Entregador de moto: gasto mensal com gasolina pode chegar perto de R$ 1.000 (Capuski/Getty Images)
Instituto Millenium
Publicado em 9 de abril de 2025 às 16h54.
A recente decisão da prefeitura de São Paulo de proibir e combater as motos por aplicativo reacendeu um debate nacional sobre mobilidade urbana. Enquanto a administração paulistana justifica a medida com preocupações de segurança, cidades como Porto Alegre contam uma história diferente: aqui, serviços como Uber Moto e 99Moto operam desde 2022, mesmo sem uma regulamentação municipal específica, oferecendo uma alternativa acessível, eficiente e economicamente vantajosa.
Como porto-alegrense, acompanho de perto essa transformação sutil no tecido urbano da capital gaúcha. Longe de ser um problema, nossa experiência local sugere que a regulamentação, e não a proibição, é o caminho para integrar esse modal ao transporte brasileiro. Mais que isso, o veto em São Paulo levanta uma questão incômoda: será que ele protege a população ou interesses de monopólios do transporte público?
Em Porto Alegre, as motos por aplicativo atendem a uma necessidade real, especialmente em bairros como Restinga, Lomba do Pinheiro e Rubem Berta, onde o transporte público peca em frequência e alcance. É possível ver, diariamente, dezenas de motos conectando essas regiões ao centro, em tempos que ônibus ou carros não conseguem igualar. Uma corrida do Centro ao Partenon, por exemplo, custa cerca de R$6 e leva 10 minutos, contra R$13 e 17 minutos de carro por aplicativo ou R$5 e até 40 minutos de ônibus em horário de pico. Para quem calcula cada minuto e centavo, a diferença pesa.
Como consultor de investimentos, vejo o impacto financeiro disso com nitidez. Motos por aplicativo custam 30% menos que carros, o que permite a uma família com gasto mensal de R$300 em transporte economizar R$90 ao escolhê-las. Em um ano, isso significa mais de R$1.000 — recursos que podem virar material escolar, um curso ou o início de uma poupança.
Os números reforçam essa percepção. Segundo uma pesquisa da FGV-SP com a 99, em 2023, o 99Moto contribuiu com R$5 bilhões ao PIB nacional (0,05% do total), gerou R$461 milhões em impostos e criou mais de 114 mil empregos indiretos. Em Porto Alegre, vemos esse efeito nas comunidades: o dinheiro economizado e ganho pelos motoqueiros aquece a economia de forma tangível.
Críticos apontam a segurança como obstáculo, e os dados realmente merecem atenção: em 2024, Porto Alegre registrou 4,8 mil acidentes com motos, com 42 mortes, segundo a EPTC, que desencoraja o uso das motos por aplicativo.
Mas esses riscos precisam de contexto. Esses 4,8 mil casos englobam todas as motos — de uso pessoal a entregas —, não apenas o transporte de passageiros. Na prática, vemos que motoristas de aplicativo circulando com passageiros tendem a ser mais cautelosos, um senso de responsabilidade compartilhada, com motoristas mais atentos à velocidade e ao cuidado com o passageiro, que reduz os riscos, diferentemente de entregadores pressionados por prazos. Comparados a outros modais, o transporte público e os carros também têm acidentes, e ninguém sugere bani-los por isso.
A solução não é banir, mas regulamentar inteligentemente. Medidas como treinamento obrigatório para motoristas, vistorias trimestrais nas motos e seguros específicos para passageiros reduziriam os riscos. Um limite de velocidade monitorado por GPS, já testado em outras cidades, seria outra solução prática. Porto Alegre opera sem regras municipais detalhadas e, ainda assim, não enfrenta uma crise de acidentes ligada às motos de aplicativo. Isso sugere que, com diretrizes claras, o serviço pode ser ainda mais seguro e confiável.
Desde 2022, Uber Moto e 99Moto estão nas ruas de Porto Alegre, atendendo a uma demanda real sem causar o caos previsto pelos opositores. Em avenidas como Assis Brasil, Protásio Alves e Ipiranga, as motos deslizam entre engarrafamentos, levando pessoas ao trabalho ou a compromissos em metade do tempo dos modais tradicionais. Em áreas como a Restinga, onde ônibus passam com atrasos, elas são um alívio diário. Não competem com o transporte público, mas o complementam onde ele falha.
A EPTC não registra uma explosão de acidentes específica ao transporte de passageiros — diferente dos casos mais frequentes com entregadores. Isso indica que as motos por aplicativo já operam de forma funcional, mesmo sem legislação local detalhada, e reforça seu valor como peça de um sistema de mobilidade mais eficiente e inclusivo.
Enquanto Porto Alegre e outras cidades acolhem as motos por aplicativo, São Paulo escolhe o veto. A prefeitura cita segurança, mas há motivos para duvidar se essa é a única razão. O transporte público tradicional, sustentado por empresas de ônibus que receberão R$6,5 bilhões em subsídios em 2025, enfrenta concorrência direta das motos nas periferias — justamente onde os ônibus deixam a desejar.
Nesse cenário, a proibição parece menos um cuidado com vidas e mais uma defesa de um modelo de negócio consolidado.
Se segurança fosse a prioridade, por que não regulamentar? Cidades como Porto Alegre, Fortaleza e Recife provam que motos por aplicativo podem conviver com o transporte público, oferecendo alívio onde ele não chega. Em vez de banir um serviço vital para os mais pobres, São Paulo poderia investir em ônibus mais frequentes e confiáveis — uma resposta mais justa que um veto puro e simples.
As motos por aplicativo não são o problema da mobilidade urbana, mas parte da solução. Elas criam empregos, reduzem custos de deslocamento e ampliam o acesso, beneficiando tanto o indivíduo quanto a sociedade. Sim, há riscos, mas eles são gerenciáveis com regulamentação inteligente, não com proibições precipitadas.
Porto Alegre, desde 2022, prova isso na prática: o serviço das motos por aplicativo se consolidou, ganhou adeptos por sua praticidade e economia. Cidades que optam por barrá-lo, talvez movidas por interesses nem tão claros, poderiam olhar para exemplos concretos como o que temos por aqui e buscar regras que protejam sem sufocar a liberdade de escolha.
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Leonardo Chagas é consultor e especialista em investimentos, internacionalista pela UFRGS e Diretor Executivo da Rede Liberdade.