Prêmios salariais do setor público são iguais para todos os servidores?
Salários desproporcionais dentro do setor público parecem existir apenas para uma parcela específica de funcionários
Da Redação
Publicado em 21 de junho de 2022 às 10h00.
O conteúdo desse blog é gerenciado pelo Insper Metricis , o núcleo do Insper especializado em realizar estudos sobre estratégias organizacionais e práticas de gestão envolvendo projetos com potencial de gerar alto impacto socioambiental.
De acordo com o relatório do Banco Mundial sobre gastos públicos, o Brasil está entre os países que mais gasta com a folha de pagamentos (como proporção do PIB) de seus funcionários públicos. O problema, contudo, não está no tamanho do setor público, mas sim nos altos salários pagos. Grande parte das evidências (referências sobre o assunto podem ser encontradas aqui e aqui ) aponta que empregados do setor público costumam receber salários mais altos do que os de funcionários do setor privado. Em minha dissertação de mestrado em políticas públicas ( MPP), exploro esse fenômeno.
Parte do gap salarial público-privado advém de diferenças em habilidades e características entre funcionários de cada setor (idade, educação, experiência, entre outros fatores). De fato, quando comparamos trabalhadores dos setores público e privado, percebemos que aqueles do setor público têm, em média, um maior nível educacional, assim como mais experiência. Dessa forma, é esperado que recebam salários superiores. Entretanto, o que salta aos olhos é que mesmo comparando indivíduos idênticos em termos de características, sendo o setor em que trabalham a única diferença entre eles, ainda assim encontraríamos que funcionários públicos ganham, em média, salários superiores. Ou seja, o simples fato de se trabalhar no setor público é capaz de garantir um prêmio salarial para funcionários daquele setor. Utilizando dados da PNAD (2001-2019) e considerando funcionários formais que trabalham em tempo integral, decomponho a diferença salarial público-privada nesses dois efeitos. Enquanto características distintas garantem que empregados do setor público recebem, em média, 40% a mais do que empregados do setor privado, o prêmio salarial garante a eles, em média, um adicional de 15%. Esses valores, por sua vez, se mostram constantes ao longo dos anos analisados.
Grande parte da literatura brasileira no tema concentra-se em olhar para um prêmio salarial médio. Embora a análise de uma diferença salarial média seja de grande importância e possa nos ajudar a repensar na estrutura salarial do setor público, ela ignora potenciais heterogeneidades entre empregados que se encontram em diferentes faixas de rendimento. Por essa razão, também procuro entender se esse prêmio salarial existe para todo o setor público ou apenas para uma fração específica. Dessa forma, decomponho a diferença salarial público-privada para funcionários que se encontram em diferentes percentis de renda e ao longo do tempo. Encontro que o prêmio parece ser exclusividade da parcela do funcionalismo no topo da distribuição salarial, ou seja, os funcionários públicos que recebem os maiores salários. Isso significa que empregados públicos na base da pirâmide podem até apresentar rendimentos superiores ao outro setor, mas isso se dá quase que exclusivamente pela heterogeneidade nas características. O mesmo não se aplica para a elite do funcionalismo público, mais especificamente para os 10% com salários mais elevados, que é capaz de extrair um prêmio de quase 20% a mais do que seria esperado em comparação àqueles com os maiores rendimentos no setor privado. Além disso, chama a atenção o fato desse prêmio ser constante ao longo dos últimos 20 anos, indicando que nenhuma medida efetiva tenha sido tomada durante todo o período.
Evidências como essa são cruciais quando debatemos reformas acerca do funcionalismo público. A discussão muitas vezes parte do pressuposto de que prêmios salariais no setor público são estruturais e presentes em todas as faixas de renda. Desconsiderar a heterogeneidade dos trabalhadores pode acabar por penalizar a parte inferior da pirâmide social, caso alguma reforma, que não leve em consideração essas peculiaridades, seja encaminhada em um futuro próximo.
*Sophie Magri Levy é economista e mestre em Políticas Públicas, tendo obtido ambas as titulações pelo Insper.
O conteúdo desse blog é gerenciado pelo Insper Metricis , o núcleo do Insper especializado em realizar estudos sobre estratégias organizacionais e práticas de gestão envolvendo projetos com potencial de gerar alto impacto socioambiental.
De acordo com o relatório do Banco Mundial sobre gastos públicos, o Brasil está entre os países que mais gasta com a folha de pagamentos (como proporção do PIB) de seus funcionários públicos. O problema, contudo, não está no tamanho do setor público, mas sim nos altos salários pagos. Grande parte das evidências (referências sobre o assunto podem ser encontradas aqui e aqui ) aponta que empregados do setor público costumam receber salários mais altos do que os de funcionários do setor privado. Em minha dissertação de mestrado em políticas públicas ( MPP), exploro esse fenômeno.
Parte do gap salarial público-privado advém de diferenças em habilidades e características entre funcionários de cada setor (idade, educação, experiência, entre outros fatores). De fato, quando comparamos trabalhadores dos setores público e privado, percebemos que aqueles do setor público têm, em média, um maior nível educacional, assim como mais experiência. Dessa forma, é esperado que recebam salários superiores. Entretanto, o que salta aos olhos é que mesmo comparando indivíduos idênticos em termos de características, sendo o setor em que trabalham a única diferença entre eles, ainda assim encontraríamos que funcionários públicos ganham, em média, salários superiores. Ou seja, o simples fato de se trabalhar no setor público é capaz de garantir um prêmio salarial para funcionários daquele setor. Utilizando dados da PNAD (2001-2019) e considerando funcionários formais que trabalham em tempo integral, decomponho a diferença salarial público-privada nesses dois efeitos. Enquanto características distintas garantem que empregados do setor público recebem, em média, 40% a mais do que empregados do setor privado, o prêmio salarial garante a eles, em média, um adicional de 15%. Esses valores, por sua vez, se mostram constantes ao longo dos anos analisados.
Grande parte da literatura brasileira no tema concentra-se em olhar para um prêmio salarial médio. Embora a análise de uma diferença salarial média seja de grande importância e possa nos ajudar a repensar na estrutura salarial do setor público, ela ignora potenciais heterogeneidades entre empregados que se encontram em diferentes faixas de rendimento. Por essa razão, também procuro entender se esse prêmio salarial existe para todo o setor público ou apenas para uma fração específica. Dessa forma, decomponho a diferença salarial público-privada para funcionários que se encontram em diferentes percentis de renda e ao longo do tempo. Encontro que o prêmio parece ser exclusividade da parcela do funcionalismo no topo da distribuição salarial, ou seja, os funcionários públicos que recebem os maiores salários. Isso significa que empregados públicos na base da pirâmide podem até apresentar rendimentos superiores ao outro setor, mas isso se dá quase que exclusivamente pela heterogeneidade nas características. O mesmo não se aplica para a elite do funcionalismo público, mais especificamente para os 10% com salários mais elevados, que é capaz de extrair um prêmio de quase 20% a mais do que seria esperado em comparação àqueles com os maiores rendimentos no setor privado. Além disso, chama a atenção o fato desse prêmio ser constante ao longo dos últimos 20 anos, indicando que nenhuma medida efetiva tenha sido tomada durante todo o período.
Evidências como essa são cruciais quando debatemos reformas acerca do funcionalismo público. A discussão muitas vezes parte do pressuposto de que prêmios salariais no setor público são estruturais e presentes em todas as faixas de renda. Desconsiderar a heterogeneidade dos trabalhadores pode acabar por penalizar a parte inferior da pirâmide social, caso alguma reforma, que não leve em consideração essas peculiaridades, seja encaminhada em um futuro próximo.
*Sophie Magri Levy é economista e mestre em Políticas Públicas, tendo obtido ambas as titulações pelo Insper.