Prefeitos outsiders distribuem cargos públicos como políticos estabelecidos?
Jorge Ikawa analisa se candidatos outsiders se utilizam da distribuição de cargos públicos para aliados políticos quando são eleitos prefeitos
Publicado em 21 de julho de 2022 às, 09h00.
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Por Jorge Ikawa*
A vitória em eleições locais no Brasil usualmente é acompanhada da distribuição de cargos públicos para aliados políticos, conforme demonstra este estudo. Essa prática geralmente traz efeitos negativos em áreas importantes, como educação e saúde, por exemplo. Em um dos capítulos de minha tese, analiso se determinados candidatos, chamados de outsiders por serem externos ao ambiente político, também se utilizam desse artifício quando são eleitos prefeitos.
Embora a definição de outsider possa variar dependendo do estudo, incluo nessa categoria candidatos que cumpram simultaneamente três requisitos: 1) concorrem pela primeira vez, 2) filiaram-se a algum partido a menos de quatro anos e 3) são candidatos por um partido diferente daquele pelo qual o último prefeito foi eleito (mais sobre o assunto, você confere aqui). Uma vez que esses concorrentes ingressaram somente recentemente no mundo eleitoral, poderiam ter menos conexões políticas, característica esta que tenderia a influenciar a forma como apoiadores políticos são empregados pela administração pública local.
Utilizando a relação de filiados partidários disponibilizada pelo TSE, analiso quantos dos apoiadores do mesmo partido do candidato fazem parte do setor público municipal após o político tomar posse. Com base nesse número e na quantidade total de servidores públicos de cada município, construo uma medida da proporção da máquina local ocupada por partidários. Para tentar inferir causalidade do efeito da vitória de um outsider sobre a composição do setor público local, comparo a proporção de apoiadores do outsider em municípios em que esse candidato venceu ou perdeu por pequena margem de votos, por meio de uma metodologia conhecida como regressão descontínua (RDD, na sigla em inglês). Para efeito de comparação, promovo um exercício parecido com candidatos já imersos na estrutura política (que não sejam prefeitos ou vereadores).
De modo similar ao apontado em trabalhos anteriores (aqui, aqui e aqui, por exemplo), encontro que a vitória de candidatos imersos na estrutura política promove um aumento substancial de apoiadores do mesmo partido em cargos da administração pública municipal. No entanto, no caso de uma vitória de um outsider, os efeitos são estatisticamente nulos. Consistente com essa diferença de comportamento, encontro efeitos similares quando analiso a proporção da folha de pagamento voltada aos apoiadores: um aumento para candidatos imersos no ambiente político e um efeito nulo para os outsiders. Dadas as limitações da metodologia, essas conclusões não necessariamente serão válidas para todas as eleições, restringindo-se apenas para pleitos decididos por pequena margem de votos.
Uma possível explicação para esse fenômeno é que outsiders poderiam se apoiar em uma estrutura administrativa já existente, de modo a promover uma rotatividade menor no setor público, dada a menor experiência política e/ou um menor número de conexões políticas. Para testar se esse seria o caso, analiso a probabilidade de apoiadores do candidato e de seus adversários políticos deixarem o serviço público após o início do novo mandato. Para o caso de apoiadores, não encontro evidências de um comportamento distinto entre outsiders e políticos já estabelecidos. No entanto, encontro evidências de que outsiders são menos severos na penalização de servidores que apoiaram adversários políticos. Apesar do comportamento distinto entre outsiders e políticos estabelecidos, as mudanças promovidas podem ser transitórias, uma vez que a elite política destituída do poder pode tentar retomá-lo. Esse assunto será abordado em um próximo texto. Até lá!
*Jorge Ikawa é doutor em Economia dos Negócios pelo Insper, bacharel em Economia pela FEARP-USP e formado em Jornalismo pela ECA-USP.