Investimento de impacto: avanços recentes e a necessidade da medição
Em 2020, o total de ativos neste segmento já somava US$ 2,2 bilhões
Publicado em 17 de março de 2022 às, 08h00.
Por Angélica Rotondaro*
Em novembro de 2012, o Insper e o então hub da Universidade de St.Gallen organizaram a primeira conferência sobre investimento de impacto no Brasil. O encontro contou com 90 participantes, dentre organizações e indivíduos envolvidos na agenda de energias renováveis, moradia de interesse social e acesso à saúde. Deste encontro nasceram e se fortaleceram vários dos principais atores de investimento de impacto no Brasil.
Naquele momento, o total de capital alocado no setor era de US$ 785 milhões no Brasil. Em 2020, o total de ativos neste segmento já somava US$ 2,2 bilhões (total incluindo as organizações de microcrédito). A evolução neste período é um indício de que houve no país progresso no entendimento de questões relacionadas à expectativa de retorno financeiro ajustado ao risco e à inclusão de novos temas prioritários para definir o aporte de capital.
Dentre os temas relevantes a essa agenda, destaca-se o setor de saúde, seguido pelas tecnologias verdes. Em termos de instrumento financeiro, o investimento via estrutura de dívida segue como uma preferência, principalmente para o setor de agricultura e alimento. No entanto, um ponto positivo neste quesito é o aumento dos instrumentos de equity ou quasi-equity para alocações em negócios em estágio de venture capital.
Para ilustrar a importância da conexão entre o investimento de impacto como capital first mover em startups com modelos inovadores, mas que ainda precisam de escala, com o capital de corporate venturing, apresento dois exemplos. O primeiro é o caso do capital catalítico de um fundo de impacto, a Positive Ventures, no Series A do Labi Exames, healthtech que oferece exames laboratoriais de baixo custo. Em menos de 18 meses, o Labi Exames despertou atenção da Raia Drogasil, que acabou liderando o Series B da companhia, concluído em dezembro de 2021. Além do papel desempenhado no setor de saúde, a Positive Ventures foi um dos primeiros fundos a apostar na temática de economia circular, tendo liderado o seed round da Eureciclo, atualmente a maior certificadora de créditos de reciclagem da América Latina.
O segundo exemplo ilustra o papel do capital filantrópico estratégico. Neste sentido, destaco a Fundação Grupo Boticário, mantida por investimento social privado, que oferece capacitações e incentivos para negócios da economia verde e azul e a estruturação de fundos filantrópicos para direcionar capital semente e alavancar negócios locais. Dentre os programas, há o Camp Oceano, que selecionou 19 propostas de soluções para desafios da costa brasileira que serão apoiadas com um capital total de R$ 3,7 milhões a partir de 2022.
A reflexão acima, no entanto, ainda deixa de lado um dos elementos essenciais dos investimentos de impacto, a necessidade de mensuração do impacto. No último mapeamento da ANDE, 75% dos entrevistados afirmaram medir o impacto de todas ou quase todas as empresas de seu portfólio. Apesar disso, destes, 59% relataram utilizar ferramentas próprias ou menos conhecidas de medição, indicando o baixo uso de instrumentos padronizados. O principal argumento é o custo da medição.
No investimento de impacto, a medição é parte do ethos do investimento, assim como a intencionalidade. Para ganhar escala e para que não se desconecte de sua missão, investimentos de impacto não podem esquecer que we cannot value what we do not measure.
* Angélica Rotondaro é sócia fundadora da Alimi Impact Ventures, diretora executiva no Climate Smart Institute e membro do conselho do Insper Metricis.