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Responsabilidade social em cadeias de suprimentos: custo ou vantagem competitiva?

Estudo publicado recentemente na Harvard Business Review mostra alternativas para o desenvolvimento de práticas ESG em cadeias de suprimentos

 (RoadLight/Pixabay/Divulgação)
(RoadLight/Pixabay/Divulgação)
I
Impacto Social

Publicado em 19 de julho de 2022 às, 09h00.

O conteúdo desse blog é gerenciado pelo Insper Metricis, o núcleo do Insper especializado em realizar estudos sobre estratégias organizacionais e práticas de gestão envolvendo projetos com potencial de gerar alto impacto socioambiental. 

Por Fernando Picasso*

Muito se discute sobre práticas ESG, sigla utilizada para as ações das companhias nos campos ambiental (E: environmental), social (S: social) e de governança (G: governance). Hoje, não basta que as organizações desenvolvam práticas ESG para suas operações, elas devem ir além, garantindo que outros elos da cadeia também olhem seus impactos. Nessa perspectiva, estudo publicado recentemente na Harvard Business Review mostra algumas alternativas para o desenvolvimento de práticas ESG em cadeias de suprimentos.

No âmbito acadêmico, pesquisadores têm avançado no tema com o uso de métricas de ESG ao longo de cadeias de suprimentos. Apesar dos desenvolvimentos na área, pouco se sabe ainda sobre o assunto. Recentemente, eu e colegas publicamos um estudo que relacionou o grau de adoção de práticas de responsabilidade social nas cadeias de suprimentos a indicadores de desempenho. Utilizando dados coletados entre 2013 e 2018 com base em uma amostra de 262 unidades fabris de 15 países, classificamos essas organizações em três grupos, de acordo com o nível de adoção de práticas de responsabilidade social nas cadeias de suprimentos.

Nesse estudo, chamamos as organizações com maior nível de adoção dessas práticas de “moralmente engajadas”, as com nível médio de “dispostas a cumprir a lei” e as com menor nível de adoção de “egoístas”. Em seguida, comparamos alguns indicadores de desempenho entre esses grupos, como nível de receita e eficiência operacional. As organizações classificadas como “moralmente engajadas” apresentaram um desempenho superior em todas as dimensões analisadas em relação aos outros dois grupos, sugerindo que o desenvolvimento de práticas de responsabilidade social ao longo das cadeias de suprimentos traz vantagens competitivas. Uma possível explicação para esse fenômeno está relacionada ao fato de que esse alto nível de adoção de práticas de responsabilidade social parece influenciar variáveis como reputação e imagem externa da organização.

Apesar de ainda em desenvolvimento, a noção de práticas ESG em cadeias de suprimentos tem mobilizado também gestores públicos. Por exemplo, em 2021, o governo alemão publicou um documento que cria parâmetros de responsabilidade social em cadeias de suprimentos para organizações com mais de 1.000 funcionários que operam na Alemanha. Em meio a várias diretrizes, esse documento exige que essas organizações garantam que seus fornecedores e que os fornecedores de seus fornecedores, por exemplo, não tenham mão de obra análoga à escrava, trabalho infantil, paguem um salário digno, entre outras ações. Na esfera privada, grandes players do mercado têm sido catalizadores de boas práticas ESG em suas cadeias de suprimentos. Google, IBM e Microsoft têm investido cada vez mais na diversidade e inclusão no desenvolvimento de fornecedores liderados por mulheres. Além da vantagem competitiva, não endereçar questões de responsabilidade social em cadeias de suprimentos pode causar impactos desastrosos como vistos nos casos da Nike, Zara e Apple.

As diferentes iniciativas para o desenvolvimento de práticas ESG em cadeias de suprimentos têm demonstrado que seus benefícios vão além de um eventual custo inicial de implementação que possa existir. É urgente que cada vez mais organizações se engajem moralmente no desenvolvimento de cadeias cada vez mais ligadas nos seus impactos sociais e ambientais para o respeito à vida, a preservação de direitos humanos fundamentais e o desenvolvimento de uma sociedade mais igualitária, mostrando que a responsabilidade social é de todos e para todos.

*Fernando Picasso é doutor em administração pela FGV – EAESP e professor no Insper, onde leciona as disciplinas de Gestão da Cadeia de Suprimentos e Riscos e Resiliência em Cadeias de Suprimentos. Seus temas de pesquisa incluem sustentabilidade e risco e resiliência em cadeias de suprimentos