5 inovações no surf utilizadas por Medina em Pipeline
Todos que gostam do esporte sabem da importância do título de Gabriel Medina para o Brasil, tanto do ponto de vista de incentivo quanto da imagem do surfista brasileiro no mundo. Ao longo dos últimos 20 anos pude acompanhar a evolução dos equipamentos, materiais e na cultura do esporte mas se olharmos mais para trás na história podemos identificar inovações importantes que moldaram o padrão de surf atual. Um atleta […] Leia mais
Da Redação
Publicado em 19 de dezembro de 2014 às 21h17.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 08h11.
Todos que gostam do esporte sabem da importância do título de Gabriel Medina para o Brasil, tanto do ponto de vista de incentivo quanto da imagem do surfista brasileiro no mundo. Ao longo dos últimos 20 anos pude acompanhar a evolução dos equipamentos, materiais e na cultura do esporte mas se olharmos mais para trás na história podemos identificar inovações importantes que moldaram o padrão de surf atual. Um atleta profissional como Medina tem a disposição tecnologias que permitem elevar seu nível de surf nunca imaginados pelos antigos polinésios.
As pranchas, wetsuits, acessórios e previsões das ondas atualmente utilizados são fruto de pesquisas e desenvolvimentos de indústrias química, petroquímica, aeronáutica e militar. Engenheiros, químicos, físicos e outros profissionais (a maioria deles também surfistas) aplicaram seus conhecimentos técnicos e criatividade para criar inovações que mudaram a história do surf. Abaixo apresento a história de cinco delas:
1. Pranchas – a popularização do surf como esporte de massa se deve a muitas inovações nos materiais, quilhas e design das pranchas nos últimos 100 anos. Os antigos havaianos utilizavam pranchas feitas de madeira maciça de 10 a 16 pés dependendo da classe social do surfista. Com a colonização da ilha no século 18 os nativos aos poucos foram sendo afastados do mar e o surf gradualmente perdendo espaço porém no início do século 20 a prática renasceu com o desenvolvimento da ilha como destino turístico e a chegada de colonizadores europeus e americanos. Surfistas como Duke Kahanamoku e George Freeth passaram a viajar pelo mundo demonstrando a atividade e promovendo o turismo e até mesmo empreendimentos imobiliários para atrair compradores e desenvolver regiões até então vistas como sendo carentes de atrativos e perigosas.
A chegada do surf a Califórnia teve um impacto importante no desenvolvimento tecnológico do esporte. O peso das pranchas sempre foram um problema por isso em 1926 Tom Blake desenvolveu uma importante modificação na forma de produzir as pranchas criando as chamadas hollow boards. Essas pranchas eram construídas de madeira mas com um estrutura interna vazada que diminuiu pela metade o peso. Apesar disso, a grande inovação criada por Blake foi a colocação de uma quilha nas pranchas em 1935. Até então o surf se resumia a percorrer ondas em uma direção andando sobre a prancha e pequenas mudanças de direção. Com a introdução da quilha pode-se evoluir nas técnicas e manobras permitindo que o surfista na desgarrasse da parede da onda.
Outros materiais foram testados para reduzir o peso das pranchas como balsa e compensado mas nada teve tanto impacto como as pranchas de bloco e fibra que foram desenvolvidas pelo chamado pai das pranchas modernas, Bob Simmons. A história conta que Simmons teve um acidente de bicicleta quando jovem e foi aconselhado a surfar para recuperar o movimento de um braço. As pranchas da época eram pesadas, o que dificultava o deslocamento então ele usou seu conhecimento de matemática, materiais e hidrodinâmica para desenvolver pranchas que usam fibra de vidro e bloco, materiais que ele conhecia pois trabalhava na indústria de aviação militar no sul da Califórnia.
Anos depois o número de quilhas foram aumentando para duas, três, quatro e até cinco e novos designs sendo incorporados para maximizar o desempenho das pranchas para diferentes estilos de onda e surf. Os materiais também estão sendo aprimorados para melhor desempenho e resistência como fibras de epóxi e blocos de polietileno expandido.
Até o início da década de 90 o processo de fabricação das pranchas eram baseados na produção quase artesanal por parte dos shapers. Com a introdução das máquinas de shape as pranchas começaram a ser produzidas com muito mais escala, permitindo às marcas atender uma demanda muito maior que apenas as comunidades locais de surfistas.
Nesse mesmo período Randy French, um shaper da Califórnia apostou na massificação da produção de pranchas e criou a Surftech. Ele licenciou designs e marcas de pranchas consagradas e desenvolveu um sistema de produção de pranchas que envolve diferentes camadas de materiais para torna-la mais resistente e durável. Tudo isso feito na Tailândia longe dos principais picos do mundo em parceria com a maior fabricante de pranchas do mundo chamada Cobra International.
Um surfista profissional como Gabriel Medina usa de 70 a 100 pranchas ao longo de um ano entre treinos e campeonatos. Para cada etapa seu shaper, Johnny Cabianca da Pukas Surfboards, desenvolve um quiver para as condições da onda. Normalmente são 3 a 4 modelos em diferentes tamanhos chegando a 15 pranchas por etapa. Cada prancha pode traduz o estilo de surf e preferências de manobras de Medina em cada onda do tour.
2. Wetsuits – a invenção dos wetsuits atuais está intimamente ligada com a indústria militar. Durante a segunda guerra mundial os aliados realizavam operações de mergulho para reconhecimento nas praias e remoção de minas visando preparar o desembarque de tropas com segurança. Em locais em que as águas eram frias os chamados homens-rã utilizam roupas de lã sobrepostos com trajes de borracha impermeáveis. O conceito era manter os mergulhadores secos, não permitindo que a água entrasse em contato com o corpo. O grande problemas dos drysuits era justamente o desconforto e a pouca mobilidade que oferecia.
Depois da guerra as forças armadas americanas perceberam a importância estratégica de desenvolver as competências para operações no oceano e passou a investir no desenvolvimento de tecnologias para suas unidades (além do wetsuit outras tecnologias decorreram desses esforços como a previsão de ondas). Hugh Bradner, um físico que durante a guerra trabalhou no projeto da bomba atômica, passou a buscar alternativas para os drysuits. A grande ideia de Bradner foi perceber que você não precisaria ficar seco para ficar quente. Com essa sacada, em 1952 ele mudou o paradigma dos trajes de mergulho.
Para colocar em prática essa ideia de permitir que uma fina camada de água ficasse em contato com a pele ele buscou uma borracha sintética que havia sido desenvolvida pela Dupont em 1930 chamada neoprene. O próprio neoprene foi desenvolvido para suprir a demanda por borracha natural imposta pelas restrições de acesso à matéria-prima vinda da Malásia. Como Bradner não conseguiu patentear sua invenção abriu-se espaço para o surgimento de empresas que visualizaram a nova tecnologia como uma grande oportunidade.
Surgiam então a O’neill e a Body Glove que trouxeram para o surf os wetsuits. O desenvolvimento dos wetsuits é uma das inovações mais importantes da história do surf pois ele permitiu que os surfistas pudessem praticar o esporte em locais até então não explorados (e não somente em locais tropicais), além de permitir que se pudesse ficar mais tempo na água e durante o ano todo. Além disso, o insight que Bradner trouxe, de que o corpo ficasse em contato com a água também foi fundamental para manter a ligação entre o surfista e o oceano.
De lá para cá muitas novidades foram incorporadas aos wetsuits como o nylon (que também havia sido inventado em 1934 pela Dupont) para evitar que as roupas se rasgassem o vestir, mudanças na modelagem, cores, maleabilidade do material, velocidade de secagem, formas de selamento das emendas e outros elementos mas ainda se mantém o conceito original criado por Bradner: quente não seco!
Esse ano, boa parte das das onze etapas do WCT foram surfadas por Medina em locais que se faz necessário a utilização de wetsuits: Margaret River, Bells Beach e J-Bay, Trestles, Hossegor e Peniche ou mesmo em locais de água mais quente que mesmo assim ele utilizou short john como Fiji, Tahiti e mesmo Pipeline.
3. Leash – a invenção do leash trouxe uma ruptura importante na cultura do surf. Até então, o surf e a natação estavam intimamente ligados (assim como o remo). Os grandes responsáveis por difundir o surf moderno eram excelentes nadadores e remadores como Duke Kahanamoku, que ganhou 5 medalhas olímpicas de natação. Até o surgimento do leash nadar atrás da prancha fazia parte de toda experiência de surfar, o que tornava o esporte perigoso em determinadas condições do mar, especialmente para pessoas comuns que não eram grandes nadadores.
Pat O’neill, filho do fundador da empresa de wetsuits de Santa Cruz, Califórnia é considerado o inventor do acessório. Em 1971, Pat utilizou o primeiro leash feito de um tubo elástico cirúrgico preso a prancha em um campeonato de surf em Malibu. Apesar de ter sido desclassificado da competição por levar vantagem em relação aos concorrentes a ideia de manter a prancha presa ao corpo se difundiu. Os primeiros leashes ofereciam proteção mas também eram perigosos aos surfistas pois quando o tubo esticava a prancha voltava contra o corpo devido o efeito chicote. O acidente mais famoso foi o do pai de Pat e fundador da empresa O’neill, que perdeu a visão do olho esquerdo em um acidente devido ao leash (por isso o tapa olho).
Anos depois da invenção de Pat novos materiais começaram a ser desenvolvidos e aplicados nos leashes (logo em seguida começou-se a usar cordas de bungee-jump). Em 1977 um surfista australiano patenteou o uretano que até hoje foi o material que conseguiu entregar o melhor desempenho de resistência e maleabilidade e combinado com desenvolvimentos dos destorcedores, velcro (em substituição ao couro) e outros materiais.
Se o wetsuit foi um dos grandes responsáveis por popularizar o surf, o leash foi um grande indutor para evolução das técnicas de surfar. Com o novo acessório os surfistas passaram a arriscar mais e pegar mais ondas por sessão (já que não tinham que nadar para recuperar as pranchas), além de evitar que as pranchas se quebrassem quando soltas em pedras nas praias ou atingisse algum banhista. Sem dúvidas o leash é um grande aliado dos surfistas profissionais como Medina para refinar as manobras e garantir muitas ondas surfadas por sessão.
4. Previsão das ondas – durante muito tempo em cada ida a praia ou sessão de surf havia uma expectativa grande sobre as condições do mar. A pouca informação sobre as condições das ondas vinha de boletins nas rádios que refletiam apenas o momento sem grande capacidade de prever transformações ao longo do dia ou mesmo da semana. Até a década de 80 a previsão de ondas voltadas para o surf dependia do conhecimento dos picos e dos sinais que o oceano, os ventos e o ambiente dava aos surfistas. Entretanto tudo começou a mudar a partir da criação do Surfline em 1985.
Novamente os investimentos militares em tecnologia tiveram impacto com o desenvolvimento de inovações no surf. Operações militares de desembarque em praias com mares agitados eram problemáticas e arriscadas, fato que começou a demandar investimentos em oceanográfica e tecnologias de sensoriamento das condições meteorológicas e dos mares. Não bastasse a demanda militar, havia também a necessidade de proteger as pessoas de eventos como tsunamis e furacões. O tsunami que atingiu o Hawaii em 1946 matou mais de 150 pessoas pois pegou a população da ilha despreparada, gerando um esforço para monitorar os oceanos com novas tecnologias.
A partir do final da década de 40 começou-se a instalar uma rede de boias em alto mar que, interligadas a postos de comando geravam dados combinados com satélites meteorológicos sobre as condições dos oceanos. Esses dados eram disponibilizados ao público em geral e não demorou para alguns surfistas da Califórnia enxergarem aquilo como uma boa oportunidade de negócio.
O Surfline passou a fornecer não apenas a condição do momento das praias mas também previsões de swell que eram fruto da interpretação dos dados disponíveis. Posteriormente na década de 90 os serviços passaram a ser online e vários outros começaram a fornecer previsões de swell, ventos e período nas praias banhadas pelos Oceano Pacífico. Após o tsunami de 2004 que atingiu vários países e matou milhares de pessoas no Oceano Índico, sistemas de monitoramento foram instalados ao redor do mundo, criando uma rede de informação que também passou a ser utilizado por surfistas no mundo todo.
Os serviços de previsão de ondas mudaram a cultura do surf pois permite que possamos acompanhar o melhor momento e local para entrar na água, além de programar viagens atrás da melhor onda no momento certo. Claro que há um lado negativo nessa história toda pois o surfista de hoje não precisa mais saber “ler” e reforçou o crowd em praias pouco frequentadas.
Para o universo dos campeonatos e surfistas profissionais as novas tecnologias de previsão de ondas foram um importante aliado. Hoje os campeonatos são realizados em janelas de competição, o que permite monitorar quando serão os melhores dias para as baterias acontecerem. A definição de surf trips para treinos de atletas como Medina são baseadas também nas previsões de swell que podem ser determinadas com antecedência.
5. Wearables – os desenvolvimentos mais recentes no surf estão nas chamadas tecnologias vestíveis, que são produtos que ficam vinculados ao corpo humano durante um período de tempo para coleta ou transmissão de dados. Eles podem conter circuitos, conectividade wireless e capacidade de processamento. Muito dos desenvolvimentos até o momento estão restritos a pulseiras e relógios inteligentes mas muitas outras aplicações estão a caminho.
Nos últimos dez anos relógios que informam marés e outras informações básicas foram desenvolvidos para informar aos surfistas o melhor momento do dia para entrar na água. Recentemente os relógios inteligentes com funções integradas à internet, smartphones e GPS prometem elevar os treinos de surf para outro patamar. Medina tem utilizado nos treinamentos o Rip Curl Search GPS que oferece informações como velocidade, distância e permite criar uma base de dados para análise. Esse é o começo da incorporação das tecnologias vestíveis ao mundo do surf. A Red Bull criou um projeto voltado para analisar novas tecnologias chamado Surf Science e várias novas funcionalidades estão sendo testadas em caráter experimental.
Todos que gostam do esporte sabem da importância do título de Gabriel Medina para o Brasil, tanto do ponto de vista de incentivo quanto da imagem do surfista brasileiro no mundo. Ao longo dos últimos 20 anos pude acompanhar a evolução dos equipamentos, materiais e na cultura do esporte mas se olharmos mais para trás na história podemos identificar inovações importantes que moldaram o padrão de surf atual. Um atleta profissional como Medina tem a disposição tecnologias que permitem elevar seu nível de surf nunca imaginados pelos antigos polinésios.
As pranchas, wetsuits, acessórios e previsões das ondas atualmente utilizados são fruto de pesquisas e desenvolvimentos de indústrias química, petroquímica, aeronáutica e militar. Engenheiros, químicos, físicos e outros profissionais (a maioria deles também surfistas) aplicaram seus conhecimentos técnicos e criatividade para criar inovações que mudaram a história do surf. Abaixo apresento a história de cinco delas:
1. Pranchas – a popularização do surf como esporte de massa se deve a muitas inovações nos materiais, quilhas e design das pranchas nos últimos 100 anos. Os antigos havaianos utilizavam pranchas feitas de madeira maciça de 10 a 16 pés dependendo da classe social do surfista. Com a colonização da ilha no século 18 os nativos aos poucos foram sendo afastados do mar e o surf gradualmente perdendo espaço porém no início do século 20 a prática renasceu com o desenvolvimento da ilha como destino turístico e a chegada de colonizadores europeus e americanos. Surfistas como Duke Kahanamoku e George Freeth passaram a viajar pelo mundo demonstrando a atividade e promovendo o turismo e até mesmo empreendimentos imobiliários para atrair compradores e desenvolver regiões até então vistas como sendo carentes de atrativos e perigosas.
A chegada do surf a Califórnia teve um impacto importante no desenvolvimento tecnológico do esporte. O peso das pranchas sempre foram um problema por isso em 1926 Tom Blake desenvolveu uma importante modificação na forma de produzir as pranchas criando as chamadas hollow boards. Essas pranchas eram construídas de madeira mas com um estrutura interna vazada que diminuiu pela metade o peso. Apesar disso, a grande inovação criada por Blake foi a colocação de uma quilha nas pranchas em 1935. Até então o surf se resumia a percorrer ondas em uma direção andando sobre a prancha e pequenas mudanças de direção. Com a introdução da quilha pode-se evoluir nas técnicas e manobras permitindo que o surfista na desgarrasse da parede da onda.
Outros materiais foram testados para reduzir o peso das pranchas como balsa e compensado mas nada teve tanto impacto como as pranchas de bloco e fibra que foram desenvolvidas pelo chamado pai das pranchas modernas, Bob Simmons. A história conta que Simmons teve um acidente de bicicleta quando jovem e foi aconselhado a surfar para recuperar o movimento de um braço. As pranchas da época eram pesadas, o que dificultava o deslocamento então ele usou seu conhecimento de matemática, materiais e hidrodinâmica para desenvolver pranchas que usam fibra de vidro e bloco, materiais que ele conhecia pois trabalhava na indústria de aviação militar no sul da Califórnia.
Anos depois o número de quilhas foram aumentando para duas, três, quatro e até cinco e novos designs sendo incorporados para maximizar o desempenho das pranchas para diferentes estilos de onda e surf. Os materiais também estão sendo aprimorados para melhor desempenho e resistência como fibras de epóxi e blocos de polietileno expandido.
Até o início da década de 90 o processo de fabricação das pranchas eram baseados na produção quase artesanal por parte dos shapers. Com a introdução das máquinas de shape as pranchas começaram a ser produzidas com muito mais escala, permitindo às marcas atender uma demanda muito maior que apenas as comunidades locais de surfistas.
Nesse mesmo período Randy French, um shaper da Califórnia apostou na massificação da produção de pranchas e criou a Surftech. Ele licenciou designs e marcas de pranchas consagradas e desenvolveu um sistema de produção de pranchas que envolve diferentes camadas de materiais para torna-la mais resistente e durável. Tudo isso feito na Tailândia longe dos principais picos do mundo em parceria com a maior fabricante de pranchas do mundo chamada Cobra International.
Um surfista profissional como Gabriel Medina usa de 70 a 100 pranchas ao longo de um ano entre treinos e campeonatos. Para cada etapa seu shaper, Johnny Cabianca da Pukas Surfboards, desenvolve um quiver para as condições da onda. Normalmente são 3 a 4 modelos em diferentes tamanhos chegando a 15 pranchas por etapa. Cada prancha pode traduz o estilo de surf e preferências de manobras de Medina em cada onda do tour.
2. Wetsuits – a invenção dos wetsuits atuais está intimamente ligada com a indústria militar. Durante a segunda guerra mundial os aliados realizavam operações de mergulho para reconhecimento nas praias e remoção de minas visando preparar o desembarque de tropas com segurança. Em locais em que as águas eram frias os chamados homens-rã utilizam roupas de lã sobrepostos com trajes de borracha impermeáveis. O conceito era manter os mergulhadores secos, não permitindo que a água entrasse em contato com o corpo. O grande problemas dos drysuits era justamente o desconforto e a pouca mobilidade que oferecia.
Depois da guerra as forças armadas americanas perceberam a importância estratégica de desenvolver as competências para operações no oceano e passou a investir no desenvolvimento de tecnologias para suas unidades (além do wetsuit outras tecnologias decorreram desses esforços como a previsão de ondas). Hugh Bradner, um físico que durante a guerra trabalhou no projeto da bomba atômica, passou a buscar alternativas para os drysuits. A grande ideia de Bradner foi perceber que você não precisaria ficar seco para ficar quente. Com essa sacada, em 1952 ele mudou o paradigma dos trajes de mergulho.
Para colocar em prática essa ideia de permitir que uma fina camada de água ficasse em contato com a pele ele buscou uma borracha sintética que havia sido desenvolvida pela Dupont em 1930 chamada neoprene. O próprio neoprene foi desenvolvido para suprir a demanda por borracha natural imposta pelas restrições de acesso à matéria-prima vinda da Malásia. Como Bradner não conseguiu patentear sua invenção abriu-se espaço para o surgimento de empresas que visualizaram a nova tecnologia como uma grande oportunidade.
Surgiam então a O’neill e a Body Glove que trouxeram para o surf os wetsuits. O desenvolvimento dos wetsuits é uma das inovações mais importantes da história do surf pois ele permitiu que os surfistas pudessem praticar o esporte em locais até então não explorados (e não somente em locais tropicais), além de permitir que se pudesse ficar mais tempo na água e durante o ano todo. Além disso, o insight que Bradner trouxe, de que o corpo ficasse em contato com a água também foi fundamental para manter a ligação entre o surfista e o oceano.
De lá para cá muitas novidades foram incorporadas aos wetsuits como o nylon (que também havia sido inventado em 1934 pela Dupont) para evitar que as roupas se rasgassem o vestir, mudanças na modelagem, cores, maleabilidade do material, velocidade de secagem, formas de selamento das emendas e outros elementos mas ainda se mantém o conceito original criado por Bradner: quente não seco!
Esse ano, boa parte das das onze etapas do WCT foram surfadas por Medina em locais que se faz necessário a utilização de wetsuits: Margaret River, Bells Beach e J-Bay, Trestles, Hossegor e Peniche ou mesmo em locais de água mais quente que mesmo assim ele utilizou short john como Fiji, Tahiti e mesmo Pipeline.
3. Leash – a invenção do leash trouxe uma ruptura importante na cultura do surf. Até então, o surf e a natação estavam intimamente ligados (assim como o remo). Os grandes responsáveis por difundir o surf moderno eram excelentes nadadores e remadores como Duke Kahanamoku, que ganhou 5 medalhas olímpicas de natação. Até o surgimento do leash nadar atrás da prancha fazia parte de toda experiência de surfar, o que tornava o esporte perigoso em determinadas condições do mar, especialmente para pessoas comuns que não eram grandes nadadores.
Pat O’neill, filho do fundador da empresa de wetsuits de Santa Cruz, Califórnia é considerado o inventor do acessório. Em 1971, Pat utilizou o primeiro leash feito de um tubo elástico cirúrgico preso a prancha em um campeonato de surf em Malibu. Apesar de ter sido desclassificado da competição por levar vantagem em relação aos concorrentes a ideia de manter a prancha presa ao corpo se difundiu. Os primeiros leashes ofereciam proteção mas também eram perigosos aos surfistas pois quando o tubo esticava a prancha voltava contra o corpo devido o efeito chicote. O acidente mais famoso foi o do pai de Pat e fundador da empresa O’neill, que perdeu a visão do olho esquerdo em um acidente devido ao leash (por isso o tapa olho).
Anos depois da invenção de Pat novos materiais começaram a ser desenvolvidos e aplicados nos leashes (logo em seguida começou-se a usar cordas de bungee-jump). Em 1977 um surfista australiano patenteou o uretano que até hoje foi o material que conseguiu entregar o melhor desempenho de resistência e maleabilidade e combinado com desenvolvimentos dos destorcedores, velcro (em substituição ao couro) e outros materiais.
Se o wetsuit foi um dos grandes responsáveis por popularizar o surf, o leash foi um grande indutor para evolução das técnicas de surfar. Com o novo acessório os surfistas passaram a arriscar mais e pegar mais ondas por sessão (já que não tinham que nadar para recuperar as pranchas), além de evitar que as pranchas se quebrassem quando soltas em pedras nas praias ou atingisse algum banhista. Sem dúvidas o leash é um grande aliado dos surfistas profissionais como Medina para refinar as manobras e garantir muitas ondas surfadas por sessão.
4. Previsão das ondas – durante muito tempo em cada ida a praia ou sessão de surf havia uma expectativa grande sobre as condições do mar. A pouca informação sobre as condições das ondas vinha de boletins nas rádios que refletiam apenas o momento sem grande capacidade de prever transformações ao longo do dia ou mesmo da semana. Até a década de 80 a previsão de ondas voltadas para o surf dependia do conhecimento dos picos e dos sinais que o oceano, os ventos e o ambiente dava aos surfistas. Entretanto tudo começou a mudar a partir da criação do Surfline em 1985.
Novamente os investimentos militares em tecnologia tiveram impacto com o desenvolvimento de inovações no surf. Operações militares de desembarque em praias com mares agitados eram problemáticas e arriscadas, fato que começou a demandar investimentos em oceanográfica e tecnologias de sensoriamento das condições meteorológicas e dos mares. Não bastasse a demanda militar, havia também a necessidade de proteger as pessoas de eventos como tsunamis e furacões. O tsunami que atingiu o Hawaii em 1946 matou mais de 150 pessoas pois pegou a população da ilha despreparada, gerando um esforço para monitorar os oceanos com novas tecnologias.
A partir do final da década de 40 começou-se a instalar uma rede de boias em alto mar que, interligadas a postos de comando geravam dados combinados com satélites meteorológicos sobre as condições dos oceanos. Esses dados eram disponibilizados ao público em geral e não demorou para alguns surfistas da Califórnia enxergarem aquilo como uma boa oportunidade de negócio.
O Surfline passou a fornecer não apenas a condição do momento das praias mas também previsões de swell que eram fruto da interpretação dos dados disponíveis. Posteriormente na década de 90 os serviços passaram a ser online e vários outros começaram a fornecer previsões de swell, ventos e período nas praias banhadas pelos Oceano Pacífico. Após o tsunami de 2004 que atingiu vários países e matou milhares de pessoas no Oceano Índico, sistemas de monitoramento foram instalados ao redor do mundo, criando uma rede de informação que também passou a ser utilizado por surfistas no mundo todo.
Os serviços de previsão de ondas mudaram a cultura do surf pois permite que possamos acompanhar o melhor momento e local para entrar na água, além de programar viagens atrás da melhor onda no momento certo. Claro que há um lado negativo nessa história toda pois o surfista de hoje não precisa mais saber “ler” e reforçou o crowd em praias pouco frequentadas.
Para o universo dos campeonatos e surfistas profissionais as novas tecnologias de previsão de ondas foram um importante aliado. Hoje os campeonatos são realizados em janelas de competição, o que permite monitorar quando serão os melhores dias para as baterias acontecerem. A definição de surf trips para treinos de atletas como Medina são baseadas também nas previsões de swell que podem ser determinadas com antecedência.
5. Wearables – os desenvolvimentos mais recentes no surf estão nas chamadas tecnologias vestíveis, que são produtos que ficam vinculados ao corpo humano durante um período de tempo para coleta ou transmissão de dados. Eles podem conter circuitos, conectividade wireless e capacidade de processamento. Muito dos desenvolvimentos até o momento estão restritos a pulseiras e relógios inteligentes mas muitas outras aplicações estão a caminho.
Nos últimos dez anos relógios que informam marés e outras informações básicas foram desenvolvidos para informar aos surfistas o melhor momento do dia para entrar na água. Recentemente os relógios inteligentes com funções integradas à internet, smartphones e GPS prometem elevar os treinos de surf para outro patamar. Medina tem utilizado nos treinamentos o Rip Curl Search GPS que oferece informações como velocidade, distância e permite criar uma base de dados para análise. Esse é o começo da incorporação das tecnologias vestíveis ao mundo do surf. A Red Bull criou um projeto voltado para analisar novas tecnologias chamado Surf Science e várias novas funcionalidades estão sendo testadas em caráter experimental.