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O BNDES precisa cumprir sua missão na Amazônia

Para desenvolver a região, o banco deve parar de emprestar para as atividades da destruição e financiar a economia boa para as pessoas e o ambiente

o Rio Negro, na Amazônia: o financiamento de longo prazo é fundamental para o desenvolvimento da região (Leandro Fonseca/Exame)
DR

Da Redação

Publicado em 29 de março de 2023 às 08h47.

Nesta semana, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) bloqueou aproximadamente R$ 25 milhões em recursos de financiamento de 58 proprietários rurais envolvidos com desmatamentos irregulares. Essa é uma medida importante para auxiliar no combate ao desmatamento e no desenvolvimento da Amazônia Legal, mas não pode ser a única. Além de parar de financiar a destruição da floresta, o BNDES precisa olhar para a Amazônia e seus habitantes. Afinal, o BNDES é o principal instrumento do Governo Federal para o financiamento de longo prazo e investimento no Brasil. Ele contribui para a promoção do desenvolvimento econômico e social do país e tem o objetivo de ser o banco do desenvolvimento sustentável brasileiro. No entanto, um estudo do projeto Amazônia 2030, que  investigou a atuação do Banco na Amazônia Legal desde 2009, analisando as características dos financiamentos e as atividades econômicas mais fomentadas mostrou que o BNDES é fundamental para a Amazônia, mas infelizmente, a Amazônia não é vista da mesma forma pelo banco.

Segundo o estudo, “A atuação do BNDES na Amazônia Legal”, do projeto Amazônia 2030, a região detém a menor proporção de investimentos do BNDES quando comparadas com o restante do país. Cinco dos nove estados que compõem a Amazônia Legal têm menos de 1% dos investimentos do banco, sendo que três deles ocupam as últimas três colocações no ranking de investimentos (Amapá, Acre e Roraima), seja por meio de financiamento direto ou indireto. A maior parte dos investimentos fica com São Paulo (24%) e Rio de Janeiro (13%). Em contrapartida, a análise mostrou que a região possui a maior participação dos desembolsos em relação ao seu Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, como esses estados possuem menos recursos financeiros, o tímido investimento do BNDES acaba desempenhando um importante papel de banco de fomento para a região.

Outro problema levantado pelo estudo é que os investimentos realizados pelo BNDES na Amazônia não são, necessariamente, para a Amazônia. Explico, o estudo constatou que os principais investimentos feitos na região foram destinados para a construção de grandes usinas hidrelétricas, mas as obras pouco beneficiam os próprios moradores da Amazônia. A região é responsável por 26% da geração de energia do Brasil, mas conta com mais de 1 milhão de pessoas no escuro e outras 3 milhões dependentes de usinas termelétricas locais. O que representa 14% dos habitantes de toda a Amazônia Legal. Um detalhe importante é que o custo adicional dessa geração de energia é pago por todos os consumidores por meio de encargos na conta de luz. No ano passado, o valor estimado deste gasto ultrapassou R$10 bilhões,um subsídio per capita anual superior a R$ 3 mil por habitante atendido.

A Amazônia Legal continua sendo a região mais isolada do país. Não há como desenvolvê-la sem o aprimoramento das redes de transporte e comunicação, além, é claro, de energia. Mas, isso envolve melhorar as conexões econômicas, em infraestrutura logística com as demais regiões. Só assim iremos conseguir dinamizar a economia local, gerando empregos e renda. Não adianta focar esforços na antiga estratégia de investimento em intervenções tradicionais como rodovias e ferrovias, pois como provaram os pesquisadores do Amazônia 2030, elas carregam um alto custo socioambienta l. Os investimentos do banco precisam delimitar a área de influência de projetos de infraestrutura logística para mitigar os riscos socioambientais e investir no acesso à comunicação e nas cidades da Amazônia. A região tem uma população dispersa, baixa densidade demográfica, poucas metrópoles e cidades médias, grandes distâncias entre centros urbanos e falta de acesso a serviços básicos, como rede de esgoto e água, coleta de lixo, energia e banda larga. A lei do Marco Legal do Saneamento Básico, aprovada em 2020, estabeleceu que 99% da população tenha acesso à água potável e 90% ao tratamento e à coleta de esgoto, até 2033. Para isso, o Instituto Trata Brasil estimou que seria necessário um investimento anual médio de R$ 6 bilhões, valores que também poderiam vir via BNDES.

Parar de financiar o desmatamento é urgente, assim como a necessidade de um novo ciclo de financiamentos com investimentos que considerem as particularidades da Amazônia, bem como a qualidade de vida e as necessidades da população. Os novos investimentos precisam ser focados no desenvolvimento regional, na redução da desigualdade, no acesso à energia de qualidade, acesso à internet, acesso a serviços básicos de rede de esgoto e água e coleta de lixo.

O banco pode usar seu poder para alavancar bons negócios, baseados numa economia que use os recursos naturais de forma inteligente. A exportação de produtos compatíveis com a floresta traz receita de aproximadamente R$ 1,5 bilhão para empresas sediadas na Amazônia Legal. Um valor demonstra que a região já tem capacidade instalada e um número mínimo de empreendedores que conseguem competir no mercado internacional. Porém, quando analisamos essas exportações no contexto global, descobrimos que elas representam somente 0,18% do mercado total correspondente, por onde circulam cerca de R$ 795 bilhões (US$159 bilhões) ao ano. Conforme o pesquisador Salo Coslovsky, esta é uma área que se priorizada e bem trabalhada poderia render anualmente mais de R$ 10 bilhões para a Amazônia, em exportações, sem considerar o mercado doméstico. Outra oportunidade crescente que carece de investimentos é o mercado de restauração florestal. Sob a estrita ótica econômica, podemos dizer que na Amazônia, atualmente, a captura do carbono é mais promissora do que a atividade agropecuária. Enquanto a pecuária na região segue sendo de baixíssima produtividade, desmatando e degradando áreas de floresta ao passo que não gera renda e empregos, a recuperação da floresta amazônica pode aportar para a região mais de 18 bilhões de dólares até 203 1. Sem contar com o aumento de empregos e fomento da economia da região.

O  Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social precisa fazer valer a sua missão de ser um instrumento de transformação real.Essa seria a melhor missão para o BNDES. Ajudar a promover a virada econômica da Amazônia, saindo das atividades baseadas na destruição e financiando uma economia saudável, de regeneração e desenvolvimento.

*Alexandre Mansur é diretor de projetos do Instituto O Mundo Que Queremos

Nesta semana, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) bloqueou aproximadamente R$ 25 milhões em recursos de financiamento de 58 proprietários rurais envolvidos com desmatamentos irregulares. Essa é uma medida importante para auxiliar no combate ao desmatamento e no desenvolvimento da Amazônia Legal, mas não pode ser a única. Além de parar de financiar a destruição da floresta, o BNDES precisa olhar para a Amazônia e seus habitantes. Afinal, o BNDES é o principal instrumento do Governo Federal para o financiamento de longo prazo e investimento no Brasil. Ele contribui para a promoção do desenvolvimento econômico e social do país e tem o objetivo de ser o banco do desenvolvimento sustentável brasileiro. No entanto, um estudo do projeto Amazônia 2030, que  investigou a atuação do Banco na Amazônia Legal desde 2009, analisando as características dos financiamentos e as atividades econômicas mais fomentadas mostrou que o BNDES é fundamental para a Amazônia, mas infelizmente, a Amazônia não é vista da mesma forma pelo banco.

Segundo o estudo, “A atuação do BNDES na Amazônia Legal”, do projeto Amazônia 2030, a região detém a menor proporção de investimentos do BNDES quando comparadas com o restante do país. Cinco dos nove estados que compõem a Amazônia Legal têm menos de 1% dos investimentos do banco, sendo que três deles ocupam as últimas três colocações no ranking de investimentos (Amapá, Acre e Roraima), seja por meio de financiamento direto ou indireto. A maior parte dos investimentos fica com São Paulo (24%) e Rio de Janeiro (13%). Em contrapartida, a análise mostrou que a região possui a maior participação dos desembolsos em relação ao seu Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, como esses estados possuem menos recursos financeiros, o tímido investimento do BNDES acaba desempenhando um importante papel de banco de fomento para a região.

Outro problema levantado pelo estudo é que os investimentos realizados pelo BNDES na Amazônia não são, necessariamente, para a Amazônia. Explico, o estudo constatou que os principais investimentos feitos na região foram destinados para a construção de grandes usinas hidrelétricas, mas as obras pouco beneficiam os próprios moradores da Amazônia. A região é responsável por 26% da geração de energia do Brasil, mas conta com mais de 1 milhão de pessoas no escuro e outras 3 milhões dependentes de usinas termelétricas locais. O que representa 14% dos habitantes de toda a Amazônia Legal. Um detalhe importante é que o custo adicional dessa geração de energia é pago por todos os consumidores por meio de encargos na conta de luz. No ano passado, o valor estimado deste gasto ultrapassou R$10 bilhões,um subsídio per capita anual superior a R$ 3 mil por habitante atendido.

A Amazônia Legal continua sendo a região mais isolada do país. Não há como desenvolvê-la sem o aprimoramento das redes de transporte e comunicação, além, é claro, de energia. Mas, isso envolve melhorar as conexões econômicas, em infraestrutura logística com as demais regiões. Só assim iremos conseguir dinamizar a economia local, gerando empregos e renda. Não adianta focar esforços na antiga estratégia de investimento em intervenções tradicionais como rodovias e ferrovias, pois como provaram os pesquisadores do Amazônia 2030, elas carregam um alto custo socioambienta l. Os investimentos do banco precisam delimitar a área de influência de projetos de infraestrutura logística para mitigar os riscos socioambientais e investir no acesso à comunicação e nas cidades da Amazônia. A região tem uma população dispersa, baixa densidade demográfica, poucas metrópoles e cidades médias, grandes distâncias entre centros urbanos e falta de acesso a serviços básicos, como rede de esgoto e água, coleta de lixo, energia e banda larga. A lei do Marco Legal do Saneamento Básico, aprovada em 2020, estabeleceu que 99% da população tenha acesso à água potável e 90% ao tratamento e à coleta de esgoto, até 2033. Para isso, o Instituto Trata Brasil estimou que seria necessário um investimento anual médio de R$ 6 bilhões, valores que também poderiam vir via BNDES.

Parar de financiar o desmatamento é urgente, assim como a necessidade de um novo ciclo de financiamentos com investimentos que considerem as particularidades da Amazônia, bem como a qualidade de vida e as necessidades da população. Os novos investimentos precisam ser focados no desenvolvimento regional, na redução da desigualdade, no acesso à energia de qualidade, acesso à internet, acesso a serviços básicos de rede de esgoto e água e coleta de lixo.

O banco pode usar seu poder para alavancar bons negócios, baseados numa economia que use os recursos naturais de forma inteligente. A exportação de produtos compatíveis com a floresta traz receita de aproximadamente R$ 1,5 bilhão para empresas sediadas na Amazônia Legal. Um valor demonstra que a região já tem capacidade instalada e um número mínimo de empreendedores que conseguem competir no mercado internacional. Porém, quando analisamos essas exportações no contexto global, descobrimos que elas representam somente 0,18% do mercado total correspondente, por onde circulam cerca de R$ 795 bilhões (US$159 bilhões) ao ano. Conforme o pesquisador Salo Coslovsky, esta é uma área que se priorizada e bem trabalhada poderia render anualmente mais de R$ 10 bilhões para a Amazônia, em exportações, sem considerar o mercado doméstico. Outra oportunidade crescente que carece de investimentos é o mercado de restauração florestal. Sob a estrita ótica econômica, podemos dizer que na Amazônia, atualmente, a captura do carbono é mais promissora do que a atividade agropecuária. Enquanto a pecuária na região segue sendo de baixíssima produtividade, desmatando e degradando áreas de floresta ao passo que não gera renda e empregos, a recuperação da floresta amazônica pode aportar para a região mais de 18 bilhões de dólares até 203 1. Sem contar com o aumento de empregos e fomento da economia da região.

O  Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social precisa fazer valer a sua missão de ser um instrumento de transformação real.Essa seria a melhor missão para o BNDES. Ajudar a promover a virada econômica da Amazônia, saindo das atividades baseadas na destruição e financiando uma economia saudável, de regeneração e desenvolvimento.

*Alexandre Mansur é diretor de projetos do Instituto O Mundo Que Queremos

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