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A única maneira de tornar uma pessoa livre é pela educação

Na coluna desta semana, conheça a história de Alejandro Arruiz - Diretor Geral na Cencosud S.A.

Na coluna desta semana, conheça a história de Alejandro Arruiz - Diretor Geral na Cencosud S.A. (Histórias de Sucesso/Divulgação)
Na coluna desta semana, conheça a história de Alejandro Arruiz - Diretor Geral na Cencosud S.A. (Histórias de Sucesso/Divulgação)
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Histórias de sucesso

Publicado em 29 de julho de 2022 às, 13h24.

Por Fabiana Monteiro  

 

As minhas jornadas pessoais e profissionais sempre foram permeadas por características típicas de uma pessoa inquieta, e que jamais se rendeu para permanecer na zona de conforto. Quando percebi que tinha habilidades e dons para atuar em um setor voltado para a interação com pessoas no mercado varejista, busquei a qualificação necessária para ser o melhor possível na área em que me consolidei como um líder de sucesso e, principalmente, com relações bem estabelecidas e sólidas.  

Nascido em Buenos Aires, em 1975, sou o primogênito de um casal que constituiu família com menos de 20 anos de idade, ou seja, passamos por algumas dificuldades, inclusive tendo que morar com meus avós. Meu pai iniciou os estudos na faculdade, ao passo que precisava trabalhar duro para sustentar a casa, e tudo deu certo quando ele assumiu funções mais importantes, conforme ganhou experiência após os estudos. Essa trajetória me ajudou em termos de inspiração e de valorizar a educação, haja vista que frequentei colégios públicos até o meu ingresso na Pontifícia Universidade Católica da Argentina para cursar Contabilidade, e me formei em 1998.  

Tratava-se de uma universidade com enorme prestígio, especialmente nesse segmento, o que me ajudou a abrir diversas portas. E vale ressaltar que como estudar sempre foi um objetivo primordial para mim, considero como uma condição intrínseca para quem almeja ser um indivíduo com capacidade de prosperar – a única maneira de ter liberdade é pela educação.  

Eu também comecei a trabalhar bem jovem, no Banco Velox, pois queria colocar em prática os meus ensinamentos acadêmicos e, na sequência, entrei na Telefônica da Argentina, com somente 22 anos, para atuar na área financeira. Contudo, decidi mudar o perfil da minha ocupação, pois apesar do êxito obtido dentro da instituição, logo notei o meu perfil e o que eu gostava de fato me conduzia à outra rota. Simplesmente pretendia estar em contato com clientes, sentir o calor humano e o poder da convivência. Na parte administrativa não há muito essa característica, e por isso me propus ao desafio de mudar de carreira, o que me ocasionou a realizar a primeira grande mudança em minha vida. 

 

Coragem para mudar de carreira 

Com essa meta preestabelecida, busquei outras fontes de trabalho, e em uma visita à universidade, surgiu uma oportunidade para jovens profissionais, que a minha atual empresa, a Cencosud S.A, desenvolvia na Argentina. Mandei um currículo, passei por um processo seletivo e fui aprovado. Ao receber a notícia, “minhas pernas tremeram” e, de imediato, avisei a minha esposa. Tive que aprender a lidar com outros profissionais, porque, até então, estava muito vinculado ao setor de finanças. 

A partir de então, nunca mais mudei do eixo de consumidores e clientes, pois, instantaneamente, pude confirmar o meu pensamento de outrora: amava trabalhar com isso, no trato com pessoas, não apreciava somente a parte de números, de finanças, embora tenha estudado bastante para tal. Em função desses fatores, comecei a trabalhar na Cencosud S.A., obviamente, embasado pela minha formação que permite poder aplicar o meu conhecimento em diversas áreas. Embora tenha utilidade maior na parte de contabilidade, engloba também gestão de pessoas, administração, tributação e marketing. 

Iniciei a minha jornada na Cencosud S.A em junho de 1998 no programa de jovens profissionais, no treinamento em lojas, sendo que a cada semana cobria um setor diferente da unidade, como recepção de mercadorias, operador de caixas, repositor de estoque e açougue. A ideia consistia em ter o conhecimento ao menos básico de como operar uma loja de supermercado, estabelecendo contato com clientes, fornecedores, enfim, todos os processos da empresa.  

Iniciei as tarefas sem saber quanto tempo demoraria o treinamento, que no final teve o prazo de apenas três meses. Após esse período, uma vaga foi aberta no setor comercial para ser assistente, e assim comecei a minha jornada no segmento – justamente o que queria, perfeito para as minhas pretensões, com foco no consumidor, na negociação com fornecedores, em desenvolver categorias. 

A partir de então, essa trajetória ganhou outros contornos, ao assumir posições mais importantes, como de analista, de comprador, de gerência de alguns setores, até liderando equipes. Neste ritmo, trabalhei durante dez anos na Argentina, incluindo uma série de aquisições importantes, o que fez à unificação de todas essas empresas, complementando uma operação demasiadamente bem realizada. 

 

O desafio de trabalhar expatriado 

Após esse período na Argentina recebi a ofertada de me mudar para o exterior, em 2008, e foi uma etapa muito importante, pois já havia casado e estava com os filhos pequenos. Com somente 32 anos, fui para o Peru depois da corporação me selecionar para ser o diretor comercial de uma empresa gigantesca do setor de alimentos. Neste desafio, precisei comandar uma equipe de aproximadamente cem pessoas, em uma estrutura erigida com processos enormes, repleta de gerentes, diretores, comerciantes e compradores. 

Destaco que no Peru a parte de comidas preparadas é muito importante, já que se trata de um dos países com a melhor culinária do mundo – o desenvolvimento do setor gastronômico é impressionante. Nós tínhamos dentro da equipe comercial seis chefs especializados, uma situação inédita, e decidíamos juntos as receitas dos produtos a serem repassadas para os clientes. A mudança cultural foi extraordinária para mim, porque quando uma pessoa mora sempre no mesmo país ela restringe seu conhecimento global como um todo.  

Quando cheguei ao Peru percebi as diferenças, havia muita coisa nova das quais não estava habituado. Aprendi demais e amei trabalhar por lá, já que a cultura de serviço ao cliente é diferenciada, inclusive bem melhor em relação ao que eu estava adaptado. Ou seja, o peruano tem esse carinho que é difícil de se encontrar em qualquer outro lugar do planeta. Minha esposa e meus filhos sempre me acompanhavam e aproveitei para viajar pelo país, conhecer novos hábitos e elementos culturais, inclusive rodando pelo interior, onde possuíamos lojas.  

Definitivamente realizávamos um trabalho excepcional no Peru, a companhia melhorou consideravelmente, e eu estava bastante ambientado. Todavia, recebi um convite para me mudar para Salvador, com uma proposta bacana para assumir as operações na capital baiana como diretor comercial, um desafio enorme. Eram muitas empresas que havíamos comprado no Brasil e era preciso saber como implementar a sinergia, incorporando todo o negócio.  

À época, sequer falava o português corretamente, então a primeira atitude foi me dedicar diariamente às aulas do idioma. No começo foi bem difícil, principalmente nos três primeiros meses – uma coisa é falar parcialmente o idioma para interagir socialmente, porém para aplicar no corporativo, assinar contratos, dialogar com colabores, é essencial dominar a língua para se comunicar da maneira adequada. Trabalhava o dia inteiro, mas chegou um momento em que falava português quase perfeitamente – neste período minha família veio ao Brasil e eles passaram pela mesma dificuldade. Mas meus filhos aprenderam mais rápido e melhor que eu. Falar como brasileiros nativos, algo que me enche de orgulho por se tratar de um patrimônio valioso. Saber falar inglês, português e espanhol é fundamental, especialmente no eixo latino-americano, e a melhor forma de se aprimorar é o empenho nos estudos.  

Assim, morei na Bahia por quase dois anos, para depois assumir como diretor-comercial em São Paulo também. Mas, em 2018, fui diretor-geral de uma empresa chamada Bretas, com sede em Goiânia, com filial em Belo Horizonte. Portanto, viajava bastante neste eixo São Paulo, Goiânia e BH, permanecendo neste sistema até dezembro de 2021, antes de regressar para Buenos Aires.  

No Brasil ocupei duas posições: diretor-comercial, e a partir de 2018 diretor-geral da Bretas em que precisei desempenhar uma função deveras importante. Conseguimos reverter resultados insatisfatórios, reposicionando-a no mercado, colocando tudo nos eixos. Trabalhamos arduamente, durante quatro anos intensos. Tudo isso em meio à pandemia, o que alterou o plano de todo mundo – no meu caso, viajava todas as semanas e, repentinamente, precisei permanecer alocado na capital paulista. Inclusive, o maior projeto o qual participei foi durante a gestão na Bretas, como líder da operação. Estava à frente da área de core business, com muitos desafios a serem superados, mas com resultados que vieram com muito esforço e dedicação de todas as equipes envolvidas. Sem dúvida, marcou como o grande desafio da minha carreira até então – costumava ouvir que seria impossível de implementar as mudanças necessárias, mas com modelos disruptivos logramos o sucesso almejado.  

 

A importância de saber se reinventar  

Quando estava com 22 anos, trabalhando na Telefônica, senti a insatisfação por não ser o meu perfil. Quando me deparei com o anúncio da vaga no supermercado Jumbo no cartaz da universidade e me candidatei, estava ciente de que poderia ser um “divisor de águas”. Outro ponto de suma importância foi quando aceitei sair do meu país. Nós tínhamos operações na Argentina e no Chile somente, mas a companhia pretendia expandir para mais uma nação sul-americana.  

Neste momento, houve a compra de empresas tanto no Peru quanto no nordeste brasileiro, praticamente ao mesmo tempo. Desta maneira, ponderei como era interessante desenvolver o meu trabalho no exterior – eu já era gerente, mas essa tomada de decisão representou uma saída da zona de conforto, ainda bastante jovem. Contudo, com dez anos de experiência e ainda amparado por uma equipe competente. Foi a melhor decisão que tomei, pois abriu as portas para aprender novas coisas, inclusive para a minha família.  

Já no campo acadêmico, havia a questão de repensar sobre qual seria o foco. Sempre gostei de economia e de temas correlatos, e considerava a carreira de contador como algo muito prático. Era um pensamento de quando eu estava com 16, 17 anos, não foi exatamente um planejamento a longo prazo, o que viria a se comprovar, posteriormente, ao me encontrar no segmento comercial. Em minha primeira experiência, como estagiário no Jumbo, ao promover uma campanha de bebidas, pude contemplar a felicidade dos consumidores, perceber como seria feliz se continuasse nessa trajetória. Essa interação com o cliente, vislumbrá-lo feliz com o meu projeto, foi fantástico.  

 

As habilidades de um autodidata  

Quando me indagam se há uma pessoa específica que me acompanhou em termos de mentoria costumo alegar que sempre fui bastante autodidata nesse sentido. Na minha mente, as ideias surgem de forma clara, de como pretendo executar determinado projeto. Desde criança sentia que estudaria algo relacionado à Economia e, posteriormente, a certeza de que ingressaria na área comercial de consumo massivo, no setor varejista. 

Evidentemente, tive muitos chefes na Cencosud e cada um deles contribuiu muito para a minha evolução profissional. Ao menos cinco pessoas, todas da empresa, desempenharam papéis fundamentais para que chegasse à posição em que me encontro hoje – de alguma maneira exerceram essa função de mentoria. Sempre me inspirei nesses indivíduos e quando comecei a minha carreira percebia como eles colocavam os consumidores no centro das atenções, priorizando-os acima de tudo.  

Uma dessas pessoas é o Horst Paulmann que é o dono da Cencosud. Ele é sensacional, o que mais conhecia sobre os negócios desde o início, extremamente inteligente e com visão voltada para o consumidor. Mesmo como proprietário de uma multinacional de varejo desse porte, se alguém parasse ele na loja para perguntar algo, ele dedicava o tempo que fosse necessário para resolver o problema do cliente imediatamente. A lógica é simples: se uma pessoa tem um empecilho, outras mil devem se encontrar em apuros também, ou seja, ele aplicava esse conceito de solucionar o imbróglio, utilizando o exemplo primário.  

Além disso, havia a obsessão pelo produto, a limpeza das lojas, algo que representava toda a cautela com o negócio. Ele me influenciou e a outros diretores do grupo pelo exemplo, conhecimento e dedicação perante o consumidor. E eu não tinha tanto contato com ele no começo, mas fazia questão de observar sua atuação quando ele estava na Argentina.  

 

 

Busque ser o melhor em sua área de atuação 

Pensar que a vida é fácil, enriquecer sem esforço, deixando de estudar e se dedicar, simplesmente não acontece. Penso que o indivíduo deve escolher algo para realizar, e buscar ser o melhor naquilo que se propõe, independentemente da área de atuação. Estudar e se manter atualizado são fatores primordiais para evitar armadilhas e a famigerada zona de conforto.  

É preciso imprimir paixão em seu trabalho – sem a vontade de progredir, não há sentido em continuar no negócio. Se o chefe pede algo, tente concretizar algo a mais, demonstre motivação, caso contrário, busque mudar de setor, alterar o rumo da carreira. Eu fiz esse movimento duas vezes até encontrar o meu verdadeiro caminho, até sentir prazer em executar as minhas tarefas.  

Outro ponto fundamental aborda a relação com os seus pares – eu me considero um excelente colega e amigo de quem está ao meu lado na companhia. É importante valorizar as interações pessoais para impactar positivamente na entrega de resultados positivos com mais velocidade e sinergia.  

O novo líder não deve pensar que somente estudar basta para ser um gestor bem-sucedido. Ele deve possuir, obviamente, skills acadêmicos, e espaço para atuar com empatia que considero muito relevante. Quando penso em um legado, quando estiver nos cinquenta anos, gostaria de saber que as pessoas gostam de estar comigo, de ser reconhecido por ser uma pessoa altruísta, agradável, justa, capaz de transmitir coisas boas para equipe. E isso não é fácil – o mundo contemporâneo é complicado, acelerado.  

Foi muito importante ter recebido inúmeros feedbacks de colegas sobre como era prazeroso trabalhar ao meu lado, compor times comigo. A pessoa não pode estar permanentemente estressada, com a mente ruim, operando sob pressão extrema, pois desta maneira torna-se inviável extrair o melhor da equipe.  

Primeiro deve-se inspirar os liderados. O líder, portanto, posiciona assertivamente os objetivos, acompanhando, se envolvendo, mas sem jamais interferir em demasia na autonomia dos profissionais. Além disso, quem está à frente, deve prover ferramentas para que as pessoas consigam resultados, e também fornecer os feedbacks aos colaboradores, com o propósito de gerar integração entre os funcionários e a empresa – engajar essas pessoas deriva em melhor qualidade na relação entre indivíduos e instituições.   

Vivi em países e cidades distintas e, ao analisar os diferentes modelos e estruturas, corroboro a tese de que para se alcançar um objetivo é preciso conhecê-lo muito bem. Ao se dirigir a uma pessoa, torna-se imprescindível declarar qual é a finalidade do projeto, proporcionando todas as ferramentas e fomentando a liberdade para que o profissional execute o plano com o acompanhamento necessário, com o intuito de que o seu potencial seja explorado a contento.  

 

Dedique-se e faça escolhas com sabedoria 

O jovem precisa pensar com carinho sobre o que quer fazer da vida – se é algo mais técnico, lidar com pessoas, e a partir deste ponto elabora-se o plano de carreira. Há de se saber escolher, mas é preciso dedicar tempo nesta etapa para não cometer um erro que possa acarretar em dificuldades no futuro, caso no desejo de empreender, a transição de carreira desperte.  

Enfatizo: é preciso estudar aquilo que você gosta e buscar ser o melhor nessa área. Não há vida fácil sem estudos, trabalhando pouco, com pouca dedicação. Sobretudo, colocar em prática e ter prazer na profissão escolhida são diferenciais, assim como sempre fazer mais que esperam de você. Se há uma reunião agendada, prepare-se, evite ser egocêntrico, aborde o assunto com abrangência e assertividade.  

Com a tecnologia, tudo mudou. O digital impactou diretamente os negócios – precisamos estar atentos aos concorrentes, e isso exige capacitação para ser competitivo em um mercado que se movimenta com uma velocidade impressionante. As novas gerações detêm mais facilidade em assimilar tais habilidades, pois nascerem dentro desse contexto. Evitar o comodismo é um atalho para estar um passo à frente dos demais. 

 

Oportunidades e gratidão 

Sou muito grato pelas oportunidades que tive, e principalmente à minha família – jamais teria angariado tamanho sucesso sem o respaldo da minha esposa, Lucia Ochoa, e dos meus filhos, Rocio e Maximo Arruiz. Eles me acompanharam em minhas jornadas continente afora, em diferentes cidades, adaptando-nos às diferenças culturais, com grandes desafios.   

Contei com muitas oportunidades, e tive, sim, um pouco de sorte. Além disso, jamais duvidei ao arriscar quando precisei sair da zona de conforto para aceitar desafios complexos. É importante pensar em que lugar você quer estar daqui a dez ou vinte anos, e conseguir lograr essa meta. Penso que trabalhar com pessoas e culturas diferentes é uma forma espetacular de incrementar a carreira.  

A única maneira que torna uma pessoa livre é pela Educação"