Por que uma startup está contratando 800 pessoas no meio da pandemia?
Na contramão da crise provocada pelo coronavírus, uma empresa de call center em casa mostra como negócios para as pessoas e para o clima podem prosperar
isabelarovaroto
Publicado em 6 de abril de 2020 às 17h35.
Última atualização em 6 de abril de 2020 às 22h26.
Enquanto empresas se preparam para enfrentar a maior crise de sua história, uma dupla de empreendedores brasileiros está contratando e anunciou a abertura de 800 vagas. Eles estão na contramão da recessão provocada pela pandemia de coronavírus . Quando os amigos Ricardo Galdino e Geraldo Brasil tiveram a ideia da JobHome, em 2017, obviamente não imaginavam que pouco tempo depois o mundo iria enfrentar uma pandemia. Nem que as medidas de distanciamento social impostas para conter o avanço no número de casos de coronavírus iria obrigar as pessoas a ficarem em casa.
Mas eles já sabiam que o trabalho em casa era uma tendência promissora. E foi de olho nisso que os sócios fundaram a primeira empresa brasileira especializada em call center 100% home office. Ao criar um software, que permite a gestão tanto de projetos, quanto de operadores remotamente, eles anteciparam o que agora é uma necessidade.
A maior parte dos call centers ainda não tem sistemas home office. As justificativas mais comuns para que esse trabalho continue sendo presencial são os protocolos que, por segurança, só podem ser acessados de um local físico. Mas bastou um momento de necessidade para que as empresas percebessem que há soluções para isso. É o caso do serviço oferecido pela JobHome. Agora, por imposição de um vírus, pelo menos 800 operadores estão sendo contratados pela empresa e passarão por treinamento à distância. “Em 15 dias fechamos em negócios o que a gente demoraria o ano inteiro”, afirma Ricardo Galdino. “São empresas que estavam postergando o home office, o que acabou sendo inevitável nesse momento”, detalha.
Em um cenário onde sair de casa é um risco para a saúde coletiva, o home office se apresenta como alternativa para proteger as pessoas, fisicamente e financeiramente. Em casa, elas também podem cuidar dos filhos, já que as escolas também estão fechadas. A longo prazo, esse modelo de trabalho também pode ajudar a descentralizar a renda no país, que hoje ainda está concentrada basicamente nas grandes capitais, de modo que, remotamente, trabalhadores que moram em qualquer região podem ser incluídos.
Outra vantagem é dispensar um traslado desnecessário. Em média, um trabalhador de call center, por exemplo, perde entre uma hora e meia e duas horas de deslocamento, transtorno que pode ser evitado. De acordo com dados da JobHome, só em 2019, foram 57.856 horas a menos no trânsito, o que significa 53.9796 quilos em redução de emissões de gás carbônico.
O desejo de todos é que a pandemia seja controlada o mais rápido possível e que as pessoas possam voltar a sair de casa o quanto antes. Porém, a experiência de atravessar uma pandemia pode render algumas descobertas. A mudança de perspectiva das empresas, que até então eram resistentes com o home office, pode ser uma delas. O teste forçado pode fazer com que muitos empresários percebam este como um caminho a ser incluído nos planejamentos a longo prazo.
Eles vão perceber que é uma alternativa interessante no que diz respeito à produtividade e qualidade de vida do funcionários, mas também que precisam de ferramentas para implantar o modelo de forma eficiente. “É preciso ter muito cuidado e entender que home office não é só mandar o funcionário para casa, com computador e telefone. A parte de gestão precisa estar muito bem preparada para monitorar tudo isso”, explica Ricardo Galdino.
Além disso, segundo ele, o mercado tem espaço para todos. “Não vejo o fato de mais empresas investindo nisso como concorrência, mas como negócios que estão nos ajudando a disseminar o que a gente acredita. Estamos falando de uma mudança de hábitos que é melhor para as cidades, para o planeta, que é o que a gente precisa agora: pensar coletivamente”.
O home office, claro, é bom também para o clima porque há menos emissão de gases na atmosfera. A conta é simples: menos transporte, menos poluição. Com poucos dias de medidas de contenção, já é possível notar até mais estrelas no céu de São Paulo. Além de render boas fotos para o Instagram, isso é sinal de que a atmosfera está mais limpa. A qualidade do ar também tem melhorado, de acordo com plataformas de monitoramento e secretarias de meio ambiente locais. Fenômenos também têm sido notados em outras grandes cidades de todo o mundo: Itália e China divulgaram recentemente quedas notáveis na emissão de poluentes no primeiro mês de distanciamento social.
Gustavo Pinheiro, coordenador do portfólio de Economia de Baixo Carbono do Instituto Clima e Sociedade (ICS), defende outro aspecto positivo da questão. Para ele, o momento é de dar uma resposta urgente à questão de saúde pública, em primeiro lugar. Como fazer isso? “Há bons exemplos de articulação público-privada que mostram que num momento de grande pressão, a sociedade brasileira consegue se organizar coletivamente, com empresas e pessoas se engajando em campanhas de solidariedade”, observa.
Já podemos começar a pensar nos impactos de longo prazo que essa mudança de mentalidade trará para diversos setores, incluindo a aceleração da transição para uma economia de baixo carbono. “Pelas razões erradas, isso agora está acontecendo muito rapidamente. A gente gostaria que fosse por consciência, por alinhamento do investimento com os valores humanos, conformidade com os acordos internacionais, como o Acordo de Paris”, afirma.
Gustavo Pinheiro lembra que os setores que investem em trabalho remoto e tecnologias de comunicação já estavam crescendo e, neste momento, apenas estão experimentando um salto. “A digitalização, inclusive do trabalho, é algo que já está em curso há, pelo menos, 30 anos. O que está acontecendo é que estamos vendo, em semanas, coisas que talvez fossem levar anos para serem realizadas”. Ele explica que, de modo geral, a economia digital emite menos gases do efeito estufa do que a economia tradicional e ainda tem o benefício de rodar com qualquer energia.
Grandes empresas de tecnologia, como Apple, Amazon e Facebook, já se preocupam há alguns anos em fazer uma transição para energias renováveis, pelo menos para abastecer todas suas operações digitais. E esse é outro fator importante que torna a indústria digital mais limpa e faz a gente torcer para que essas mudanças tenham chegado para ficar.
A operadora Jaqueline Isabella da Silva Orestes trabalha na JobHome há quatro meses e já relata uma mudança de vida. “No regime presencial minha vida era uma correria e tanto, eu passava mais tempo na rua do que em casa com a minha família e fazendo as minhas tarefas. Quando chovia, já chegava cansada no trabalho o que, claro, impactava na minha produtividade”. Para ela, o novo regime de trabalho mudou tudo. “Voltei a fazer faculdade e consigo dar a atenção necessária para a minha filha de três anos. Trabalho com mais ânimo e disposição”. Ela vê com bons olhos as tendências de mudança no mercado. “É bom tanto para a empresa quanto para o funcionário. As empresas precisam começar a pensar fora da caixinha e esse momento está aí para nos provar isso”.
Por Angélica Queiroz
Enquanto empresas se preparam para enfrentar a maior crise de sua história, uma dupla de empreendedores brasileiros está contratando e anunciou a abertura de 800 vagas. Eles estão na contramão da recessão provocada pela pandemia de coronavírus . Quando os amigos Ricardo Galdino e Geraldo Brasil tiveram a ideia da JobHome, em 2017, obviamente não imaginavam que pouco tempo depois o mundo iria enfrentar uma pandemia. Nem que as medidas de distanciamento social impostas para conter o avanço no número de casos de coronavírus iria obrigar as pessoas a ficarem em casa.
Mas eles já sabiam que o trabalho em casa era uma tendência promissora. E foi de olho nisso que os sócios fundaram a primeira empresa brasileira especializada em call center 100% home office. Ao criar um software, que permite a gestão tanto de projetos, quanto de operadores remotamente, eles anteciparam o que agora é uma necessidade.
A maior parte dos call centers ainda não tem sistemas home office. As justificativas mais comuns para que esse trabalho continue sendo presencial são os protocolos que, por segurança, só podem ser acessados de um local físico. Mas bastou um momento de necessidade para que as empresas percebessem que há soluções para isso. É o caso do serviço oferecido pela JobHome. Agora, por imposição de um vírus, pelo menos 800 operadores estão sendo contratados pela empresa e passarão por treinamento à distância. “Em 15 dias fechamos em negócios o que a gente demoraria o ano inteiro”, afirma Ricardo Galdino. “São empresas que estavam postergando o home office, o que acabou sendo inevitável nesse momento”, detalha.
Em um cenário onde sair de casa é um risco para a saúde coletiva, o home office se apresenta como alternativa para proteger as pessoas, fisicamente e financeiramente. Em casa, elas também podem cuidar dos filhos, já que as escolas também estão fechadas. A longo prazo, esse modelo de trabalho também pode ajudar a descentralizar a renda no país, que hoje ainda está concentrada basicamente nas grandes capitais, de modo que, remotamente, trabalhadores que moram em qualquer região podem ser incluídos.
Outra vantagem é dispensar um traslado desnecessário. Em média, um trabalhador de call center, por exemplo, perde entre uma hora e meia e duas horas de deslocamento, transtorno que pode ser evitado. De acordo com dados da JobHome, só em 2019, foram 57.856 horas a menos no trânsito, o que significa 53.9796 quilos em redução de emissões de gás carbônico.
O desejo de todos é que a pandemia seja controlada o mais rápido possível e que as pessoas possam voltar a sair de casa o quanto antes. Porém, a experiência de atravessar uma pandemia pode render algumas descobertas. A mudança de perspectiva das empresas, que até então eram resistentes com o home office, pode ser uma delas. O teste forçado pode fazer com que muitos empresários percebam este como um caminho a ser incluído nos planejamentos a longo prazo.
Eles vão perceber que é uma alternativa interessante no que diz respeito à produtividade e qualidade de vida do funcionários, mas também que precisam de ferramentas para implantar o modelo de forma eficiente. “É preciso ter muito cuidado e entender que home office não é só mandar o funcionário para casa, com computador e telefone. A parte de gestão precisa estar muito bem preparada para monitorar tudo isso”, explica Ricardo Galdino.
Além disso, segundo ele, o mercado tem espaço para todos. “Não vejo o fato de mais empresas investindo nisso como concorrência, mas como negócios que estão nos ajudando a disseminar o que a gente acredita. Estamos falando de uma mudança de hábitos que é melhor para as cidades, para o planeta, que é o que a gente precisa agora: pensar coletivamente”.
O home office, claro, é bom também para o clima porque há menos emissão de gases na atmosfera. A conta é simples: menos transporte, menos poluição. Com poucos dias de medidas de contenção, já é possível notar até mais estrelas no céu de São Paulo. Além de render boas fotos para o Instagram, isso é sinal de que a atmosfera está mais limpa. A qualidade do ar também tem melhorado, de acordo com plataformas de monitoramento e secretarias de meio ambiente locais. Fenômenos também têm sido notados em outras grandes cidades de todo o mundo: Itália e China divulgaram recentemente quedas notáveis na emissão de poluentes no primeiro mês de distanciamento social.
Gustavo Pinheiro, coordenador do portfólio de Economia de Baixo Carbono do Instituto Clima e Sociedade (ICS), defende outro aspecto positivo da questão. Para ele, o momento é de dar uma resposta urgente à questão de saúde pública, em primeiro lugar. Como fazer isso? “Há bons exemplos de articulação público-privada que mostram que num momento de grande pressão, a sociedade brasileira consegue se organizar coletivamente, com empresas e pessoas se engajando em campanhas de solidariedade”, observa.
Já podemos começar a pensar nos impactos de longo prazo que essa mudança de mentalidade trará para diversos setores, incluindo a aceleração da transição para uma economia de baixo carbono. “Pelas razões erradas, isso agora está acontecendo muito rapidamente. A gente gostaria que fosse por consciência, por alinhamento do investimento com os valores humanos, conformidade com os acordos internacionais, como o Acordo de Paris”, afirma.
Gustavo Pinheiro lembra que os setores que investem em trabalho remoto e tecnologias de comunicação já estavam crescendo e, neste momento, apenas estão experimentando um salto. “A digitalização, inclusive do trabalho, é algo que já está em curso há, pelo menos, 30 anos. O que está acontecendo é que estamos vendo, em semanas, coisas que talvez fossem levar anos para serem realizadas”. Ele explica que, de modo geral, a economia digital emite menos gases do efeito estufa do que a economia tradicional e ainda tem o benefício de rodar com qualquer energia.
Grandes empresas de tecnologia, como Apple, Amazon e Facebook, já se preocupam há alguns anos em fazer uma transição para energias renováveis, pelo menos para abastecer todas suas operações digitais. E esse é outro fator importante que torna a indústria digital mais limpa e faz a gente torcer para que essas mudanças tenham chegado para ficar.
A operadora Jaqueline Isabella da Silva Orestes trabalha na JobHome há quatro meses e já relata uma mudança de vida. “No regime presencial minha vida era uma correria e tanto, eu passava mais tempo na rua do que em casa com a minha família e fazendo as minhas tarefas. Quando chovia, já chegava cansada no trabalho o que, claro, impactava na minha produtividade”. Para ela, o novo regime de trabalho mudou tudo. “Voltei a fazer faculdade e consigo dar a atenção necessária para a minha filha de três anos. Trabalho com mais ânimo e disposição”. Ela vê com bons olhos as tendências de mudança no mercado. “É bom tanto para a empresa quanto para o funcionário. As empresas precisam começar a pensar fora da caixinha e esse momento está aí para nos provar isso”.
Por Angélica Queiroz