Especialistas e credibilidade em tempos de fake news
Estudo analisa qual é o papel da credibilidade de fontes em um contexto onde cada vez mais somos expostos a diversas informações simultaneamente
Fabiane Stefano
Publicado em 28 de junho de 2020 às 09h00.
Última atualização em 31 de janeiro de 2022 às 13h49.
Você já parou para pensar se dá pesos iguais à opinião de um médico ou do seu vizinho quando o assunto é saúde? Ou ainda, se você deveria seguir o conselho de um mecânico profissional ou do seu tio quando precisa consertar o carro?
A não ser que seu vizinho seja um médico ou que seu tio seja um mecânico, provavelmente você considera a opinião dessas pessoas de modo muito diferente. Com o objetivo de entender um pouco melhor o papel da credibilidade da fonte emissora na transmissão do conhecimento, desenvolvi estudos com gerentes de empresas e trabalhadores de uma plataforma digital.
Nestes trabalhos, os indivíduos receberam diversas informações que poderiam ajudá-los a realizar uma determinada tarefa. No entanto, para parte do grupo, além das instruções, foram emitidos “sinais” sobre a credibilidade das fontes de informação (por exemplo, se a informação foi retirada de uma especialista no tema ou de uma opinião pessoal).
Conforme o esperado, indivíduos que receberam “sinais” de credibilidade adquiriram conhecimento das fontes que lhes pareceram mais confiáveis. Essa priorização aconteceu mesmo quando conhecimentos associados a fontes menos críveis eram tão relevantes quanto (ou até mais) para a execução da tarefa.
Os participantes da pesquisa (especialmente os mais experientes) demonstraram um viés ao selecionar apenas fontes que lhes pareciam mais confiáveis, sem efetivamente julgar a relevância das demais informações.
Assim, foi possível concluir que, quando expostos a múltiplas informações, indivíduos tendem a focar apenas em conhecimento de fontes que lhes parecem críveis e ignorar demais informações (potencialmente úteis) não associados a tais fontes.
Essa tendência passa a ser um problema tanto em um contexto de fake news, em que indivíduos vivem em bolhas de informação que reforçam a “credibilidade” de um pequeno número de fontes, quanto em um cenário no qual o estoque de conhecimento de uma pessoa (por exemplo, um especialista em economia) enviesa sua percepção sobre a credibilidade de fontes de conhecimento de outras especialidades (por exemplo, um epidemiologista).
Por um lado, deve-se frisar que é sensato e desejável adquirir informações de fontes efetivamente críveis, na medida que um indivíduo busca as melhores informações possíveis. Por outro, a própria experiência de uma pessoa pode gerar uma percepção enviesada sobre o que é uma fonte crível. Em particular, a experiência em um campo único pode gerar um viés (in)consciente ao julgar fontes de conhecimento de outras disciplinas.
Ao se lidar com problemas interdisciplinares, há a necessidade de repensar mecanismos para promover a troca de conhecimento entre indivíduos de campos diferentes. Manter um espaço de diálogo entre especialistas de diversas áreas pode ser uma das chaves para se encontrar soluções efetivas para tais problemas.
Thomaz Teodorovicz é pesquisador da Universidade de Harvard, doutor em Economia dos Negócios e pesquisador do Insper Metricis
Você já parou para pensar se dá pesos iguais à opinião de um médico ou do seu vizinho quando o assunto é saúde? Ou ainda, se você deveria seguir o conselho de um mecânico profissional ou do seu tio quando precisa consertar o carro?
A não ser que seu vizinho seja um médico ou que seu tio seja um mecânico, provavelmente você considera a opinião dessas pessoas de modo muito diferente. Com o objetivo de entender um pouco melhor o papel da credibilidade da fonte emissora na transmissão do conhecimento, desenvolvi estudos com gerentes de empresas e trabalhadores de uma plataforma digital.
Nestes trabalhos, os indivíduos receberam diversas informações que poderiam ajudá-los a realizar uma determinada tarefa. No entanto, para parte do grupo, além das instruções, foram emitidos “sinais” sobre a credibilidade das fontes de informação (por exemplo, se a informação foi retirada de uma especialista no tema ou de uma opinião pessoal).
Conforme o esperado, indivíduos que receberam “sinais” de credibilidade adquiriram conhecimento das fontes que lhes pareceram mais confiáveis. Essa priorização aconteceu mesmo quando conhecimentos associados a fontes menos críveis eram tão relevantes quanto (ou até mais) para a execução da tarefa.
Os participantes da pesquisa (especialmente os mais experientes) demonstraram um viés ao selecionar apenas fontes que lhes pareciam mais confiáveis, sem efetivamente julgar a relevância das demais informações.
Assim, foi possível concluir que, quando expostos a múltiplas informações, indivíduos tendem a focar apenas em conhecimento de fontes que lhes parecem críveis e ignorar demais informações (potencialmente úteis) não associados a tais fontes.
Essa tendência passa a ser um problema tanto em um contexto de fake news, em que indivíduos vivem em bolhas de informação que reforçam a “credibilidade” de um pequeno número de fontes, quanto em um cenário no qual o estoque de conhecimento de uma pessoa (por exemplo, um especialista em economia) enviesa sua percepção sobre a credibilidade de fontes de conhecimento de outras especialidades (por exemplo, um epidemiologista).
Por um lado, deve-se frisar que é sensato e desejável adquirir informações de fontes efetivamente críveis, na medida que um indivíduo busca as melhores informações possíveis. Por outro, a própria experiência de uma pessoa pode gerar uma percepção enviesada sobre o que é uma fonte crível. Em particular, a experiência em um campo único pode gerar um viés (in)consciente ao julgar fontes de conhecimento de outras disciplinas.
Ao se lidar com problemas interdisciplinares, há a necessidade de repensar mecanismos para promover a troca de conhecimento entre indivíduos de campos diferentes. Manter um espaço de diálogo entre especialistas de diversas áreas pode ser uma das chaves para se encontrar soluções efetivas para tais problemas.
Thomaz Teodorovicz é pesquisador da Universidade de Harvard, doutor em Economia dos Negócios e pesquisador do Insper Metricis