(Global Partners)
Colunista
Publicado em 6 de junho de 2025 às 20h41.
Moro no Brasil há 12 anos, e, ao olhar para trás, percebo que as diferenças culturais se mostraram impasses significativos. Em vários momentos me deparei com a sensação de que não iria conseguir superar as barreiras que surgiam no caminho, o que exigiu de mim grande resiliência diária, principalmente nos primeiros meses, que foram árduos em vários aspectos. Mas desistir nunca esteve no meu vocabulário. Perseverança é o que me define. Hoje posso afirmar com convicção que me sinto plenamente integrado e à vontade no Brasil. Este país se tornou não só um local de residência, mas o meu verdadeiro lar.
Nasci e cresci em uma pequena vila no interior da Alemanha, próxima à Suíça, um ambiente sereno e acolhedor, onde vivi com pai, mãe e dois irmãos, sendo eu o primogênito. Essa simplicidade marcou momentos especiais na minha infância e me deu oportunidade de acompanhar de perto a carreira dos meus pais, que eram do setor bancário. Essa proximidade me incentivou a explorar áreas ligadas ao setor financeiro e comercial, um caminho que parecia natural para mim à época.
Desde 2005, atuo na B. Braun Group no setor de dispositivos médicos, uma referência entre as grandes companhias locais. No passado, outros integrantes da família também fizeram parte do quadro de colaboradores da companhia, entre eles minha avó materna e alguns irmãos dela, assim como outros parentes. Esse vínculo, somado ao desejo de trabalhar em algo que une inovação, impacto social e desenvolvimento humano, foi determinante para que eu optasse por construir uma carreira neste campo.
Ingressei na B. Braun Group como estudante, em um programa de formação oferecido pela organização. Essa iniciativa permitia conciliar as vivências práticas do ambiente corporativo com os estudos universitários em Administração Internacional. Pude ver de perto a prática de um dos principais lemas que a empresa carrega, onde o compartilhamento do conhecimento e a educação são o principal caminho para a colaboração contínua entre profissionais de saúde.
Concluí a graduação em 2008 e dei continuidade na carreira ao ser selecionado como trainee. Após cerca de seis meses, efetivaram-me no setor de marketing global e depois gerente de produto júnior na área de equipamentos cirúrgicos motorizados. Permaneci nessa posição por aproximadamente dois anos. Foi então que, em 2012, tive a possibilidade de trabalhar fora da Alemanha. Essa troca de ideias resultou, ao final daquele ano, com uma proposta para mudar para o Brasil.
Desembarquei em território brasileiro em 2013 para liderar um segmento focado em equipamentos cirúrgicos e assumi um cargo na área de marketing da subsidiária local. Ocupei este posto por três anos e fui promovido à liderança intermediária, na qual comecei a gerenciar pessoas e administrar um portfólio mais amplo incluindo consumíveis cirúrgicos, fios e materiais voltados para intervenções vasculares. Certamente esta etapa representou um grande impulso na minha carreira e permitiu que eu desenvolvesse habilidades estratégicas e de gestão.
Construa um time vencedor
Em 2017, surgiu a chance de apresentar um plano de negócios diretamente ao CEO da subsidiária aqui do Brasil. A proposta envolvia a criação de uma unidade voltada para o mercado cirúrgico com foco em tecnologias de alta complexidade destinadas a hospitais, incluindo motores e instrumentais. O plano foi aprovado e no terceiro trimestre de 2017 iniciei a implementação dessa nova estrutura, sendo o responsável pela gestão integral do projeto. Durante os três anos seguintes lideramos uma projeção valiosa. Partimos de uma receita inicial de R$13 milhões com a ambição de alcançar R$50 milhões em quatro anos. Construímos uma dinâmica de trabalho inovadora, quase como uma startup interna.
Em 2020, recebi o convite para comandar a gestão da regional de vendas em São Paulo, com uma equipe comercial responsável por um portfólio que atendia a mais de 70% das demandas hospitalares. Esse desafio coincidiu com o início da pandemia, exigindo uma rápida adaptação a um cenário de incertezas. Durante dois anos e meio atuei em um projeto de reestruturação direcionado em ampliar a lucratividade e promover um crescimento sustentável.
Em janeiro de 2023, obtive uma nova ascensão profissional, dessa vez para a diretoria executiva da empresa no Brasil. Desde então, supervisiono diferentes áreas estratégicas, incluindo divisão cirúrgica, marketing, comunicação, acesso ao mercado e programas de educação continuada. Além disso, passei a liderar duas regionais de vendas, atribuição que trouxe demandas mais complexas juntamente com a oportunidade de contribuir para a transformação do negócio, aumento da participação no mercado e fortalecimento da rentabilidade da organização.
Ao refletir sobre meu percurso atual, compreendo que, mais do que as conquistas financeiras e estratégicas, a maior realização foi construir e desenvolver um time vencedor. Formar uma equipe capaz de superar desafios e alcançar resultados consistentes é, para mim, o legado mais significativo da minha trajetória.
Seja um líder eficaz desenvolvendo estas características
Liderar sem uma compreensão clara das próprias emoções, gatilhos e reações, reduz a eficácia de gerir e inspirar pessoas. Um líder de alta performance precisa desenvolver competências-chave, que ultrapassam a qualificação técnica. Entre elas, enfatizo o autoconhecimento e a inteligência emocional como pilares imprescindíveis.
Outro aspecto central é o foco nas pessoas. Muitas vezes, líderes estão fixados em estratégias, metas e planos, esquecendo que são as pessoas que tornam as conquistas possíveis. Independentemente do cargo ou posição hierárquica, cada colaborador tem uma contribuição única para o sucesso organizacional. O modo como interagimos, a colaboração, o engajamento e até a energia presente no ambiente de trabalho, são elementos que afetam diretamente o rendimento.
Buscar crescimento, rentabilidade e expansão de mercado é crucial, mas esses ganhos apenas se sustentam quando estão alinhados a uma convivência saudável e produtiva. Somado a isso, uma visão estratégica bem delineada, com metas concretas e planos adaptáveis, é primordial para guiar equipes aos objetivos desejados.
Contudo, essa percepção deve ser complementada pela capacidade de adaptação e agilidade. Vivemos em um mundo de mudanças rápidas e ciclos cada vez mais curtos, onde a flexibilidade e a destreza de se reinventar são cruciais para o êxito. Em suma, vejo que a comunicação atua como um elo que conecta todas essas competências, fortalecendo alianças e garantindo que tudo funcione em harmonia. Sem isso, as iniciativas podem se tornar fragmentadas e perder a coesão necessária para gerar o desfecho esperado.
Um líder transforma vidas
Os valores que considero indispensáveis para exercer uma ótima liderança transcendem o óbvio, agregando diretrizes que são os alicerces de uma gestão competente e humanizada. Em primeiro lugar, saliento o respeito e a responsabilidade. Um líder gerencia processos e transforma vidas, seja diretamente por meio de seus times, seja indiretamente por meio da organização, dos clientes e de outros stakeholders. Essa consciência sobre o alcance das decisões que tomamos é essencial para agirmos com integridade e cuidado, certificando-se de que o ambiente corporativo seja pautado pela confiança mútua, diversidade e colaboração.
Outra premissa que levo comigo é a ética. A transparência, o comprometimento com a justiça e o tratamento igualitário são inegociáveis. Não há espaço para favoritismos ou práticas que comprometam a equidade. Tenho o conceito de que inspirar ultrapassa o ato de simplesmente apontar direções; é sobre criar uma integração entre objetivos organizacionais e padrões pessoais de cada membro do grupo. Propósito, nesse contexto, ganha múltiplas dimensões. Ele pode ser interpretado como uma missão empresarial de crescimento, lucratividade e entrega de valor para os acionistas, mas também como algo mais íntimo que vincula o trabalho, aspirações e sonhos individuais.
Construa uma cultura de equilíbrio, celebração e inovação
A ansiedade é uma das situações que pode colocar em risco o desenvolvimento de uma carreira. Quando não administrada adequadamente, pode causar receios como o medo de fracassar, a insegurança de não atingir metas ou até mesmo a sensação de insuficiência ao se comparar constantemente com outras pessoas. Essa comparação em demasia, amplificada por pressões externas e a idealização promovida pelas redes sociais, é uma armadilha que frequentemente distorce a percepção da própria evolução. O desejo de abraçar múltiplas tarefas, sem priorizar ou organizar etapas, muitas vezes leva à dispersão e à ineficiência para concluir objetivos.
Seguir um plano estruturado e com prioridades definidas, permite não só o alcance de metas, mas também a adaptação a novos cenários e mudanças de rota, quando necessário. Por isso, estimule o desenvolvimento de competências, ofereça oportunidades de capacitação e permita que cada indivíduo explore seu potencial. Estas são práticas motivadoras, que impulsionam o engajamento.
Um elemento que absorvi e priorizo, especialmente em minha experiência no Brasil, é a importância de equilibrar momentos de dedicação intensa com celebrações. Apreciar conquistas, comemorar marcos e incentivar a socialização contribuem para um ambiente mais fluido, dinâmico e acolhedor. As gerações mais novas, e até mesmo as atuais, valorizam cada vez mais locais que propiciem alegria, leveza e equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Ao nivelar crescimento, propósito e bem-estar, criamos uma cultura que reterá talentos e os impulsionará a inovação e triunfo.
Visionários conectam ideias a transformações reais
Tenho inúmeras fontes de inspiração que me influenciam, de figuras próximas a referências globais amplamente conhecidas. Entre as mais reconhecidas mundialmente destaco Steve Jobs. Seu dom em enxergar a inovação de forma disruptiva, seu pensamento visionário e sua facilidade em materializar ideias em soluções revolucionárias são inspirações que utilizo frequentemente no cotidiano. Relevante citar também Elon Musk. Sua sagacidade em desafiar limites e explorar possibilidades até então inimagináveis serve como exemplo de determinação e coragem. Outras influências notáveis, mas sob outra perspectiva, são Barack Obama e Martin Luther King. Ambos demonstraram uma maestria extraordinária de mobilizar pessoas, engajar grandes públicos e comunicar ideias de forma elucidativa e gentil. Suas lideranças são exemplos de como a comunicação pode ser uma ferramenta poderosa para motivar e inspirar ações coletivas.
No âmbito pessoal, destaco Thomas Kraft, responsável por me convidar a mudar para o Brasil. É alguém que admiro imensamente, pois lidera com sutileza sem recorrer à hierarquia para alcançar resultados. Sua habilidade de motivar e criar um senso de união em torno de objetivos comuns foram atributos que aprendi diretamente convivendo com ele. Cito também Álvaro Americano, que exerceu uma influência vital na estreia que tive como gestor de equipe. Na época, era jovem e inexperiente e ele me proporcionava a tranquilidade de saber que poderia errar, desde que aprendesse com os deslizes. Essas influências, tanto globais quanto pessoais, formam uma combinação rica de valores e perspectivas que aplico no dia a dia. São lições que me guiam na busca contínua por evolução e excelência.
Respeite o tempo na busca pelo sucesso
Tem uma frase que sempre ecoa em meus pensamentos: “Roma não foi construída em um dia”. Essa expressão, muito comum na Alemanha, me ajudou a compreender a importância de respeitar o tempo. Esse conselho, frequentemente repetido por minha mãe e minha avó, sempre me ajudou a refletir sobre a importância de dar um passo de cada vez, com paciência e planejamento. Entendo que o progresso é feito por etapas e é essencial respeitar todas elas.
Portanto, para os jovens que estão começando agora na jornada corporativa, tenham certeza de que será um percurso longo e muitas vezes repletos de incertezas. Porém, à medida que estamos vivenciando o processo, vamos percebendo de fato, que o progresso ocorre gradualmente e acontece por meio de esforços consistentes. Não tenha medo de falhar. Esse receio pode se tornar uma adversidade, pois é justamente através das falhas que surgem as oportunidades de aprendizado e evolução. Saber ouvir, colaborar e valorizar as ideias alheias, sem colocar-se acima dos outros é superimportante e fortalece os laços de união e cooperação em um time.
Por outro lado, pensar “fora da caixa” é uma questão poderosa em qualquer situação. Ter coragem de apresentar ideias diferentes, mesmo que nem todos compreendam de imediato, é fundamental.
Liderar é, acima de tudo, servir
Arrisque, teste e explore caminhos novos! São atitudes que abrem portas para o sucesso. Cuide da saúde mental, do bem-estar físico e valorize a vida pessoal. Com o tempo, percebi que uma carreira de longo prazo exige uma sustentação firme. Família, saúde e momentos de descanso são fontes vitais de energia e equilíbrio. Sem esse alicerce o sucesso profissional se torna insustentável. E o mais interessante é entender que liderar é acima de tudo servir. Uma liderança inspiradora é baseada no apoio e capacitação de pessoas para elas descobrirem seus próprios caminhos. Essas lições continuam sendo meus princípios e me fazem lembrar que mediante a essas condutas deixarei um legado positivo e com muitos capítulos de sucesso.
Leitura recomendada por Michael Dickscheid:
Líderes servem por último: como construir equipes seguras e confiantes, de Simon Sinek. Alta Books, 2019.