Atenção básica que salva vidas: evidências da Estratégia Saúde da Família
Estudo encontra evidências que reforçam que a exposição à ESF e seu tempo de exposição são essenciais na prevenção de mortes por condições evitáveis
Da Redação
Publicado em 31 de março de 2022 às 11h20.
Por Adriano Dutra Teixeira*
Desde a sua concepção, a Estratégia Saúde da Família (ESF) gradativamente se tornou a principal estratégia de acesso à atenção básica no Brasil. Tendo como eixo norteador os princípios do SUS, a ESF tem como objetivo proporcionar saúde básica por meio da ação de equipes de profissionais de saúde, que visitam e acompanham as famílias em suas comunidades. Cada equipe é formada por ao menos um médico, um enfermeiro e agentes comunitários de saúde, que seguem um número pré-planejado de famílias, oferecendo aconselhamento de saúde e orientações relacionadas à prevenção e recuperação de doenças.
Sua execução requer esforços colaborativos entre os governos municipal, estadual e federal. Com a participação progressiva de novos municípios, a ESF experimentou um aumento expressivo de municípios cobertos, especialmente durante o início dos anos 2000. Em 2022, a ESF já conta com equipes em 5510 dos 5570 municípios brasileiros.
Após mais de 20 anos de sua criação, torna-se necessário a avaliação de seus efeitos. Em particular, existem estudos importantes que verificaram que a ESF teve influência na redução da mortalidade infantil e adulta e na hospitalização por doenças crônicas. Alguns destes, no entanto, focaram nos primeiros anos de implementação da estratégia.
Em artigo da minha tese, investigamos os efeitos de longo prazo acerca da adesão dos municípios à ESF, bem como do tempo de exposição e intensidade de cobertura municipal, na mortalidade infantil por causas evitáveis. Estas condições são classificadas como reduzíveis por: i) ações de imunização; ii) atenção à mulher na gestação; iii) atenção à mulher no parto; iv) atenção ao recém-nascido; v) ações de diagnóstico e tratamento; vi) promoção à saúde vinculadas a ações de atenção. Nossa metodologia incorpora os efeitos pelo tempo de exposição, decorrente do número de anos em que o município dispõe da ESF, e pela intensidade de cobertura, definida de acordo com o número de habitantes por equipe em cada município.
O gráfico acima ilustra um de nossos resultados, em que estimamos o efeito do tempo de exposição em cada intensidade. A baixa intensidade da ESF configura um município com equipes que cobrem menos de um quarto de sua população, enquanto que a alta intensidade possui equipes suficientes para cobrir mais de 75% de sua população. Os resultados indicam que os efeitos na mortalidade infantil por condições evitáveis são maiores quanto mais os municípios estão expostos a médias e altas intensidades da ESF. Além disso, a redução da mortalidade pode ser até 3 vezes maior na alta intensidade em comparação com a baixa intensidade.
Estudos recém-publicados indicam que o efeito heterogêneo da ESF se estende também a adultos. Vale citar a recente investigação do efeito de diferentes intensidades da ESF nas condições sensíveis à atenção básica, que revela que os efeitos duradouros na mortalidade adulta são verificados apenas para a exposição à alta intensidade. Com dados individuais, nosso outro estudo mede a influência da cobertura domiciliar nos resultados de biomarcadores de adultos e evidencia efeitos da ESF nos indicadores de anemia e hipertensão arterial, por exemplo. Os resultados convergem, portanto, ao revelar os efeitos benéficos da Estratégia Saúde da Família, mas acentuam que desafios precisam ser superados na expansão da atenção básica no Brasil, em especial, sobre a importância de continuar o incremento da cobertura em áreas que ainda possuem baixa intensidade de equipes.
* Adriano Dutra Teixeira é Professor de Economia do Insper e membro do Global Health Econometrics & Economics - Brazilian Group (GHE2 - Brazil). Possui doutorado em Economia pela Universidade de São Paulo e sua área de pesquisa concentra temas de Avaliação de Impacto, Economia da Saúde e Economia do Gênero.
Por Adriano Dutra Teixeira*
Desde a sua concepção, a Estratégia Saúde da Família (ESF) gradativamente se tornou a principal estratégia de acesso à atenção básica no Brasil. Tendo como eixo norteador os princípios do SUS, a ESF tem como objetivo proporcionar saúde básica por meio da ação de equipes de profissionais de saúde, que visitam e acompanham as famílias em suas comunidades. Cada equipe é formada por ao menos um médico, um enfermeiro e agentes comunitários de saúde, que seguem um número pré-planejado de famílias, oferecendo aconselhamento de saúde e orientações relacionadas à prevenção e recuperação de doenças.
Sua execução requer esforços colaborativos entre os governos municipal, estadual e federal. Com a participação progressiva de novos municípios, a ESF experimentou um aumento expressivo de municípios cobertos, especialmente durante o início dos anos 2000. Em 2022, a ESF já conta com equipes em 5510 dos 5570 municípios brasileiros.
Após mais de 20 anos de sua criação, torna-se necessário a avaliação de seus efeitos. Em particular, existem estudos importantes que verificaram que a ESF teve influência na redução da mortalidade infantil e adulta e na hospitalização por doenças crônicas. Alguns destes, no entanto, focaram nos primeiros anos de implementação da estratégia.
Em artigo da minha tese, investigamos os efeitos de longo prazo acerca da adesão dos municípios à ESF, bem como do tempo de exposição e intensidade de cobertura municipal, na mortalidade infantil por causas evitáveis. Estas condições são classificadas como reduzíveis por: i) ações de imunização; ii) atenção à mulher na gestação; iii) atenção à mulher no parto; iv) atenção ao recém-nascido; v) ações de diagnóstico e tratamento; vi) promoção à saúde vinculadas a ações de atenção. Nossa metodologia incorpora os efeitos pelo tempo de exposição, decorrente do número de anos em que o município dispõe da ESF, e pela intensidade de cobertura, definida de acordo com o número de habitantes por equipe em cada município.
O gráfico acima ilustra um de nossos resultados, em que estimamos o efeito do tempo de exposição em cada intensidade. A baixa intensidade da ESF configura um município com equipes que cobrem menos de um quarto de sua população, enquanto que a alta intensidade possui equipes suficientes para cobrir mais de 75% de sua população. Os resultados indicam que os efeitos na mortalidade infantil por condições evitáveis são maiores quanto mais os municípios estão expostos a médias e altas intensidades da ESF. Além disso, a redução da mortalidade pode ser até 3 vezes maior na alta intensidade em comparação com a baixa intensidade.
Estudos recém-publicados indicam que o efeito heterogêneo da ESF se estende também a adultos. Vale citar a recente investigação do efeito de diferentes intensidades da ESF nas condições sensíveis à atenção básica, que revela que os efeitos duradouros na mortalidade adulta são verificados apenas para a exposição à alta intensidade. Com dados individuais, nosso outro estudo mede a influência da cobertura domiciliar nos resultados de biomarcadores de adultos e evidencia efeitos da ESF nos indicadores de anemia e hipertensão arterial, por exemplo. Os resultados convergem, portanto, ao revelar os efeitos benéficos da Estratégia Saúde da Família, mas acentuam que desafios precisam ser superados na expansão da atenção básica no Brasil, em especial, sobre a importância de continuar o incremento da cobertura em áreas que ainda possuem baixa intensidade de equipes.
* Adriano Dutra Teixeira é Professor de Economia do Insper e membro do Global Health Econometrics & Economics - Brazilian Group (GHE2 - Brazil). Possui doutorado em Economia pela Universidade de São Paulo e sua área de pesquisa concentra temas de Avaliação de Impacto, Economia da Saúde e Economia do Gênero.