Diversidade agrega valor, minimiza riscos e estimula a inovação
Na coluna desta semana, conheça a história de Olga Stankevicius Colpo, Membro do Conselho de Administração na Solví Participações S.A
Da Redação
Publicado em 3 de fevereiro de 2023 às 13h02.
Por Fabiana Monteiro
Nasci na cidade de São Paulo em uma família de origem polonesa. Tive a minha primeira experiência profissional aos 14 anos, como recepcionista em um escritório de engenharia de um tio. Antes de começar o curso universitário, trabalhei na área administrativa da Coopers & Lybrand, que nessa ocasião possuía uma associação com a Boucinhas & Campos, e fui estimulada a fazer Economia ou Ciências Contábeis, mas meu coração batia por Psicologia. Em 1976, concluí o curso de Psicologia noturno de cinco anos, na Universidade de Mogi das Cruzes (com especialização em Psicologia Industrial, hoje chamada Psicologia Organizacional). Nessa época, eu trabalhava durante o dia na Coopers & Lybrand e estudava à noite. Durante minha permanência na empresa, tive grandes oportunidades de desenvolvimento e fiz parte do grupo que criou a prática de consultoria no Brasil. Na atividade-fim, atuava como consultora em Recursos Humanos e Organização, e na atividade-meio era responsável pela área técnica de RH, coordenando o recrutamento, o treinamento e a avaliação do pessoal técnico.
Com o crescimento da instituição (especializada no segmento de auditoria e consultoria), fui promovida a sócia em 1984. Lembro-me até hoje que no rigoroso processo de avaliação para admissão, a sociedade recebeu de um sócio sênior a ênfase de um ponto forte: “trabalha tanto quanto um homem”. Esta frase, hoje, não seria aceitável, mas na época possuía um aspecto elogioso por parte do autor. Entre os concorrentes no Brasil (na época, Big Eight ), fui a primeira mulher a ser aceita na sociedade. Assumi, em 1990, a liderança da Consultoria no Brasil e também coordenei, junto ao Chairma, as atividades de Partners Affairs. Quando da fusão global entre a Coopers & Lybrand e a Price Waterhouse, foi constituída a PricewaterhouseCoopers (PwC), uma das maiores empresas globais de auditoria e consultoria. Como sócia, eu assumi a responsabilidade pela unidade de negócios de consultoria em “Organization, People & Change” na América do Sul e Central.
Estive envolvida em projetos e em atividades que decisivamente influenciaram meus valores e minha vida pessoal e profissional: Projetos Sociais, Family Business, Projetos em Sustentabilidade e Governança Corporativa. Pude coordenar projetos sociais relevantes, entre os quais tive a honra de trabalhar com a Dra. Ruth Cardoso na Comunitas, e de participar da Constituição do Instituto Childhood Foundation no Brasil (entidade que trabalha com a causa de proteção de crianças e adolescentes contra o abuso e a exploração social, temas tabus presentes no final da década de 1990 e ainda na atualidade – pois no século XXI, estas questões constituem-se como grandes ameaças sociais ao desenvolvimento sadio das novas gerações). Dediquei-me vários anos a esta causa e hoje sou conselheira da instituição.
Como todas as Big Four, a PwC também tem um limite de idade para aposentadoria dos sócios (63 anos), o que favorece o planejamento estruturado de uma nova fase de carreira e vida. Frente a esse cenário, desenvolvi minha visão de longo prazo: queria atuar futuramente como Conselheira de Administração e em Projetos de Impacto Social. Não planejei ter algum ciclo intermediário entre essas duas etapas, mas aos 57 anos de idade e 38 anos de empresa (C&L e PwC, 25 dos quais como sócia), solicitei a Early Retirement da PwC ao ser convidada a assumir a posição de chief executive officer (CEO) de um Family Office complexo, que, além de gerir um portfólio de negócios segregado do Grupo Empresarial (funcionando como uma espécie de hedge ), coordenava o processo de desenvolvimento da próxima geração de acionistas, a relação entre os sócios e interface, e entre o Conselho de Administração do Grupo dos negócios operacionais e os acionistas controladores. Por mais de seis anos, fui CEO da Participações Morro Vermelho S.A., atuando junto ao Conselho de Acionistas, que subordinava o Conselho da Holding Operacional (o qual controlava os conselhos dos negócios de cimentos, real estate, concessões, engenharia & construções, etc.). Desliguei-me da PMV na conclusão do processo de sucessão entre a segunda e a terceira geração de acionistas.
Posso dizer que sempre tive uma participação relevante junto ao Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), tendo a honra de ter participado do núcleo de criação do Comitê de Empresas Familiares, responsável por disseminar as boas práticas de governança familiar e corporativa nesse segmento que representa parte substancial de nossa economia. Fui, ainda, coautora de diversos cadernos orientativos (como o Guia de Governança em Empresas Familiares e Sucessão em Empresas Familiares ).
Em 2017, finalmente dei o passo seguinte à minha carreira, para o qual eu já vinha me preparando, ao me tornar conselheira do Banco BMG (onde, no momento, sou vice-presidente do Conselho de Administração) e da Companhia Paranaense de Energia (Copel S.A) (indicada para representar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), onde atuei por 4 anos). Além disso, sou membro dos conselhos da Solví e do Grupo São Martinho, e continuo atuando no IBGC como membro da Comissão de Inovação e na Banca de Certificação de Conselheiros do Instituto. No terceiro setor, sou conselheira do Instituto Childhood Foundation, entidade fundada pela rainha Sílvia, da Suécia, participando de programas de mentoria para mulheres empreendedoras.
Uma crença no mundo corporativo: gestão é a base que dá segurança para um modelo sólido e robusto de Governança Corporativa
Faço parte do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) desde o começo dos anos 2000. A PwC apoiava sempre o instituto e o ajudava de muitas formas. Quando o IBGC estabeleceu uma comissão de empresas familiares, lá estava eu, fazendo parte do grupo de criação. Mesmo ainda na PwC, em razão da aposentadoria compulsória aos 63 anos, eu já alimentava a aspiração de continuar trabalhando e contribuindo por muitos anos. Já sabia qual seria o meu próximo passo na carreira dez anos antes de tê-lo dado. Evidentemente, o meu papel de consultora fazia com que eu trabalhasse a ligação entre Diretoria Executiva e Conselho. Dessa forma, sabia muito bem como as coisas aconteciam entre Conselho e Gestão. Além disso, participava de diversas reuniões no IBGC e tudo parecia para mim muito claro, mas muitas vezes sombrio, desafiante e mutante.
Dedicação profissional, estudo e valorização do lado humano nos negócios sempre foram meus melhores ativos. Acredito na citação “só fecha o livro quem já morreu”. No meu processo de educação continuada, fiz cursos na Michigan University (Management of Managers), na Harvard University (International Business), na Singularity University, no Instituto Europeu de Administração de Empresas (INSEAD) ( in company program; focado em estratégia, liderança e performance improvement ), além do Curso Avançado de Conselheiros de Administração e da Jornada Técnica para Israel e Canadá, ambos coordenados pelo IBGC. Tenho um mantra: “conhecimento é descartável”, portanto, minha meta é fazer um curso a cada ano, e pelo menos a cada dois anos um curso no exterior. Nesse processo, eu me preparei, fiz cursos no próprio IBGC, além de outros de gestão, fora do país. De todos os conselhos dos quais fiz parte, um foi por meio de headhunter e os demais vieram por indicação, por meio pessoas que já me conheciam, que trabalharam direta ou indiretamente comigo, e que me recomendaram. Depois disso, vieram os duros processos de entrevista, mas fui seguindo em frente. Meu segundo mantra (vivenciado pessoalmente): “ninguém tem uma carreira evolutiva sem a ajuda de muitos, por isso é minha responsabilidade ajudar muitos outros a se desenvolverem”. Tenho a honra de ter uma infinidade de pessoas que me encorajaram, apoiaram e me mentorearam ao longo de minha carreira, me ajudando a ser o que sou hoje e a buscar uma constante evolução.
Hoje, meu maior desafio como conselheira é contribuir com a preparação dessas empresas, para que realmente estejam conectadas ao futuro sem se esquecer do presente. O mundo encontra-se em transformação e é preciso assegurar que a qualidade da estratégia seja bastante adequada, zelando pela sua implementação. Também é preciso garantir que os processos éticos e de compliance sejam muito bem estruturados, e que haja um processo robusto de gestão de pessoas e de meritocracia. Acredito que a gestão vem antes da governança – com processos sistematizados, controles internos, indicadores e sólido modelo de negócio, de organização e gestão. Quando não se tem uma boa gestão, governa-se no vácuo. Esta é a base que dá segurança para que o modelo de governança seja sólido e robusto, e que possa, inclusive, contribuir para entender e desafiar a efetividade do modelo de negócio e de organização das empresas.
O maior aprendizado que a Pandemia de Covid-19 e a Guerra da Ucrânia nos trouxeram
Empresas e governos foram obrigados a colocar, de fato, as “pessoas em primeiro lugar”, a ter uma evolução e ruptura inimaginável no uso da tecnologia e na forma de entregar o trabalho, um entendimento pleno do significado de resiliência pessoal e organizacional, uma visualização da fragilidade da interdependência da cadeia logística de fornecimento global, uma amplificação da conscientização das relevantes questões ambientais e sociais, um questionamento sobre a atual de globalização, entre outros.
Diversidade agrega valor, minimiza riscos e estimula a inovação
Minha carreira é fruto da diversidade. Embora tenha feito MBA em Business, minha graduação é em Psicologia Organizacional. Ainda assim, fui indicada como sócia de uma Big Four, sendo a primeira mulher na América Latina a conseguir esta façanha. Evidentemente, na caminhada executiva, você nunca chega a determinado lugar sozinho. Mas, sem dúvida alguma, é preciso ser uma pessoa que se autodesafie, que tenha as hard e soft skills necessárias, e seja maior que a cadeira que ocupa para conseguir se desenvolver.
Entendo que a diversidade já era uma questão presente em meu entorno, antes mesmo de este ser um tema valorizado. Era, geralmente, a única mulher a sentar à mesa nas reuniões com meus demais colegas, acionistas e clientes. Tive que quebrar resistências e, muitas vezes, ouvir: “É competente, apesar de ser mulher” ou “ela é competente tal como um homem”. Hoje, felizmente, essa discussão ganhou uma nova escala, e o mundo e as pessoas estão percebendo que a diversidade é aquilo que agrega valor e minimiza riscos. É aquilo que promove transformações adequadas e estimula a inovação. Sem diversidade, tem-se um grande perigo de “miopia”, de olhar apenas para si mesmo. Então, é importante diversidade em várias dimensões: de gênero, cultural, de formação, de faixa etária, de todos os tipos – porque isso significa valor. Quando se fala em colegiado, seja no sentido de Conselho ou de Diretoria, é necessário priorizar que ele seja diverso, e que nele sejam encontradas as competências necessárias para a boa entrega dos resultados, para desafiar o status quo, e daí procurar melhor antecipar os impactos do futuro, da ruptura, da transformação tecnológica e da inovação.
No person : a figura que questiona ostatus quoe a crença coletiva
Quem deseja uma cadeira no Conselho não pode “abrir mão” da capacitação. Conselho é algo diferente, independentemente da formação ou da experiência anterior. Para estar lá, é importantíssimo se capacitar em Governança e em Negócios, continuadamente, ter experiência anterior diversificada (inclusive como gestor), além de interação com outras empresas, realidades e conselheiros. Quando eu saí da vida profissional da PwC, e depois da PMV, onde tínhamos estruturas de desenvolvimento formalizadas, estabeleci para mim um plano de que não passaria mais que um ano sem ter uma experiência educacional significativa, tanto no Brasil quanto no exterior. Este é um ponto importante que não quero “abrir mão”. São essas experiências que trazem os insights mais significativos e nos fazem questionar “nossas verdades e crenças” – a experiência e a senioridade carregam junto de si um perigo, o de pensar possuir “muitas certezas”. Essa abertura para entender o contexto e os desafios, não só aqueles relacionados à organização, e se autoquestionar, é vital para agregar valor e contribuir para a construção da ponte entre o presente e o futuro.
Ser conselheiro significa ter uma boa e estruturada iniciação, realizando reuniões individuais com a Diretoria Executiva e cada um dos conselheiros, e ter plano de visita à organização, para entender o negócio e suas idiossincrasias. O conselheiro precisa estar tanto próximo ao mundo quanto à organização, elaborar uma profunda análise prévia de documentos e não ter receio de dizer que não entendeu, pedir ajuda quando necessário e, eventualmente, abster-se de colocar uma posição quando não se sentir completamente confortável para isso. Certa vez, fiz um curso no INSEAD e um professor americano pontuou algo que nunca esqueci. Ele recomendava que, para todas as decisões complexas no Conselho, e, principalmente, nas quais rapidamente fosse estabelecido um consenso, deveria haver uma figura que ele intitulou de no person, ou seja, aquele indivíduo que questionaria os argumentos trazidos. Essa prática apresenta os riscos eventualmente não esclarecidos e as premissas passíveis de questionamento ou que requerem monitoramento futuro diferenciado. O professor orientou, ainda, que esse papel fosse rodiziado para que a pessoa não fosse intitulada o “chato de plantão”. Este papel deveria ser essencial quando todos, em uma situação importante, estiverem de acordo, pois ali justamente pode residir o perigo, portanto, torna-se imperativo questionar: “por que isso?”, “Por que aquilo?”, “Quais as premissas usadas”, “Quais as opções descartadas”, “Quais os trade-offs requeridos”, etc. Essa prática proporciona que todos saiam da zona de conforto e vejam por outra perspectiva o que está acontecendo, tornando, portanto, o processo decisório e com um monitoramento mais efetivo.
Propósito é o que mantém a empresa pulsando e viva
As inovações tecnológicas estão realmente impulsionando as organizações para novos tempos, mas também ameaçando o futuro delas. Há uma crença não muito nova que nunca fez tanto sentido: “Não pergunte se você vai ser disruptado, mas quando você será disruptado”. Esse realmente é um aspecto importante e para o qual as empresas devem se atentar e buscar caminhos. As companhias têm que fazer suas escolhas de acordo com seus princípios e sua cultura. Um passo relevante é se aproximar de startups, fazer hackathons para os seus principais problemas, visitar centros de inovação e incentivar que a inovação seja um valor para toda a organização, criando fóruns específicos com esta finalidade, até que a cultura da inovação e da transformação esteja consolidada.
Mas não se deve buscar a inovação pela inovação, porque é moda. É preciso ter razões e propósitos muito bem definidos. Lembrar que propósito, ou a razão de ser da empresa, é aquilo que promove a aderência dos colaboradores, dos clientes, dos fornecedores e das demais partes interessadas com a organização. Uma operação que não tem um propósito claro e inspirador, não consegue atrair pessoas e talentos. Hoje, as empresas diferenciadas estabelecem um propósito maior que seu próprio negócio.
No início do século era o triple bottom line, ou o tripé da sustentabilidade, que consistia em assegurar equidade, respeito ao meio ambiente e resultado econômico. Nesse sentido, a ESG (Environmental, Social and Governance) é uma bem-vinda evolução que dá oportunidade ímpar para que as organizações também reflitam sobre seu propósito. Sempre digo que as organizações precisam definir qual é a sua aspiração e o seu posicionamento em relação a ESG, e formalizar caminhos para atingir o que elas realmente querem, tanto na parte social e ambiental quanto em termos de governança. Propósito é aquilo que mantém a empresa pulsando e viva, com capacidade para criar engajamento com todos os stakeholders.
As empresas brasileiras precisam avançar no tema da ESG, pois isso traz benefícios. Deveria haver dois movimentos nesse sentido: um top-down (do topo da empresa para sua base) e outro bottom-up (da base para o topo do negócio). E cabe ao Conselho fazer a provocação, discutir e definir qual o posicionamento que a organização deve possuir em relação ao tema. A liderança deve entender como está o alinhamento e fazer uma conexão com os objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS), observar em quais deles a organização está mais exposta e definir, eventualmente, as prioridades, porque não são todas as metas que ela conseguirá trabalhar. Como diz Ivan Lansberg: “A melhor forma de definir um destino desejável é conversar com pessoas que vivem no mundo para o qual você está pensando em viajar”. Então, preciso ouvir e conversar com quem já faz isso bem e que está alguns passos à frente. Além disso, há várias consultorias especializadas que podem ajudar.
Entender seu cliente atual e futuro nunca foi fundamental, a emersão de uma nova geração que já nasceu digital está provocando grandes mudanças. É vital conhecer as megatendências e como elas impactarão a sociedade, suas crenças, necessidades e, por fim, seus negócios.
Ética, Transparência, Tecnologia Digital eCyber Security: uma questão central
O que e como fazemos, como organização e pessoa, nos deixa confortável ou nos tira o sono à noite. O que aconteceria com nossa empresa e clientes se muitas decisões se tornassem públicas? Na PwC, havia na frente de todos os elevadores um espelho com a seguinte frase no topo: “Quem é responsável pela ética na PWC?”. Então, você via a sua imagem individual no espelho, e na base deste a pergunta final: “Olhe novamente”, ou seja, tudo começa com você, o indivíduo.
As evoluções tecnológicas em todos os campos têm sido exponenciais (inteligência artificial, data analytics, microbiomas, biologia sintética, descarbonização, guerra fria tecnológica, etc.). O fato de entender como antever e lidar com todas essas inovações e mudanças, é uma arte em construção.
As barreiras muitas vezes estão em nós mesmos, e não nos outros
Nós, mulheres, quando estamos no Conselho, temos uma preocupação sobre qual é o valor que estamos aportando para que aquele colegiado cumpra bem o seu papel. O Conselho é a arena onde geralmente são analisados os trade off, isto é, escolhem-se determinadas opções em detrimento de outras. Na visão do filósofo grego Platão, há quatro virtudes cardeais, que são a base das demais virtudes e do comportamento humano: sabedoria, coragem, moderação e justiça. É isso que devemos entregar no dia a dia do conselho.
Sabedoria é a base para a tomada de boas decisões e está ancorada em conhecimento, experiência e razão. A coragem permite ir contra um posicionamento de alguém que, invariavelmente, é mais experiente que você ou tem coragem para implementar um curso diferente de ação. A moderação leva ao distanciamento de vieses, permitindo que os fatos sejam analisados de modo coerente e equilibrado; nesse aspecto, a justiça ajuda a balancear o que é certo, se posicionar do lado que é direito e reconhecer o mérito de alguém ou de algo.
Em uma palestra da psicoterapeuta belga Esther Perel, feita no festival SXSW, ela disse algo que até parei para anotar: “a qualidade dos relacionamentos no trabalho determina a qualidade do trabalho e a capacidade geral de sucesso”. Fui levada a concordar com ela, afinal, estamos em uma era em que o conhecimento técnico e a experiência são a “porta de entrada”, mas a “porta de manutenção” e que faz toda a diferença são, de fato, as habilidades socioemocionais, as soft skills.
Portanto, antes de mais nada, seja você mesma. Tenha coragem para aprender e desaprender, para superar desafios. As barreiras, muitas vezes, estão mais em nós mesmos que nos outros. Nesta jornada, não deixe de prestar atenção em alguns pontos. O primeiro é a relação. Devemos sempre encontrar uma pessoa que já trilhou pelos caminhos que almejamos trilhar e que pode discutir as nossas dúvidas e, principalmente, os nossos medos. Veremos, então, que, talvez, os medos e as dúvidas são muito parecidos ao longo do tempo, e a forma como nos relacionamos com eles é que é diferente. Outro ponto importante é a conexão, porque precisamos estar conectadas ao que acontece no mundo. Isso, somado a apoio, a preparo, a persistência e a coragem, faz parte de um núcleo importante que nos ajuda a superar os desafios. Falta de empatia, soberba e arrogância são pecados a serem evitados. E, por fim: tenha visão de longo prazo. Precisamos olhar para nós mesmas daqui a 20 ou 30 anos e identificar, ao olhar para traz, que pessoa queremos ver e como ter respeito e orgulho do que vemos e da pessoa que nos transformamos. Depois disso, é “correr atrás”, pois nenhuma conquista é obra do acaso.
Por Fabiana Monteiro
Nasci na cidade de São Paulo em uma família de origem polonesa. Tive a minha primeira experiência profissional aos 14 anos, como recepcionista em um escritório de engenharia de um tio. Antes de começar o curso universitário, trabalhei na área administrativa da Coopers & Lybrand, que nessa ocasião possuía uma associação com a Boucinhas & Campos, e fui estimulada a fazer Economia ou Ciências Contábeis, mas meu coração batia por Psicologia. Em 1976, concluí o curso de Psicologia noturno de cinco anos, na Universidade de Mogi das Cruzes (com especialização em Psicologia Industrial, hoje chamada Psicologia Organizacional). Nessa época, eu trabalhava durante o dia na Coopers & Lybrand e estudava à noite. Durante minha permanência na empresa, tive grandes oportunidades de desenvolvimento e fiz parte do grupo que criou a prática de consultoria no Brasil. Na atividade-fim, atuava como consultora em Recursos Humanos e Organização, e na atividade-meio era responsável pela área técnica de RH, coordenando o recrutamento, o treinamento e a avaliação do pessoal técnico.
Com o crescimento da instituição (especializada no segmento de auditoria e consultoria), fui promovida a sócia em 1984. Lembro-me até hoje que no rigoroso processo de avaliação para admissão, a sociedade recebeu de um sócio sênior a ênfase de um ponto forte: “trabalha tanto quanto um homem”. Esta frase, hoje, não seria aceitável, mas na época possuía um aspecto elogioso por parte do autor. Entre os concorrentes no Brasil (na época, Big Eight ), fui a primeira mulher a ser aceita na sociedade. Assumi, em 1990, a liderança da Consultoria no Brasil e também coordenei, junto ao Chairma, as atividades de Partners Affairs. Quando da fusão global entre a Coopers & Lybrand e a Price Waterhouse, foi constituída a PricewaterhouseCoopers (PwC), uma das maiores empresas globais de auditoria e consultoria. Como sócia, eu assumi a responsabilidade pela unidade de negócios de consultoria em “Organization, People & Change” na América do Sul e Central.
Estive envolvida em projetos e em atividades que decisivamente influenciaram meus valores e minha vida pessoal e profissional: Projetos Sociais, Family Business, Projetos em Sustentabilidade e Governança Corporativa. Pude coordenar projetos sociais relevantes, entre os quais tive a honra de trabalhar com a Dra. Ruth Cardoso na Comunitas, e de participar da Constituição do Instituto Childhood Foundation no Brasil (entidade que trabalha com a causa de proteção de crianças e adolescentes contra o abuso e a exploração social, temas tabus presentes no final da década de 1990 e ainda na atualidade – pois no século XXI, estas questões constituem-se como grandes ameaças sociais ao desenvolvimento sadio das novas gerações). Dediquei-me vários anos a esta causa e hoje sou conselheira da instituição.
Como todas as Big Four, a PwC também tem um limite de idade para aposentadoria dos sócios (63 anos), o que favorece o planejamento estruturado de uma nova fase de carreira e vida. Frente a esse cenário, desenvolvi minha visão de longo prazo: queria atuar futuramente como Conselheira de Administração e em Projetos de Impacto Social. Não planejei ter algum ciclo intermediário entre essas duas etapas, mas aos 57 anos de idade e 38 anos de empresa (C&L e PwC, 25 dos quais como sócia), solicitei a Early Retirement da PwC ao ser convidada a assumir a posição de chief executive officer (CEO) de um Family Office complexo, que, além de gerir um portfólio de negócios segregado do Grupo Empresarial (funcionando como uma espécie de hedge ), coordenava o processo de desenvolvimento da próxima geração de acionistas, a relação entre os sócios e interface, e entre o Conselho de Administração do Grupo dos negócios operacionais e os acionistas controladores. Por mais de seis anos, fui CEO da Participações Morro Vermelho S.A., atuando junto ao Conselho de Acionistas, que subordinava o Conselho da Holding Operacional (o qual controlava os conselhos dos negócios de cimentos, real estate, concessões, engenharia & construções, etc.). Desliguei-me da PMV na conclusão do processo de sucessão entre a segunda e a terceira geração de acionistas.
Posso dizer que sempre tive uma participação relevante junto ao Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), tendo a honra de ter participado do núcleo de criação do Comitê de Empresas Familiares, responsável por disseminar as boas práticas de governança familiar e corporativa nesse segmento que representa parte substancial de nossa economia. Fui, ainda, coautora de diversos cadernos orientativos (como o Guia de Governança em Empresas Familiares e Sucessão em Empresas Familiares ).
Em 2017, finalmente dei o passo seguinte à minha carreira, para o qual eu já vinha me preparando, ao me tornar conselheira do Banco BMG (onde, no momento, sou vice-presidente do Conselho de Administração) e da Companhia Paranaense de Energia (Copel S.A) (indicada para representar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), onde atuei por 4 anos). Além disso, sou membro dos conselhos da Solví e do Grupo São Martinho, e continuo atuando no IBGC como membro da Comissão de Inovação e na Banca de Certificação de Conselheiros do Instituto. No terceiro setor, sou conselheira do Instituto Childhood Foundation, entidade fundada pela rainha Sílvia, da Suécia, participando de programas de mentoria para mulheres empreendedoras.
Uma crença no mundo corporativo: gestão é a base que dá segurança para um modelo sólido e robusto de Governança Corporativa
Faço parte do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) desde o começo dos anos 2000. A PwC apoiava sempre o instituto e o ajudava de muitas formas. Quando o IBGC estabeleceu uma comissão de empresas familiares, lá estava eu, fazendo parte do grupo de criação. Mesmo ainda na PwC, em razão da aposentadoria compulsória aos 63 anos, eu já alimentava a aspiração de continuar trabalhando e contribuindo por muitos anos. Já sabia qual seria o meu próximo passo na carreira dez anos antes de tê-lo dado. Evidentemente, o meu papel de consultora fazia com que eu trabalhasse a ligação entre Diretoria Executiva e Conselho. Dessa forma, sabia muito bem como as coisas aconteciam entre Conselho e Gestão. Além disso, participava de diversas reuniões no IBGC e tudo parecia para mim muito claro, mas muitas vezes sombrio, desafiante e mutante.
Dedicação profissional, estudo e valorização do lado humano nos negócios sempre foram meus melhores ativos. Acredito na citação “só fecha o livro quem já morreu”. No meu processo de educação continuada, fiz cursos na Michigan University (Management of Managers), na Harvard University (International Business), na Singularity University, no Instituto Europeu de Administração de Empresas (INSEAD) ( in company program; focado em estratégia, liderança e performance improvement ), além do Curso Avançado de Conselheiros de Administração e da Jornada Técnica para Israel e Canadá, ambos coordenados pelo IBGC. Tenho um mantra: “conhecimento é descartável”, portanto, minha meta é fazer um curso a cada ano, e pelo menos a cada dois anos um curso no exterior. Nesse processo, eu me preparei, fiz cursos no próprio IBGC, além de outros de gestão, fora do país. De todos os conselhos dos quais fiz parte, um foi por meio de headhunter e os demais vieram por indicação, por meio pessoas que já me conheciam, que trabalharam direta ou indiretamente comigo, e que me recomendaram. Depois disso, vieram os duros processos de entrevista, mas fui seguindo em frente. Meu segundo mantra (vivenciado pessoalmente): “ninguém tem uma carreira evolutiva sem a ajuda de muitos, por isso é minha responsabilidade ajudar muitos outros a se desenvolverem”. Tenho a honra de ter uma infinidade de pessoas que me encorajaram, apoiaram e me mentorearam ao longo de minha carreira, me ajudando a ser o que sou hoje e a buscar uma constante evolução.
Hoje, meu maior desafio como conselheira é contribuir com a preparação dessas empresas, para que realmente estejam conectadas ao futuro sem se esquecer do presente. O mundo encontra-se em transformação e é preciso assegurar que a qualidade da estratégia seja bastante adequada, zelando pela sua implementação. Também é preciso garantir que os processos éticos e de compliance sejam muito bem estruturados, e que haja um processo robusto de gestão de pessoas e de meritocracia. Acredito que a gestão vem antes da governança – com processos sistematizados, controles internos, indicadores e sólido modelo de negócio, de organização e gestão. Quando não se tem uma boa gestão, governa-se no vácuo. Esta é a base que dá segurança para que o modelo de governança seja sólido e robusto, e que possa, inclusive, contribuir para entender e desafiar a efetividade do modelo de negócio e de organização das empresas.
O maior aprendizado que a Pandemia de Covid-19 e a Guerra da Ucrânia nos trouxeram
Empresas e governos foram obrigados a colocar, de fato, as “pessoas em primeiro lugar”, a ter uma evolução e ruptura inimaginável no uso da tecnologia e na forma de entregar o trabalho, um entendimento pleno do significado de resiliência pessoal e organizacional, uma visualização da fragilidade da interdependência da cadeia logística de fornecimento global, uma amplificação da conscientização das relevantes questões ambientais e sociais, um questionamento sobre a atual de globalização, entre outros.
Diversidade agrega valor, minimiza riscos e estimula a inovação
Minha carreira é fruto da diversidade. Embora tenha feito MBA em Business, minha graduação é em Psicologia Organizacional. Ainda assim, fui indicada como sócia de uma Big Four, sendo a primeira mulher na América Latina a conseguir esta façanha. Evidentemente, na caminhada executiva, você nunca chega a determinado lugar sozinho. Mas, sem dúvida alguma, é preciso ser uma pessoa que se autodesafie, que tenha as hard e soft skills necessárias, e seja maior que a cadeira que ocupa para conseguir se desenvolver.
Entendo que a diversidade já era uma questão presente em meu entorno, antes mesmo de este ser um tema valorizado. Era, geralmente, a única mulher a sentar à mesa nas reuniões com meus demais colegas, acionistas e clientes. Tive que quebrar resistências e, muitas vezes, ouvir: “É competente, apesar de ser mulher” ou “ela é competente tal como um homem”. Hoje, felizmente, essa discussão ganhou uma nova escala, e o mundo e as pessoas estão percebendo que a diversidade é aquilo que agrega valor e minimiza riscos. É aquilo que promove transformações adequadas e estimula a inovação. Sem diversidade, tem-se um grande perigo de “miopia”, de olhar apenas para si mesmo. Então, é importante diversidade em várias dimensões: de gênero, cultural, de formação, de faixa etária, de todos os tipos – porque isso significa valor. Quando se fala em colegiado, seja no sentido de Conselho ou de Diretoria, é necessário priorizar que ele seja diverso, e que nele sejam encontradas as competências necessárias para a boa entrega dos resultados, para desafiar o status quo, e daí procurar melhor antecipar os impactos do futuro, da ruptura, da transformação tecnológica e da inovação.
No person : a figura que questiona ostatus quoe a crença coletiva
Quem deseja uma cadeira no Conselho não pode “abrir mão” da capacitação. Conselho é algo diferente, independentemente da formação ou da experiência anterior. Para estar lá, é importantíssimo se capacitar em Governança e em Negócios, continuadamente, ter experiência anterior diversificada (inclusive como gestor), além de interação com outras empresas, realidades e conselheiros. Quando eu saí da vida profissional da PwC, e depois da PMV, onde tínhamos estruturas de desenvolvimento formalizadas, estabeleci para mim um plano de que não passaria mais que um ano sem ter uma experiência educacional significativa, tanto no Brasil quanto no exterior. Este é um ponto importante que não quero “abrir mão”. São essas experiências que trazem os insights mais significativos e nos fazem questionar “nossas verdades e crenças” – a experiência e a senioridade carregam junto de si um perigo, o de pensar possuir “muitas certezas”. Essa abertura para entender o contexto e os desafios, não só aqueles relacionados à organização, e se autoquestionar, é vital para agregar valor e contribuir para a construção da ponte entre o presente e o futuro.
Ser conselheiro significa ter uma boa e estruturada iniciação, realizando reuniões individuais com a Diretoria Executiva e cada um dos conselheiros, e ter plano de visita à organização, para entender o negócio e suas idiossincrasias. O conselheiro precisa estar tanto próximo ao mundo quanto à organização, elaborar uma profunda análise prévia de documentos e não ter receio de dizer que não entendeu, pedir ajuda quando necessário e, eventualmente, abster-se de colocar uma posição quando não se sentir completamente confortável para isso. Certa vez, fiz um curso no INSEAD e um professor americano pontuou algo que nunca esqueci. Ele recomendava que, para todas as decisões complexas no Conselho, e, principalmente, nas quais rapidamente fosse estabelecido um consenso, deveria haver uma figura que ele intitulou de no person, ou seja, aquele indivíduo que questionaria os argumentos trazidos. Essa prática apresenta os riscos eventualmente não esclarecidos e as premissas passíveis de questionamento ou que requerem monitoramento futuro diferenciado. O professor orientou, ainda, que esse papel fosse rodiziado para que a pessoa não fosse intitulada o “chato de plantão”. Este papel deveria ser essencial quando todos, em uma situação importante, estiverem de acordo, pois ali justamente pode residir o perigo, portanto, torna-se imperativo questionar: “por que isso?”, “Por que aquilo?”, “Quais as premissas usadas”, “Quais as opções descartadas”, “Quais os trade-offs requeridos”, etc. Essa prática proporciona que todos saiam da zona de conforto e vejam por outra perspectiva o que está acontecendo, tornando, portanto, o processo decisório e com um monitoramento mais efetivo.
Propósito é o que mantém a empresa pulsando e viva
As inovações tecnológicas estão realmente impulsionando as organizações para novos tempos, mas também ameaçando o futuro delas. Há uma crença não muito nova que nunca fez tanto sentido: “Não pergunte se você vai ser disruptado, mas quando você será disruptado”. Esse realmente é um aspecto importante e para o qual as empresas devem se atentar e buscar caminhos. As companhias têm que fazer suas escolhas de acordo com seus princípios e sua cultura. Um passo relevante é se aproximar de startups, fazer hackathons para os seus principais problemas, visitar centros de inovação e incentivar que a inovação seja um valor para toda a organização, criando fóruns específicos com esta finalidade, até que a cultura da inovação e da transformação esteja consolidada.
Mas não se deve buscar a inovação pela inovação, porque é moda. É preciso ter razões e propósitos muito bem definidos. Lembrar que propósito, ou a razão de ser da empresa, é aquilo que promove a aderência dos colaboradores, dos clientes, dos fornecedores e das demais partes interessadas com a organização. Uma operação que não tem um propósito claro e inspirador, não consegue atrair pessoas e talentos. Hoje, as empresas diferenciadas estabelecem um propósito maior que seu próprio negócio.
No início do século era o triple bottom line, ou o tripé da sustentabilidade, que consistia em assegurar equidade, respeito ao meio ambiente e resultado econômico. Nesse sentido, a ESG (Environmental, Social and Governance) é uma bem-vinda evolução que dá oportunidade ímpar para que as organizações também reflitam sobre seu propósito. Sempre digo que as organizações precisam definir qual é a sua aspiração e o seu posicionamento em relação a ESG, e formalizar caminhos para atingir o que elas realmente querem, tanto na parte social e ambiental quanto em termos de governança. Propósito é aquilo que mantém a empresa pulsando e viva, com capacidade para criar engajamento com todos os stakeholders.
As empresas brasileiras precisam avançar no tema da ESG, pois isso traz benefícios. Deveria haver dois movimentos nesse sentido: um top-down (do topo da empresa para sua base) e outro bottom-up (da base para o topo do negócio). E cabe ao Conselho fazer a provocação, discutir e definir qual o posicionamento que a organização deve possuir em relação ao tema. A liderança deve entender como está o alinhamento e fazer uma conexão com os objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS), observar em quais deles a organização está mais exposta e definir, eventualmente, as prioridades, porque não são todas as metas que ela conseguirá trabalhar. Como diz Ivan Lansberg: “A melhor forma de definir um destino desejável é conversar com pessoas que vivem no mundo para o qual você está pensando em viajar”. Então, preciso ouvir e conversar com quem já faz isso bem e que está alguns passos à frente. Além disso, há várias consultorias especializadas que podem ajudar.
Entender seu cliente atual e futuro nunca foi fundamental, a emersão de uma nova geração que já nasceu digital está provocando grandes mudanças. É vital conhecer as megatendências e como elas impactarão a sociedade, suas crenças, necessidades e, por fim, seus negócios.
Ética, Transparência, Tecnologia Digital eCyber Security: uma questão central
O que e como fazemos, como organização e pessoa, nos deixa confortável ou nos tira o sono à noite. O que aconteceria com nossa empresa e clientes se muitas decisões se tornassem públicas? Na PwC, havia na frente de todos os elevadores um espelho com a seguinte frase no topo: “Quem é responsável pela ética na PWC?”. Então, você via a sua imagem individual no espelho, e na base deste a pergunta final: “Olhe novamente”, ou seja, tudo começa com você, o indivíduo.
As evoluções tecnológicas em todos os campos têm sido exponenciais (inteligência artificial, data analytics, microbiomas, biologia sintética, descarbonização, guerra fria tecnológica, etc.). O fato de entender como antever e lidar com todas essas inovações e mudanças, é uma arte em construção.
As barreiras muitas vezes estão em nós mesmos, e não nos outros
Nós, mulheres, quando estamos no Conselho, temos uma preocupação sobre qual é o valor que estamos aportando para que aquele colegiado cumpra bem o seu papel. O Conselho é a arena onde geralmente são analisados os trade off, isto é, escolhem-se determinadas opções em detrimento de outras. Na visão do filósofo grego Platão, há quatro virtudes cardeais, que são a base das demais virtudes e do comportamento humano: sabedoria, coragem, moderação e justiça. É isso que devemos entregar no dia a dia do conselho.
Sabedoria é a base para a tomada de boas decisões e está ancorada em conhecimento, experiência e razão. A coragem permite ir contra um posicionamento de alguém que, invariavelmente, é mais experiente que você ou tem coragem para implementar um curso diferente de ação. A moderação leva ao distanciamento de vieses, permitindo que os fatos sejam analisados de modo coerente e equilibrado; nesse aspecto, a justiça ajuda a balancear o que é certo, se posicionar do lado que é direito e reconhecer o mérito de alguém ou de algo.
Em uma palestra da psicoterapeuta belga Esther Perel, feita no festival SXSW, ela disse algo que até parei para anotar: “a qualidade dos relacionamentos no trabalho determina a qualidade do trabalho e a capacidade geral de sucesso”. Fui levada a concordar com ela, afinal, estamos em uma era em que o conhecimento técnico e a experiência são a “porta de entrada”, mas a “porta de manutenção” e que faz toda a diferença são, de fato, as habilidades socioemocionais, as soft skills.
Portanto, antes de mais nada, seja você mesma. Tenha coragem para aprender e desaprender, para superar desafios. As barreiras, muitas vezes, estão mais em nós mesmos que nos outros. Nesta jornada, não deixe de prestar atenção em alguns pontos. O primeiro é a relação. Devemos sempre encontrar uma pessoa que já trilhou pelos caminhos que almejamos trilhar e que pode discutir as nossas dúvidas e, principalmente, os nossos medos. Veremos, então, que, talvez, os medos e as dúvidas são muito parecidos ao longo do tempo, e a forma como nos relacionamos com eles é que é diferente. Outro ponto importante é a conexão, porque precisamos estar conectadas ao que acontece no mundo. Isso, somado a apoio, a preparo, a persistência e a coragem, faz parte de um núcleo importante que nos ajuda a superar os desafios. Falta de empatia, soberba e arrogância são pecados a serem evitados. E, por fim: tenha visão de longo prazo. Precisamos olhar para nós mesmas daqui a 20 ou 30 anos e identificar, ao olhar para traz, que pessoa queremos ver e como ter respeito e orgulho do que vemos e da pessoa que nos transformamos. Depois disso, é “correr atrás”, pois nenhuma conquista é obra do acaso.