Gestão Fora da Caixa
Publicado em 27 de julho de 2015 às 12h16.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 07h59.
Porque somos brasileiros.
Sim, o desejo ansioso que temos de acabar com esse clima de incertezas em relação ao futuro e encontrar uma pessoa que seja capaz de verdadeiramente nos representar e, em nosso lugar, liderar o fim da crise vem de aspectos essenciais de nossa cultura. Assim como o desejo de que esse líder represente a nação e nos proteja, em troca, oferecemos nossa lealdade e aceitamos que ele tenha um status superior ao nosso.
Porém, esse líder não pode simplesmente acabar com a crise e as incertezas do jeito que ele quiser. Ele precisa fazer isso de forma estruturada, criando leis e regulamentações fortes que garantam o bom funcionamento da sociedade e da economia, sem deixar de lado a criatividade e a atenção ao momento presente para lidar com os imprevistos e as mudanças que sempre acontecem ao longo do caminho. Além disso, o líder precisa trabalhar para garantir um equilíbrio adequado entre um país competitivo e um país que ofereça boa qualidade de vida à população. Outro equilíbrio importante para sua liderança é respeitar as tradições e as coisas que funcionaram até aqui com as novas ideias e abordagens mais modernas (não pode estacionar no tempo e nem ser tão disruptivo).
Esses comportamentos ou visão de mundo, às vezes claros para nós e às vezes nem tanto são características que revelam aspectos importantes de nossa cultura e como ela nos diferencia da cultura de outros países.
Geert Hofstede é reconhecido mundialmente como uma das pessoas mais influentes do mundo quando o assunto é cultura. Ele desenvolveu uma metodologia onde a cultura de um país, de uma organização ou de um grupo de pessoas é identificada através de 6 dimensões. Com a evolução e aprofundamento dessa metodologia, hoje temos acesso a uma rica base da dados para conhecer melhor os as aspectos culturais essenciais de cada sociedade.
Conhecer as 6 dimensões e os resultados de cada país nos dá uma visão completamente diferente e ampliada. Por exemplo, uma das dimensões trata do individualismo versus coletivismo, nessa dimensão, o Brasil possui uma cultura coletivista, onde valoriza-se o “nós”, a família é toda a família (pais, irmãos, filhos, avós, tios, primos, cunhados, amigos chegados, cachorro…) e é esperado que ela apoie seus membros. Já os Estados Unidos tem uma cultura individualista, onde valoriza-se o “eu”, a família é reduzida (pais e filhos) e é esperado que a pessoa se vire e consiga as coisas pelo seu mérito, sem ajuda.
Outro exemplo curioso, agora sobre a dimensão que trata da distância de poder. Países com alta distância de poder aceitam que exista uma ordem hierárquica social que diferencie as pessoas e não é necessária nenhuma justificativa para essas diferenças. No Brasil, país com nível alto de distância de poder, é comum que as crianças sejam convidadas a sair de um ambiente quando a conversa é “só para adultos” e desde cedo aprendemos que existe essa diferença social. Na Holanda, país com baixo nível de distância de poder, é comum que a conversa seja adaptada, independente do assunto, para que a criança possa fazer parte. Um fato curioso aconteceu na Holanda com o Fernando Lanzer, um colega nosso da Corall, que é também um grande estudioso sobre cultura, autor de livros e atua como consultor nessa área em diversos países. Ele conta que um dia um funcionário da prefeitura tocou a campainha de sua casa para avisar que iriam construir um parquinho para as crianças ali no bairro e o funcionário gostaria de saber quais brinquedos os filhos dele mais gostavam. Prontamente, o Fernando começou a responder, mas o funcionário o interrompeu dizendo: “o Sr. poderia chamar os seus filhos? Eu gostaria de conversar com eles para saber a opinião deles.”
Para conhecer melhor alguns aspectos importantes sobre a cultura do Brasil, o site oficial do Hofstede disponibiliza os resultados do país em cada uma das 6 dimensões:
Olhando as 6 dimensões, começa a ficar interessante entender e comparar as diferenças entre os países e como elas influenciam a forma como eles lidam com a crise, com o futuro, com a maneira de entender a política ou a atuação do governo. Também é interessante compararmos a influência na cultura das organizações, como elas são estruturadas, como as decisões são tomadas, as diferenças de salários e benefícios entre os cargos, a forma como planejam a estratégia, lidam com os resultados ou renegociam as metas, principalmente no Brasil, onde convivemos com grandes empresas nacionais e multinacionais.
Uma comparação interessante, com 2 países de culturas muito diferentes: Estados Unidos e Holanda.
Podemos julgar um americano egoísta, mas ele pode estar sendo apenas americano. Ou, podemos elogiar um holandês que respeita tradições e ideias diferentes muito diferentes das dele, mas ele pode estar sendo apenas holandês.
Uma outra comparação interessante, agora com 2 países próximos: Argentina e Chile.
As pesquisas sobre a cultura das sociedades e as dimensões do modelo do Hofstede, nos ajudam a entender um pouco melhor nosso comportamento cultural no Brasil diante da crise que estamos enfrentando.
Temos compartilhado em diversos artigos nesse Blog sobre como a crise é uma grande oportunidade de evolução. Talvez, poderíamos aproveitá-la, também, para repensarmos a nossa cultura em nossa sociedade, em nossas famílias, em nossas organizações e instituições, ao invés buscarmos um novo “salvador da pátria” . Qual seria o próximo movimento de evolução que faria sentido? Que aspecto dessa cultura necessitaria mais urgentemente de uma transformação para uma sociedade mais saudável? Se o país fosse um ser humano e você um acupunturista, em qual parte do corpo você colocaria uma ou duas agulhas para proporcionar um equilíbrio saudável no corpo todo?