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A imunidade parlamentar dos EUA nos ensina sobre o Brasil

A diferença (entre EUA e Brasil) não está no texto da lei, mas no respeito dos juízes ao texto legal.

Donald Trump, ex-presidente dos EUA (Jim Watson/AFP)
André Marsiglia

Colunista - Instituto Millenium

Publicado em 7 de novembro de 2024 às 08h40.

No Brasil, temos assistido a uma onda de parlamentares processados e presos em decorrência de suas falas. É o caso de Marcel Van Hattem e Nikolas Ferreira, que estão sendo investigados e processados no STF, e de Daniel Silveira, que foi condenado pela Corte e está preso desde o início do ano passado.

A imunidade parlamentar não é um direito absoluto. Mesmo em países em que a democracia é madura, como os Estados Unidos, esse direito é limitado. No entanto, não em relação a discursos parlamentares. O artigo I, seção 6, da Constituição norte-americana aduz que políticos eleitos podem ser presos e processados por traição ou crimes graves, mas não em decorrência de suas falas. No Brasil, a Constituição também é clara a esse respeito, talvez até mais. O artigo 53 prevê que “quaisquer” palavras e votos de parlamentares serão “invioláveis”.

Ou seja, a imunidade parlamentar, aqui e lá, não é absoluta, mas protege o direito a discursar de intervenção estatal. E isso não é à toa; a imunidade é um dos eixos de independência institucional do Legislativo. Se o parlamentar, que exerce sua função falando, tiver medo, o parlamento será medroso e a democracia estará acovardada pela pressão dos demais poderes da República.

Justamente por isso, em democracias de fachada, processar e prender políticos é tão conveniente a governantes e juízes, abrindo caminho para submeter legisladores que, por representarem a coletividade, acabam submetendo o próprio povo. Mas se lá e cá a proteção à fala é plena, por qual razão eles não têm presos e processados, e nós sim? A diferença não está no texto da lei, mas no respeito dos juízes ao texto legal.

No Brasil, a impressão é de que a Constituição é uma redação livre de escola, e os juízes os únicos aptos a atualizá-la. Assim, a Constituição brasileira depende da subjetividade e interpretação do Judiciário. Já nos Estados Unidos, habita em torno da Constituição uma cultura de profundo respeito a seu texto e a seu significado histórico. Os juízes não são por lá mais relevantes que as leis ou que as instituições, menos ainda que a história delas.

Haverá quem diga: e como ficam os abusos das falas de parlamentares? Acolher os abusos é o preço social que uma democracia madura como a norte-americana paga para que haja conforto para a existência das boas falas.  Afinal, como o que vem a ser um abuso depende da interpretação de juízes, se a liberdade de fala não for plena, o parlamento estará submetido à subjetividade e terminará com medo, autocensurando-se.

Ao relativizarmos a imunidade parlamentar das falas de políticos, acabamos mostrando que não temos maturidade democrática nenhuma.

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No Brasil, temos assistido a uma onda de parlamentares processados e presos em decorrência de suas falas. É o caso de Marcel Van Hattem e Nikolas Ferreira, que estão sendo investigados e processados no STF, e de Daniel Silveira, que foi condenado pela Corte e está preso desde o início do ano passado.

A imunidade parlamentar não é um direito absoluto. Mesmo em países em que a democracia é madura, como os Estados Unidos, esse direito é limitado. No entanto, não em relação a discursos parlamentares. O artigo I, seção 6, da Constituição norte-americana aduz que políticos eleitos podem ser presos e processados por traição ou crimes graves, mas não em decorrência de suas falas. No Brasil, a Constituição também é clara a esse respeito, talvez até mais. O artigo 53 prevê que “quaisquer” palavras e votos de parlamentares serão “invioláveis”.

Ou seja, a imunidade parlamentar, aqui e lá, não é absoluta, mas protege o direito a discursar de intervenção estatal. E isso não é à toa; a imunidade é um dos eixos de independência institucional do Legislativo. Se o parlamentar, que exerce sua função falando, tiver medo, o parlamento será medroso e a democracia estará acovardada pela pressão dos demais poderes da República.

Justamente por isso, em democracias de fachada, processar e prender políticos é tão conveniente a governantes e juízes, abrindo caminho para submeter legisladores que, por representarem a coletividade, acabam submetendo o próprio povo. Mas se lá e cá a proteção à fala é plena, por qual razão eles não têm presos e processados, e nós sim? A diferença não está no texto da lei, mas no respeito dos juízes ao texto legal.

No Brasil, a impressão é de que a Constituição é uma redação livre de escola, e os juízes os únicos aptos a atualizá-la. Assim, a Constituição brasileira depende da subjetividade e interpretação do Judiciário. Já nos Estados Unidos, habita em torno da Constituição uma cultura de profundo respeito a seu texto e a seu significado histórico. Os juízes não são por lá mais relevantes que as leis ou que as instituições, menos ainda que a história delas.

Haverá quem diga: e como ficam os abusos das falas de parlamentares? Acolher os abusos é o preço social que uma democracia madura como a norte-americana paga para que haja conforto para a existência das boas falas.  Afinal, como o que vem a ser um abuso depende da interpretação de juízes, se a liberdade de fala não for plena, o parlamento estará submetido à subjetividade e terminará com medo, autocensurando-se.

Ao relativizarmos a imunidade parlamentar das falas de políticos, acabamos mostrando que não temos maturidade democrática nenhuma.

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