer já é difícil. Em coletividade, com outros membros nos ancorando, é ainda mais. Mas é preciso.

Acompanhe tudo sobre:Políticas públicasSuper-heróis