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Ter um propósito impulsiona e abre caminhos, afirma Caio Sanches

Na coluna desta semana, conheça a história de Caio Sanches CEO Brasil da United Imaging Healthcare

O mundo está repleto de oportunidades. Às vezes não estamos 100% preparados ou motivados para enxergá-las, mas acredite: elas existem e estão à disposição de quem quiser se apropriar delas. Da minha parte, sempre procurei manter-me atento aos sinais, e sempre tive em mente um objetivo bem definido do que queria.

Venho de uma família de classe média, e passei parte da infância no bairro do Jaçanã, Zona Norte da capital paulista. Já a adolescência vivi na cidade de Guarulhos, na Grande São Paulo. Apesar da mudança de município, tanto eu quanto meu irmão mantivemos a rotina de nos deslocarmos entre ambas as cidades quase diariamente. Isso porque estudávamos em uma escola particular e ali permanecemos, apesar da alteração de endereço. Ao todo, eram quatro ônibus por dia e mais de duas horas de trânsito entre ida e volta. Passava as manhãs na escola e, à tarde, comprava material para fazer e vender diversos tipos de pipas na rua. E assim o lado empreendedor surgia.

Próximo dos 15 anos, consegui sozinho o primeiro emprego formal, como vendedor em um shopping. Na época, o meu pai, que era analista financeiro, havia perdido o emprego de mais de 20 anos, ficando à cargo da minha mãe, professora de escola pública, a missão de ser o arrimo da família naquele momento.

Naquela ocasião, ainda me adaptando à nova situação, lembro que, ao passar por uma loja, me deparei com uma roupa que queria comprar, mas não poderia devido ao momento financeiro que vivíamos. Contudo, abaixo do manequim que chamara a atenção, havia uma placa que dizia: “Precisa-se de vendedor!”. Imediatamente entrei e pedi o emprego, sem nem saber o quê e como fazer. Fiquei trabalhando o dia inteiro como teste e à noite comuniquei a todos a novidade: estava empregado!

Esteja atento às oportunidades

Tempos depois, meu irmão, que era professor de Informática, me avisou que havia surgido uma vaga de professor na escola onde trabalhava. Me empenhei para participar de todo o processo seletivo e consegui a posição. Trabalhava à noite durante a semana e também aos sábados e domingos, dando aulas de MS-DOS, Windows 11 e sobre Iniciação em informática.

Nossa expertise nos capacitou a desenvolver a quatro mãos um curso novo para a escola: “Como montar seu próprio computador”. Com o sucesso, percebemos que havia uma oportunidade a ser explorada e por meio de um imóvel emprestado e um pequeno capital, abrimos uma empresa de informática para a venda de computadores. Posteriormente, criamos um curso de montagem e manutenção de redes e arrumamos um sócio. A empresa cresceu bastante e tudo ia muito bem.

Entretanto, dentro de nós havia um forte chamado: os estudos. Prestei vestibular para Engenharia e passei em várias universidades. Acabei optando pela Fundação Educacional Inaciana “Pe. Sabóia de Medeiros” (FEI), em São Bernardo do Campo, pois tinha que ficar perto do trabalho. Dentro da graduação, tinha muito interesse em aviões – por ter feito um curso de piloto privado no aeródromo Campo de Marte, em São Paulo – e desenvolvi grande interesse em física, por influência de um professor chamado José Feliz, da escola ginasial. Fazia todos os exercícios dos livros de forma antecipada e, entre um estudo e outro, continuava com o serviço de manutenção de computadores, chegando, inclusive, a atender professores da universidade.

Foque em aprender outras línguas e prepare-se para conexões globais

Comecei a fazer estágio na empresa mecânica de um amigo da classe, localizada em Guarulhos. Inicialmente, o trabalho era na parte de Qualidade e Compras. Quando desenvolvi um sistema de compras automatizado em Excel, um funcionário foi demitido. Fiquei arrasado, mas entendi na prática um dos efeitos imediatos da automatização.

Continuei a busca por grandes empresas a fim de aprender o estado da arte da engenharia e produção industrial. Consegui estágio na General Motors (GM), e considero o dia em que recebi a notícia como um dos melhores da minha vida! Trabalhei em projetos de pick-ups que estavam em desenvolvimento e, no dia a dia, passei a entender como navegar em corporações e influenciar pessoas.

Nesse período, me apliquei para um programa de intercâmbio chamado IAESTE e fui aprovado para ir trabalhar na Technische Universität München (TUM) em Munique, na Alemanha. Meu Inglês era bem ruim e não sabia falar alemão. Decidi sair de casa um mês antes do estágio e parar em Londres, na Inglaterra, para aprender o idioma “na marra“. Foi muito difícil, mas, quando cheguei ao estágio, já estava bem melhor na fluência da língua.

O fato é que o mundo é global e as conexões acontecem mundialmente, mesmo quando se atua em uma empresa nacional. E saber outro idioma foi essencial. Quem não sabe ler e minimamente se comunicar, fica extremamente restrito no seu conhecimento e também na troca de informações e vivências com pessoas de outros países. Ter me aprofundado no inglês e no espanhol me deu muita abertura neste sentido. Aliás, falo Inglês praticamente todos os dias.

Empreender é estar atuante

A estadia na Alemanha durou alguns meses. Quando retornei ao Brasil, concluí a graduação e formei-me engenheiro. Nessa altura, a empresa que havia fundado tinha quebrado pois nem eu, nem meu irmão, estávamos mais ativos. Lição aprendida: negócio só com o dono atuante. Por isso, se for sair e se dedicar a uma outra questão, feche seu ciclo antes de abrir outro. No caso da empresa, venda!

Trabalhe com o que te realiza e onde se é bom

Nos estágios em Engenharia Aplicada em Projetos, descobri que gostava da técnica, mas que não me conectava em ficar no chão de fábrica, no processo produtivo em si. O que me realizava era trabalhar na elaboração dos projetos e nos planejamentos estratégicos. Então fui me aperfeiçoando nisso, o que me levou a escolher depois a Engenharia Mecânica, com ênfase em produção. Neste momento, só queria trabalhar em montadoras, pois adorava carros! Como a GM não tinha programa de trainee, participei de alguns processos seletivos externos e passei na Volkswagen e na Ford. Acabei optando pela primeira opção, onde trabalhei no setor de qualidade. Quando participei da tentativa de implementar o sistema de melhoria contínua, com a colocação de um palmtop para coletar os erros, passei por uma situação bem constrangedora: em um final de semana, a sala dos computadores foi violada e o computador quebrado. Mais uma lição sobre como se pode reagir um grupo quando se sente ameaçado pelo novo, visto que o sistema, caso prosseguisse, deveria diminuir a célula de retrabalho.

Algum tempo se passou e recebi uma proposta irrecusável da Ford. E lá fui eu trabalhar com Marketing (um nicho novo para mim) e cuidar de pick-ups. O diretor da área, Arnaldo Brazil, era realmente um gênio e se prontificou a me ensinar algumas noites na semana. Investi muito em minha formação neste segmento, fiz curso de especialização e pós-graduação em Administração de Marketing e fui, aos poucos, melhorando habilidades e direcionando mais para áreas de negócio. Hoje, anos depois, posso dizer que já não sou engenheiro, mas sim um executivo, um administrador. E que este caminho não teve nada a ver com a escolha pessoal, mas sim com o fato de ter me encaixado completamente em um nicho repleto de possibilidades!

Fiquei 6 anos na Ford e lancei vários produtos, como Ranger Storm, Ranger Sport, Motor Power Ranger, entre outros. Havia muito reconhecimento e propósito, mas a velocidade de movimentação interna e o crescimento de carreira eram baixos. Optei por sair para ter um crescimento mais acelerado fora, ao invés de insistir internamente

onde gostava... Não sabia, mas estava cometendo um erro de trajetória, que seria sentido mais adiante. Os erros também nos ensinam.

Fui para o ramo de Telecomunicações. Crescimento rápido como supervisor de marketing, mas não me conectei com o mercado e com a empresa. Aprendi a duras penas que emprego tem que ser a união de Propósito + Perspectiva + Reconhecimento.

Saí em 2 anos e fui para algo muito diferente, para tentar me reencontrar: consultoria. Que escola! Aprendi a base da análise e da pesquisa mercadológica e como apresentar ideias de forma completa e objetiva. Acho que todo mundo deveria ter esse intensivo. Aprendi a contar histórias (de negócio) de forma visual e com conexão à audiência.

Descobrir no que se é bom é essencial, e isso só se consegue na experimentação. Sendo bom, aprende-se a gostar do que faz.

Ter um propósito impulsiona e abre caminhos

Foi quando apareceu o meu propósito. Trabalhar no ramo da Saúde em uma operadora de saúde. Iniciei esta fase na Medial Saúde! O desafio? Levar melhor qualidade de vida a pacientes buscando a melhoria do setor frente a custo, qualidade e acesso. Fiquei lá por 5 anos, tempo suficiente para implantar sistemas de monitoramento de mercado, programas de incentivo a corretores, sistema de geomarketing para rede a credenciada e apoio a M & A para a compra de operadoras e hospitais, entre outras melhorias. Paralelo a este trabalho, fui convidado para ministrar aulas de Marketing e Pesquisa de Mercado e formar o programa de graduação de uma universidade. Foi uma excelente oportunidade para construir trocas de aprendizado entre alunos e professor, e onde assimilei mais uma lição: seja humilde e continue aprendendo. Ensinar é parte do aprendizado. Aplico isso no dia a dia e pensar assim reforça conceitos, melhora a consistência, abre novos horizontes e me desafia.

Eu sou a prova que não se pode parar de aprender. “Quanto mais você sabe, mais percebe que nada sabe!”, já dizia o filósofo Sócrates. Seja o aprendizado que se consegue sendo curioso e humilde para perguntar e aceitar ou o aprendizado formal nos cursos e escolas. O último curso que fiz foi há um ano, na Universidade de Harvard em Boston (USA), algo que sempre sonhei em fazer e conhecer. E espero não parar por aqui, pois estudar sempre abre uma oportunidade de repensar e encontrar novos e melhores caminhos.

Contrate pessoas melhores que você

Após esse período, entrei na GE Healthcare. Acredito que houve o encontro perfeito com minhas ambições e pude trabalhar diversos conceitos, como a criação do programa de Key Opinion Leader (KOL), programa de educação continuada interno e construção de clubes de usuários, entre outros. Atuei em diversas posições, até chegar a gerente-geral de Produtos para a América Latina, gerenciando quase 200 pessoas e sendo staff do chief executive officer (CEO) da região. Estar em uma posição C-Level me deu um bom aprendizado sobre liderança pela inspiração e exemplo. Gerenciei e contratei pessoas realmente excelentes. Aí, mais um aprendizado: contrate pessoas melhores que você, dê a direção e apoie seu crescimento. Todos crescem e o resultado aparece.

Em 2023, a empresa globalmente fez o spin-off e se tornou independente. A região da América Latina se fundiu com outras três regiões no mundo e a subsidiária foi para Dubai. Após quase 14 anos, fechei este ciclo e desfrutei de um pequeno e merecido descanso, após três décadas de trabalho contínuo. Mas o período sabático não durou muito tempo.

Um dia, já querendo voltar ao mercado, e sabendo que um gigante mundial do segmento de diagnóstico médico (MedTech), com sede na China, ainda não tinha presença no Brasil, mando uma mensagem ao CEO mundial e, para a minha surpresa, recebo um contato em poucas horas. Após meses de construção de um business plan, fechamos a nova empreitada. CEO/General Manager Brasil com a missão de trazer a subsidiária ao país e aplicar os conceitos aprendidos. Hora de usar as lições antigas e aprender algumas novas.

Fuja destas armadilhas

Existem situações que todo profissional deve evitar, se quiser se destacar no mercado. A primeira delas é não fazer apenas o que é pedido, sem entender o que acontece como um todo: o antes e o depois. Estar à par do processo é relevante.

Outro ponto que deve ser evitado é vivenciar a Síndrome do Impostor e se diminuir ou, em sentido oposto, ser arrogante demais. A chave está em ser humilde e praticar a escuta ativa, sem parar de agregar conhecimentos.

Entrar em disputas internas é um grande erro. O concorrente está fora da empresa e não dentro. Sempre busque a empatia e o senso comum de maneira cordial. O objetivo final não é fazer amigos, mas sim parceiros para o melhor do mercado. E se no decorrer da jornada este contato se transformar em amizade, melhor ainda.

Haja sempre no Walk the Talk. O que se fala é o que se faz. Seja consistente e faça sua palavra valer ouro! Atue com a melhoria contínua e seja inovador, sempre se conectando com pessoas e com processos.

Qualidades que tornam o líder imbatível

O líder tem que ser humilde e praticar a escuta ativa de forma consistente. Cabe a ele balancear entre a hora de ser apoiador, direcionador ou diretivo, sempre com empatia e transparência. Ser um bom comunicador também é importante (mais vale o excesso de comunicação que a falta). Ele tem que saber expressar e vender as suas ideias, inspirar e engajar as pessoas por meio da comunicação e pelo exemplo. E nessa hora, a empatia para entender e abraçar a diversidade de opiniões se faz necessária. Afinal, o confronto de pensamentos faz parte do processo. As diferenças são importantes para que haja um olhar a partir de diversas perspectivas, a fim de discutir uma ideia e chegar a um consenso, para que, na hora de agir, se encontre o melhor direcionamento possível. O líder também deve analisar cenários de forma isenta, para não entrar em embates emocionais. A visão deve ser a mais objetiva possível.

E lembre-se: pessoas realizadoras inspiram. Não as que só falam, mas sim as que fazem. Inspirar também passa por ser humilde, não se fechar dentro do próprio mundo e estar disposto a compartilhar conhecimento.

O segredo da carreira de sucesso

Seja curioso para aprender! Não fique no nível raso, se aprofunde, busque. Portanto, leia, converse, estude, porque ao fazer isso as portas se abrem. É impressionante, mas é assim que acontece! Nesta jornada, aproxime-se de pessoas inspiradoras e batalhadoras para se conectar. Todos precisamos de um conselheiro (ou vários) ao longo da carreira, com quem se possa ser transparente e escutar o que não queremos ouvir.

E tome suas decisões tendo em mente que nunca estará 100% pronto. Contudo, isto não pode te paralisar, muito pelo contrário! Confie no seu potencial, na sua bagagem, empreenda e siga adiante! O medo faz parte de tudo o que é novo e não deve te paralisar, mas sim ser transformado em energia positiva na tomada de decisões.

Livro recomendado por Caio Sanches:

A marca da vitória: a autobiografia do criador da Nike, de Phil Knight. Editora Sextante, 2016.