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Nenhum sucesso surge sem o enfrentamento de grandes desafios, afirma Gerci Volpato

Cada pessoa possui características próprias que a levam a desenvolver habilidades inatas

 (Editora Global Partners)

(Editora Global Partners)

Publicado em 28 de fevereiro de 2025 às 21h47.

Tenho uma definição de sucesso bastante objetiva. Aprendi com meus pais e professores que sucesso é alcançar os objetivos, sejam eles pequenos ou grandes. O sucesso será vencê-los. E nenhum sucesso surge sem o enfrentamento de majestosos desafios. 

Minha história começa entre as colinas, os riachos e as planícies bucólicas de Rio Pequeno, vila do município de Braço do Norte (SC), onde nasci e passei os primeiros anos de vida. Sou filho dos agricultores Gregório e Úrsula Volpato, e desde cedo fui ensinado a dar valor à natureza e a tudo o que ela é capaz de nos oferecer. E este apreço por cuidar do que o Criador nos confiou foi passado não somente a mim, mas a todos os meus 13 irmãos, mais novos e mais velhos do que eu. Meus pais sempre foram a luz, a energia e a inspiração para a minha evolução e o enfrentamento dos momentos difíceis da vida.

Aos 2 anos, me mudei para Anta Gorda, povoado do município de Rio do Oeste, também em Santa Catarina. Ali, trabalhávamos na roça, plantando arroz, batata, milho, cana, feijão, mandioca e mais alguns alimentos que garantiam o sustento da família, dos quatro cavalos, das seis vacas leiteiras e das muitas galinhas e porcos que engordávamos e uma vez ao ano vendíamos. 

Iniciei os estudos primários aos 7 anos. A tinta de escrever era manufaturada por mamãe, com bagas de cor azul-aveludado que colhíamos no mato e, após fervidas, espremidas e coadas, transformavam-se em um sumo que era colocado na caneta-tinteiro. Lembro que diariamente saía de casa com um irmão e uma irmã e percorríamos, descalços, cerca de seis quilômetros até a escola, cuidada com esmero pelas freiras Sibila e Melânia, que também zelavam pela igreja da região. Foi com elas que aprendi a ler, escrever, fazer contas e também a amar a Deus sobre todas as coisas. 

Com mais idade, aos 12, fui encaminhado para o seminário, que ficava em Rio do Oeste (SC). Ali permaneci por três anos e tive que me adaptar a uma rotina rígida de horários e obrigações. Ao final deste período, fui direcionado para outro seminário, em São Manuel (SP), para iniciar a vida como padre. No entanto, nesse processo, iniciei um namoro às escondidas, feito que resultou na saída do seminário e no retorno para a casa, em Anta Gorda. Um novo momento se descortinava para mim. 

Foque no que precisa ser feito e não se intimide com as negativas 

A estadia em Anta Gorda não foi extensa. Disposto a continuar os estudos, convenci meus pais a autorizarem a minha ida a Rio do Sul (SC), onde passei a morar em uma pensão. Nessa região, cursei o último ano de ginásio (atual Ensino Fundamental) no período noturno e, durante o dia, arrumei trabalho em uma loja de venda de automóveis. Na verdade, atuava como cobrador, indo de bicicleta às roças contatar os clientes que não habitavam na cidade. Nesse período, fiz amizade com vários colonos e intermediei diversas negociações de Jeeps e Kombis, conseguindo, dessa forma, pagar todas as despesas com a comissão que recebia. 

Mas o bom momento não durou por muito tempo. Por conta de um problema de saúde do meu pai, a família se mudou para Curitiba (PR). E lá fui eu, no auge dos 17 anos, tentar a vida em um novo estado. Com mais dois sócios, me tornei um dos proprietários do Bar Lanchonete Ponto Chic. Fiz um curso noturno de 60 dias no Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), onde aprendi sobre relacionamento e atendimento ao cliente, e fui atrás de uma vaga no Colégio Estadual do Paraná, para fazer o Científico (atual Ensino Médio). E foi neste momento que me deparei com uma situação que exigiu de mim resiliência e estratégia. 

Isso porque, por conta de divergências envolvendo a documentação do seminário, tive que fazer diversas viagens para conseguir os papeis necessários para a realização da matrícula. E quando finalmente estava com todos em mãos, fui informado de que não havia mais vagas. 

Nesse instante, constatei que, além de mim, outras 50 pessoas estavam na mesma situação. Sugeri então um manifesto na frente do colégio. E, quando estávamos ali, um professor me confidenciou que o colégio dispunha de duas salas vazias, capazes de comportar até 76 alunos, além de contar com professores disponíveis. Faltavam apenas o quadro-negro, as cadeiras e a mesa do professor. Mencionei ao grupo que sabia onde morava o governador e combinamos de ir até lá. 

O encontro não foi fácil. Dois policiais armados estavam presentes, mas consegui que o governador me atendesse pessoalmente. Expliquei-lhe a situação e, dois dias depois, conseguimos realizar a matrícula. Foi uma vitória que me deixou profundamente emocionado e feliz. 

Tudo o que fizer, faça bem-feito!

O episódio do colégio foi uma das muitas batalhas que estavam por vir nesta nova fase. No mesmo período, passei por uma situação digna de entrar para o Guinness Book, na ocasião da minha entrada no Banco Mercantil de Minas Gerais. Logo no primeiro dia de trabalho, fui surpreendido com uma greve geral dos bancários. E os grevistas não só me impediram de entrar no banco, como também me convenceram a participar da greve. Fiz piquetes por cinco dias seguidos, xinguei os banqueiros… tornei-me grevista e ainda ganhei um aumento salarial sem sequer ter trabalhado um único dia. 

Novamente vivia um bom momento. E apesar da rotina agitada, sentia que o futuro era promissor. Em 1967, ao final do Científico, prestei vestibular de Ciências Econômicas na Universidade Federal do Paraná (UFPR) – e passei. No primeiro dia de aula, o professor Luiz Antônio Fayet fez uma breve fala, que por alguma razão me seguiu por toda a vida. Em suas palavras, deu as boas-vindas e nos disse: “Para ter sucesso na vida, tudo que vocês fizerem, façam bem-feito”.

Mesmo nas pequenas coisas, gosto de lembrar da lição deste saudoso professor. Seguindo este ensinamento, aliás, fiz o trabalho de conclusão de curso com o título Análise crítica do processo de urbanização do Brasil, recebendo, pessoalmente, do reitor da UFPR, os cumprimentos e a notícia de que a pesquisa havia sido eleita a melhor entre todos as apresentadas naquele ano. E assim recebi o diploma de economista. 

Esteja atento aos movimentos do mercado

Apesar de trabalhar desde pequeno, os primeiros passos dados como líder ocorreram quando estava com 25 anos. Fui convidado por um amigo chamado Paschoal a ser seu sócio e gerenciar algumas atividades comerciais e administrativas da empresa. Na época, ele era proprietário da Fábrica de Artigos para Bares, Refrigeração, Instalações e Móveis Especiais Ltda. (Fabrime), e eu o havia conhecido quando adquiri os balcões frigoríficos e as geladeiras para o bar que abrira no passado. Diante da proposta feita por ele, tanto eu quanto os outros dois sócios decidimos vender o nosso negócio e nos tornar sócios de Paschoal.

Foi a primeira experiência à frente de uma equipe. Costumava sair com os vendedores para atender clientes e fechar negócios e, pessoalmente, apreciava a oportunidade de conhecer novas pessoas. Entre as muitas conversas que tive nessa época, surgiu a inspiração para começar a fabricar equipamentos em série – que até então eram feitos sob medida – e vendê-los para lojistas e distribuidores, seguindo o modelo já adotado pela Prosdócimo e por outras indústrias de eletrodomésticos da época. Isso permitiria alcançar maior escala e expandir o mercado. Contudo, não existiam lojas especializadas na venda de produtos comerciais para refrigeração. 

Conversei com o Paschoal e ele concordou em desenvolvermos esta ideia – uma inovação para a empresa e para o segmento na época. Porém, aproximadamente dois anos depois, meu sócio e amigo faleceu, e sua esposa decidiu seguir sozinha na empresa, encerrando a sociedade comigo. 

Empreender exige visão ampla e habilidade para solucionar problemas

Nessa época, já tinha amizade com o dono de uma outra fábrica, concorrente da Fabrime: a refrigeração Baduí. Quando ficou sabendo que estava disponível para o mercado de trabalho, o proprietário ofereceu-me a venda de sua pequena indústria, na época com 8 funcionários, em um barracão alugado de 600 m². Foi então que surgiu a oportunidade de fundar, em 26 de outubro de 1972, a Gelopar Refrigeração Paranaense Ltda., onde iniciei já com este modelo de negócio de produtos em série como foco. 

O grande desafio na época foi identificar e convencer empresas com potencial para comercializar nossos produtos. Essa foi, sem dúvida, a principal inovação da minha carreira. Porém, até hoje, liderar inovações continua sendo um grande obstáculo a ser enfrentado. 

Atualmente, o principal desafio tem sido liderar a transformação da indústria para um modelo sustentável, o que exige um grande esforço e investimento. Como essa mudança não gera um impacto imediato e direto nos resultados, ela depende de um forte compromisso e foco por parte das empresas e gestores. Já avançamos nesse sentido e conquistamos diversos marcos recentes, como o Selo Clima Paraná, que reconhece empresas que se destacam no combate às mudanças climáticas e na redução de gases de efeito estufa, e o Selo Ecovadis, a maior plataforma mundial de avaliação de sustentabilidade corporativa. A Gelopar mantém-se no nível Prata, figurando entre os 15% das empresas mais bem avaliadas do planeta. Além disso, seguimos firmes nos Compromissos SBTi – Pacto Global da ONU. Somos a primeira indústria de refrigeração da América Latina a ter metas de Redução de Emissões de Carbono definidas e aprovadas pelo SBTi, contribuindo para a mitigação das mudanças climáticas e a construção de um futuro sustentável.

Invista naquilo que te deixa feliz

Em 1976 conheci o Cerrado Brasileiro e me encantei pela natureza exuberante que há por lá. Convivi com onças, jaguatiricas, tamanduás-bandeiras, antas, capivaras, jacarés, sucuris, tartarugas, pirarucus, botos, emas, curicacas, seriemas, corujinhas suindaras, carcarás, araras e tantos outros animais. Interagi com a flora fascinante daquele lugar, lá em São Miguel do Araguaia (GO). 

Em meados de 1980, adquiri minha primeira terrinha, plena em água e com potencial para a criação de gado. Graças a muito trabalho e funcionários dedicados, pude, ao longo dos anos, comprar outras terras. 

Hoje, a Fazenda Água Boa é, para mim, motivo de orgulho – com a natureza 100% preservada. De médio porte, minha fazenda de gado atua com a cria, a recria e a engorda, com um administrador local e diversos colaboradores diretos; eu a visito, regularmente, a cada 60 dias.

Cerquei minha fazenda de amor, preservei suas águas, fauna e flora, e hoje é o local bucólico onde me refugio das agruras do mundo e me conecto com a natureza.

Entenda suas limitações e aprenda a desenvolvê-las

Enfrentei um problema psicológico grave, decorrente de traumas vividos na infância e na adolescência, que impactou significativamente minha vida profissional. Em determinado momento, ao passar por desavenças com meus pares na empresa, essa condição se revelou um desafio grande demais para ser administrado sozinho.

Foi então que busquei ajuda e conheci a psicóloga Dra. Ivani Alves de Lima Carollo. Ter a humildade de reconhecer minha fragilidade, a coragem de expor minha necessidade de ajuda e a felicidade de encontrar uma profissional altamente capacitada e inspiradora foram passos fundamentais nesse processo. Com seu apoio, consegui compreender minhas limitações e transformá-las em oportunidades de crescimento. 

Na trajetória como empresário, especialmente na Gelopar, vivi momentos em que deixar a empresa parecia a decisão mais viável e, em um caso mais extremo, a única alternativa possível. Ainda assim, não foi o caminho que escolhi seguir.

A coragem e a determinação nesses momentos, especialmente naqueles em que parecia não haver saída, vieram dos sonhos e propósitos que construí ao longo da vida. As pessoas que conheci, as relações que estabeleci e cada obstáculo que superei fortaleceram, cada vez mais, o propósito e a paixão que eu tinha pelo meu sonho: construir a Gelopar.

Quando me deparei com desafios imensos, meu sonho foi maior. Essa motivação não é garantia de sucesso, mas foi o combustível que alimentou minha persistência, mesmo nos momentos mais difíceis e obscuros. 

Cultive o relacionamento pessoal

Sempre cultivei o relacionamento com as pessoas, pois tenho comigo que elas continuam sendo o fator mais importante de qualquer empresa. Foi um propósito durante toda a carreira construir relações que transcendessem o aspecto exclusivamente profissional, tanto com funcionários quanto com clientes e fornecedores. Acreditar e trabalhar junto com aqueles que considero parceiros é fundamental, tendo em mente que o sucesso deles também é o meu. Cada pessoa possui características próprias que a levam a desenvolver habilidades inatas, assim como pontos que representam oportunidades de crescimento e aprimoramento. 

Pratique a escuta ativa e tenha humildade para conectar pessoas e ideias

Acredito na liderança pelo exemplo. Sempre fui dedicado e certamente isso contribuiu para motivar aqueles que trabalham comigo. Defendo igualmente o exercício contínuo da humildade. É importante entender que cada um com quem se relaciona pode contribuir. Estar pronto para ouvir e se relacionar, tratando a todos com respeito e igualdade, é algo que sempre traz um grande retorno. 

Aliás, na minha carreira na Gelopar, tenho um grande exemplo disso. Em meados da década de 1970, em visita ao Rio de Janeiro, fui convidado por um lojista a me encontrar com clientes de uma comunidade bastante pobre. Na ocasião, conheci o dono de um mercadinho, que me relatou, de forma despretensiosa, a necessidade de um determinado produto. Achei a ideia bastante promissora e, juntos, desenvolvemos um modelo de balcão frigorífico específico para frangos, projetado para atender à dinâmica de descongelamento, exposição e venda mencionada por aquele senhor. O resultado? O produto tornou-se o mais vendido da empresa por 20 anos. 

Trabalhe com propósito e valores bem definidos

Embora o ambiente de negócios evolua constantemente, com concorrência e volatilidade cada vez mais altas, acredito que as características que definem um bom líder permanecem as mesmas: habilidade nas relações interpessoais e inteligência emocional. Afinal, atitudes e valores são essenciais para o sucesso tanto do líder quanto de seus liderados. 

O desenvolvimento diário das habilidades é crucial. E, ao mesmo tempo que o mercado apresenta maiores dificuldades e uma concorrência mais acirrada, também oferece um número equivalente de oportunidades e acesso a novas ferramentas para aquisição de conhecimento. Por isso, acredito que o mais importante é ter um propósito claro, valores bem definidos e uma busca constante pelo desenvolvimento, junto aos liderados.

Fazer junto é algo em que continuo acreditando e que representa bem o que é ser um líder. Cerque-se de pessoas cujos valores e propósitos estejam alinhados aos seus e procure aprimorar sua capacidade de lidar com aqueles que, por suas próprias razões, não contribuem ou até se opõem ao que você está construindo e desenvolvendo. 

Seja ávido por novos conhecimentos

Para alcançar o sucesso na vida profissional, é fundamental desenvolver diversas frentes do conhecimento. O mundo passa por transformações em uma velocidade cada vez maior e, para mim, conhecimento nunca é exagero. Não tenho dúvida da importância da educação formal, que nos fornece a base do saber e o conhecimento técnico para uma determinada área. No entanto, muito além disso, existe um universo vasto a ser explorado, com cursos das mais variadas expertises, mentorias, trocas de cultura e, principalmente, livros. Sempre tive na leitura uma grande fonte de ajuda e inspiração. O hábito de ler, antes visto apenas como um passatempo, tornou-se um suporte essencial em minha trajetória profissional. As histórias e saberes desbravados em cada obra me ajudaram, de maneira significativa, a superar desafios ao longo do caminho. Em um mundo cada vez mais competitivo, é essa ferramenta que nos permite conquistar melhores posições e alcançar nossos objetivos.

O trabalho tem um papel fundamental para uma jornada feliz

O trabalho e a educação são grandes ferramentas de transformação e realização pessoal e, muito além do sustento, podem proporcionar ao indivíduo conquistas, destaques, emoções e situações capazes de oferecer ao ser humano uma vida virtuosa e completa. Se a felicidade é o nosso objetivo máximo, creio que uma vida feliz depende do equilíbrio nos âmbitos pessoal, social e profissional, tendo, portanto, o trabalho um papel fundamental nessa jornada. Posso afirmar categoricamente que as oportunidades no mundo profissional estão ao alcance de qualquer pessoa que estabeleça objetivos, busque conhecimento e tenha a disciplina para enfrentar o que a espera. 

Leitura recomendada por Gerci Volpato:

Algoritmos das redes sociais e seitas políticas: reflexões sobre tecnologia, democracia e sociedade, de Carlos Rocha. Editora Pimenta Cultural, 2024. 

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