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“Desfrute de cada momento da sua jornada, sem pensar no final ou na recompensa”

Na coluna desta semana, conheça a história de Hugo Nisenbom - Presidente da MSD Brasil

Na coluna desta semana, conheça a história de Hugo Nisenbom - Presidente da MSD Brasil (Divulgação/Divulgação)
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Da Redação

Publicado em 30 de setembro de 2022 às 18h12.

Por Fabiana Monteiro

Na coluna desta semana, conheça a história de Hugo Nisenbom - Presidente da MSD Brasil

A vida acadêmica contemplou as minhas primeiras aspirações profissionais, especialmente na atuação como pesquisador e cientista da área da saúde. Todavia, em determinado momento, ao receber a proposta para me tornar um executivo, pude perceber como os dois segmentos se complementavam, ou seja, ensejaria mais possibilidades às pessoas que necessitavam de tratamentos preventivos, de medicações e de interações apropriadas com médicos e com especialistas. Devidamente provido de experiências e de habilidades erigidas ao longo de décadas de dedicação, atualmente sou presidente da MSD Brasil e do Conselho Diretor da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa).

Meu início nesse nicho se deu por causa da grande inspiração proporcionada pelo meu avô. Costumava, quando criança, acompanhar meu abuelo nas suas atribuições em uma farmácia, sem deixar de trabalhar nos plantões de fins de semana também. Simplesmente abdicava de brincar com os garotos da minha idade por gostar bastante do ambiente que galguei os meus primeiros passos. Recordo-me com ternura de Castelar, pequena cidade argentina, onde cresci agregando diversos aprendizados.

O meu olhar de admiração em relação ao meu avô, um autêntico exemplo para mim, induziu-me a concluir os mestrados em Ciências Bioquímicas e em Farmácia na Universidade de Buenos Aires e na Universidade Nacional de Rosario, respetivamente. Nesta etapa, estagiei e trabalhei em hospitais, e obtive várias bolsas de estudos no CONICET ( Consejo Nacional de Investigaciones Cientificas y Técnicas de Argentina ) para me tornar pesquisador – posteriormente, concluí um doutorado nesse segmento, também na Universidade de Buenos Aires. Ganhei um respeitável prêmio da Faculdade de Farmácia e Bioquímica da Universidade de Buenos Aires como melhor jovem pesquisador, e assim a minha jornada ganhou robustez.

Aliando ciência ao mundo corporativo

Ainda bastante jovem, recebi a oferta para ingressar na indústria farmacêutica, e comecei a me movimentar no mercado corporativo pela primeira vez. Até então, meu foco estava voltado para o acadêmico como bioquímico, inclusive lecionando como Professor de Metodologia de Radioisótopos e Radioquímica. Porém, ao mesmo tempo em que me desenvolvia na carreira científica, interagia com as indústrias farmacêuticas para realizar aconselhamento ou serviços. E aconteceu o momento de mesclar a ciência com a parte de negócios. Recebi ao mesmo tempo duas boas propostas, uma como bolsista, atuando no Conselho Nacional de Saúde dos Estados Unidos, e outra de uma farmacêutica de pesquisa para conectar a parte da ciência com a comercial. Aos 28 anos, e cheio de dúvidas acerca de qual caminho percorrer, pessoas notáveis surgiram para me aconselhar.

Com o embasamento correto, fui orientado a investir no segmento industrial, com ênfase no marketing, pois havia essa demanda de profissionais no segmento farmacêutico. Honestamente, não detinha conhecimento sobre essa pauta, mas, em contrapartida, a empresa tinha muita tecnologia.

Ao receber uma bolsa do Rotary Club, que me permitiu ter contato com diferentes profissionais nos EUA, e assim conhecer outras culturas, aproveitei para realizar fortes conexões com presidentes de corporações a cargo da região da América Latina, ligados ao marketing. Assim, comecei a aprender, a me desenvolver, e aprimorei ainda mais o meu repertório com um MBA da Universidad de Deusto, na Espanha, e da Universidade do Salvador na Argentina. Completei a minha formação, conhecendo o negócio em áreas diferentes: farmacêutica de atenção primária, de especialidades, diagnóstica, cirúrgica e de instrumentos médicos, assumindo novos cargos em diferentes empresas, sempre de inovação. Na Schering-Plough fui promovido até alcançar o cargo de Diretor de Unidade de Negócio. Adorava trabalhar com pessoas, e em pouco tempo era o Presidente da empresa no Peru, depois passando por Equador em que consolidei a fusão com a MSD, e depois, na Venezuela, para desembarcar no Brasil em 2016.

Trajetória permeada por vitórias em prol da vida

Antes de pensar em mundo corporativo, eu era um pesquisador e, de repente, com essa transição de carreira, passei a apoiar, simplificar e gerar conhecimento para os professionais e “atores” do setor da saúde, acerca dos produtos de alta tecnologia. Comecei minha carreira em um laboratório, compreendendo todo o negócio, como funcionava tanto a parte científica como a do marketing. Como os setores se integravam para realmente conceber esses aprendizados aos profissionais de saúde, e como lograr o melhor desfecho para os pacientes.

Depois tive a oportunidade de assumir colocações em outras instituições da área da saúde, como no setor de diagnósticos da Bayer, Farmacêutico da Boehringer Ingelheim e Cirúrgico da Alcon. Quando estava na Schering-Plough, retornei ao segmento de farmacêutica pura, estabelecendo contato com todos as divisões envolvendo a saúde, o que me permitiu ter a visão ampla do negócio.

Ao assumir como Diretor da Unidade de Negócios na Schering-Plough, em 1999, tive a sorte de liderar uma divisão do laboratório que se tratava de uma entidade à parte, com certa independência dentro da própria companhia, focada em marcas estabelecidas. Tive pessoas que me ajudaram na preparação para ser um diretor-geral, mesmo sem todo o conhecimento, necessário à época. Um grupo bastante unido, com excelente manejo dos recursos humanos fizeram do projeto um sucesso que me promoveu a Presidente na subsidiaria do Peru da Schering-Plough.

Fizemos uma virada, resultando em um aumento de 3,5 vezes das vendas, em sete anos de operações. De fato, marcou como uma experiência muito bonita, e responsável por me conduzir à presidência da empresa simultaneamente no Equador que detinha um mercado maior. Como o time do Peru estava consolidado, com muitos anos juntos, atuando bem, resolvi dirigir os dois países desde Quito, permanecendo lá por quatro anos.

Na etapa do momento em que aconteceu a fusão entre a Schering-Plough e a americana Merck & Co fui uma das pessoas que ficou na Merck Sharp & Dohme (MSD). Após mais um período na subsidiária equatoriana, migrei para a Venezuela, outro mercado com atrativos, mas com seus conhecidos e recorrentes problemas econômicos. Contudo, conseguimos crescer, e isso resultou em minha promoção para a maior operação do grupo na América do Sul, estabeleci no Brasil em janeiro de 2016.

Estou há 26 anos na MSD, sendo que vinte deles como expatriado, liderando a empresa em diferentes nações da América Latina. E atualmente, além do privilégio de ser o presidente da companhia no Brasil, acumulo a função de presidente do conselho de diretores da Interfarma que reúne as indústrias farmacêuticas de pesquisa e inovação.

Edifiquei essa trajetória me pautando em determinados preceitos, especialmente com a capacidade de organizar equipes coesas, multidisciplinares e unidas, com profissionais amparados em suas próprias fortalezas de competências. Ninguém é mais importante que o coletivo – todos precisam empenhar propósitos fortes, comprometidos em melhorar e salvar vidas. Ao longo de minha carreira, sempre priorizei a criação de times com esse perfil. Gosto de me concentrar nas fortalezas das pessoas, e utilizar esses pontos fortes em prol das equipes. Isso propicia muita confiança, pois aquele que atua em sua área natural produz e entrega melhores resultados.

Sempre acreditei no foco e na inovação. O segredo do sucesso é fazer menos coisas extremamente bem, de alto impacto. A subsidiária do Brasil é um exemplo em termos de inovação, novas metodologias e meios de trabalho, com operações ágeis, abarcando o mundo digital, e por meio de parcerias exitosas com o paciente no centro. O mercado brasileiro está crescendo bem, solidamente, e representa um exemplo de como a corporação se encontra em franca ascensão.

O cientista com viés executivo

Sempre que indagado sobre qual legado gostaria de deixar para posteridade remeto à importância de contribuir para valorizar o aspecto humano. Sendo assim, aponto como cases de sucesso os processos responsáveis por impactar a sociedade. Cada vez que logramos acesso às vacinas salvamos milhões de vidas, e acredito fervorosamente na prevenção como a melhor solução, ou seja, estou mencionando fatores como acesso à água potável, educação alimentar e imunização.

Em parceria com o Instituto Butantan, temos o acordo de transferência de tecnologia para produzir a vacina contra HPV que previne alguns tipos de casos de cânceres, e para a vacina contra a hepatite A que atualmente é disponibilizada pelo SUS. Também é importante enfatizar como podemos auxiliar no combate ao câncer, com remédios essenciais para impedir o avanço da doença ou, em alguns casos, até alcançar a cura.

Atualmente, também estamos trabalhando para incorporar os antivirais nesse plano. Compreendo que a Covid tem vacinas à disposição, primordiais no combate à pandemia, mas o grupo de risco, ao contrair o vírus, necessita do auxílio das medicações. Nós estamos buscando formas de amparar essa parcela da sociedade ao lado do governo.

“São legados que gostaria de deixar. Contribuir para a saúde, seja pela prevenção ou através do tratamento, é algo que me enche de orgulho”

Além disso, refiro-me a capacidade de me adaptar, de incorporar novas tecnologias, como nas áreas digitais, novas metodologias de trabalho. No meu caso, por ter atuado em diferentes países, incorporando outras culturas em todos os âmbitos. Essa habilidade de adaptação é algo da qual me orgulho, pois posso retransmitir para as minhas equipes. Assim, justificativas infundadas não se sustentam.

Acredito possuir uma história bonita. Quando estava na dúvida de aceitar um cargo na Indústria com a proposta para me tornar executivo também, um amigo disse algo que me marcou demais nessa época: “Mais pode àquele que quer do que o que sabe.”. Essa capacidade de empenhar essa vontade de aprender, de fazer acontecer e de trabalhar para tal, marcou demais a minha vida.

Conforme mencionado, meu primeiro ponto de inflexão ocorreu quando resolvi migrar do cargo de pesquisador para me tornar um executivo. É um momento o qual é preciso mudar o seu mindset, mas sem jamais declinar dos seus valores. É uma outra maneira de ajudar, pois como pesquisador o foco compreende uma tendência mais assistencial, alicerçado em ciência pura, e o outro promove o acesso primordial para as que pessoas desfrutem das novas descobertas da área médica.

Contudo, o ponto mais crítico em termos de momento de mudança nessa trajetória se deu ao deixar o meu país rumo a novos desafios. Cresci em uma cidade pequena, vivi até os 40 anos na Argentina e, repentinamente, assumi o negócio no Peru. Logo notei que não existe melhor ou pior cultura – elas contêm apenas elementos diferentes. Importante mencionar como o leque de aprendizado se amplia, a visão periférica entra em ação e a pessoa começa a se enriquecer com a mente aberta, propiciando-a compreender mais o mundo e a ser tolerante, superando situações inimagináveis. Obviamente, cada país ou cidade têm coisas boas e ruins. Na Venezuela, vivenciei uma situação de quase guerra civil, e ali ficou claro para mim que o serviço nos fortalece mesmo nas piores situações.

“Estar ao serviço de outrem gera sentimento de plenitude”

Networking e aprendizado contínuo

Além do meu avô e de meus pais, outros indivíduos contribuíram para que alcançasse o meu atual cargo, como presidente de uma grande multinacional. No mundo acadêmico, tive a oportunidade de atuar ao lado de pessoas muito consolidadas, haja vista que a Universidade de Buenos Aires e o CONITEC contavam com três vencedores do Prêmio Nobel. Pude realizar trocas importantes com algum de seus discípulos, e se trata de uma instituição de ensino extremamente prestigiada, uma autêntica escola do pensamento, com enorme rigor científico.

Recordo-me bem de quando pude dialogar com o médico e bioquímico argentino Luis Federico Leloir, vencedor do Nobel de Química de 1970. A possibilidade de integrar discussões científicas é sensacional, ao agregar conhecimento, aprendizados – inclusive fora do seu campo de atuação convencional. O Leloir me disse: “A única coisa certa são os dados, o problema vem com a interpretação dos cientistas.”.

Quando me movimentei dentro da indústria farmacêutica, reitero como consegui aprender com cada chefe que convivi. Alguns mais estrategistas, outros mais orientados para gestão de pessoas e equipes. E isso engloba adquirir conhecimento também das pessoas que compõe as equipes, cada qual com suas peculiaridades e suas habilidades intrínsecas.

Posso citar como um diferencial o fato de que, durante toda a minha vida, fui um esportista – pratico diversas atividades até hoje. E aplico isso em minha carreira, como no futebol. Um jogador pode ser extremamente importante para a equipe, mas o coletivo deve prevalecer. Já no Rugby, apesar de ser uma prática bastante física, trata-se de um esporte de cavalheiros que se reúnem no terceiro tempo para comer algo – concorrente não é inimigo. Amizades surgem após as partidas, o networking é construído, e por isso sou amigo de vários executivos do segmento farmacêutico e o presidente da Interfarma.

Esses grupos têm muito em comum, e essa troca de aprendizados é primordial. No golfe, compreendi o valor da etiqueta, da humildade, de como errar faz parte da vida, ajuda a planejar, reinventar-se para a próxima ocasião. Aos 55 anos, aprendi a esquiar, motivado pela minha família. A lição é que não há idade determinada para se instruir de coisas novas, e ao estar próximo dos jovens você se contagia com o entusiasmo deles. Não obstante, ainda jogo tênis com meus filhos – e eles dizem que sou muito competitivo.

Dissolvendo dilemas: o líder humanista

Uma armadilha que pude compreender muito bem foi quando cursei, em 2005, o General Management Program, na Universidade de Columbia, uma excelente pós-graduação para a minha área. A vida de diretor-geral está repleta de dilemas e é preciso saber lidar com eles – para tal, torna-se essencial se embasar em valores. Se o indivíduo respeita os próprios princípios, dissolver dilemas vira uma missão mais fácil. Outro ponto remete a ter cuidado com a visão do especialista. Eventualmente, por enxergar só uma parte e não o todo, esse profissional pode tomar uma decisão que o conduza ao erro.

Além disso, o diretor-geral necessita estar atento para não se “encantar demais” com suas próprias ideias, podendo desencadear um processo fracassado. Tento, constantemente, desapegar-me de minhas ideias, analisar o que funciona ou não. Quando há uma falha, trato logo de mudar o foco e compreender que as imprecisões fazem parte da vida, entram como aprendizados e, assim, limito a ação do ego nas decisões.

Ao abordar esses méritos, aponto como o novo líder deve possuir valores humanistas, com propósitos e valores bem alinhados com as exigências contemporâneas. Essa posição também requer a capacidade de saber se adaptar e estar em constante aprendizado, empenhando curiosidade na vida.

A habilidade do gestor bem-sucedido passa pela capacidade de conseguir nortear os caminhos dos times, atuando como uma espécie de bússola, escutando a todos, sempre respeitando a autonomia de cada indivíduo. Outra questão atende ao compromisso de “arregaçar as mangas” e trabalhar junto aos seus liderados, eximindo-se da posição que se encontra como argumento para não cooperar integralmente.

No meu caso, enfatizo como invisto na fortaleza das pessoas – não sou o tipo de líder que surge em determinada empresa e reformula tudo, sem estar inteirado da capacidade de cada um. É primordial alocar os profissionais em colocações adequadas aos seus conhecimentos – assim se cria um time entrosado e repleto de sinergia.

Porém, sempre saliento a atitude como o fator mais louvável para quem procura se destacar. Admiro a atitude positiva, de aprendizagem permanente, otimista, que proponha soluções de diferentes formas. Sem dúvida, considero mais importante deter softs kills que hard skills – obviamente, contar com o conhecimento técnico é fundamental, mas em qualquer profissão, o equilíbrio se faz necessário.

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Por Fabiana Monteiro

Na coluna desta semana, conheça a história de Hugo Nisenbom - Presidente da MSD Brasil

A vida acadêmica contemplou as minhas primeiras aspirações profissionais, especialmente na atuação como pesquisador e cientista da área da saúde. Todavia, em determinado momento, ao receber a proposta para me tornar um executivo, pude perceber como os dois segmentos se complementavam, ou seja, ensejaria mais possibilidades às pessoas que necessitavam de tratamentos preventivos, de medicações e de interações apropriadas com médicos e com especialistas. Devidamente provido de experiências e de habilidades erigidas ao longo de décadas de dedicação, atualmente sou presidente da MSD Brasil e do Conselho Diretor da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa).

Meu início nesse nicho se deu por causa da grande inspiração proporcionada pelo meu avô. Costumava, quando criança, acompanhar meu abuelo nas suas atribuições em uma farmácia, sem deixar de trabalhar nos plantões de fins de semana também. Simplesmente abdicava de brincar com os garotos da minha idade por gostar bastante do ambiente que galguei os meus primeiros passos. Recordo-me com ternura de Castelar, pequena cidade argentina, onde cresci agregando diversos aprendizados.

O meu olhar de admiração em relação ao meu avô, um autêntico exemplo para mim, induziu-me a concluir os mestrados em Ciências Bioquímicas e em Farmácia na Universidade de Buenos Aires e na Universidade Nacional de Rosario, respetivamente. Nesta etapa, estagiei e trabalhei em hospitais, e obtive várias bolsas de estudos no CONICET ( Consejo Nacional de Investigaciones Cientificas y Técnicas de Argentina ) para me tornar pesquisador – posteriormente, concluí um doutorado nesse segmento, também na Universidade de Buenos Aires. Ganhei um respeitável prêmio da Faculdade de Farmácia e Bioquímica da Universidade de Buenos Aires como melhor jovem pesquisador, e assim a minha jornada ganhou robustez.

Aliando ciência ao mundo corporativo

Ainda bastante jovem, recebi a oferta para ingressar na indústria farmacêutica, e comecei a me movimentar no mercado corporativo pela primeira vez. Até então, meu foco estava voltado para o acadêmico como bioquímico, inclusive lecionando como Professor de Metodologia de Radioisótopos e Radioquímica. Porém, ao mesmo tempo em que me desenvolvia na carreira científica, interagia com as indústrias farmacêuticas para realizar aconselhamento ou serviços. E aconteceu o momento de mesclar a ciência com a parte de negócios. Recebi ao mesmo tempo duas boas propostas, uma como bolsista, atuando no Conselho Nacional de Saúde dos Estados Unidos, e outra de uma farmacêutica de pesquisa para conectar a parte da ciência com a comercial. Aos 28 anos, e cheio de dúvidas acerca de qual caminho percorrer, pessoas notáveis surgiram para me aconselhar.

Com o embasamento correto, fui orientado a investir no segmento industrial, com ênfase no marketing, pois havia essa demanda de profissionais no segmento farmacêutico. Honestamente, não detinha conhecimento sobre essa pauta, mas, em contrapartida, a empresa tinha muita tecnologia.

Ao receber uma bolsa do Rotary Club, que me permitiu ter contato com diferentes profissionais nos EUA, e assim conhecer outras culturas, aproveitei para realizar fortes conexões com presidentes de corporações a cargo da região da América Latina, ligados ao marketing. Assim, comecei a aprender, a me desenvolver, e aprimorei ainda mais o meu repertório com um MBA da Universidad de Deusto, na Espanha, e da Universidade do Salvador na Argentina. Completei a minha formação, conhecendo o negócio em áreas diferentes: farmacêutica de atenção primária, de especialidades, diagnóstica, cirúrgica e de instrumentos médicos, assumindo novos cargos em diferentes empresas, sempre de inovação. Na Schering-Plough fui promovido até alcançar o cargo de Diretor de Unidade de Negócio. Adorava trabalhar com pessoas, e em pouco tempo era o Presidente da empresa no Peru, depois passando por Equador em que consolidei a fusão com a MSD, e depois, na Venezuela, para desembarcar no Brasil em 2016.

Trajetória permeada por vitórias em prol da vida

Antes de pensar em mundo corporativo, eu era um pesquisador e, de repente, com essa transição de carreira, passei a apoiar, simplificar e gerar conhecimento para os professionais e “atores” do setor da saúde, acerca dos produtos de alta tecnologia. Comecei minha carreira em um laboratório, compreendendo todo o negócio, como funcionava tanto a parte científica como a do marketing. Como os setores se integravam para realmente conceber esses aprendizados aos profissionais de saúde, e como lograr o melhor desfecho para os pacientes.

Depois tive a oportunidade de assumir colocações em outras instituições da área da saúde, como no setor de diagnósticos da Bayer, Farmacêutico da Boehringer Ingelheim e Cirúrgico da Alcon. Quando estava na Schering-Plough, retornei ao segmento de farmacêutica pura, estabelecendo contato com todos as divisões envolvendo a saúde, o que me permitiu ter a visão ampla do negócio.

Ao assumir como Diretor da Unidade de Negócios na Schering-Plough, em 1999, tive a sorte de liderar uma divisão do laboratório que se tratava de uma entidade à parte, com certa independência dentro da própria companhia, focada em marcas estabelecidas. Tive pessoas que me ajudaram na preparação para ser um diretor-geral, mesmo sem todo o conhecimento, necessário à época. Um grupo bastante unido, com excelente manejo dos recursos humanos fizeram do projeto um sucesso que me promoveu a Presidente na subsidiaria do Peru da Schering-Plough.

Fizemos uma virada, resultando em um aumento de 3,5 vezes das vendas, em sete anos de operações. De fato, marcou como uma experiência muito bonita, e responsável por me conduzir à presidência da empresa simultaneamente no Equador que detinha um mercado maior. Como o time do Peru estava consolidado, com muitos anos juntos, atuando bem, resolvi dirigir os dois países desde Quito, permanecendo lá por quatro anos.

Na etapa do momento em que aconteceu a fusão entre a Schering-Plough e a americana Merck & Co fui uma das pessoas que ficou na Merck Sharp & Dohme (MSD). Após mais um período na subsidiária equatoriana, migrei para a Venezuela, outro mercado com atrativos, mas com seus conhecidos e recorrentes problemas econômicos. Contudo, conseguimos crescer, e isso resultou em minha promoção para a maior operação do grupo na América do Sul, estabeleci no Brasil em janeiro de 2016.

Estou há 26 anos na MSD, sendo que vinte deles como expatriado, liderando a empresa em diferentes nações da América Latina. E atualmente, além do privilégio de ser o presidente da companhia no Brasil, acumulo a função de presidente do conselho de diretores da Interfarma que reúne as indústrias farmacêuticas de pesquisa e inovação.

Edifiquei essa trajetória me pautando em determinados preceitos, especialmente com a capacidade de organizar equipes coesas, multidisciplinares e unidas, com profissionais amparados em suas próprias fortalezas de competências. Ninguém é mais importante que o coletivo – todos precisam empenhar propósitos fortes, comprometidos em melhorar e salvar vidas. Ao longo de minha carreira, sempre priorizei a criação de times com esse perfil. Gosto de me concentrar nas fortalezas das pessoas, e utilizar esses pontos fortes em prol das equipes. Isso propicia muita confiança, pois aquele que atua em sua área natural produz e entrega melhores resultados.

Sempre acreditei no foco e na inovação. O segredo do sucesso é fazer menos coisas extremamente bem, de alto impacto. A subsidiária do Brasil é um exemplo em termos de inovação, novas metodologias e meios de trabalho, com operações ágeis, abarcando o mundo digital, e por meio de parcerias exitosas com o paciente no centro. O mercado brasileiro está crescendo bem, solidamente, e representa um exemplo de como a corporação se encontra em franca ascensão.

O cientista com viés executivo

Sempre que indagado sobre qual legado gostaria de deixar para posteridade remeto à importância de contribuir para valorizar o aspecto humano. Sendo assim, aponto como cases de sucesso os processos responsáveis por impactar a sociedade. Cada vez que logramos acesso às vacinas salvamos milhões de vidas, e acredito fervorosamente na prevenção como a melhor solução, ou seja, estou mencionando fatores como acesso à água potável, educação alimentar e imunização.

Em parceria com o Instituto Butantan, temos o acordo de transferência de tecnologia para produzir a vacina contra HPV que previne alguns tipos de casos de cânceres, e para a vacina contra a hepatite A que atualmente é disponibilizada pelo SUS. Também é importante enfatizar como podemos auxiliar no combate ao câncer, com remédios essenciais para impedir o avanço da doença ou, em alguns casos, até alcançar a cura.

Atualmente, também estamos trabalhando para incorporar os antivirais nesse plano. Compreendo que a Covid tem vacinas à disposição, primordiais no combate à pandemia, mas o grupo de risco, ao contrair o vírus, necessita do auxílio das medicações. Nós estamos buscando formas de amparar essa parcela da sociedade ao lado do governo.

“São legados que gostaria de deixar. Contribuir para a saúde, seja pela prevenção ou através do tratamento, é algo que me enche de orgulho”

Além disso, refiro-me a capacidade de me adaptar, de incorporar novas tecnologias, como nas áreas digitais, novas metodologias de trabalho. No meu caso, por ter atuado em diferentes países, incorporando outras culturas em todos os âmbitos. Essa habilidade de adaptação é algo da qual me orgulho, pois posso retransmitir para as minhas equipes. Assim, justificativas infundadas não se sustentam.

Acredito possuir uma história bonita. Quando estava na dúvida de aceitar um cargo na Indústria com a proposta para me tornar executivo também, um amigo disse algo que me marcou demais nessa época: “Mais pode àquele que quer do que o que sabe.”. Essa capacidade de empenhar essa vontade de aprender, de fazer acontecer e de trabalhar para tal, marcou demais a minha vida.

Conforme mencionado, meu primeiro ponto de inflexão ocorreu quando resolvi migrar do cargo de pesquisador para me tornar um executivo. É um momento o qual é preciso mudar o seu mindset, mas sem jamais declinar dos seus valores. É uma outra maneira de ajudar, pois como pesquisador o foco compreende uma tendência mais assistencial, alicerçado em ciência pura, e o outro promove o acesso primordial para as que pessoas desfrutem das novas descobertas da área médica.

Contudo, o ponto mais crítico em termos de momento de mudança nessa trajetória se deu ao deixar o meu país rumo a novos desafios. Cresci em uma cidade pequena, vivi até os 40 anos na Argentina e, repentinamente, assumi o negócio no Peru. Logo notei que não existe melhor ou pior cultura – elas contêm apenas elementos diferentes. Importante mencionar como o leque de aprendizado se amplia, a visão periférica entra em ação e a pessoa começa a se enriquecer com a mente aberta, propiciando-a compreender mais o mundo e a ser tolerante, superando situações inimagináveis. Obviamente, cada país ou cidade têm coisas boas e ruins. Na Venezuela, vivenciei uma situação de quase guerra civil, e ali ficou claro para mim que o serviço nos fortalece mesmo nas piores situações.

“Estar ao serviço de outrem gera sentimento de plenitude”

Networking e aprendizado contínuo

Além do meu avô e de meus pais, outros indivíduos contribuíram para que alcançasse o meu atual cargo, como presidente de uma grande multinacional. No mundo acadêmico, tive a oportunidade de atuar ao lado de pessoas muito consolidadas, haja vista que a Universidade de Buenos Aires e o CONITEC contavam com três vencedores do Prêmio Nobel. Pude realizar trocas importantes com algum de seus discípulos, e se trata de uma instituição de ensino extremamente prestigiada, uma autêntica escola do pensamento, com enorme rigor científico.

Recordo-me bem de quando pude dialogar com o médico e bioquímico argentino Luis Federico Leloir, vencedor do Nobel de Química de 1970. A possibilidade de integrar discussões científicas é sensacional, ao agregar conhecimento, aprendizados – inclusive fora do seu campo de atuação convencional. O Leloir me disse: “A única coisa certa são os dados, o problema vem com a interpretação dos cientistas.”.

Quando me movimentei dentro da indústria farmacêutica, reitero como consegui aprender com cada chefe que convivi. Alguns mais estrategistas, outros mais orientados para gestão de pessoas e equipes. E isso engloba adquirir conhecimento também das pessoas que compõe as equipes, cada qual com suas peculiaridades e suas habilidades intrínsecas.

Posso citar como um diferencial o fato de que, durante toda a minha vida, fui um esportista – pratico diversas atividades até hoje. E aplico isso em minha carreira, como no futebol. Um jogador pode ser extremamente importante para a equipe, mas o coletivo deve prevalecer. Já no Rugby, apesar de ser uma prática bastante física, trata-se de um esporte de cavalheiros que se reúnem no terceiro tempo para comer algo – concorrente não é inimigo. Amizades surgem após as partidas, o networking é construído, e por isso sou amigo de vários executivos do segmento farmacêutico e o presidente da Interfarma.

Esses grupos têm muito em comum, e essa troca de aprendizados é primordial. No golfe, compreendi o valor da etiqueta, da humildade, de como errar faz parte da vida, ajuda a planejar, reinventar-se para a próxima ocasião. Aos 55 anos, aprendi a esquiar, motivado pela minha família. A lição é que não há idade determinada para se instruir de coisas novas, e ao estar próximo dos jovens você se contagia com o entusiasmo deles. Não obstante, ainda jogo tênis com meus filhos – e eles dizem que sou muito competitivo.

Dissolvendo dilemas: o líder humanista

Uma armadilha que pude compreender muito bem foi quando cursei, em 2005, o General Management Program, na Universidade de Columbia, uma excelente pós-graduação para a minha área. A vida de diretor-geral está repleta de dilemas e é preciso saber lidar com eles – para tal, torna-se essencial se embasar em valores. Se o indivíduo respeita os próprios princípios, dissolver dilemas vira uma missão mais fácil. Outro ponto remete a ter cuidado com a visão do especialista. Eventualmente, por enxergar só uma parte e não o todo, esse profissional pode tomar uma decisão que o conduza ao erro.

Além disso, o diretor-geral necessita estar atento para não se “encantar demais” com suas próprias ideias, podendo desencadear um processo fracassado. Tento, constantemente, desapegar-me de minhas ideias, analisar o que funciona ou não. Quando há uma falha, trato logo de mudar o foco e compreender que as imprecisões fazem parte da vida, entram como aprendizados e, assim, limito a ação do ego nas decisões.

Ao abordar esses méritos, aponto como o novo líder deve possuir valores humanistas, com propósitos e valores bem alinhados com as exigências contemporâneas. Essa posição também requer a capacidade de saber se adaptar e estar em constante aprendizado, empenhando curiosidade na vida.

A habilidade do gestor bem-sucedido passa pela capacidade de conseguir nortear os caminhos dos times, atuando como uma espécie de bússola, escutando a todos, sempre respeitando a autonomia de cada indivíduo. Outra questão atende ao compromisso de “arregaçar as mangas” e trabalhar junto aos seus liderados, eximindo-se da posição que se encontra como argumento para não cooperar integralmente.

No meu caso, enfatizo como invisto na fortaleza das pessoas – não sou o tipo de líder que surge em determinada empresa e reformula tudo, sem estar inteirado da capacidade de cada um. É primordial alocar os profissionais em colocações adequadas aos seus conhecimentos – assim se cria um time entrosado e repleto de sinergia.

Porém, sempre saliento a atitude como o fator mais louvável para quem procura se destacar. Admiro a atitude positiva, de aprendizagem permanente, otimista, que proponha soluções de diferentes formas. Sem dúvida, considero mais importante deter softs kills que hard skills – obviamente, contar com o conhecimento técnico é fundamental, mas em qualquer profissão, o equilíbrio se faz necessário.

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