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IA e a próxima revolução nos negócios: services-as-softwares

O desafio não está mais em construir IA. Está em colocar a IA para trabalhar

Primeiro MBA em Inteligência Artificial para Negócios do Brasil está com as matriculas abertas (Getty Images/Reprodução)

Primeiro MBA em Inteligência Artificial para Negócios do Brasil está com as matriculas abertas (Getty Images/Reprodução)

Publicado em 28 de julho de 2025 às 13h42.

É difícil acompanhar todos os movimentos puxados pela Inteligência Artificial. Embora esses ainda sejam os primeiros capítulos dessa nova era, tão transformacional quanto a Internet e o smartphone, são muitos os setores e mercados tocados por essa tecnologia.

Um movimento em especial, no entanto, vem chamando a atenção de startups e empresas de tecnologia. Um movimento que pode mudar (ou já mudou) tudo o que entendemos como produto, como software e como entrega de valor. Estou falando da mudança de Software as a Service (Saas) para Services-as-Softwares.

Por mais de duas décadas, o modelo SaaS foi o padrão-ouro da tecnologia empresarial e definiu o jeito como companhia compram e usam tecnologia. A lógica era simples: você contratava uma ferramenta, pagava por licença/usuário, e contava com um time interno para operar o sistema, extrair relatórios, rodar processos.

As empresas de software entregavam a interface. O trabalho, propriamente dito, ficava com os colaboradores da empresa contratante.

Mas algo importante começou a mudar nos últimos 18 meses. Startups nascidas já na era da inteligência artificial generativa deixaram de vender a ferramenta e passaram a vender o serviço completo. Elas não entregam software: entregam o trabalho feito.

É o que Ashu Garg e Jaya Gupta, da Foundation Capital, chamaram de Services-as-Software, em ótimo artigo publicado no início deste ano. No texto, eles explicam como está ocorrenda uma inversão estrutural do que conhecemos como produto digital.

Não estamos falando aqui de melhorias incrementais, nem de automações pontuais. Essas novas empresas não vendem assistentes para acelerar o trabalho de um humano. Vendem sistemas inteiros que substituem o humano. Agentes de IA que assumem o papel de vendedores (os chamados AI SDRs), assistentes jurídicos (AI paralegals), engenheiros de confiabilidade (AI SREs) ou mesmo coordenadores de compras, contas a pagar, suporte técnico.

O que isso muda, na prática? Quase tudo. No modelo anterior, a vantagem competitiva estava no código: como o software era escrito, a interface, a arquitetura etc. Hoje, com os modelos fundacionais (GPT-4, Claude, Gemini) acessíveis a qualquer empresa, a competição se deslocou para outro lugar.

Quando todos usam a mesma base tecnológica, o diferencial não é o que se constrói, mas como aquilo é encaixado na realidade do cliente. O diferencial estratégico migrou do core para a borda. Está na capacidade de adaptar um sistema às particularidades de cada organização: seu vocabulário interno, seus dados bagunçados, seus fluxos não documentados e suas exceções invisíveis.

Nesse novo jogo, integração vira produto. O engenheiro mais estratégico não é o que escreve o modelo no laboratório. Agora, é o que senta ao lado do time do cliente, mapeia seus quirks (as manias operacionais), transforma conhecimento tácito em parâmetros configuráveis e faz com que a IA funcione com dados reais, imperfeitos, imprevisíveis.

Pré-venda e pós-venda colapsam: ninguém mais assina contrato com base em promessa. O cliente quer ver a IA em funcionamento, no mundo real, antes de pagar qualquer centavo. Isso encarece a operação, estica o ciclo de vendas. Mas, quando bem feito, cria uma barreira quase intransponível para novos entrantes.

O impacto chega também no modelo de precificação. A lógica de 'seats' pensada para um mundo em que o software era apenas uma ferramenta, perde o sentido. No Services-as-Software, o software não apoia o trabalho, ele é o trabalho. E quem faz o trabalho, recebe por tarefa ou por resultado. Mesmo que esse resultado seja torto, híbrido, bagunçado.

Como mostrou um estudo recente da AlixPartners, citado pela Business Insider, mais de 100 empresas públicas de software estão sendo pressionadas pela mudança de expectativa dos clientes: pagar por acesso deixou de fazer sentido quando o software virou um funcionário digital.

Não é difícil entender o tamanho da oportunidade. Se o SaaS tradicional disputava um pedaço do orçamento de tecnologia, o Services-as-Software começa a morder o que antes era reservado a serviços. Segundo a Foundation Capital, esse bolo representa US$ 4,6 trilhões apenas no ano um dessa transição.

A mensagem, para fundadores e executivos, é clara. O desafio não está mais em construir IA. Está em colocar IA para trabalhar, com tudo o que isso implica: sujar as mãos nos dados do cliente, aceitar que cada integração é única, entender que toda entrega é co-construída. Startups que dominarem esse novo ciclo — implementação, adaptação, entrega — vão deixar de disputar espaço no mercado SaaS e começar a capturar um pedaço muito maior da economia real.

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