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Uma lupa sobre os policymakers

Se aproximarmos uma lupa ao momento em que os policymakers desenham políticas públicas, quais são os grandes desafios sobre esse processo?

Para que a política possa ser desenhada, policymakers se resguardam nos dados disponíveis (Getty Images/Getty Images)
Para que a política possa ser desenhada, policymakers se resguardam nos dados disponíveis (Getty Images/Getty Images)

Por Giovanni De Paola* e Sophie Magri Levy** 

O conteúdo desse blog é gerenciado pelo Insper Metricis, o núcleo do Insper especializado em realizar estudos sobre estratégias organizacionais e práticas de gestão envolvendo projetos com potencial de gerar alto impacto socioambiental.

Há pouco mais de um ano, lançava-se no Insper uma coletânea de artigos a respeito das políticas públicas que não tiveram sucesso no Brasil. Os textos, compilados em formato de livro, contam com especialistas de suas respectivas áreas, dos quais muitos atuaram ou ainda atuam como policymakers. Por essa mesma razão, são cientes de que a visão crítica que emerge após a implementação de qualquer política é sempre uma tarefa menos árdua do que aquela que a precede. Se aproximarmos uma lupa ao momento em que os policymakers desenham políticas públicas, quais os grandes desafios sobre esse processo que somos capazes de enxergar? 

Idealmente, a concepção de que uma dada política pública deva ser posta em prática surge de necessidades e demandas locais, em conjunto com evidências que apontam essas últimas. O próximo passo, naturalmente, é pensar de que maneira o programa deve ser desenhado e sua viabilidade tanto prática quanto financeira. Uma vez implementado, é possível coletar dados e computar evidências da efetividade do programa. Obviamente, no período prévio à implementação, não temos ainda dados em mãos para dizermos se irá funcionar como esperado. 

Para que a política possa ser desenhada, policymakers se resguardam nos dados disponíveis, assim como na literatura acadêmica que circunda a própria política. E é exatamente nessa etapa que um dos problemas fundamentais que antecedem o programa se mostra. Quantas das evidências que temos de outros países/regiões são válidas para pensarmos a política local? Por exemplo, até que ponto o que sabemos sobre um programa de moradias populares no sudeste brasileiro pode ser levado em conta no desenho de um programa similar no Nordeste? Usualmente, denominamos esse possível problema de falta de validade externa. 

Suplantar a ausência de validade externa sobre a literatura disponível é similar a fazer um percurso sem um mapa detalhado: caminhamos conscientes, mas sem saber ao certo para onde ir. Assim, policymakers encaram um risco enorme: dadas as necessidades e demandas populares, vale a pena direcionar recursos públicos para um programa que traz poucas evidências sobre seu sucesso? Afinal, se estamos investindo em uma política, estamos também abrindo mão de outras. 

Assuma, no entanto, um cenário mais positivo. Um em que a validade externa de parte da literatura se faz presente e, inclusive, que seja possível realizar estudos adicionais capazes de incrementar o conhecimento quanto ao sucesso do programa. Isso posto, continuamos com inúmeras pedras no caminho. Políticas públicas ocupam espaço no orçamento e costumam influenciar a popularidade dos governos vigentes. Por conta dos ciclos eleitorais, muitas vezes, o tempo disponível para se desenhar e implementar um programa é curto. Contudo, identificar quais e quantos artigos relevantes à política a literatura dispõe está longe de ser algo simples. O mesmo pode ser dito sobre levar a cabo uma pesquisa do zero sobre o programa. Ambas as tarefas, muitas vezes, demandam mais tempo do que os ciclos eleitorais permitem. Com isso, diante de um cenário mais otimista, persiste o risco que enfrentam os policymakers: gastamos recursos com essa política, ainda que os estudos que temos sejam de baixa qualidade? 

A avaliação de programas, ainda que desafiadora, por fortuna não esbarra nos problemas acima (embora apresente outras dificuldades). Além disso, com essa somos capazes de incorporar à literatura futura erros e acertos do passado. A efetividade, entretanto, é apenas um dos elementos que constituem a complicada dinâmica das ações do governo. É importante também trazer para o debate as informações que os policymakers dispunham durante a elaboração das políticas em questão. Ter consciência dos riscos antes descritos é da mesma ordem democrática que o conhecimento de sua eficácia. 

*Giovanni De Paola é economista graduado pelo Insper e mestre em Economia pela Escola de Economia de São Paulo (EESP-FGV). Doutorando em economia pela Universidade de Rochester. 

**Sophie Magri Levy é economista e mestre em Políticas Públicas, tendo obtido ambas as titulações pelo Insper. Doutoranda em economia pela Universidade de Rochester.