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Novo líder deve atuar com o perfil humanístico, empático e conciliador, afirma Peter Rebrin

Na coluna desta semana, conheça a história de Peter Rebrin - CEO - AFP Futuro de Bolivia, empresa do Grupo Zurich

Na coluna desta semana, conheça a história de Peter Rebrin  - CEO - AFP Futuro de Bolivia , empresa do Grupo Zurich   (Peter Rubrin/Reprodução)
Na coluna desta semana, conheça a história de Peter Rebrin - CEO - AFP Futuro de Bolivia , empresa do Grupo Zurich (Peter Rubrin/Reprodução)

A minha trajetória no mundo corporativo começou a se desenvolver quando ainda era bastante jovem, pois já me interessava por questões pertinentes às relações internacionais. Detentor de um sólido perfil humanístico, pude vislumbrar a oportunidade de entrar em contato com culturas diversas, amealhando conhecimentos intrínsecos, com o propósito de seguir me aprimorando, sempre com perseverança e empatia. Atualmente, ocupo a cadeira de CEO da AFP FUTURO DE BOLIVIA, uma empresa da Zurich Insurance Company Ltd, eminente multinacional da área de seguros. Sou casado com Ana Paula, há mais de trinta anos, e somos pais da Vivian, de 27 anos, que mora e trabalha em Lisboa.  

Natural de São Paulo, nascido em 1963, tenho origem italiana e portuguesa pelo lado da minha mãe Mariângela Rebrin, enquanto o meu pai Igor Rebrin nasceu na China, em Pequim, mas é filho de russos. Fui criado na capital paulista, onde passei toda a minha infância e adolescência, tendo estudado em um colégio norte-americano.  

Já durante a juventude, detinha a intenção de cursar uma faculdade nos Estados Unidos, principalmente para amealhar conhecimentos de outras culturas e de me preparar adequadamente para a carreira a qual viria a me dedicar futuramente.  

Com o planejamento do que pretendia realizar em minha vida devidamente estruturado, logo após concluir os estudos iniciais em São Paulo, parti para os EUA, onde me graduei em Relações Internacionais na University of Pennsylvania, em 1984. Meu perfil sempre foi mais voltado para o lado de Humanas, e neste curso encontrei algo bastante interessante, que reunia Ciências Políticas, Artes, História, Economia e outras disciplinas correlatas. 

Todavia, nunca pensei que me dedicar a esse curso representaria por si só a minha futura área de atuação, mas sim marcaria demasiadamente na questão da formação acadêmica, para consolidar uma base de conhecimentos bem alicerçada. À época, pensava em atuar com comércio internacional, incluindo importação, exportação, e por isso optei por esse caminho no momento de selecionar uma universidade de grande prestígio.  

Aproveitei para realizar um estágio entre a faculdade e o MBA de International Management, cursado na Thunderbird School of Global Management. Neste intervalo, entre 1984 e 1985, trabalhei em São Paulo, na Expobras, uma trading, sendo que a empresa era voltada para o comércio internacional, na qual adquiri uma ampla gama de conhecimentos, sobretudo no campo desse setor. Dediquei-me com determinação a essa área até fazer a transição para o setor de seguros. 

Os aprendizados elementares na edificação da carreira 

No começo, também auxiliava o meu pai, que era corretor de seguros, amealhando conhecimentos valiosos sobre essa área. Inclusive, serviu como uma plataforma para enveredar para o setor de seguros, pois, após concluir o MBA, entrei em contato com o círculo de amigos do meu pai, a maioria conectada à área. Uma dessas pessoas mencionou para mim que a companhia dele, a Cigna – a subsidiária de um grupo estadunidense – estava abrindo um programa para estagiários. Logo considerei pertinente candidatar-me à vaga e assim ingressei no nicho de seguros.  

A Cigna me proveu a base essencial para compreender o setor de seguros, sendo que tive a oportunidade, durante o estágio de 18 meses, de atuar em todas as áreas da companhia, no modelo rotativo. Depois, ainda passei um período nos Estados Unidos, com o intuito de compreender melhor como funcionavam os programas internacionais de seguros para empresas multinacionais. 

Conforme me destacava dentro da organização, passei a crescer, abrindo caminhos, amparado por dedicação, perseverança e disciplina. Comecei no setor comercial, atendendo corretores de seguros e, na sequência, passei para a área de programas multinacionais, com foco em processos de empresas globais. Posteriormente, tive a oportunidade de ocupar a Diretoria Técnica (Underwriting) da instituição. Ressalto como, ao investigar um projeto novo, responsável por trazer produtos de garantias estendidas, acabei recebendo uma proposta do próprio parceiro internacional da Cigna, para abrir a unidade da empresa no Brasil, em 1995. 

A companhia se chamava IMCO, e decidi aceitar essa oportunidade de desenvolver a empresa a partir do zero, sendo que fui o primeiro funcionário, contando com a parceria de um sócio inglês, detentor de todo o know-how, e aliado de executivos brasileiros. Nosso maior êxito nesta empreitada foi como, pioneiramente, trouxemos o conceito de garantia estendida para o Brasil.  

A sólida trajetória dentro da Zurich Insurance Company 

Menos de dois anos depois, a empresa na Inglaterra foi vendida para a GE Capital, e eles resolveram mudar os rumos das operações, visando abarcar a administração de cartões de crédito. Com essa movimentação, ponderei ser mais razoável deixar a organização, levando-me a aceitar um alto cargo na AIG, companhia norte-americana, que, à época, estava entrando em uma fusão, uma joint-venture com o Unibanco, antes da união entre bancos com o Itaú.  

Iniciei em 1998, e ocupava a posição de diretor, mas permaneci por menos de dois anos na empresa, pois recebi uma oferta da Zurich Insurance Company Ltd, em 1999. Entre 2014 e 2018, deixei a companhia para assumir uma posição de CEO na QBE, um grupo multinacional, também do ramo de seguros, de origem australiana. Porém, em 2018, a Zurich Insurance comprou as operações da QBE na América Latina, englobando Brasil, Argentina e demais países da região. Por conta deste processo, voltei a atuar na Zurich. 

Comecei em 1999 na Zurich do Brasil, e já em 2001, a empresa resolveu abrir o escritório regional para a América Latina, efetuando essa operação inicialmente em Santiago, no Chile. Por conta dos meus conhecimentos, fui convidado para ser transferido com o intuito de ajudar a implementar o negócio, integrando essa primeira fase de estabelecimento da estrutura regional.  

Permaneci no Chile por cinco anos. No entanto, quando o grupo criou uma divisão de mercados emergentes, fui chamado para ficar alocado na matriz, na Suíça. Essa oportunidade, de poder trabalhar no Chile e na Suíça, e começar a atuar em um nível mais alto dentro da organização, representa o grande turning point da minha carreira até o presente momento.  

Em 2007 decidiram mudar o escritório regional LATAM de Santiago para Miami, na Flórida. Voltei a trabalhar para a região LATAM e fui trasladado para os EUA, para atuar como COO da América Latina e, posteriormente, como CEO de seguros de ramos elementares para toda a América Latina, totalizando cinco anos como expatriado em Miami.  

Ao final desse período, a companhia promoveu uma joint-venture com o Grupo Santander, que hoje se chama Zurich Santander, abarcando os mercados do Brasil, México, Chile, Argentina e Uruguai. Eu tive um papel importante no Due Diligence e no início deste projeto, regressando ao Brasil para focar em estabilizar a parceria solidamente em todos os países. Logo depois, fiquei imbuído de atribuições para desenvolver parcerias com bancos no contexto global.  

Por conta dessa operação, tive a oportunidade de trabalhar em inúmeros projetos ao redor do mundo, inclusive inserido em países distintos, como África do Sul, Turquia, Cingapura, Hong-Kong, algo que me proveu uma exposição maior a nível global. Foi nesta época que decidi deixar o Grupo Zurich e migrar para a QBE, como CEO em Porto Rico, e depois ocupando a mesma função, mas no Brasil. Todavia, a Zurich efetuou a operação de compra da QBE exatamente no final deste período. 

Os desafios complexos à frente das operações na Bolívia 

As lideranças decidiram me manter na companhia, alocado no Brasil, em outra função, com a responsabilidade de estabelecer relacionamentos com bancos, e também a parte de seguros de pessoas, automóveis e residências. Neste ínterim, passei a entrar em contato novamente com as operações da organização na Bolívia. Destacava-me por ser uma das únicas pessoas da companhia que conhecia a história das aquisições e dos negócios do mercado boliviano, assim como as evoluções dos processos daquele país.  

Em 2006, o governo da Bolívia tinha redirecionado o país para o modelo socialista, com Evo Morales assumindo a Presidência, e essa nova política de Estado resultou na expropriação do negócio da Zurich por meio de uma mudança na Constituição boliviana, em 2010. Tal processo se prolongou por mais de 10 anos, e assumi a missão de ir para a Bolívia em 2020, com o propósito de acelerar a transferência do negócio ao Estado Boliviano e tirar a companhia do país em definitivo.  

Contudo, no meio desta história, existe o processo de arbitragem entre a Zurich e o Estado Boliviano na Corte Internacional de Haia. Estive na Holanda em 2022 como testemunha, e neste ano de 2023 retornarei para prosseguir lidando com este processo bastante complexo de ser solucionado.  

Projetos exitosos como executivo do setor de seguros 

Considero como o meu primeiro case de sucesso o de ter estabelecido o negócio de garantias estendidas no contexto brasileiro em 1995, com a IMCO do Brasil. Em outro momento, destaco quando integrei o time de Miami, redirecionando a estratégia da Zurich para a América Latina por meio do ingresso no negócio de afinidades, que representa a venda de seguros a partir de parceiros, algo que a empresa não fazia até então. 

Essa mudança de estratégia representou um marco para a companhia na América Latina, ampliando o escopo da organização. Enalteço também a minha participação na joint-venture junto ao Santander, um projeto de grande dimensão. 

Já mais recentemente, é evidente que esse trabalho realizado na Bolívia é extremamente exigente e demasiadamente complexo, por envolver questões governamentais.  

O perfil humanístico e empático do novo líder 

Examinando cuidadosamente os desafios enfrentados por um executivo encarregado de estabelecer conexões sólidas com diversos parceiros, é essencial destacar a complexidade quando há múltiplos stakeholders envolvidos. Isso pode incluir acionistas minoritários com interesses divergentes em relação à operação local, em comparação com a matriz, o que frequentemente gera uma tensão política significativa. Lidar com um grupo tão diversificado de pessoas, cada uma com perspectivas distintas, é invariavelmente complexo. Portanto, essa situação exige um alto nível de diplomacia e habilidade para navegar com sucesso pelos processos envolvidos. 

Ao ser indagado sobre o perfil do líder contemporâneo, considero que, atualmente, o mais importante não são mais aquelas hard skills, de conhecimento puramente técnico. O gestor moderno deve, antes de tudo, contemplar o lado humano, enfim, deter o perfil humanístico, saber se colocar no lugar dos outros, agindo com ampla empatia. Além disso, é preciso conhecer os caminhos para motivar as pessoas por meio dessa empatia, evitando o formato antiquado de apenas fornecer instruções, canalizando tudo para os aspectos técnicos dos negócios.  

Enfim, é fundamental se aplicar no engajamento, tendo em vista promover o compromisso dos indivíduos envolvidos. É isso que faz a diferença no mundo corporativo de hoje em dia. Nesse sentido, busco sempre atuar amparado por tais características, e quando recebo feedback, detenho essa habilidade forte de saber escutar, de procurar o consenso, sendo empático. Ressalto que às vezes recebo certas críticas que vêm exatamente pelo contrário, por não ser um líder que bate na mesa ou realiza cobranças arbitrárias.  

Dentro deste tópico, aproveito para examinar o perfil dos colaboradores também. Primeiro, o indivíduo necessita contar com um bom fit junto à cultura da empresa, ou seja, ser um profissional que percebemos estar adequado aos propósitos, que não entrará em choque com os demais colaboradores ou mesmo lideranças.  

As fartas e preciosas oportunidades no setor de seguros  

Às novas gerações, ressalto como o setor de seguros vem crescendo muito, mas ainda existe uma baixa penetração do produto no Brasil. Observamos como muitas pessoas e empresas não possuem qualquer espécie de seguro – mesmo para o automóvel, que é bastante comum. Esse déficit ocorre por uma série de motivos, incluindo questões culturais, estruturais, falhas nas próprias empresas do segmento, que não disponibilizam acesso aos produtos para certos setores. 

Portanto, existe uma enorme oportunidade no mercado brasileiro de se trabalhar com seguros para incrementar a penetração do produto no país inteiro. É preciso compreender como alcançar determinado público-alvo, de forma correta, com o preço adequado, para que o consumidor tenha condições de adquirir os diversos seguros ofertados, com enormes benefícios.  

Aproveito a questão mercadológica para exaltar a relevância do ESG, algo que tem muito significado para o nosso negócio. Deixo de lado a governança, por ser algo fundamental no setor de serviços financeiros – sempre se tratou de algo bastante forte, especialmente para as seguradoras. Porém, nas diretrizes ambientais e sociais, é imprescindível deter uma visão especial, porque o clima no mundo está mudando abruptamente. Isso tem gerado cada vez mais eventos catastróficos, quase impossíveis de serem previstos, e responsáveis por causar perdas enormes tanto para segurados quanto para não segurados. Ou seja, sentimos que temos a responsabilidade em relação ao meio ambiente, com comunidades, para encontrar formas de combater inundações, por exemplo, ou como prevenir e proteger melhor os locais mais propensos de serem afetados.  

Aplique-se amparado por conhecimentos e relações sadias 

No início da carreira, gostaria de ter ouvido conselhos de como tomar mais riscos. É muito importante valorizar todas as pessoas com as quais trabalhamos, sejam colegas, clientes, fornecedores, pois os ensinamentos agregam constantemente. E devemos estar sempre abertos a ouvir, aprender com humildade, pois a pior coisa que existe é a arrogância. 

A carreira, por si só, é um caminho que buscamos nas nossas vidas, imbuídos de felicidade e harmonia. E a jornada não precisa, necessariamente, ser algo estático, pois vamos pavimentando os caminhos, adquirindo conhecimentos, experiências, estabelecendo relações interpessoais sadias, crescendo de acordo com a trajetória escolhida por cada um.  

O importante é o que conseguimos absorver para contemplar o lado pessoal, no sentido de nos sentirmos úteis, em prol de prover a diferença no mundo. Sempre olhando em frente – percalços existirão, vamos cair às vezes –, mas basta se levantar e prosseguir, amparado por perseverança, otimismo, porque todos chegaremos lá no momento certo.”