Educação do consumidor e pressão dos investidores: caminhos para a nova economia
Varejo e setor financeiro podem contribuir para a construção de um modelo econômico mais justo e sustentável
Publicado em 17 de fevereiro de 2021 às, 20h08.
Já está claro para uma grande parte das pessoas, dos empreendedores, dos empresários e dos formadores de opinião que os critérios ambientais, sociais e de governança (da sigla em inglês, ESG) vieram para ficar. Mas ainda há quem duvide dessa afirmação e ache que essa é uma tendência que logo deve ser trocada por outra. No Sistema B, acreditamos desde a nossa fundação que esse é um passo definitivo, sem volta e, cada vez mais, necessário.
Mais do que certificar empresas que querem ser B - ou seja, comprometidas não só com a viabilidade econômica e lucro dos seus negócios, mas com o impacto socioambiental positivo e em trazer benefícios a todos os seus públicos - também temos mostrado por meio de ferramentas, programas e campanhas que esse é um caminho possível e necessário. Uma das portas de entrada para empresas interessadas em ser B é o Caminho +B, programa que permite à empresa conhecer melhor a si mesma, medir, gerenciar seu impacto socioambiental e engajar o público interno nessa jornada.
Analisando alguns dados, conseguimos mapear de onde vêm as principais forças que estão movendo as empresas e buscarem esse "caminho B". De 2017 a 2020, por exemplo, vimos que dois setores se destacam na busca pelo programa: varejo e financeiro (cada um responde por 17% da busca pelo Caminho +B). Isso nos comprova que esses dois segmentos já se atentaram que consumidores e investidores procuram negócios atentos e praticantes dos valores de uma nova economia.
Em uma economia até então movida essencialmente pelo lucro e pelo benefício dos acionistas, ter agentes financeiros interessados em empresas de impacto socioambiental positivo é, sem dúvida, uma contribuição para o amadurecimento do setor. Apesar de ser uma tendência recente no Brasil, o setor financeiro tem buscado não só opção de investimentos de impacto, como também tem se comprometido com sua transformação, mesmo com algumas inconsistências.
Ainda é o começo de uma jornada, a decisão cabe muito mais aos gestores e ter uma legislação para o tema iria contribuir demais para que o ESG se expandisse. Mas já vemos empresas em busca de métricas ambientais que mostrem seu relacionamento com o meio ambiente, seu nível de dependência de recursos naturais e números que façam o investidor compreender suas potenciais preocupações em relação a direitos humanos, relações trabalhistas, comunidades e outros públicos impactados por suas operações e negócios. Além desses aspectos, já existe no mercado um reconhecimento de que companhias com boa governança são mais confiáveis e possuem processos que mitigam a possibilidade de ceder à corrupção ou a outros comportamentos condenáveis.
Essas demandas fazem com que o meio corporativo comece a buscar métricas únicas, saiba calibrar parâmetros, ver o que é importante medir ou não para sacramentar seu comprometimento com as práticas ESG. Quando o ecossistema financeiro olha com mais atenção para o tema, vemos emergir a busca por metodologias únicas e movimentos como o da CVM, que começa a se questionar sobre a exigência do ESG em prestações de contas e sobre a hierarquia entre impacto e lucro. Ainda é um começo e precisamos evoluir muito nesses critérios, mas é válido ter agentes financeiros começando a se ater a esses pontos.
E o meio corporativo está atento à essa crescente demanda. Olhando de novo para os dados do Sistema B, ao analisarmos os números do BIA (B Impact Assessment) - plataforma online, confidencial e gratuita responsável pela mensuração e gerenciamento do impacto socioambiental de cada tipo de modelo de negócio), vemos esse crescimento. Em 2018, tivemos 116 submissões e 1.010 registros de empresas na plataforma. Em 2020, fechamos com 168 submissões e 2.594 registros de empresas interessadas em analisar seus dados. Ou seja, as empresas estão buscando cada vez mais os caminhos para entender seu funcionamento e seu impacto. Elas querem prestar conta e saber como melhorar. Apesar do crescimento, ainda é pouco para um universo imenso de empresas no país.
Além do interesse do mercado financeiro no assunto, outro público que vem, cada vez mais, olhando para a questão é o consumidor. Recentemente, o estudo "Mudanças climáticas: a percepção dos brasileiros", realizada pelo Ibope Inteligência, Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio) e Programa de Comunicação de Mudanças Climáticas da Universidade de Yale, dos Estados Unidos, mostrou que 95% dos brasileiros entrevistados acreditam que as mudanças climáticas já são sentidas atualmente. E não só: os problemas causados por ela podem trazer danos para a geração atual. 32% dos entrevistados disseram que a responsabilidade sobre o tema é das empresas. Isso nos dá pistas de que é pelo varejo, no contato direto com o consumidor, que vamos contribuir para que tenhamos um público educado para esse tema, atento ao que cobrar de uma marca e pedindo produtos de empresas de impacto na gôndola.
Ter esses dois setores liderando o acesso a programas do Sistema B não é um acaso. É o caminho (que está bem no início) para construir um futuro com uma economia possível, sustentável e que coloque as pessoas e o Planeta em seu centro.