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Cresça com o desconforto e crie a sua própria versão do sucesso, afirma Angela Schwarz

Na coluna desta semana, conheça a história de Angela Schwarz - Senior Vice President – National Transit and Rail Market Sector Leader - WSP USA

 (Editora Global Partners)

(Editora Global Partners)

Publicado em 14 de fevereiro de 2025 às 10h43.

Ao refletir sobre minha trajetória de realizações, percebi como priorizar a educação foi a iniciativa mais relevante da minha vida. Desde jovem, dediquei-me com afinco ao aprendizado, superando inúmeros desafios, sem jamais deixar de aproveitar todas as oportunidades que surgiram.

Ao “crescer por meio do desconforto”, alicercei uma sólida carreira internacional, sempre amparada por valores indeléveis, ética, aprendizado contínuo, defendendo a equidade e o respeito profissional e com foco em retribuir ao mundo o que alcancei como profissional.

Atualmente, ocupo a posição de vice-presidente sênior na WSP USA, prestigiada multinacional estadunidense do segmento de Consultoria e Engenharia, em que lidero a área de transporte público.

Nasci em Santo André (SP). Relembrando minha infância, posso dizer que jamais me identifiquei com o tipo de menina fascinada por bonecas ou brinquedos tidos como “femininos”. Gostava de jogar futebol na rua, andar de bicicleta, de ler e de estudar.

Sou a filha caçula e a única mulher de uma família de quatro irmãos: Luiz Morais, Carlos Morais e Eduardo Morais. A minha mãe, Tereza de Paiva Morais, já falecida, era dona de casa, e meu pai, Sebastiao de Paiva Morais, trabalhou no setor automobilístico. Crescemos em um contexto no qual cuidávamos muito uns dos outros.

Diferentemente de meus irmãos, fui a única da família a tentar algo diferente em termos de carreira, me aventurando no exterior. Meus irmãos e meu pai continuam morando no Brasil.

Em nossa casa, a educação era um tema importantíssimo. Meus pais nos incentivavam muito para estudar. Eles terminaram somente o ensino básico e sabiam da relevância de concentrar esforços nesse sentido. Minha mãe me motivou bastante e assim me dediquei com afinco, obtendo excelentes notas, algo essencial para planejar a carreira.

No ensino médio, estudei no Colégio Técnico Jorge Street, com o objetivo de me formar como técnica de eletrônica. Foi uma fase muito importante para mim, que contribuiu para minha escolha de cursar Engenharia Elétrica pela FEI, uma instituição extremamente conceituada. Completei minha graduação em 1995 e, à época, já lidava com o ambiente majoritariamente masculino, mas soube contornar as adversidades.

A oportunidade de sedimentar a carreira nos EUA e o início na Siemens

No momento em que cursava Engenharia na FEI, nem sequer pensava em edificar uma carreira internacional. Acontece que esse curso exigia um estágio obrigatório e surgiu para mim uma excelente oportunidade, alavancada pelo reconhecimento que a FEI tinha – e ainda tem – junto às empresas.

As grandes empresas buscavam jovens talentos na universidade, o que me proporcionou ingressar na Siemens. Essa foi uma das melhores chances que recebi na vida e, assim, logo no início da minha carreira, já estava atuando em uma multinacional prestigiada, o que me abriu as portas para alcançar o sucesso em outros países.

A Siemens propicia a oportunidade de atuar em vários locais, caso haja o desejo genuíno da pessoa. Assim, após começar a jornada no Brasil, assumi precocemente uma posição na Alemanha, em 1999, permanecendo por um ano e meio naquele país.

Logo na sequência, em 2001, aceitei a oferta de me mudar para Nova York (EUA), com a missão de implementar um projeto de engenharia bastante sofisticado, que apresentou excelentes resultados.

As oportunidades internacionais derivaram de posições e projetos significativos dos quais participei ainda bem jovem, incluindo projetos no Brasil, nos Alemanha e nos EUA.

Com o êxito do projeto em Nova York e com o nascimento do meu filho, Reiner Schwarz, decidi que minha vida seria alicerçada nos EUA, principalmente por conta da rápida adaptação.

Os desafios complexos e a ascensão como uma executiva realizada no exterior

Alcançar uma posição de liderança é um processo que demanda aproveitar as chances que se apresentam no decorrer do caminho, sempre provendo o melhor de si, com disposição e resiliência.

Quando parti para Nova York, gerenciei o projeto da automação do metrô, algo de grande visibilidade junto à comunidade técnica. Deparei-me em um país novo, inserida em outro contexto cultural, sob enorme pressão, à frente de um projeto de sólido impacto para a sociedade, o que me levou a assimilar aprendizados singulares.

Além da parte técnica, busquei ampliar o arcabouço cultural, aspectos acerca da diversidade cultural – fator essencial para alavancar a carreira e me tornar líder. Já detinha o inglês básico e tratei de aprimorar o idioma para me desenvolver rapidamente, considerando que se trata de um diferencial poderoso.

Sempre gostei da parte técnica da engenharia e, no início da minha experiência americana, liderei um grupo composto por 50 engenheiros altamente qualificados, como parte de um programa que existia há trinta anos e que jamais havia sido conduzido por uma mulher.

De certa forma, essa empreitada me abriu os olhos. Eles apostaram que eu iria desistir, mas acabei me consolidando no decorrer dos anos, recebendo o respeito de todos, inclusive, tornando-me amiga de muitos deles.

Outro evento transformador em minha jornada ocorreu recentemente, ao ser selecionada para liderar o mercado de Transit and Rail, já na WSP USA. O meu time, direto e indireto, é formado por 300 profissionais de alta performance e estamos atuando com o segmento mais robusto da empresa.

A liderança pelo exemplo e a luta pela igualdade no mundo corporativo  

Ao refletir sobre minha carreira, percebo que não precisei mudar nada da minha personalidade para superar os eventuais obstáculos por ser mulher. Acima de tudo, o mais importante para ser líder ou ocupar qualquer outra posição é amparar-se em valores sólidos, como integridade, ética e transparência, objetivando desenvolver e criar um ambiente de confiança, com comprometimento entre pessoas.

Claro que é fundamental que o líder pratique o que fala, dentro do conceito da liderança pelo exemplo. Além disso, é mandatório ter a consciência de que é preciso devolver para a comunidade parte das conquistas, contribuir com a sociedade de alguma forma. Conforme se cresce na carreira, naturalmente, a pessoa torna-se uma fonte de inspiração.

Sempre me deparei com desafios, pois a Engenharia é um campo que está em constante progresso. Trabalho em uma área que engloba transportes, lido diretamente com homens e há sim uma forte pressão e é preciso provar-se capaz para obter respeito e credibilidade em relação ao que se fala e o que se executa.

Nós, mulheres, muitas vezes, não acreditamos no nosso potencial, e isso reduz a nossa presença em cargos de alta direção. Segue existindo no mundo corporativo o preconceito inconsciente. A atuação masculina e a feminina têm pesos diferentes, principalmente no meu caso, pois sou uma mulher latina e negra, o que me motiva ainda mais.

Há várias pesquisas que apontam como as mulheres têm se fortalecido no mundo executivo, contribuindo com cerca de 50% da força de trabalho. No entanto, somente 11% delas ocupam cargos de liderança.

Essa questão evoluiu nas últimas décadas, mas está longe de ser a ideal. Por isso, é importante envolver as pessoas, engajar a comunidade, para fomentar os conceitos de igualdade.

Equilibrar todos os âmbitos da vida para evitar a estagnação e a autossabotagem

Sobre o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, acredito que o principal ponto é realizar o melhor para a sua família, de acordo com as possibilidades, dentro do tempo de qualidade. Eventualmente, alguns compromissos afetam os momentos familiares, mas faz parte da jornada.

Deixei de alcançar algumas realizações porque sentia culpa de que não seria uma boa mãe ou esposa. Contudo, isso não é o ideal. Ao me tornar mãe, muitos projetos de alta visibilidade surgiram, e abdiquei deles para não ficar distante do meu filho.

Por exemplo, me arrependo de não participar do Jack Welch Leadership Program, quando estava na General Eletric, um programa dedicado a empregados de alto desempenho. Desisti de participar, por considerar que afetaria o meu papel em casa. De certa forma, me anulei. Hoje entendo que se deve evitar esse bloqueio psicológico. Nas companhias nas quais trabalhei, a questão da maternidade jamais foi um impeditivo para crescer ou buscar novos desafios. Em Nova York, consegui ficar 12 semanas com o meu filho antes de retomar os meus afazeres. O mundo corporativo está mais bem preparado para aceitar mães trabalhadoras – um conceito que mudou, evoluiu bastante nos últimos tempos.

Priorizar o aprendizado contínuo, com foco em comunicação e relacionamentos

O bom líder é aquele que sabe se comunicar adequadamente – os times precisam saber, com clareza, como o gestor pensa, quais objetivos estão em pauta e quais são os planejamentos.

O mercado de trabalho, atualmente, conta com quatro gerações atuando concomitantemente, e é preciso inspirar e empoderar essas equipes com tantas diferenças entre seus integrantes. É um desafio que requer alinhar os propósitos, motivando os indivíduos de formas distintas, entendendo as demandas e os anseios de cada um.

Essa proposta ajuda a reter profissionais capacitados e os jovens talentos. Sem inspiração, os grupos não se mantêm – uma situação que atrapalha demais o planejamento das organizações e que gera improdutividade.

Diante de uma área que está sempre inovando e que exige dos profissionais uma atualização constante, acredito em uma abordagem criativa, com responsabilidade, especialmente em relação à inteligência artificial.

Sempre procurei aprender coisas novas e é algo que aconselho a todos que estão começando. Há muita informação e conhecimento à disposição, que ajudam a se conectar com o mundo e, por conseguinte, com a comunidade.

Indiscutivelmente, a relevância do aprendizado contínuo é um pilar precioso e imprescindível na edificação do perfil de um líder. Porém, a educação não se restringe somente ao campo profissional, ela exige expandir o escopo e ter a mente aberta para compreender o que está ocorrendo no entorno. O engajamento e a responsabilidade social são fatores inegociáveis, por meio dos quais o profissional pode contribuir para tornar o mundo melhor para si e para a sociedade.

Aplicar-se à educação continuada provê qualidade de vida em todos os âmbitos. O conhecimento adquirido ao longo da jornada é algo que jamais será retirado da pessoa. Com o desenvolvimento contínuo, torna-se possível estabelecer bons relacionamentos, bem como abrir novas portas – algumas delas até então desconhecidas.

Dedicar-se com a mente aberta, integridade, confiança e comprometimento

Com a mente aberta torna-se mais viável aproveitar as oportunidades que surgem, mesmo aquelas com as quais não se têm tanta afinidade. Na Siemens, por exemplo, passei pelo padrão rotativo, atuando em diversas áreas, como Engenharia, Marketing e Vendas. Sabia do que gostava, mas aprendi muito com os outros nichos.

A visão ampla é fundamental para edificar uma trajetória bem-sucedida, e uso minha experiência como exemplo: não tive medo de ir para a Alemanha, mesmo sem tanta experiência na época, e foi um passo fundamental para sedimentar uma carreira internacional.

Além de manter a mente aberta a novas possibilidades, a integridade, a confiança e o comprometimento são princípios inegociáveis para um bom líder. Realizar os trabalhos da melhor maneira possível, por mais chatos que estes sejam, tem um grande impacto para a ascensão profissional. Também é importante evitar questionar-se o tempo todo sobre a adequação para o cargo, enfrentando o desafio sem medo de fracassar, pois todas as vivências contribuem para se adquirir novas habilidades.

Soma-se à mente aberta e aos princípios fundamentais para ser uma liderança, iniciativas de se voluntariar para participar de eventos profissionais ou de comunidades profissionais, alinhadas com seu perfil, em prol do desenvolvimento da área. Nos EUA, participo de atividades correlatas ao setor de transportes, compartilhando ideias e atuando ao lado de pessoas que pensam como eu.

Certa vez, recebi um conselho sobre como o crescimento é desconfortável, pois há momentos extremamente desafiadores e difíceis. Porém, tudo está vinculado ao ato de nunca se acomodar, em prol do crescimento. Nessas situações, é importante buscar um equilíbrio e refletir sobre o que realmente nos motiva a prosseguir.

O mundo é um lugar complexo e instigante, já sem tantas fronteiras. Às vezes, algumas coisas podem nos afetar, mas basta estarmos preparados para solucionar conflitos de quaisquer espécies, com resiliência. Raramente será fácil alcançar as metas exatamente como planejado – pode levar tempo para chegar à posição desejada. Contudo, é fundamental permanecer atento, pois, com preparo e paciência, os objetivos acabam sendo atingidos.

Acreditar em si e contar com o auxílio de mentores e pessoas inspiradoras

Ao longo da minha carreira, tenho contado com o apoio de mentores que acreditam em mim até mais do que eu mesma. Sempre tive ao meu lado pessoas que me inspiraram e me orientaram a crescer, potencializando minhas competências e fortalecendo minha autoconfiança.

Em relação a mentores e inspiradores, posso dizer que minha carreira se divide em três partes. Logo ao me graduar, tive o apoio de Oswaldo Roschel, que me deu todas as oportunidades na empresa – segui suas orientações à risca.

Já em Nova York, Jöerg Nuttelmann foi bem colaborativo, capaz de enxergar o potencial de cada pessoa, alocando-a na posição correta, de excelência. Certamente, é aprendizado valioso para quem comanda times de alta performance.

Agora, conto com o suporte da Jannet Walker-Ford, que me moldou para a posição executiva. Ela é magnífica e me ajudou a adquirir novos soft skills, para me tornar a executiva que sou hoje.

No geral, todos os programas de liderança que realizei contribuíram para a minha jornada. Porém, um deles, em específico, mudou significativamente a minha trajetória e foi um autêntico investimento de carreira. A indústria já reconhecia minhas capacidades técnicas, sem dúvidas quanto a isso, mas eu precisava evidenciar também outros aspectos da minha personalidade.

Recentemente, participei do Leadership APTA Program, um programa desafiador, dedicado ao desenvolvimento da próxima geração de líderes. Indubitavelmente, me ajudou a alcançar a posição que ocupo hoje.

Fora do mundo profissional, encontro minha inspiração na minha família e nos meus amigos. Em especial, na minha mãe, que sempre me incentivou a priorizar os estudos. São pessoas que estarão ao meu lado, independentemente do momento, algo essencial para manter o ritmo de crescimento.

É importante contar com essa rede de apoio, pois, à medida que nos desenvolvemos na carreira e subimos de posição, a jornada pode se tornar mais solitária. Também é válido cultivar hobbies e atividades saudáveis para prevenir o estresse. Eu, por exemplo, gosto bastante de praticar golfe.

Crescer com o desconforto e criar sua própria versão do sucesso

Algumas pessoas acham que sucesso é só sobre compensação financeira. Discordo disso. Você pode criar sua própria versão de sucesso, um conceito que não é idêntico para todos.

As novas gerações dispõem de diversas oportunidades, prontas para serem aproveitadas. É fundamental empenhar-se, adquirir competências e direcionar esses esforços para o próprio desenvolvimento, ao mesmo tempo em que se colabora com a família e a comunidade. Além disso, há múltiplas alternativas de aprendizado disponíveis fora do contexto acadêmico.

Eu corri atrás do que estabeleci para contemplar o meu plano de carreira e, ao encontrar o meu propósito, tive a oportunidade de estudar, criando a situação ideal para custear a universidade.

A minha ideia sobre o conceito de sucesso mudou bastante, conforme amadureci. Quando era mais jovem, consistia em demonstrar do que era capaz. Agora, vejo além disso. Como líder de uma proeminente organização, preciso manter os negócios em ascensão, cuidar do meu time, ciente de que detenho a força para inspirar outras pessoas.

Meu conselho final para quem deseja crescer na carreira é se manter perenemente motivado. Se não tem o desejo de ir trabalhar, por falta desânimo ou falta de propósito, tome outro rumo. Empenhe-se nas empreitadas com otimismo, alinhado com aquilo que lhe faz feliz, vislumbrando o futuro, todos esses são aspectos motivacionais imprescindíveis.

Por fim, reitero a importância de aprender a crescer com o desconforto constante, pois isso evita a falsa sensação de que tudo se resolverá sem esforço ou dedicação, permitindo que você encontre as soluções por conta própria.

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