(Global Partners)
Colunista
Publicado em 23 de maio de 2025 às 19h14.
Última atualização em 27 de maio de 2025 às 14h53.
Sou uma paulistana da Zona Norte, nascida em 1984, na maternidade Santa Joana. Minha estrutura familiar é pequena: pai, mãe e avó materna. Tenho meus alicerces nessas três figuras, mesmo com meus pais separados desde que eu era pré-adolescente.
Estudei a vida inteira em colégio particular, minha mãe sempre priorizou o investimento na minha educação, mas durante o ensino médio entendi que minha família não teria condições de pagar uma universidade particular. Por isso, juntos decidimos que eu deveria ingressar em um desses cursinhos pré-vestibular com o intuito de me preparar para ingressar em uma universidade pública.
Mas como nem todos os planos seguem linhas retas, no meio do caminho surgiu a oportunidade de um intercâmbio internacional para estudar inglês em Londres. Eu tinha 18 anos quando embarquei, muitos sonhos e uma grande responsabilidade, pois vi o sacrifício dos meus pais para me proporcionarem esta oportunidade, minha mãe vendeu o carro dela para pagar o curso e durante um bom tempo dependeu do transporte público. Meu pai, por sua vez, parcelou a passagem em várias vezes. A passagem e o curso de inglês de um ano estavam pagos, no entanto, eu tinha apenas três meses de dinheiro para pagar aluguel, comida e outras despesas. Ou seja, eu realmente tive que me virar e arrumar um emprego assim que desembarquei, mesmo com o inglês limitado e vivenciando uma experiência absolutamente diferente de tudo aquilo que eu estava acostumada, consegui! Fiquei na Inglaterra por um ano e com a conclusão do curso retornei para o Brasil.
Quando voltei, fiquei um tempo em São Paulo, mas logo me mudei para Itapira, no interior do estado, onde meu pai e minha avó moravam. Comecei a graduação em Administração com ênfase em Comércio Exterior, embora meu desejo inicial fosse cursar Educação Física, já que sempre fui ligada aos esportes. Cheguei até a “flertar” com a Economia durante a época do colégio, mas essa ideia não evoluiu.
No segundo ano do curso, entrei como estagiária no Laboratório Cristália, uma empresa da indústria farmacêutica em Itapira. Fui moldada ali, no setor de importação. Nesta empresa, tive a possibilidade de me desenvolver e atingir evolução relativamente rápida. Após um ano e meio de estágio, fui efetivada, e alcancei o cargo de analista de importação sênior. A fluência no inglês foi um grande diferencial para este crescimento.
Passados cinco anos de Cristalia, minha mãe, que estava morando sozinha em São Paulo, adoeceu e eu decidi retornar para a casa dela, a fim de ajudá-la a enfrentar o tratamento renal. Com a ajuda de amigos, consegui me aplicar e ser selecionada para uma posição, ainda na área de compras na Hypera Pharma. Ali, cresci profissionalmente e alcancei um cargo de gerência, viajando o mundo para conhecer fornecedores e suas plantas de fabricação de insumos farmacêuticos.
Quando a gerente executiva responsável pela área em que eu atuava faleceu, não me adaptei à troca de liderança e comecei a buscar novas oportunidades. Eu decidi que o próximo passo deveria ser internacional, talvez passar um ou dois anos no exterior para agregar conhecimento. Inicialmente, meu plano estava focado em aplicar para vagas na China ou na Índia, já que são os grandes polos da indústria a qual eu atuo.
Com alguns contatos estabelecidos, durante uma feira na Alemanha quando comentei com um conhecido sobre minha vontade de mudar de emprego e me aventurar em uma experiência internacional, ele compartilhou comigo que ele estava com uma vaga aberta em seu departamento e me incentivou a aplicar para o processo seletivo. No fim das contas fui selecionada, mas a grande surpresa foi em relação ao destino, a vaga era para trabalhar no Canadá, país o qual eu nunca tinha visitado e nem sequer tinha pensado em morar. Entre o processo seletivo e a burocracia imigratória, foram quase dez meses de espera e hoje moro em Toronto há oito anos.
Tenho um profundo orgulho do nosso país, e hoje tenho plena convicção que todos os países possuem qualidades e desafios. Não descarto a possibilidade de retornar para o Brasil, já que a saudade é constante e existem excelentes oportunidades profissionais disponíveis. Busco manter contato com meus mentores e profissionais de mercado, continuo acompanhando a evolução do mercado, não somente na América do Norte, mas também na América Latina.
Nossos laços profissionais são como relacionamentos, precisam ser nutridos: se o “match” não acontece, precisamos procurar o que é melhor para nós, de acordo com os nossos valores e objetivos.
Cada etapa do seu crescimento impõe mudanças: procure se adaptar
No início da carreira, ouvi alguns “nãos”. Um deles me marcou bastante. Não fui aprovada na minha primeira tentativa de estágio em comércio exterior. Mas esse “não” moldou minha resiliência e, pouco tempo depois, comecei como estagiária na mesma empresa, em uma vaga mais específica que acabou servindo de trampolim para onde cheguei hoje.
Cada passo do meu crescimento implicou em mudanças geográficas. Primeiro, mudei para o interior. Depois, voltei para a capital paulista. Quando já estava praticamente estabelecida, vim para o Canadá. Esses recomeços foram desafiadores e me ensinaram a trabalhar minha adaptabilidade.
Curiosamente, desde muito pequena, aprendi a me comunicar com facilidade. Eu chegava em um parquinho e logo falava com todas as crianças, querendo fazer novas amizades. Essa característica me acompanha até hoje. Minha abordagem não é hiperfocada, mas expansiva. Não importa seu cargo ou status, eu vou conversar com você. Tenho essa necessidade de reconhecer o ambiente ao meu redor.
No meu primeiro emprego, Aléssio José Francisco foi um grande mentor e me ajudou no meu desenvolvimento, moldando meu perfil profissional com paciência e dedicação. Venho de uma família humilde, minha mãe sempre foi minha maior incentivadora nos estudos. Ela sempre fez questão de pagar colégio particular, acreditando que essa era a melhor forma de me dar oportunidades. Apesar disso, ela tinha algumas limitações intelectuais e, quando chegou a hora de dar passos mais largos, como a escolha da pós-graduação e do MBA, precisei buscar mentores que me orientassem nessa jornada. Sou profundamente grata por todo apoio e amor dela, que sempre fez o impossível para que eu chegasse onde estou hoje. Meu primeiro gerente, Aléssio, me conduziu da fase inicial no mercado de trabalho até minha verdadeira profissionalização.
Ainda me surpreendo ao ver pessoas com a convicção de que sabem tudo sobre suas atividades. Acredito no aprendizado contínuo e na renovação constante. Sempre temos algo novo para aprender, a perfeição não existe, estamos em constante evolução.
Procure acompanhar as inovações tecnológicas
Tenho um problema com redes sociais, principalmente o Instagram. Perdia muito tempo rolando a tela, vendo conteúdos que não agregam em nada, na maior parte das vezes publicados por desconhecidos. Por isso, de tempos em tempos, faço períodos sabáticos. No último ano e meio, percebi que estava presa nesse ciclo novamente, perdendo mais de uma hora e meia antes de dormir. Saí definitivamente da plataforma. No atual momento da minha vida, o mais saudável é pausar a utilização deste aplicativo.
Com o LinkedIn, é diferente. Acesso duas ou três vezes por semana, entendendo que sua dinâmica é outra. Tento focar no que realmente importa e me disciplinei nesse sentido. No entanto, não dá para ficar alheia às novas tecnologias. No último ano, por exemplo, lapidei minha forma de escrever e-mails para C-suites Level. Antes, gastava muito tempo revisando porque o inglês não é meu idioma principal. Agora, o ChatGPT me ajuda a ganhar eficiência com a revisão de textos mais complexos. Essas tecnologias estão amplamente disponíveis e certamente são grandes aliadas no aumento da nossa produtividade.
Na área em que eu atuo, departamento de compras, temos um desafio: o conhecimento ainda fica retido nos colaboradores. Quando eles não estão mais presentes, parte desse conhecimento vai embora. Algumas startups já trabalham com a combinação de IA e capital humano para resolver isso. Plataformas permitem que os colaboradores registrem estratégias e processos, evitando a necessidade de recomeçar do zero caso alguém deixe a empresa.
Acredito que, no curto e médio prazo, a IA não substituirá pessoas, mas haverá uma redução natural dos times. O conhecimento será cada vez mais registrado em plataformas que permitirão consultas rápidas e precisas.
Se você não quer ficar para trás, acompanhe essas inovações. Muitos profissionais acima de 40 anos enfrentam dificuldades com análise de dados, enquanto os mais jovens, entre 20 e 30 anos, dominam essa habilidade com facilidade. O motivo? Muitos profissionais experientes ignoram a importância de acompanhar as inovações, que acontecem cada vez mais rápido.
Para tomar decisões difíceis, eu abri mão da pressa e do imediatismo
Brasileira e paulistana que sou, passei muito tempo presa ao imediatismo. Meus alicerces eram agilidade e precisão. Durante uma reunião, em que fui questionada sobre um fato específico, gastei muito tempo tentando explicar um tópico o qual eu não estava preparada, a resposta não foi errada, mas faltou precisão e fatos. Logo depois, um dos executivos que estavam presentes na reunião, veio até a minha sala e me disse que não precisamos ter todas as respostas na ponta da língua, muitas vezes podemos simplesmente assumir que não estamos preparados para responder à questão e dar um prazo para produzi-la. Esse feedback foi muito importante para mim, para reduzir a pressão do imediatismo. E hoje, utilizo este conselho como base para controlar minha personalidade imediatista.
Quando mudei para o Canadá, deixei para trás 32 anos de vida e comecei do zero. Foi a decisão mais difícil que tomei. Para ser sincera, nem eu acreditava no meu potencial. Fui inundada com dúvidas e medos, mas precisei tomar uma decisão com agilidade. Não podemos fugir de decisões importantes. Analisar cenários, abrir mão da pressa e do imediatismo aumenta a assertividade e traz resultados melhores.
No Canadá, tive um choque de realidade ao me deparar com a diversidade cultural
Vivo em um país conhecido por acolher imigrantes. No meu time de compras, temos em torno de 40 pessoas de mais de 15 nacionalidades diferentes: Suíça, Colômbia, Nigéria, Índia, China… É um ambiente enriquecedor, mas, ao mesmo tempo, é extremamente desafiador, a complexidade de acomodar tantas culturas é constante.
Um exemplo é o Ramadã, quando os muçulmanos não comem nem bebem água durante o dia, reservando momentos para oração. Na empresa, temos um quarto de orações, algo que nunca vi no Brasil.
Em fevereiro, os chineses não trabalham durante uma semana para celebrar o Ano Novo Lunar. Já em março, os iranianos folgam por dois ou três dias para comemorar o Nowruz, o Ano Novo Persa.
Ao longo desses oito anos, aprendi que não tinha que me adaptar apenas à cultura canadense, mas a várias culturas dentro desse novo contexto. Aprendi também que, em alguns aspectos, o Brasil está muito à frente do Canadá, como nos sistemas bancários e processos administrativos.
Por outro lado, percebi como a carga horária no Brasil era maior. Aqui, o conceito de work-life balance é real. Sou uma das últimas a sair do escritório, e meu expediente termina às 17h15. No inverno, quando anoitece por volta das 17h, dificilmente aproveitamos a luz do dia, pois quando chegamos no escritório, ainda não amanheceu e quando saímos já escureceu, logo quando o verão chega e os dias com a luz solar passam a ser mais longos, quase ninguém continua trabalhando depois das 15h30, essa adaptação vale para todos, de CEOs a estagiários, afinal todos querem aproveitar os dias ensolarados e quentes.
Valorizo a boa comunicação e a disciplina no meu time
Busco a excelência na comunicação e a disciplina como pilares fundamentais para o sucesso da minha equipe. Acredito que esses pilares não apenas impulsionam o desempenho, mas também criam um ambiente de trabalho harmonioso e produtivo, onde cada membro se sente motivado a contribuir com seu melhor.
Minha abordagem de planejamento estratégico é pautada em uma visão de longo prazo, com metas claras para os próximos cinco anos. Essa perspectiva me permite identificar oportunidades e antecipar desafios, mesmo em um cenário global dinâmico. Recentes medidas adotadas nos Estados Unidos, que tem repercutido na economia canadense, exemplificam a necessidade de sermos flexíveis e estarmos preparados para ajustar nossas estratégias a qualquer momento. Essa adaptabilidade é essencial para manter a competitividade e garantir a sustentabilidade dos negócios.
Ao longo da minha trajetória, aprendi que, embora o conhecimento técnico e a formação acadêmica sejam fundamentais para ingressar no mercado de trabalho, é o desenvolvimento das habilidades comportamentais que verdadeiramente impulsionam o crescimento profissional. As habilidades interpessoais, a capacidade de trabalhar em equipe e a comunicação eficaz são determinantes para o sucesso, especialmente em níveis executivos. Essas competências, que demandam tempo para serem refinadas, revelam o verdadeiro potencial dos profissionais e contribuem decisivamente para a construção de uma carreira sólida.
Para mim, sucesso é sinônimo de paz e tranquilidade
No ano passado, vivenciamos uma transformação significativa quando a empresa onde trabalho foi adquirida por uma outra empresa. Em meio a mudanças estratégicas que envolveram o fechamento de plantas e redução de equipes em departamentos vizinhos, pude constatar a importância de liderar com sensibilidade e clareza, mesmo sem poder oferecer garantias em tempos de incerteza.
Adoto uma postura de liderança que prioriza o diálogo franco e a colaboração, promovendo um ambiente onde o conhecimento é compartilhado abertamente, contribuindo para a resiliência de cada membro da equipe. Hoje, sucesso é ter maturidade para tomar decisões que impactam vidas e, ao final do dia, estar em paz com as minhas escolhas. No início da minha carreira, associava sucesso a dinheiro e cargos altos. Contudo, aprendi que cada posição tem seu preço e que o verdadeiro crescimento requer um investimento contínuo não só em qualificações técnicas, mas também na saúde mental e emocional.
O verdadeiro equilíbrio está em pagar o alto preço do crescimento, mantendo, contudo, a harmonia em todas as esferas da vida. Convido você a refletir: o sucesso, para cada um de nós, pode – e deve – ser medido não apenas por números e títulos, mas pela capacidade de cultivar a paz, a saúde e a realização pessoal.
Tento não me sentir refém de uma boa reputação
Procuro não me definir ou me limitar pela boa reputação que construí ao longo da minha carreira. Minhas decisões são guiadas por valores sólidos e pelo discernimento, não por uma imagem que, muitas vezes, pode ser ilusória. No mundo digital, essa questão se torna ainda mais complexa. É comum recebermos feedback imediato que, ao ser quantificado e comparado com a experiência de outras pessoas, pode afetar nossa autoconfiança. No entanto, aprendi que a verdadeira liderança não se baseia em curtidas e comentários, mas na autenticidade das suas atitudes.
Tenho observado que muitos perfis de sucesso nas redes sociais nem sempre traduzem essa imagem em ações consistentes no cotidiano. Construir uma reputação digital requer tempo e dedicação, mas, infelizmente, ela pode ser desfeita rapidamente. Por isso, incentivo a todos a não se deixarem refém de uma imagem idealizada. Ao focarmos no desenvolvimento de competências reais e na integridade de nossas ações, não apenas construímos uma carreira sólida, mas também inspiramos confiança genuína. Não tomo decisões para manter uma boa reputação. Priorizo valores e discernimento, sem deixar que essa imagem me prenda ou guie minhas atitudes.
Comece com os recursos que você tem – não espere a hora ideal
Meu conselho para os jovens, baseado na experiência daqueles que enfrentaram desafios significativos, é que as pessoas que escolhemos para nos acompanhar e as decisões que tomamos definem nosso percurso profissional e pessoal. O que parece essencial aos 17 anos pode se transformar com o tempo, mas cada fase do desenvolvimento é crucial para o progresso.
Manter a fidelidade aos seus valores, ajustando-os conforme as circunstâncias, é imprescindível. Nossa reputação nasce da união entre convicções autênticas e ações consistentes.
Atualmente, estou lendo A arte de pensar claramente, de Rolf Dobelli, que ressalta a importância de identificar padrões mentais e evitar erros que possam comprometer decisões estratégicas.
No início da minha jornada, talvez eu fosse o que hoje chamam de “nem-nem”. A mudança começou quando dei o primeiro passo, que me ajudou a enxergar o mundo com meus próprios olhos. Começar é importante, mesmo que as condições não sejam ideais. Faça o que pode com os recursos que tem. Não espere a hora perfeita para colocar seus planos em prática. As coisas vão acontecer.
A verdadeira conquista se revela na capacidade de converter adversidades em crescimento e de construir um futuro fundamentado em valores e atitudes que realmente fazem a diferença.