Manifestações de violência em instituições de ensino
Relatório de 2022 contabiliza que mais de 15 escolas foram atacadas no Brasil nos últimos 25 anos
Blog Impacto Social
Publicado em 17 de maio de 2023 às 09h00.
Por Ellen Coutinho Lião* da Silva e Sérgio Roberto Cardoso**
"Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas". Este é o título que o filósofo, poeta e educador Rubem Alves nomeou uma de suas tantas crônicas. Nesta, ele descreve que: "Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo [...]. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o voo. Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar [...]."
Relatório governamental de 2022 contabiliza que mais de 15 escolas foram atacadas no Brasil nos últimos 25 anos, sendo 82,3% instituições públicas de ensino. Os dados emitem um alerta, pois anunciam a distorção do espaço de voo dos pássaros (toda a equipe escolar) para um ambiente cercado de traumas e sensação de insegurança – gaiolas que limitam esses pássaros. Isso porque a violência física se estende do plano físico e passa a coagir todo o tecido social. Parte das escolas brasileiras, sobretudo na esfera pública, já são permeadas por violências simbólicas: desvalorização e alta rotatividade dos profissionais, falta de respaldo pedagógico e infraestrutura desqualificada são exemplos dessa questão. A este conjunto, acentuam-se as ameaças e consumação de ataques.
É comum associarmos as violências ocorridas à bullying e jogos violentos (embora, estudos como este não encontrem evidências de que exposição a jogos violentos causem diferenças nos níveis de agressividade). No entanto, outros fatores se tornam imprescindíveis à análise na era digital, como as redes sociais e os transtornos advindos de seu uso em excesso. Elas foram largamente adotadas pela sociedade a partir do propósito de se conectar, mesmo distante, à rede de amizades. O crescimento desse hábito, no entanto, expandiu-se para a criação de grupos de usuários que se identificam com os mais diversos temas e personalidades - inclusive criminosas, como quando falamos de apreço a autores de ataques às escolas.
Assim, crianças e jovens que acessam as redes são envoltos de preocupante vulnerabilidade a ideologias extremistas. De acordo com informações governamentais, milhares de postagens com conteúdo de ódio com vídeos e convites a ataques foram identificadas nas redes sociais. A falta de restrição do conteúdo disseminado em grupos, bem como o mecanismo de retenção da atenção do usuário por algoritmos de recomendação são agravantes que devem ser discutidos. Mundialmente, já há leis que buscam regular o uso das redes sociais pelo público mais vulnerável.
“Dar aos pássaros coragem para voar” (nas palavras de Alves) hoje representa propiciar um ambiente seguro às crianças e adolescentes que enxergam na educação um instrumento para transformar a qualidade de sua vida e de sua comunidade. Considerando que, de acordo com o Censo Escolar de 2021, mais de 80% das matrículas nacionais são da rede pública, tratar da temática é cuidar do futuro do país. Em linha com o que o poeta nos legou: dar asas às escolas é permitir o voo da própria sociedade.
*Ellen Coutinho Lião da Silva foi aluna na Escola Municipal de Ensino Integral Padre Eustáquio em São Paulo. Hoje estuda Engenharia de Computação no Insper, onde é membra do coletivo negro Raposas Negras e monitora da disciplina Grandes Desafios da Engenharia.
**Sérgio Roberto Cardoso foi aluno e professor de escolas públicas, cientista social, doutorando em Educação (USP) e professor de Humanidades no Insper.
Por Ellen Coutinho Lião* da Silva e Sérgio Roberto Cardoso**
"Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas". Este é o título que o filósofo, poeta e educador Rubem Alves nomeou uma de suas tantas crônicas. Nesta, ele descreve que: "Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo [...]. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o voo. Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar [...]."
Relatório governamental de 2022 contabiliza que mais de 15 escolas foram atacadas no Brasil nos últimos 25 anos, sendo 82,3% instituições públicas de ensino. Os dados emitem um alerta, pois anunciam a distorção do espaço de voo dos pássaros (toda a equipe escolar) para um ambiente cercado de traumas e sensação de insegurança – gaiolas que limitam esses pássaros. Isso porque a violência física se estende do plano físico e passa a coagir todo o tecido social. Parte das escolas brasileiras, sobretudo na esfera pública, já são permeadas por violências simbólicas: desvalorização e alta rotatividade dos profissionais, falta de respaldo pedagógico e infraestrutura desqualificada são exemplos dessa questão. A este conjunto, acentuam-se as ameaças e consumação de ataques.
É comum associarmos as violências ocorridas à bullying e jogos violentos (embora, estudos como este não encontrem evidências de que exposição a jogos violentos causem diferenças nos níveis de agressividade). No entanto, outros fatores se tornam imprescindíveis à análise na era digital, como as redes sociais e os transtornos advindos de seu uso em excesso. Elas foram largamente adotadas pela sociedade a partir do propósito de se conectar, mesmo distante, à rede de amizades. O crescimento desse hábito, no entanto, expandiu-se para a criação de grupos de usuários que se identificam com os mais diversos temas e personalidades - inclusive criminosas, como quando falamos de apreço a autores de ataques às escolas.
Assim, crianças e jovens que acessam as redes são envoltos de preocupante vulnerabilidade a ideologias extremistas. De acordo com informações governamentais, milhares de postagens com conteúdo de ódio com vídeos e convites a ataques foram identificadas nas redes sociais. A falta de restrição do conteúdo disseminado em grupos, bem como o mecanismo de retenção da atenção do usuário por algoritmos de recomendação são agravantes que devem ser discutidos. Mundialmente, já há leis que buscam regular o uso das redes sociais pelo público mais vulnerável.
“Dar aos pássaros coragem para voar” (nas palavras de Alves) hoje representa propiciar um ambiente seguro às crianças e adolescentes que enxergam na educação um instrumento para transformar a qualidade de sua vida e de sua comunidade. Considerando que, de acordo com o Censo Escolar de 2021, mais de 80% das matrículas nacionais são da rede pública, tratar da temática é cuidar do futuro do país. Em linha com o que o poeta nos legou: dar asas às escolas é permitir o voo da própria sociedade.
*Ellen Coutinho Lião da Silva foi aluna na Escola Municipal de Ensino Integral Padre Eustáquio em São Paulo. Hoje estuda Engenharia de Computação no Insper, onde é membra do coletivo negro Raposas Negras e monitora da disciplina Grandes Desafios da Engenharia.
**Sérgio Roberto Cardoso foi aluno e professor de escolas públicas, cientista social, doutorando em Educação (USP) e professor de Humanidades no Insper.