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Política de cotas e entrada no mercado de trabalho

Ana Diniz discute sobre a baixa quantidade de estudos que avaliem como as cotas têm impactado a inserção no mercado de trabalho

A diversidade está além da pauta, baseada nos valores da empresa. (Angelina Bambina/Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 18 de agosto de 2022 às 09h00.

O conteúdo desse blog é gerenciado peloInsper Metricis, o núcleo do Insper especializado em realizar estudos sobre estratégias organizacionais e práticas de gestão envolvendo projetos com potencial de gerar alto impacto socioambiental.

Por Ana Diniz*

Este ano completa uma década da promulgação da Lei 12.711 ou Lei de Cotas, que instituiu a reserva de 50% das vagas em instituições federais de ensino superior e técnico de nível médio a estudantes que realizaram todo o ensino médio em escola pública. A partir desse critério inicial, outros recortes foram estabelecidos, incluindo renda familiar, raça, etnia e deficiência. A política de cotas integrou um esforço mais amplo de ampliação do ensino superior público brasileiro, atendendo a um público diverso e de modo inclusivo.

Em 2012, ano de promulgação da lei, previu-se sua revisão após dez anos de implementação. Nesse cenário, pesquisas têm buscado entender os impactos das cotas. Em seu estudo, Tatiana Silva identificou que a política tem contribuído para a mudança do perfil discente no ensino superior, com maior participação de estudantes vindos de família de baixa renda e de pessoas negras. Análises apontaram ainda que não há diferenças significativas seja no desempenho acadêmico ou no envolvimento com o curso de cotistas quando comparados aos não cotistas.

Contudo, há ainda poucos estudos que avaliem como as cotas têm impactado a inserção no mercado de trabalho. Pesquisa desenvolvida em parceria com Patrícia Bierrenbach (Insper) e Wescley Xavier (UFV) ( ver Tema 11 - EnAPG4673 ) aponta para alguns importantes avanços. A partir de dados de inserção profissional de egressos da Universidade Federal de Viçosa que concluíram a graduação entre 2016 e 2021, verificou-se que cotistas e não cotistas apresentam níveis de ocupação semelhantes no mercado de trabalho. Há efeitos positivos também em relação a gênero, já que mulheres apresentaram percentuais de ocupação e atividade similar aos dos homens, independentemente da cor ou raça.

No entanto, quando observados outros indicadores, é possível identificar que os avanços não se dão igualmente para todos os grupos. Egressos negros enfrentam taxas de desemprego 2 pontos percentuais maiores do que os brancos. Essa desvantagem reflete tendência já observada no mercado de trabalho, ainda que em menor intensidade. Além disso, quando analisadas as razões para a não colocação no mercado de trabalho, egressos brancos estão mais frequentemente dedicados aos estudos em outra graduação, mestrado ou doutorado, enquanto egressos negros seguem em busca de postos de trabalho compatíveis com seus níveis de formação e expectativas.

Diferenças são observadas também nos rendimentos dos egressos. Cotistas empregados recebem, em média, 83% do valor recebido pelos não cotistas. Essa desvantagem foi percebida tanto entre homens e mulheres, quanto entre egressos brancos e negros cotistas e não cotistas. A disparidade na renda de cotistas e não cotistas está relacionada tanto ao fato de os primeiros receberem menos na maior parte das áreas de atuação, com exceção das Engenharias, mas também por estarem mais presentes em áreas de remuneração média menor, como cursos das Ciências Humanas.

Desta forma, os resultados indicam que a política de cotas tem efeitos positivos na inserção mais igualitária no trabalho. No entanto, é necessário ainda observar o mesmo fenômeno sob outros ângulos, questionando, inclusive, como as desigualdades e discriminações enfrentadas nas organizações impõem limites para um avanço ainda mais substantivo rumo à inclusão.

* Ana Diniz é professora no Insper. Coordenadora do Núcleo de Estudos em Diversidade e Inclusão no Trabalho. Dedica-se ao desenvolvimento de estudos e tecnologias para a promoção da autonomia econômica das mulheres.

O conteúdo desse blog é gerenciado peloInsper Metricis, o núcleo do Insper especializado em realizar estudos sobre estratégias organizacionais e práticas de gestão envolvendo projetos com potencial de gerar alto impacto socioambiental.

Por Ana Diniz*

Este ano completa uma década da promulgação da Lei 12.711 ou Lei de Cotas, que instituiu a reserva de 50% das vagas em instituições federais de ensino superior e técnico de nível médio a estudantes que realizaram todo o ensino médio em escola pública. A partir desse critério inicial, outros recortes foram estabelecidos, incluindo renda familiar, raça, etnia e deficiência. A política de cotas integrou um esforço mais amplo de ampliação do ensino superior público brasileiro, atendendo a um público diverso e de modo inclusivo.

Em 2012, ano de promulgação da lei, previu-se sua revisão após dez anos de implementação. Nesse cenário, pesquisas têm buscado entender os impactos das cotas. Em seu estudo, Tatiana Silva identificou que a política tem contribuído para a mudança do perfil discente no ensino superior, com maior participação de estudantes vindos de família de baixa renda e de pessoas negras. Análises apontaram ainda que não há diferenças significativas seja no desempenho acadêmico ou no envolvimento com o curso de cotistas quando comparados aos não cotistas.

Contudo, há ainda poucos estudos que avaliem como as cotas têm impactado a inserção no mercado de trabalho. Pesquisa desenvolvida em parceria com Patrícia Bierrenbach (Insper) e Wescley Xavier (UFV) ( ver Tema 11 - EnAPG4673 ) aponta para alguns importantes avanços. A partir de dados de inserção profissional de egressos da Universidade Federal de Viçosa que concluíram a graduação entre 2016 e 2021, verificou-se que cotistas e não cotistas apresentam níveis de ocupação semelhantes no mercado de trabalho. Há efeitos positivos também em relação a gênero, já que mulheres apresentaram percentuais de ocupação e atividade similar aos dos homens, independentemente da cor ou raça.

No entanto, quando observados outros indicadores, é possível identificar que os avanços não se dão igualmente para todos os grupos. Egressos negros enfrentam taxas de desemprego 2 pontos percentuais maiores do que os brancos. Essa desvantagem reflete tendência já observada no mercado de trabalho, ainda que em menor intensidade. Além disso, quando analisadas as razões para a não colocação no mercado de trabalho, egressos brancos estão mais frequentemente dedicados aos estudos em outra graduação, mestrado ou doutorado, enquanto egressos negros seguem em busca de postos de trabalho compatíveis com seus níveis de formação e expectativas.

Diferenças são observadas também nos rendimentos dos egressos. Cotistas empregados recebem, em média, 83% do valor recebido pelos não cotistas. Essa desvantagem foi percebida tanto entre homens e mulheres, quanto entre egressos brancos e negros cotistas e não cotistas. A disparidade na renda de cotistas e não cotistas está relacionada tanto ao fato de os primeiros receberem menos na maior parte das áreas de atuação, com exceção das Engenharias, mas também por estarem mais presentes em áreas de remuneração média menor, como cursos das Ciências Humanas.

Desta forma, os resultados indicam que a política de cotas tem efeitos positivos na inserção mais igualitária no trabalho. No entanto, é necessário ainda observar o mesmo fenômeno sob outros ângulos, questionando, inclusive, como as desigualdades e discriminações enfrentadas nas organizações impõem limites para um avanço ainda mais substantivo rumo à inclusão.

* Ana Diniz é professora no Insper. Coordenadora do Núcleo de Estudos em Diversidade e Inclusão no Trabalho. Dedica-se ao desenvolvimento de estudos e tecnologias para a promoção da autonomia econômica das mulheres.

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