Menos mulheres na política, presente e futuro
Mecanismos de cota existem em grande parte do mundo. De acordo com o International IDEA, somente 19% dos 124 países analisados não têm nenhuma cota
Publicado em 6 de julho de 2021 às, 10h00.
Por Maisa Diniz e Regina Madalozzo
As eleições realizadas em maio no Chile chamaram a atenção por serem paritárias com relação a gênero. Não somente havia reserva de vagas em candidaturas para mulheres, como de assentos para elas. Mas o resultado foi ainda mais surpreendente. Contabilizados os votos, 11 mulheres que teriam sido eleitas cederam lugar para homens e 5 homens, em outros distritos, cederam vagas para mulheres. O mecanismo que garantia a eleição de mulheres acabou por favorecer também alguns homens. É exatamente isso que acontece quando o sistema eleitoral se estrutura a partir de mecanismos comprometidos com a representatividade.
Mecanismos de cota existem em grande parte do mundo. De acordo com o International IDEA, somente 19% dos 124 países analisados não têm nenhum tipo de cota eleitoral para mulheres. O Brasil, desde 1995, reserva cotas para mulheres nas candidaturas. Ao mesmo tempo, somos o país que só construiu um banheiro feminino no plenário do Senado em 2016. Ou seja, o compromisso com a representatividade não é uma prioridade.
Inicialmente, a legislação reservava 20% das candidaturas para pessoas do sexo feminino. Aos poucos, esse percentual foi elevado para 30%. Mas, somente em 2015 houve um salto mais concreto com a destinação de parte dos recursos financeiros obrigatoriamente para candidatas mulheres. Para se ter uma ideia da relevância dessa conquista, em São Paulo, dos 55 vereadores eleitos, 50 gastaram mais de cem mil reais em suas campanhas. Milton Leite foi o vereador que se elegeu com a campanha mais cara, com R$ 2,5 milhões.
Atualmente está em análise um projeto de reserva de assentos para mulheres no Congresso e Senado. Em tese seria inspirado no caso do Chile, mas na prática trouxe distorções relevantes. Institui cota de apenas 15% para mulheres eleitas, o que torna a proposta inócua, uma vez que já temos 15% de mulheres eleitas na Câmara Federal e no Senado. Além disso, retira as cotas de candidaturas (e, consequentemente, a distribuição obrigatória do fundo de financiamento de campanha para as mulheres). Essa proposta só garante a estabilidade da participação das mulheres na política em um patamar baixo o suficiente para não incomodar velhos caciques.
Na política, as pesquisas mostram que com mais mulheres eleitas aumentam os investimentos públicos em educação e saúde. Além disso, estudo publicado recentemente mostra que uma mulher conquistar o cargo de prefeita aumenta significativamente o engajamento voluntário de meninas adolescentes – maiores de 16 e menores de 18 anos – no processo eleitoral.
O que aconteceu no Chile é uma inspiração de inovação política e solidez democrática. Mas, por aqui, continuamos a distorcer bons exemplos para garantir que tudo permaneça igual. Enquanto isso, vamos nos afastando da política e a política se parecendo cada vez menos com o que somos.
A urgência da representatividade nos espaços políticos de poder precisa ser o pilar central do projeto de país que queremos no presente para um futuro em que política tenha cada vez mais a nossa cara. E é por isso que metade das cadeiras, metade das candidatas e metade do fundo eleitoral são justos para um país que implora por uma política que seja a ponte para uma realidade mais próspera e igualitária.