A classe média vai ao SUS
A impaciência em plena pandemia é ainda maior pela escassez de vacinas, um dos poucos itens anteriormente garantidos na vida de todos os brasileiros
André Martins
Publicado em 27 de março de 2021 às 15h32.
O caso dos empresários de Minas Gerais que arrumaram um lote de vacina pra chamar de seu demonstra, além da grave falha moral e legal da turma, o grau de incompreensão dos “com plano privado de saúde” frente à realidade do velho normal da maioria no Brasil, quando a falta de vaga em hospital, de médicos, de equipamentos e de insumos já era continua. A impaciência em plena pandemia é ainda maior pela escassez de vacinas, um dos poucos itens anteriormente garantidos na vida de todos os brasileiros, pobres ou ricos, pagantes ou SUS, desde a primeira infância até a terceira idade.
Por isso não espanta o dado da última pesquisa EXAME/IDEIA de que um número ainda maior que o enorme77% que acreditam que a vacinação contra a Covid-19 está atrasada, é a dos entrevistados de maior renda, escolarizados e de capitais/regiões metropolitanas. Nestes públicos a frustração passa de 80%. Por não ter muita expectativa do que o governo pode lhe oferecer em troca do imposto pago - inclusive pela barrafunda que é o nosso sistema tributário -, a classe média brasileira que tem algum recurso investe em tudo privado: educação, saúde, transporte e até segurança. Mesma classe média (e alta) que agora precisa se deparar com a dor e as delícias do SUS.
Entre os mais frustrados com a lerdeza da vacinação estão as mulheres. Mais de 80,5% delas consideram o processo atrasado, enquanto que entre os homens o dado cai para 72,4%. Os recortes de gênero nas pesquisas durante a pandemia têm sido importantes. Em primeiro lugar porque elas estão mais pressionadas do que eles pelo acúmulo de serviço doméstico, pela perda de lugar no mercado de trabalho, pela responsabilidade primária com membros da família, como crianças e idosos, e até pelo risco maior de agressões domésticas. Já surgiu até um termo em inglês para a situação econômica delas: a shecession, junção das palavra ela (she) e recessão (recession).
Em segundo lugar, neste caso do atraso da vacinação, tem a hipótese de que é a mulher que mais frequentemente cuida da carteira de imunização dos filhos e os leva para vacinar, com a tranquilidade de que no Brasil suas crianças não correrão o risco de desenvolver poliomielite, meningite viral e outras doenças que antigamente dilaceravam uma família. Essa tranquilidade deixou de existir no caso da Covid.
As mulheres também têm uma concordância maior quando perguntadas sobre a adoção de medidas mais restritivas de prevenção à Covid. 60,6% delas aceitam um isolamento maior, contra 51,4% dos homens. Já os homens estão mais otimistas com a troca de comando no Ministério da Saúde: 30% deles acham que a gestão do médico Marcelo Quiroga será melhor do que a do general Eduardo Pazuello, contra 23,6% de otimismo nesta troca entre as mulheres. Aspiores avaliações sobre o trabalho de Pazuello são do segmento de renda A/B com maior escolaridade (48% de ruim/péssimo para os de ensino superior e 40% para o grupo de rendimentos A/B). Também é na faixa de maior renda que está o otimismo em relação a melhora (35% de quem recebe mais de 5 salários mínimos). Esse dado expõe a indignação da gestão da pandemia para a classe média brasileira.
Cabe ressaltar que as mulheres sempre foram um público mais difícil para Jair Bolsonaro conquistar, desde as eleições de 2018. Depois de dois anos de governo e de um ano de pandemia, essa relação não melhorou. Se entre os homens o presidente é bem avaliado por quase 34%, entre os homens, a aprovação cai para 20,6% entre as mulheres. No mesmo sentido, 53% das mulheres consideram o governo ruim ou péssimo, mesmo índice de mulheres que desaprovam a maneira como o presidente Jair Bolsonaro está lidando com seu trabalho como presidente.
Se homens, mulheres, ricos e pobres têm visões muitas vezes distintas do que ocorre na pandemia, num ponto todos concordam: 91% consideram que o Brasil vive, nesse momento um colapso no sistema de saúde.Um colapso que atinge ricos, pobres, mulheres, homens, jovens, idosos e moradores de todas as partes do país e que, no imaginário popular, precisa de bem mais do que um pronunciamento na TV ou da criação de um comitê.
O caso dos empresários de Minas Gerais que arrumaram um lote de vacina pra chamar de seu demonstra, além da grave falha moral e legal da turma, o grau de incompreensão dos “com plano privado de saúde” frente à realidade do velho normal da maioria no Brasil, quando a falta de vaga em hospital, de médicos, de equipamentos e de insumos já era continua. A impaciência em plena pandemia é ainda maior pela escassez de vacinas, um dos poucos itens anteriormente garantidos na vida de todos os brasileiros, pobres ou ricos, pagantes ou SUS, desde a primeira infância até a terceira idade.
Por isso não espanta o dado da última pesquisa EXAME/IDEIA de que um número ainda maior que o enorme77% que acreditam que a vacinação contra a Covid-19 está atrasada, é a dos entrevistados de maior renda, escolarizados e de capitais/regiões metropolitanas. Nestes públicos a frustração passa de 80%. Por não ter muita expectativa do que o governo pode lhe oferecer em troca do imposto pago - inclusive pela barrafunda que é o nosso sistema tributário -, a classe média brasileira que tem algum recurso investe em tudo privado: educação, saúde, transporte e até segurança. Mesma classe média (e alta) que agora precisa se deparar com a dor e as delícias do SUS.
Entre os mais frustrados com a lerdeza da vacinação estão as mulheres. Mais de 80,5% delas consideram o processo atrasado, enquanto que entre os homens o dado cai para 72,4%. Os recortes de gênero nas pesquisas durante a pandemia têm sido importantes. Em primeiro lugar porque elas estão mais pressionadas do que eles pelo acúmulo de serviço doméstico, pela perda de lugar no mercado de trabalho, pela responsabilidade primária com membros da família, como crianças e idosos, e até pelo risco maior de agressões domésticas. Já surgiu até um termo em inglês para a situação econômica delas: a shecession, junção das palavra ela (she) e recessão (recession).
Em segundo lugar, neste caso do atraso da vacinação, tem a hipótese de que é a mulher que mais frequentemente cuida da carteira de imunização dos filhos e os leva para vacinar, com a tranquilidade de que no Brasil suas crianças não correrão o risco de desenvolver poliomielite, meningite viral e outras doenças que antigamente dilaceravam uma família. Essa tranquilidade deixou de existir no caso da Covid.
As mulheres também têm uma concordância maior quando perguntadas sobre a adoção de medidas mais restritivas de prevenção à Covid. 60,6% delas aceitam um isolamento maior, contra 51,4% dos homens. Já os homens estão mais otimistas com a troca de comando no Ministério da Saúde: 30% deles acham que a gestão do médico Marcelo Quiroga será melhor do que a do general Eduardo Pazuello, contra 23,6% de otimismo nesta troca entre as mulheres. Aspiores avaliações sobre o trabalho de Pazuello são do segmento de renda A/B com maior escolaridade (48% de ruim/péssimo para os de ensino superior e 40% para o grupo de rendimentos A/B). Também é na faixa de maior renda que está o otimismo em relação a melhora (35% de quem recebe mais de 5 salários mínimos). Esse dado expõe a indignação da gestão da pandemia para a classe média brasileira.
Cabe ressaltar que as mulheres sempre foram um público mais difícil para Jair Bolsonaro conquistar, desde as eleições de 2018. Depois de dois anos de governo e de um ano de pandemia, essa relação não melhorou. Se entre os homens o presidente é bem avaliado por quase 34%, entre os homens, a aprovação cai para 20,6% entre as mulheres. No mesmo sentido, 53% das mulheres consideram o governo ruim ou péssimo, mesmo índice de mulheres que desaprovam a maneira como o presidente Jair Bolsonaro está lidando com seu trabalho como presidente.
Se homens, mulheres, ricos e pobres têm visões muitas vezes distintas do que ocorre na pandemia, num ponto todos concordam: 91% consideram que o Brasil vive, nesse momento um colapso no sistema de saúde.Um colapso que atinge ricos, pobres, mulheres, homens, jovens, idosos e moradores de todas as partes do país e que, no imaginário popular, precisa de bem mais do que um pronunciamento na TV ou da criação de um comitê.