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O business case da madeira amazônica

Manejo e rastreabilidade transformam a floresta em ativo, reduzem emissões e abrem espaço para capital de longo prazo

Em um mundo de taxonomias verdes e fronteiras mais reguladas, cadeias limpas reduzem risco de barreiras comerciais e protegem a marca. (Leandro Fonseca /Exame)

Em um mundo de taxonomias verdes e fronteiras mais reguladas, cadeias limpas reduzem risco de barreiras comerciais e protegem a marca. (Leandro Fonseca /Exame)

AM

Publicado em 19 de agosto de 2025 às 17h29.

Última atualização em 25 de agosto de 2025 às 21h11.

Fingir que toda serraria é inimiga da floresta pode ser até confortável. Mas errado. O problema que corrói margens, destrói reputações e mantém a Amazônia refém chama-se grilagem de terra e madeira ilegal. Ela distorce preços, expulsa quem cumpre a lei e ajuda a encolher o mercado. Hoje a produção, em tora, gira em torno de 12 milhões de metros cúbicos por ano e só cerca de 10% desse volume vem de manejo florestal responsável. Enquanto a fraude seguir barata, o capital sério continuará na defensiva.

Manejo é outra história. É planejamento de colheita por talhão, mínima abertura de estradas, respeito a diâmetros de corte e tempo de regeneração. O efeito econômico é direto: fluxos de caixa recorrentes e rastreáveis, menor custo de capital e produto com origem e desempenho verificáveis. A madeira deixa de ser commodity indiferenciada e passa a disputar o segmento premium, onde marca e conformidade valem tanto quanto preço.

Conforme o estudo “O manejo de florestas naturais e o setor madeireiro da Amazônia brasileira: situação atual e perspectivas”, do projeto Amazônia 2030, o país precisaria colocar cerca de 25 milhões de hectares sob manejo para garantir oferta sustentável, algo próximo de 7% das florestas amazônicas. Hoje existem aproximadamente 3 milhões de hectares bem manejados. A mesma pesquisa mostra um setor que ainda opera aquém do seu potencial: a madeira em tora é o principal produto extrativo da região Norte, com algo como R$ 3,2 bilhões por ano e aproximadamente 70 mil empregos no desdobramento, mas 92% do que se produz fica no mercado interno e só 8% é exportado. É o retrato de um prêmio que o Brasil insiste em deixar na mesa por falta de rastreabilidade, diversificação de espécies e política industrial.

A virada começa na demanda. A construção civil tem tudo para ser a alavanca que faltava. Pisos, esquadrias e soluções estruturais em madeira nativa manejada substituem parte do aço e do concreto, reduzem emissões e entregam desempenho. Compras públicas que exijam certificação e rastreabilidade mudam o padrão do setor. Quando a especificação técnica vira política de Estado, a cadeia inteira se reorganiza e o investidor finalmente encontra previsibilidade.

Do lado da oferta, não há mistério. Repressão efetiva à ilegalidade com verificação eletrônica de documentos e rastreabilidade do talhão até a obra. Aceleração de concessões florestais em áreas públicas já destinadas com contratos longos, metas socioambientais claras e estabilidade regulatória. Fomento ao manejo comunitário com assistência técnica, crédito e contratos de compra que tirem a renda do papel e a levem para dentro das comunidades. Política industrial para modernizar parques, digitalizar processos, desenvolver usos para dezenas de espécies hoje subaproveitadas e viabilizar madeira engenheirada. Seguro florestal e crédito de transição fecham o ciclo.

Há ainda um alinhamento de incentivos que o país precisa abraçar. Manejo responsável conversa com pagamentos por serviços ambientais e com instrumentos de carbono. Remunerar estoque de carbono e biodiversidade onde existe plano de manejo é reconhecer o valor do ativo que sustenta o negócio.

Em um mundo de taxonomias verdes e fronteiras mais reguladas, cadeias limpas reduzem risco de barreiras comerciais e protegem a marca. Isso se traduz em captação mais barata e margens melhores.

Você pode comprar todos os móveis e revestimentos de madeira que quiser. O Brasil pode continuar vendendo madeira barata com alto custo reputacional. Ou pode transformar a madeira amazônica legal e rastreável em ativo estratégico. A segunda opção mantém a floresta em pé e fala a língua que todo CFO entende. Retorno sobre o capital investido.