O amarelar brasileiro frente ao verdejar institucional global
Mais uma vez, as regulações extraterritoriais impostas por outros países colocam em evidência a falta de estruturas de controle e compliance legal no Brasil
Publicado em 23 de junho de 2023 às, 12h38.
Última atualização em 23 de junho de 2023 às, 12h38.
Por Fernanda K. Lemos*
A aprovação da regulamentação pelo Parlamento Europeu em abril de 2023 que proíbe a importação de produtores provenientes de áreas desmatadas após 31 de dezembro de 2020 tem gerado ruídos em diversas cadeias exportadoras. Alguns grupos de interesse afirmaram que foram pegos de surpresa com a “nova barreira ambiental de comércio”. No entanto, não é recente que a União Europeia toma medidas internamente para mitigar suas emissões de gases do efeito estufa (GEE), mesmo quando tais mudanças implicam maiores custos para a população.
Os leitores neste momento já devem estar pensando internamente “eles são países desenvolvidos! Esta população faz parte de nações ricas, isso faz total diferença”. Concordo! Aumentar os custos básicos de vida em nações em desenvolvimento ou em subdesenvolvimento pode levar a consequências sérias. Mas isso não exime a todos de pensar estrategicamente sobre o que a sustentabilidade, desenvolvimento sustentável ou responsabilidade social corporativa representa para os brasileiros. Douglas North[1], em seu trabalho seminal sobre as Instituições, Mudanças Institucionais e a Performance Econômica, denominou a cultura, as normas sociais, ideologias e valores que uma população vive ou quer viver como sociedade como instituições informais. Elas moldam as instituições formais, regulações e leis, que são base para garantir a segurança social e a operação das organizações em um país.
As mudanças das instituições formais e informais na União Europeia em prol da sustentabilidade acontecem internamente de maneira gradual. Em algum momento, esta forma de ver o mundo chegaria a seus mercados como requisitos extraterritoriais para o comércio. Vale a observação de que esse movimento não está acontecendo apenas no Bloco Europeu. O “verdejar silencioso da China”, como bem colocado por Rodrigo Bellezoni, Peng Ren e Zhao Zhong[2], ocorre em um constante movimento de dentro para fora. Os Estados Unidos caminham em prol do controle de emissões[3]. As mudanças de paradigma são claras e apresentam-se no formato de regulações, primeiramente internas, em prol da sustentabilidade e de compromissos globais assumidos desde o Acordo de Paris.
E o Brasil? O país possui um excelente Código Florestal, que há 11 anos não terminou a sua implementação. Também tem um mecanismo de controle e monitoramento, o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que majoritariamente não foi validado. Sem contar com a falta de infraestrutura humana nos diversos institutos e agências, como a Agência Nacional de Mineração (ANM). Ao que parece, não se trata de discrepâncias das demandas sociais de países desenvolvidos e o Brasil, ou tampouco uma falta de capacidade de legislar internamente. Falta estrutura de monitoramento e controle para atender as demandas legais, inicialmente, pois é um direito do produtor rural ter sua documentação ambiental e poder demonstrar que está em conformidade com as leis brasileiras e/ou demandas globais. Bem como das mineradoras e outros sistemas produtivos, que podem ser diretamente impactados pelo excesso de discurso e falta de estratégia e operacionalização em prol da transparência quanto à sustentabilidade, traduzidos em mecanismos de controle e compliance.
*Fernanda K. Lemos é pesquisadora associada na Universidade de York e pesquisadora visitante no Insper (Metricis/IAG). Doutora em Administração de Empresas pela Universidade de São Paulo (FEA/USP).
[1] NORTH, Douglass C. (1990). Institutions, Institutional Change and Economic Performance. Cambridge: Cambridge University Press.
[2] Bellezoni, R., Ren, P. & Zhong, Z. O verdejar silencioso da China. O Estado de São Paulo, 20 de maio de 2023.
[3] Link: Climate Change Regulatory Actions and Initiatives | US EPA