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Desafios superados tornam o propósito mais valoroso

Na coluna desta semana, conheça a história de Mauricio Adade, presidente da DSM para a América Latina

Mauricio Adade é Presidente da DSM para a América Latina, África & Presidente Global de Parcerias e Programas Globais de Desnutrição (Histórias de Sucesso/Reprodução)
Mauricio Adade é Presidente da DSM para a América Latina, África & Presidente Global de Parcerias e Programas Globais de Desnutrição (Histórias de Sucesso/Reprodução)

O perfil multidisciplinar de viés inovador alinhado com resiliência, perseverança e tenacidade

O êxito para destacar-me no mundo corporativo granjeou os contornos iniciais ainda quando bem jovem, instigado por um espírito curioso e solidificado por valores intrínsecos. Amparado por grandes experiências, pude concretizar metas das quais muito me orgulho, alicerçadas por um perfil multidisciplinar e de viés inovador. Honrosamente, ocupo a cadeira de presidente da DSM para a América Latina e África, além de liderar a área de parcerias e programas globais voltados ao tema da desnutrição, com inúmeras atribuições pessoais, executivas e sociais.

Nasci em Sorocaba (SP), em 1963, cidade na qual passei toda a minha juventude. Meu pai, Ademar Adade, era advogado, enquanto minha mãe, Vilma Müller Adade, atuava como professora. Contei com a sorte de vivenciar uma infância muito feliz, convivendo com os meus avós maternos, inserido em uma família de classe média. Por ser o caçula – tenho uma irmã –, contei com alguns privilégios.

Sempre fui muito aplicado nos estudos, desde cedo comprometido com o desempenho e a performance. Inicialmente, estudei em colégios públicos e, antes de prestar vestibular, realizei cursos específicos para me preparar adequadamente. A opção por Engenharia de Alimentos se deu pelo processo com o qual fui criado. Meus pais eram de origem humilde e me incentivavam a investir no academicismo, com foco no aprendizado contínuo. Cheguei a passar na faculdade de Direito, mas alimentava uma paixão especial pelas disciplinas de Exatas.

Ressalto que, aos 17 anos, é impossível deter a certeza do que se quer fazer para o resto da vida – falta a maturidade. Porém, a curiosidade e o espírito inovador prevaleceram. Realizar algo novo, em uma área distinta, significou como o marco para seguir nesta carreira. Já havia uma vertente intrínseca a ser explorada.

Evidentemente, tive dúvidas no começo, mas resolvi continuar depois de um primeiro semestre complicado – estava decidido a concluir o curso, graduando-me pela Unicamp, em 1985. Neste ponto, faço uma menção indispensável de como o meu grande mentor foi o meu pai. Fundamental não somente nos momentos difíceis, mas também como exemplo de vida, um modelo inspirador. Uma pessoa muito sábia, e dentro de sua simplicidade, encontrei muitas respostas para os meus questionamentos e apoio nos momentos de dúvida.

Os ricos aprendizados e vivências na Roche

É essencial também realçar a ansiedade saudável, de querer fazer as coisas acontecerem. Assim pretendia me formar rapidamente para poder trabalhar. Utilizava todas as férias da universidade para estagiar, com ampla gama de atividades. Considero deveras importantes tais etapas para se conseguir conectar a teoria com a realidade. O meu estágio obrigatório fiz na Bayer, no setor de laticínios, atuando com enzimas. Acabou se tornando o meu primeiro trabalho, após a efetivação, com desenvolvimento de mercado. Aprendi muito sobre a parte comercial e a aprimorar as habilidades técnicas.

Posteriormente, migrei para a Visconti, conhecendo o nicho de panificação. Na companhia, gerenciava mais de 280 pessoas – havia escassez profissional no segmento, e o meu background me possibilitou assumir tal posição. Como gerente de fábrica, fiquei quase por três anos à frente da planta do bairro do Ipiranga, em São Paulo.

Contudo, percebi que a parte de produção não contemplava os meus anseios. Aprendi muito sobre gerenciamento de pessoas nas experiências prévias, mas precisava desbravar outros cenários. Sendo assim, em paralelo, iniciei o meu MBA com especialização em Marketing na ESPM, algo que considerava bem mais alinhado ao meu perfil.

A partir de então, comecei a procurar uma oportunidade na área comercial, tendo ingressado na Roche, em maio de 1988. Apesar de ser uma farmacêutica, a corporação possuía uma divisão de vitaminas e química fina. Comecei justamente no setor de aplicação de vitaminas e alimentos, junto ao desenvolvimento de negócios, pautado em um marketing muito mais técnico, por se tratar de uma empresa de negócios para negócios, com trâmites ligados a prestigiosos clientes.

Antes de completar dois anos na companhia, recebi algumas ofertas, especialmente por possuir um perfil diferenciado. Todavia, a Roche criou o primeiro centro regional para a América Latina com sede no Brasil. Convidado para assumir uma posição na operação, aprendi bastante sobre liderança política. Comecei trabalhando com os gerentes regionais na área de nutrição humana, farma e a minha última responsabilidade foi a de liderar os negócios dos países andinos, do Chile até a Venezuela.

Recebi muita exposição com essas movimentações ao conhecer pessoas de fora do Brasil, incluindo suíços, alemães, guatemaltecos e colombianos. Aliado à minha curiosidade inerente, meus olhos brilharam e pensei: o mundo é maior do que o Brasil e a América Latina. Novamente, pratiquei a minha ansiedade saudável de buscar uma posição como expatriado.

A primeira experiência ocorreu no México, assumindo como o responsável por nutrição humana. Estava com menos de 30 anos e isso me marcou como um desafio enorme, porque englobava aspectos pessoais também – a minha então esposa estava grávida do nosso primogênito.

Após esse imenso desafio, estava tudo planejado para ser transferido para a matriz, na Suíça. Contudo, no último momento, testaram a minha flexibilidade e, assim, assumi os processos na Ásia, alocado em Cingapura. De imediato, tive como grande missão lidar com a crise digital no continente, em 1998. Após quatro anos, parti para a Basileia, na sede da Roche, para incrementar o marketing global do setor de nutrição humana. Enfim, abarcava nichos como desenvolvimento de mercado, controle de preço, comunicação global, conciliando todas as funções.

O ápice e as conquistas como líder da DSM

Porém, em 2003, fomos adquiridos pela DSM, uma robusta empresa holandesa, com foco em química. Tratou-se de outro enorme desafio, haja vista que a corporação ainda carecia de história na área de nutrição. Participei do processo de integração de toda a companhia, até ser convidado para assumir como o responsável a nível global de nutrição humana, envolvendo cerca de 30% dos negócios de toda a DSM. Trabalhei como presidente global durante quatro anos, e por considerar precoce me aposentar, aceitei a proposta para ser chief marketing officer da empresa, que detinha um portfólio mais amplo.

O grande desafio contemplava implementar a harmonia em relação às capacidades distintas nas diversas modalidades de negócios. Durante cinco anos, estive incumbido de tais ações, até surgir a oportunidade de retornar ao Brasil, após mais de vinte anos expatriado. Meus filhos Gabriel e Gustavo desconheciam isso, pois tiveram uma vida globalizada, tendo estudado em colégios internacionais, diferentemente de mim, cuja trajetória começou aqui.

Duas opções despontaram, pois seria o líder para a América Latina, concomitantemente ao nível global, entrosando as nossas parcerias de modelos inovadores com ênfase em nutrição. Regressei em 2015, e continuo neste desafio maravilhoso, podendo desenvolver pessoas, amparado por todas as experiências amealhadas durante este percurso, especialmente nas funções exercidas no exterior. Mais recentemente, assumi mais uma região sob o meu chapéu, com a adição do continente africano. Enfim, continuo apreciando desafios e inovação.

Desafios superados tornam o propósito mais valoroso

Ao contemplar a minha carreira, considero como cases de sucesso também as grandes falhas – aprendemos demais com os nossos próprios erros. Todavia, tais intempéries devem servir de modelos para que, no futuro, o profissional possa desempenhar melhor, sem incorrer em estratégias inadequadas.

Durante a minha trajetória, são muitos os exemplos de projetos vitoriosos de “dar a volta por cima”. No México, depois de um ano, vivenciei momentos turbulentos, de ordem política, principalmente, com um ambiente bastante tenso. Já em Cingapura, me deparei com os problemas provenientes da crise da internet – fiquei sem ter para quem vender. Isso me ajudou a granjear perseverança e resiliência para empoderar as pessoas, motivando-as a dar o seu melhor. E isso é factível, desde que se evite olhar para as coisas com um olhar negativo. É um dos grandes aprendizados em termos de carreira.

Outro fator está relacionado a sempre realizar o extra, o algo a mais, evitando permanecer atrelado somente ao que está atribuído na descrição da função. Busco promover propostas adicionais, compreendendo as diferentes dinâmicas dos negócios. Sem dúvida, é algo imprescindível para escapar da famigerada zona de conforto.

Ademais, destaco a importância de se realizar o negócio com propósito. Particularmente, considero como algo inerente, por se tratar de nutrição, tanto animal quanto humana, com um valor incrível. Cada dólar investido na nutrição gera o retorno aproximado de US$ 37. Além disso, você proporciona com que as pessoas fiquem saudáveis, ativas e, por conseguinte, tornem-se mais felizes. Trata-se de qualidade de vida, de deter a possibilidade de conduzir o trabalho para o ecossistema completo.

Um grande marco pessoal e para a empresa remete ao trabalho efetuado na África. Ajudar o pequeno agricultor a ter uma fonte de renda garantida, em um continente extremamente sofrido, por meio de joint ventures com os governos, sem atravessadores, e devolver com a qualidade melhor para os próprios fazendeiros, deixa-me bastante satisfeito e orgulhoso. Sou o presidente do Conselho da operação em Ruanda, e há sete anos temos a Africa Improved Foods, motivo de enorme honra. Isso demonstra que é possível fazer o bem fazendo bem. A DSM tem quase 50% das participações nesta empreitada, denotando o nosso compromisso com pautas contemporâneas.

Os meus pontos de inflexão certamente me auxiliaram a compor um perfil muito sólido para lidar com obstáculos. Não consigo dissociar carreira de vida pessoal – prefiro falar de harmonia, vida e trabalho, do que work-life balance. Na primeira vez que deixei o país rumo ao México, tudo foi muito desafiador e complexo, principalmente em termos culturais, e com um mercado bastante deprimido.

Outro ponto notável diz respeito à aquisição empreendida pela DSM. Claro que as incertezas permeiam os pensamentos, especialmente por ser um brasileiro na Europa naquela época. Ao me tornar o líder global de uma das operações mais importantes da organização, abracei essa causa e trabalhei arduamente para que tudo funcionasse exitosamente.

Por fim, mais recentemente, o retorno ao meu país gerou uma sensação magnífica de realização – não tive absolutamente nenhum problema em termos de readaptação, pois jamais perdi a conexão com o Brasil. Mesmo com todas as complexidades da nação, é um lugar maravilhoso para se viver.

Flexibilidade e tenacidade abrem portas relevantes

Ao ser indagado sobre temas intrínsecos do mundo corporativo, aproveito o ensejo para opinar como escolhas boas e ruins interferem na dinâmica do indivíduo e das instituições. Deve-se ignorar o pensamento obstinado (e obsoleto) de que somente um caminho é possível. Não é e não deve ser linear, pois pode gerar frustração. É preciso, antes de tudo, haver flexibilidade com tenacidade acerca dos caminhos pelos quais a pessoa vai seguir – é imperativo estar sempre aberto às oportunidades.

Além disso, responsabilizar a corporação por eventuais erros é uma armadilha primária. Existem várias pessoas que vão influenciar a sua carreira, especialmente o seu gestor. Subestimar o valor do seu líder é um equívoco colossal. Na vida corporativa, invariavelmente, você ganha o que negocia e não o que merece. Passei por muitos estilos de liderança; é preciso saber gerenciar isso. Quando é inviável alinhar os propósitos, chega o momento de buscar outros caminhos.

Algumas frases e pensamentos norteiam como procuro agir, depois de ter escalado a pirâmide corporativa. Enfatizo o Be yourself more with skills, enfim, seja você mesmo, porém, com mais habilidade. Empenhe-se com autenticidade, para entender no que é bom e se condicionar a melhorar nos pontos falhos. Seria importante ter escutado isso quando jovem.

Cito outra expressão de impacto, e que é algo valiosíssimo para mim: Lidere, seja liderado, mas, por favor, não atrapalhe. Tem gente que simplesmente fica no meio do caminho – se não me encontro em uma posição de liderança, vou me empenhar ao máximo para que quem esteja nesta função obtenha êxito.

Em suma, valorize o seu autoconhecimento, pois não dá para lutar contra você mesmo. Chamo isso de “Felicitômetro”. Basicamente, pergunte-se constantemente o que está fazendo em determinado lugar. Caso tais dúvidas persistam, talvez seja o momento de mudar, seja de empresa, seja de carreira.

Tais aspectos valem para o líder também, porque ele precisa ser mais humano do que nunca – é a característica mais importante de todas. Todos nós precisamos do desenvolvimento técnico, mas o fundamental é a qualidade das relações humanas e a conexão emocional com elas. Para mim, é imperativo investir neste tópico, sendo extremamente genuíno com esse valor.

Exalto, também, a proatividade. Quer conquistar grandes metas? Então, vá buscá-las, corra atrás, embasado em resiliência, perseverança e tenacidade. Diante de eventuais obstáculos, é preciso encontrar soluções, pois somente assim o legado é edificado. Sem deixar de lado a paixão e a conexão emocional com aquilo com que você executa. Isso é aplicável aos colaboradores também. A tenacidade de querer ter sucesso, ser proativo, sem arrogância – ninguém sabe tudo e nunca saberá.

Engajamento junto à sociedade e o mercado aquecido 

Após tantos anos nesta digna jornada, nem sequer hesito dizer ao meu pessoal que estamos no seguimento correto. O dia em que as pessoas pararem de comer, será o momento em que o planeta estará com os dias contados. É simples: No food, no people, no planet, mas podemos fazer toda a diferença – não somente nos segmentos de inovação e produtividade, mas devidamente alinhados com o ESG.

Há dois anos utilizamos o produto Bovaer®, administrado no gado de corte e em vacas-leiteiras, responsável por reduzir a emissão de metano em 45% e 30%, respectivamente. E o metano é muito mais complicado do que o próprio dióxido de carbono. Seu efeito de aquecimento é mais curto, mas 28 vezes mais potente que o CO2, em um período de 100 anos. Portanto, sua eliminação gera resultados imediatos. Não existem quaisquer chances de se interromper essa empreitada – o planeta sucumbirá sem medidas efetivas. O Bovaer® foi desenvolvido ao longo de dez anos, ou seja, isso demonstra a perspectiva de como vislumbramos o futuro.

ESG é o DNA da nossa corporação. Fomos a primeira empresa do setor de ingredientes de consumo a tornar explícito seu impacto social por meio de um conjunto de compromissos mensuráveis, com o objetivo de abordar os desafios sociais e ambientais urgentes relacionados à forma como o mundo produz e consome alimentos até 2030. Isso envolve saúde para o planeta, para as pessoas e meio de subsistência saudável. Não é viável se considerar uma instituição ou indivíduo de sucesso em um mundo que está desaparecendo. Ou a gente cuida, ou nem sequer poderemos celebrar conquistas.

Ademais, isso gera a possibilidade de reinvestimentos, promovendo inovação, de maneira sustentável, para prover alimentos de boa qualidade, operando juntamente com governos e instituições, com o intuito de dirimir a fome e a desnutrição. Para o Brasil, detentor de um rebanho enorme, assim com um plantel de aves e suínos igualmente significativo, representa o aumento nas exportações para a China, com números fabulosos, apesar da Pandemia de Covid-19. Nosso agronegócio é um exemplo para o mundo. Enfim, a produção animal, de alimentos, bebidas e cosméticos compõe o nosso negócio, com foco em inovação e sustentabilidade.

Automotivação e confiança rumo ao sucesso

A vida pode ser boa, depende de você, do ato de gerenciar as mais diversas atribuições. Considero-me uma pessoa abençoada e privilegiada; o mínimo que posso fazer é retribuir à sociedade.

Mesmo com todos os desafios que temos visto, possuímos a capacidade, como seres humanos, de termos uma vida melhor. Noto certa inércia nas novas gerações, um conformismo, minimalismo, com tendências, inclusive, de as pessoas almejarem o sucesso sem muito esforço. Assim não funciona.

É necessário ter automotivação, transmutando-a em autoconfiança. As coisas só acontecem quando arriscamos. Sem a tentativa, não chegamos a lugar algum. É preciso errar para aprender, porém, imbuído de resiliência – caso contrário, não conseguiremos melhorar o mundo. Sem continuar neste ostracismo, mas sim buscando a milha extra”.

Respeite as pessoas – nem todo mundo pensa como você.