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O Brasil está perdendo bilhões com o desmatamento

As perdas de receita e energia nas duas maiores hidrelétricas do país por causa da destruição da floresta ultrapassam R$ 1 bilhão por ano

O desmatamento na Amazônia Legal caiu 30,6% entre agosto de 2023 e julho de 2024, segundo dados apresentados pelo Inpe (AFP)

O desmatamento na Amazônia Legal caiu 30,6% entre agosto de 2023 e julho de 2024, segundo dados apresentados pelo Inpe (AFP)

AM

Publicado em 26 de junho de 2025 às 17h52.

O Brasil insiste em pensar o desmatamento como um problema exclusivamente ambiental. No máximo, como uma preocupação para ONGs, acadêmicos e diplomatas. Mas essa visão estreita tem custado caro. Literalmente. Um estudo do Climate Policy Initiative (CPI/PUC-Rio), em parceria com o projeto Amazônia 2030, revela que a devastação da Amazônia já compromete a segurança energética e provoca perdas bilionárias para o setor elétrico.

O debate sobre o aumento da conta de luz, reacendido com a aprovação pelo Congresso de medidas que devem onerar ainda mais o consumidor, escancara uma contradição negligenciada: enquanto se discute como repassar os custos ao bolso da população, ignora-se uma das causas estruturais que pressiona o sistema elétrico — o desmatamento da Amazônia. A destruição da floresta já compromete a geração de energia nas principais hidrelétricas do país e obriga o uso crescente de termelétricas mais caras. Ou seja, parte da alta da tarifa é consequência direta da omissão frente à devastação ambiental.

Os números são robustos. As usinas hidrelétricas de Itaipu (no Paraná) e Belo Monte (no Pará), responsáveis por cerca de 11% da capacidade de geração de eletricidade no Brasil, perdem juntas, todos os anos, 3.780 GWh de energia elétrica por causa do desmatamento. Isso equivale ao consumo anual de 1,5 milhão de brasileiros. Traduzido em termos financeiros, o prejuízo é de R$ 1,1 bilhão por ano.

Conforme o estudo, a explicação está nos chamados “rios voadores”: massas de ar úmido carregadas pela floresta Amazônica, que abastecem as bacias hidrográficas de todo o país. Quando a floresta é substituída por pasto ou soja, essas massas perdem umidade e chovem menos. Com menos chuva, os rios encolhem. E com menos água, as turbinas das hidrelétricas giram menos.

No caso de Itaipu, a maior hidrelétrica do Brasil, mesmo distante mais de mil quilômetros da Amazônia, a perda anual média foi estimada em 1.382 GWh, o que representa R$ 500 milhões por ano. Só em receita acumulada, foram R$ 10,4 bilhões perdidos em duas décadas. Esse valor representa cerca de 6% do lucro líquido médio da empresa.

Já a usina de Belo Monte, construída no coração da Amazônia e operando plenamente desde 2016, sofre ainda mais. Com uma perda média anual de 2.393 GWh, ela deixa de arrecadar R$ 638 milhões por ano. Desde o início de sua operação, isso já somou R$ 13,4 bilhões em perdas. O valor corresponde a 21% do EBITDA médio da Norte Energia, controladora da usina.

Esses dados são alarmantes, mas ainda mais grave é a consequência estrutural: a perda de geração hidrelétrica tende a aumentar a dependência de usinas termelétricas, que são mais caras, mais poluentes e mais instáveis. Isso pressiona a tarifa de energia e contribui para o aumento das emissões de gases de efeito estufa — um contrassenso em tempos de emergência climática.

A ironia é cruel. O desmatamento é frequentemente justificado como motor do “progresso” rural, mas está minando a infraestrutura energética que sustenta a economia brasileira. Quando se corta uma árvore, corta-se também parte do fluxo de caixa do setor elétrico. Cada hectare devastado custa caro — e o estudo quantifica esse custo: até R$ 85 mil por km² em áreas críticas para a geração de energia.

É hora de agir com inteligência estratégica. O Brasil precisa integrar as políticas de conservação florestal à sua política energética. As empresas do setor, historicamente ausentes da pauta ambiental, devem reconhecer o valor econômico direto da floresta em pé e assumir protagonismo na defesa de medidas eficazes de proteção e restauração.

Preservar a Amazônia não é apenas uma missão ética ou climática. É uma questão de racionalidade econômica, eficiência energética e soberania nacional. O país que quiser manter a luz acesa precisa manter a floresta em pé.

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