(Global Partners)
Colunista
Publicado em 14 de março de 2025 às 20h14.
Tenho 52 anos e sou paulistano, nascido no bairro da Lapa. Minha carreira começou muito cedo, aos 13 anos, como ajudante de açougueiro. Naquela época, a legislação permitia o registro profissional apenas a partir dos 14 anos, mas, no meu caso, eu trabalhava somente atendendo clientes e embalando a carne, sem fazer nenhuma atividade perigosa. Essa foi minha primeira experiência no ramo da alimentação, para a qual voltei depois de um tempo. Após um ano, comecei a trabalhar como office boy, função que exerci durante quase quatro anos em duas empresas.
Comecei logo cedo a perceber que a área comercial e de vendas estava no meu DNA. Aos 18 anos, participei de um processo seletivo para o Citibank da avenida Paulista. Foram mais de mil pessoas concorrendo a pouco mais de cem vagas; era o emprego dos sonhos. Fui dispensado de servir o Exército e, assim, consegui entrar no banco, na área de telemarketing. A função era atender às ligações e dizer “Citibank, bom dia”, para então responder a dúvidas sobre conta-corrente, saldo e aplicações.
O trabalho que exerci no setor de relacionamento com clientes foi muito importante na minha trajetória profissional, pois me permitiu conhecer um profissional de recursos humanos que atuava no segmento de alimentação corporativa, o catering. Fui convidado a integrar a área comercial da empresa onde ele trabalhava, o que me motivou bastante, já que eu poderia desempenhar uma função mais dinâmica nesse setor.
Bom, também preciso confessar: com 20 e poucos anos, a possibilidade de ter um carro da empresa, combinado com um salário melhor, me seduziu bastante para migrar de área. O cenário de três décadas atrás era bem diferente do de hoje, e comprar o primeiro veículo era muito difícil, especialmente para quem vinha de família humilde. A liberdade que isso proporcionava era algo difícil de recusar. Além disso, como desde pequeno sou apaixonado por gastronomia, uni o útil ao agradável.
A empresa na qual comecei a construir minha carreira no segmento da alimentação era a Abela Catering. Lá fiquei dois ou três anos como vendedor, exercendo a função de consultor comercial.
Mais tarde tive a oportunidade de ser gerente regional de vendas em outra empresa. Com 27 anos, assumi a diretoria comercial da Puras do Brasil, que hoje é a Sodexo. Comecei como diretor regional, depois nacional, até chegar a diretor executivo. Exerci essas funções passando por grandes companhias, como Sapore e GR|Compass, até 2018, quando me tornei o CEO do Grupo Engefood. Passado um ano, fundei uma startup, a Novitá, vendida para outro grupo empresarial. Então, me tornei o diretor-geral da Unox no Brasil.
Quando me perguntam qual é o segredo do sucesso, eu digo: é o compromisso com a entrega ao cliente. Até hoje brinco que meu primeiro cliente fechou negócio comigo por pena. Imagine eu, jovenzinho, de terno e gravata, me reunindo com o diretor e o gerente de recursos humanos de uma empresa em Guarulhos. No início, era bem tímido, mas fui me desenvolvendo e aprimorando com sensibilidade.
Sempre busquei dar um passo a mais a cada oportunidade, fazendo um pouco além do combinado. Esse esforço constante me ajudou a me consolidar profissionalmente.
Na vida profissional, os desafios são constantes. Atuar na área comercial exige resiliência e estratégia diárias. É preciso ter energia para ouvir os clientes, já que existem outras dezenas de pessoas oferecendo o mesmo produto ou serviço que o seu.
E como fazer diferente para ser ouvido? A chave é ter persistência: se você não consegue entrar pela porta, entre pela janela! Nos cinco ou seis anos como profissional de vendas, sem ainda a necessidade de gerir equipes, combinei persistência com organização. Depois de alguns anos, comecei a estudar mais sobre o assunto e a perceber que os grandes sucessos estavam ligados a planejamento e mapeamento do mercado-alvo a ser conquistado.
Além da persistência, outra coisa importante é a disciplina. Para me manter focado, a porta da minha geladeira era cheia de ímãs e post-its colados com os nomes dos clientes que eu queria conquistar. Fazia mapeamentos, anotações nos cadernos e captava feedbacks buscando entender quem eram meus clientes. Para conquistá-los, você precisa estudar do que ele precisa, quais são suas dores e seus valores.
Essa minha obsessão envolvia trabalhar pensando não apenas no retorno financeiro – que seria consequência do trabalho realizado –, mas principalmente em oferecer algo de real valor para o cliente. A preocupação era fazer diferente, melhor, e isso reforçava a relação de confiança entre mim e o cliente.
Até hoje converso muito com meus filhos e lhes digo: “Graças a Deus, vocês tiveram mais oportunidades do que eu, não precisaram entrar no mercado de trabalho tão cedo e puderam apenas estudar”. Eles já me responderam dizendo que não precisavam estar nas melhores escolas porque eu cheguei na posição em que estou sem isso. No entanto, costumo dizer-lhes que tive sorte. No início da minha trajetória, as oportunidades eram bem diferentes das atuais. Hoje é essencial se dedicar ao máximo porque o mundo mudou bastante.
Além de sorte, também tive boas referências na vida. A primeira delas foi meu pai, um homem de vendas. Ele começou em uma loja, que depois viria a ser as Casas Bahia, vendendo móveis. Cresceu profissionalmente e chegou a ser gerente comercial na Cremer de Blumenau. Embora tenha estudado até o equivalente ao ensino fundamental, sua disciplina, seriedade e ética no trato com o cliente foram um verdadeiro exemplo para nós. Já o ouvi dizendo à minha mãe que não havia concretizado uma venda porque preferia jogar limpo e não queria ver um cliente prejudicado.
Entre os 10 e 12 anos, lembro-me de acompanhar meu pai em suas viagens para visitar clientes. Eu achava o máximo ver sua forma de se relacionar com cada um, sempre com respeito, o que fazia com que fosse sempre bem recebido. Ao seu lado, aprendi muitas lições de postura profissional, transparência e seriedade no trabalho.
Só não aprendi técnicas de venda com ele; esse conhecimento veio do mundo corporativo. E olha, se eu tivesse dedicado essa mesma energia nos estudos, acho que teria me formado em Harvard. Meu empenho no trabalho é tão grande que acordo cedo também nos fins de semana para planejar como será a próxima semana. Dúvida? Minha esposa chegou a reclamar uma vez, quando fomos jantar em um restaurante com um casal de amigos, porque acabei fechando negócio com os donos do estabelecimento. Fazer o quê? Amo o que faço e me sinto bem demais assim.
Sempre digo que o principal erro dos jovens profissionais é a impaciência. Muitos deles querem resultado imediato, pensam no prêmio antes mesmo do merecimento. No entanto, o foco deve estar primeiro na conquista, na construção da carreira; o retorno financeiro virá como consequência.
Há um tempo, um rapaz que trabalha comigo como gerente comercial vinha construindo um bom caminho, mas se empolgou com uma proposta que recebeu do mercado. Pedi a ele calma, aconselhei que não aceitasse de cara porque estava na hora de ele colher os frutos do que tinha plantado na nossa empresa. No entanto, por ser muito jovem, ele não me ouviu. Pouco tempo depois, pediu para voltar. Esse episódio me fez refletir sobre entender o timing de maturação. Hoje atuo com um modelo de produto mais complexo, mais específico. Embora os princípios de venda sejam universais, para cada produto ou serviço existem particularidades, e nesse mercado em que atuo, o de food services, valorizamos muito o relacionamento a longo prazo.
Se buscar resultados rápidos trocando de emprego é um erro, a falta de disciplina também o é. O vendedor que trabalha na área comercial, por exemplo, tem a vantagem de organizar a própria agenda. No entanto, quando isso é possível, é preciso estar atento para não cair na zona de conforto, se acomodar e confundir flexibilidade com falta de esforço, o que é uma verdadeira armadilha.
Foque sua conquista. Saiba o que está vendendo, para quem está vendendo, qual é o melhor momento e a melhor forma de abordar um cliente. No passado, eu acreditava ter um dom para a área comercial e para me relacionar com as pessoas. Hoje não creio mais nisso, e sim que o que realmente faz a diferença é acordar cedo, ter disciplina, trabalhar muito e acreditar. Quanto mais eu trabalho, mais sorte eu tenho.
Todos os dias busco ser um exemplo para meu time. Passo por todas as áreas, converso com os clientes, vou a eventos de inauguração que começam seis horas da manhã e tento me manter próximo da equipe. Além dessa proximidade, gosto de uma gestão que tenha como base o feedback, sempre de forma muito transparente. Mas dar feedback é fácil, o desafio é estar preparado e aberto para recebê-lo. Cultivo o hábito de, ao sair de uma reunião com um cliente, sentar-me com o profissional que me acompanhou e lhe perguntar o que eu poderia ter feito melhor e também dar a ele minha opinião sobre seu posicionamento com o cliente. Construir essa relação de confiança é importante.
Outro ponto fundamental é ter clareza nos resultados. Todo o time precisa entender o que se deseja alcançar e de que maneira. Pessoalmente não acredito em discursos bonitos e palavras em inglês, tão comuns no mundo empresarial. Para mim, o mais importante é manter o foco e ser claro com toda a equipe, assim, ela naturalmente se comprometerá tanto com os resultados financeiros quanto com os não financeiros.
Mais uma questão que não pode ser deixada de lado é a de proporcionar liberdade à equipe para que ela possa errar. Claro que não me refiro a deixar que o mesmo erro seja cometido várias vezes. Falo de uma liberdade gerenciada, ou seja, demonstrar o erro quando ele ocorrer, não para disciplinar, mas para transformá-lo em aprendizado. Demorei um tempo para encontrar esse equilíbrio.
Quando você vem de um modelo comercial, a competitividade acaba sendo enraizada. Quem trabalha na linha de frente das vendas quer ser o melhor sempre e naturalmente acaba se tornando individualista. Ao se tornar líder, o desafio é não competir com seu próprio time. Demorei uns dois anos para entender o seguinte: é o bom líder que faz a equipe se desenvolver, e é ela que faz as coisas acontecerem.
Acredito na automotivação, mas também na criação de um ambiente de trabalho bem estruturado para o profissional. Para isso, é essencial agir de forma respeitosa e firme, deixando claro o que cada um deve entregar. Criar essa atmosfera de trabalho também é um fator de motivação. Quando se dão condições e ferramentas ao colaborador, suas entregas acontecem mais facilmente. Procuro criar um ambiente ideal, respeitando as pessoas, suas individualidades e problemas. Dou flexibilidade, mas exijo também responsabilidade, uma vez que tudo precisa estar em equilíbrio, nada pode comprometer a qualidade das entregas. Além disso, é preciso muito cuidado para não perder essa harmonia quando o time começa a crescer.
As pessoas querem liberdade para criar e se desenvolver, mas elas precisam ter paixão pelo que fazem – ainda mais na minha área de atuação. O ramo de alimentação funciona 24 horas por dia, sete dias por semana. Bônus e premiações podem ser incentivos, mas sem paixão, não dá para levar essa rotina adiante.
Tenho algumas peculiaridades na minha forma de trabalhar, e uma delas é precisar de liberdade. Entrego tudo com muita responsabilidade, mas preciso de espaço para criar e desenvolver projetos. Procuro ser ouvinte e agir com humildade para mudar meu comportamento ou minha forma de analisar uma situação, caso seja convencido disso. Não gosto de muita ingerência no meu dia a dia, mas aceito críticas bem embasadas. Paro, reflito, ouço e corrijo o rumo. Sou muito autônomo, penso como dono; no entanto, meus interesses nunca estiveram acima dos interesses das empresas onde trabalhei.
Quando algo dá errado, o líder precisa refletir sobre o que pode fazer diferente para extrair o melhor do time. Quem olha para a janela, procura culpados, aponta o dedo e não consegue ter autocrítica. Não podemos mudar as pessoas, só podemos mudar a nós mesmos. Quando olhamos para o espelho para mudarmos, naturalmente as pessoas começam a agir de forma diferente. Esse aprendizado é um legado para a vida porque serve para qualquer situação.
Estou no meu segundo casamento, que vai completar 15 anos, depois de um relacionamento anterior de dez anos. Olhar para o espelho diariamente me obriga a questionar se estou agindo corretamente, mesmo nos momentos em que a relação com minha esposa não está boa.
Sempre tive o espírito empreendedor. Hoje sou o diretor-geral da Unox, empresa onde trabalho com dedicação exclusiva, mas tenho outros negócios de alimentação geridos por uma holding, na qual minha esposa é diretora-executiva.
Procure se manter no segmento que você conhece e pelo qual é apaixonado, isso é fundamental. Ao longo de minha carreira, já tive muitas oportunidades de mudar de área, recebendo inclusive propostas do setor de segurança empresarial e de uma multinacional do ramo de seguros. Eram boas propostas, mas escolhi permanecer onde realmente tenho conhecimento. Como generalista no segmento de gastronomia, tenho um entendimento profundo do mercado e diariamente me dedico a estudá-lo para enxergar o negócio pelos olhos do cliente.
Para quem está começando, dou um conselho básico: estude bastante e aprenda inglês, idioma fundamental no mundo corporativo. Procure se qualificar e cultivar a paixão pela área que domina.
Muitas vezes o mundo dos negócios pode ser destrutivo. Em meus 32 anos de atuação profissional, sempre busquei colocar em prática o que W. Chan Kim nos explica em A estratégia do oceano azul, um livro que ensina demais sobre como transformar seu ambiente de trabalho em um lugar saudável, onde as pessoas querem estar e desempenhar seu melhor.
Com muita força de vontade, disciplina e responsabilidade em tudo que se faz, você chega lá. Se seus olhos brilham pelo seu trabalho, você está no lugar certo. Atuando com foco, nada te atrapalhará. Diariamente, você vai receber dez baldes de água fria para te desmotivar. Nesses momentos, levante a cabeça, respire fundo e dê a volta por cima. Lembre-se: o futuro está em suas mãos, não nas do seu empregador. Ele é apenas o caminho. Acredite em você e em seus sonhos. As oportunidades vão surgir. Com vontade e perseverança, seus caminhos vão se abrir.