Tecnologia e práticas regenerativas podem alavancar agricultura mais sustentável (Thomas Barwick/Getty Images)
Colunista
Publicado em 7 de março de 2025 às 10h02.
A discussão sobre agricultura regenerativa tem ganhado espaço em eventos internacionais e setores específicos do agronegócio, mas como esse tema aparece na agenda política nacional? A Autoridades Brasil, a convite do Instituto O Mundo Que Queremos, analisou milhões de postagens nas redes sociais de autoridades brasileiras para entender como esse conceito vem sendo tratado por líderes políticos e governamentais.
A Autoridades Brasil é uma empresa de inteligência política, uma political tech, que monitora postagens de mais de 4.600 figuras públicas, incluindo membros do Executivo, Legislativo e Judiciário em diferentes níveis de governo.
O levantamento da Autoridades Brasil mostrou que, entre janeiro de 2023 e janeiro de 2025, houve apenas 92 publicações sobre agricultura regenerativa em um universo de 9,7 milhões de postagens. Esse número revela o quanto o tema ainda é pouco discutido em comparação com outras pautas do setor agropecuário e ambiental. Além disso, apenas 23 perfis de autoridades mencionaram o assunto, sendo a esmagadora maioria de perfis pessoais, com apenas 5,4% representando contas institucionais, como prefeituras.
Os picos de menções ocorreram em momentos estratégicos, principalmente em eventos do agro. Em julho de 2023, por exemplo, o Encontro Catarinense de Agricultura Regenerativa e reuniões ministeriais impulsionaram o debate. Já em dezembro do mesmo ano, a COP28 concentrou a maior quantidade de publicações, destacando os compromissos do estado do Pará para conciliar produção e conservação.
Em fevereiro de 2024, a pauta foi levantada por Adão Pretto (PT-RS), com foco em um projeto de lei sobre agropecuária regenerativa e na crítica ao uso excessivo de agrotóxicos (ou defensivos) no Brasil. Outro momento relevante foi em novembro de 2024, quando a participação do Brasil no G20, na COP29 e no Carbon Science Talks gerou uma nova onda de discussões sobre recuperação de áreas degradadas e financiamento para agroecologia.
A análise também revelou um forte viés político. A esquerda e o centro-esquerda lideram 80% das postagens sobre agricultura regenerativa. As narrativas desses grupos destacam a necessidade de políticas públicas, incentivos financeiros e regulação para impulsionar a transição agroecológica, incluindo subsídios para pequenos produtores e investimentos em bioeconomia.
A centro-direita, por sua vez, trata o tema como um diferencial de mercado, enfatizando a competitividade do agronegócio e o potencial de exportação para mercados exigentes. Já a direita não registrou menções ao tema no período analisado, o que evidencia uma baixa adesão ao discurso da regeneração agrícola dentro desse espectro político.
Três autoridades se destacaram como as que mais publicaram sobre o tema. Adão Pretto, deputado estadual do PT no Rio Grande do Sul, promove discussões sobre agroecologia e bioinsumos e defende o fortalecimento da agricultura familiar. Luiz Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, tem um discurso alinhado à necessidade de recuperação de áreas degradadas e incentivo aos bioinsumos.
Já Helder Barbalho, governador do Pará, enfatiza a agricultura regenerativa na Amazônia como estratégia para segurança alimentar e proteção florestal, buscando parcerias privadas para expandir esses investimentos.
O estudo deixa claro que a agricultura regenerativa ainda precisa ganhar maior projeção dentro do cenário político brasileiro. Embora o conceito tenha sido impulsionado por eventos internacionais e iniciativas estaduais, sua presença no debate público ainda é tímida e majoritariamente restrita a determinados grupos políticos. Para o Brasil se consolidar como líder global em produção agropecuária sustentável, será fundamental ampliar esse debate e garantir que o tema entre de vez na agenda nacional. Essa oportunidade existe hoje.
"Os dados mostram que o termo ‘agricultura regenerativa’ é pouco mencionado, tanto em número de publicações quanto na quantidade de autoridades que o citam”, diz Letícia Medeiros, gerente do Autoridades Brasil. “Além disso, a forte presença de autoridades de um único espectro político sugere que o termo está associado a uma linha político-ideológica específica.” A concentração aponta um esforço a ser feito.
“Se o objetivo for impulsionar uma agenda regulatória favorável ao tema, é essencial ampliar o apoio de autoridades de diferentes bancadas”, afirma Letícia. “Como não foram identificadas narrativas contrárias à agricultura regenerativa entre parlamentares do centro e da centro-direita, o tom do discurso analisado pode servir de base para estabelecer conexões e aproximar essa pauta desses grupos."
Para melhorar a qualidade da conversa pública sobre agricultura regenerativa e ampliar sua influência, um grupo de produtores está lançando a Frente Empresarial pela Regeneração da Agricultura (FERA). Essa iniciativa, coordenada pelo Instituto O Mundo Que Queremos, reúne produtores comprometidos com práticas regenerativas em um movimento para influenciar políticas públicas que incentivem e apoiem as melhores práticas, como crédito diferenciado, assistência técnica adequada e acesso ao mercado. A FERA pretende atuar na defesa de condições mais favoráveis para a transição do agro, promovendo boas práticas, articulando parcerias e dando visibilidade às conquistas desse segmento.