Os efeitos da PEC das Domésticas na formalização e nível de emprego da categoria
No Brasil, uma das categorias profissionais que mais emprega é a de trabalhadores domésticos, com aproximadamente 6 milhões de pessoas
Publicado em 29 de março de 2023 às, 09h00.
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Por Fernando C. Maluf*
No Brasil, uma das categorias profissionais que mais emprega é a de trabalhadores domésticos, com aproximadamente 6 milhões de pessoas, atividade esta predominantemente ocupada por mulheres - que representam mais de 93% da categoria – e sendo, muitas vezes, sua porta de entrada para o mercado de trabalho. Além do alto grau de informalidade histórico, uma vez que muitos dos trabalhadores são diaristas sem carteira de trabalho assinada, é um setor ao qual pouca atenção foi dada ao longo do tempo, com baixo índice de respeito às leis trabalhistas por parte dos empregadores.
Essa falta de foco começou a mudar com a promulgação da Constituição de 1988 e, em especial, em abril de 2013, com a Emenda Constitucional (EC) nº 72, que igualou os direitos dos trabalhadores domésticos aos dos demais trabalhadores. Uma regulamentação da EC nº 72 que trouxe efeito significativo à categoria ocorreu em junho de 2015, com a entrada em vigor da Lei Complementar (LC) nº 150, tornando obrigatória a contribuição por parte do empregador para o FGTS (que antes era opcional) com uma alíquota de 8%, como os demais trabalhadores do setor privado, acrescida de 3,2% de indenização compensatória para casos de demissão sem justa causa. Sob o ponto de vista do empregador, essa mudança poderia ser equiparada a um aumento do salário do trabalhador doméstico mensalista e formal de 11,2%.
Assim, esse “aumento” de salário, oriundo da LC nº 150/2015, pode ter criado um incentivo à informalidade da categoria, visto que as famílias, dado o baixo enforcement (o fazer cumprir, fiscalização) do setor, podem ter optado por não registrarem o trabalhador doméstico. Por outro lado, a regulação pode, além de ter impactado positivamente os ganhos da categoria como um todo, ter trazido para a formalidade trabalhadores que antes eram informais. Em minha dissertação, analiso os efeitos dessa Lei sobre as mulheres domésticas mensalistas entre 14 e 75 anos.
Utilizando a técnica de diferenças-em-diferenças, comparo a formalização e o nível de emprego das domésticas mensalistas (afetadas pela mudança) com um grupo de trabalhadoras exercendo as mesmas atividades em empresas privadas (similares ao grupo sujeito à mudança de legislação) e com as diaristas – em ambos os casos, não afetadas pela mudança na legislação. Usando dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), o estudo mostra que houve uma tendência de diminuição da formalização das domésticas mensalistas e pode-se sustentar até que, em determinado momento após a LC nº 150, as diaristas foram beneficiadas com aumento de seu registro, com perdas para as mensalistas.
Ao compararmos as domésticas mensalistas com as trabalhadoras do setor privado, há um aumento no emprego das domésticas nos primeiros trimestres após a introdução da nova Lei. Já em relação às diaristas, o comparativo é sempre favorável às mensalistas, com resultados mais sólidos e significativos a partir do início de 2016, o que pode sugerir uma migração de trabalhadoras diaristas para o emprego mensalista. Esse efeito, conjuntamente com os resultados de formalização, poderia mostrar que esta migração não foi acompanhada pela devida formalização num primeiro momento.
Dada a importância da categoria das domésticas, principalmente entre as trabalhadoras mulheres, o que se pode desprender é que a LC nº 150/2015, ao igualar o direito ao FGTS para as trabalhadoras domésticas mensalistas, não trouxe grandes efeitos negativos à formalização e ao nível de emprego delas, um resultado importante pelo fato de a Lei ter onerado os empregadores que, mesmo assim, se adequaram à nova Lei nos primeiros trimestres após sua introdução.
*Fernando C. Maluf, com trajetória profissional na indústria e ramo imobiliário, é engenheiro com mestrado em economia pelo Insper.