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Quem fez a sua roupa?

Movimentos globais e marcas locais querem mudar a forma como você pensa e consome moda

Oriba: camisas com selo Better Cotton Initiative (Henrique Resende/Divulgação)
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Ivan Padilla

Publicado em 8 de outubro de 2019 às 19h07.

Última atualização em 9 de outubro de 2019 às 17h19.

Se você acompanha moda , ou acompanha pessoas que acompanham moda, já viu posts do Instagram com a hashtasg #QuemFezMinhasRoupas. A marcação está em mais de 40 000 fotos de brechós, de funcionários de empresas têxteis ou apenas de consumidores conscientes sobre a necessidade de um uso mais racional das roupas.

A hashtag é apenas uma das ações do movimento Fashion Revolution, que atua em mais de 100 países. O grupo incentiva atransparência, sustentabilidade e ética na indústria da moda por meio da conscientização, mobilização e educação. Sua missão é bem clara: eles querem mudar radicalmente a forma como as roupas são produzidas, consumidas e descartadas.

No Brasil, o movimento atua há cinco anos. Nesta próxima quinta-feira terá início o Fórum Fashion Revolution, em São Paulo, com palestras, cursos, rodas de conversa, exibições de filmes e workshops com consumidores, empresas e profissionais da moda. A programação completa do evento, que acontece nos dias 10 e 11 de outubro, está aqui.

Este ano foram selecionados 58 trabalhos para serem apresentados no Fórum, que será realizado na Unibes Cultural. A programação foi dividida em três vertentes: Mudanças na Indústria, Mudanças Culturais e Mudanças Políticas. Ao longo dos dois dias, serão apresentados temas como tecnologia aplicada à transparência, roupas modulares como alternativa para o consumo, inovação em tecidos e cases de negócios responsáveis.

O Fashion Revolution foi criado por um grupo de profissionais da moda depois do desabamento do edifício Rana Plaza, em Bangladesh, que causou a morte de 1 134 trabalhadores da indústria de confecção, além de 2 500 feridos. A tragédia aconteceu no dia 24 de abril de 2013, e as vítimas trabalhavam para marcas globais em condições para lá de precárias.

“O Fashion Revolution promete ser uma das poucas campanhas verdadeiramente globais a surgir neste século”, diz Lola Young, embaixadora da Ethical Fashion Forum, ONG que atua também na sustentabilidade na moda.

Co-fundadora do movimento, Orsola de Castro afirma: “Nós queremos que você se pergunte: ‘Quem fez minhas roupas?’. Essa ação irá incentivar as pessoas a imaginarem o fio condutor do vestuário, passando pelo costureiro até chegar ao agricultor que cultivou o algodão usado nos tecidos. Esperamos aumentar a conscientização de que a compra é apenas o último passo de uma longa jornada que envolve centenas de pessoas.”

Indústria poluente

A indústria da moda é considerada a segunda mais poluente do mundo, depois do petróleo. Os principais problemas são o descarte e os recursos necessários para produção das peças. A produção de poliéster, afibra sintética mais usada na indústria têxtil em todo o mundo, requer estimados 70 milhões de barris de petróleo por ano e demora dois séculos para se decompor, segundo reportagem da BBC. A viscose, fibra feita de celulose, leva à derrubada de 70 milhões de árvores todos os anos.

Apesar de natural, o algodão é a fibra que mais demanda o uso de substâncias tóxicas em seu cultivo no mundo - 24% de todos os inseticidas e 11% de todo os pesticidas, com impactos no solo e na água. Nem o algodão orgânico escapa: uma camiseta pode precisar de 2 700 litros de água para ser confeccionada.

Com todo esse impacto, esta é uma indústria que só cresce. Estima-se que até 2030 a produção global de roupas aumentará 81%, chegando a 102 milhões de toneladas.

Existe um indicador que mede o progresso em medidas sustentáveis adotadas pela indústria da moda chamado Pulse Score, elaborado pelos institutos Global Fashion Agenda, Boston Consulting Group e Sustainable Apparel Coalition. No relatório de 2019, essa medida cresceu quatro pontos em relação ao ano anterior, de 38 para 42 pontos,  de um total de 100.

Boa notícia, certo? Nem tanto. Na medição passada, esse aumento havia sido de seis pontos. Ou seja, o ritmo de melhoria diminuiu em um terço

Marcas locais - e sustentáveis

Movimentos globais são essenciais para dar visibilidade ao tema, criar uma consciência coletiva e, consequentemente, promover a melhoria desses índices, mas a verdadeira revolução depende da ponta do processo, ou seja, de consumidores conscientes e marcas locais engajadas na produção sustentável dos vestidos e das camisas que usamos no dia a dia. E, nisso, bons exemplos não faltam.

A Oriba é uma marca masculina criada em São Paulo. “Durante um ano trabalhamos apenas no e-commerce, mas as pessoas não acreditavam que nossas camisas, ‘mais baratas que marcas conhecidas’, eram feitas de nobre algodão pima peruano”, diz Paulinho Moreira, um dos sócios-fundadores. “Desde o começo trabalhamos apenas com tecidos certificados de diversas formas de redução do impacto ao planeta.”

Segundo Paulinho, 98% do portfólio da marca têm o selo Better Cotton Initiative (BCI), que garante práticas de produção mais justas a todos os envolvidos. Eles também trabalham com outras matérias-primas sustentáveis, como algodão e pet reciclados e algodão orgânico. “ O mais sustentável é escolher materiais naturais que tenham alta durabilidade para reduzir o descarte de produtos acabados, que é onde está o grande problema da geração de lixo na indústria da moda”, afirma.

Oriba (Henrique Resende/Divulgação)

Paulinho continua contando a evolução da marca. “Depois dosprimeiros meses no mercado, percebemos que, ao fazer apenas peças básicas de qualidade e praticar um valor justo a todos os envolvidos na cadeia de produção, conseguimos propor uma sustentabilidade mais ampla para combater o consumo desenfreado atual.”

Após a experiência com o comércio online, os sócios abriram uma loja pop-up em Moema, em troca de pagar o IPTU da propriedade. “Gerávamos fluxo de pessoas com eventos de arte e gastronomia. Vendemos muito bem, nos divertimos e enxergamos uma oportunidade nas antiquadas lojas físicas”, brinca Paulinho.

O passo seguinte foi abrir uma loja no bairro de Pinheiros com cafeteria e espaço colaborativo de experiências com yoga, exposições e workshops. Depois, vieram as outras duas, uma nos Jardins e outra no shopping Villa Lobos, também em São Paulo. No mês passado a Oriba vendeu 3 500 peças. O plano é abrir mais cinco lojas híbridas com cafeterias até o fim de 2020.

A Insider é uma marca de camisetas, undershirts (camisetas que absorvem o suor para usar debaixo das camisas) e cuecas que atua apenas no e-commerce. “Trabalhamos com tecidos brasileiros, porém a tecnologia e origem das fibras, chamada Lenzing, é austríaca”, contaYuri Gricheno, um dos dois sócios da marca. E explica: “São fibras de celulose muito superiores ao algodão em diferentes aspectos, como conforto, durabilidade e sustentabilidade. A Lenzing tem diversos tipos de certificados e prêmios em tecnologia e inovação. A fibra é rastreável, e assim é possível saber em qual fábrica foi produzida.”

“Meio ambiente e sustentabilidade são assuntos muito importantes para a Insider”, continuaCarol Matsuse, a outra sócia da marca e namorada de Yuri. “Buscamos uma forma sustentável de criar roupas funcionais, que ajudem na regulação da temperatura corporal e absorção do suor.Ser uma marca de moda e sustentabilidade está deixando de ser algo apenas cool. É uma necessidade do mundo atual.”

Os resultados por enquanto são promissores: a marca vendeu 10 000 unidades no último mês. A meta é fechar o ano com 100 000 itens vendidos e 300 000 em 2020.

Roupas e móveis

A VIHE se apresenta como um projeto comuma ideia de sustentabilidade aplicada ao design de produtos. O foco são itens atemporais, clássicos que nunca saem de moda. Na primeira etapa, apresentada em setembro, a produção ficou concentrada em roupas e móveis.

O principal desafio foi trabalhar com jeans, matéria prima que sempre foi taxada como grande vilã do ambiente. A parceira nessa empreitada foi a Vicunha, que recorre a um processo que utiliza menos água que o habitual no processo de fabricação. O resultado final foram peças que não precisam ser lavadas depois de prontas, com cor e aspecto final na origem.

Foram produzidas calças e jaquetas em quantidades limitadas, de apenas 25 peças de cada modelo, com preços médios de R$ 500. A linha de camisaria com tecido em viscose, produzida a partir de madeira de reflorestamento, que atende a altos padrões de proteção ambiental, também teve o apoio da Vicunha.

“Na medida em que consumimos produtos mais duráveis e atemporais, não precisamos consumir tanto”, afirma Henrique Bittencort, estilista por trás do projeto, responsável pela criação e também pela escolha dos principais materiais. “Não estamos falando apenas de moda, mas sim de consumo consciente. Hoje ainda é muito difícil fazer um produto 100% sustentável, mas o desafio foi chegar o mais perto disso.”

VIHE (VIHE/Divulgação)

Além de roupas, o projeto resultou em uma poltrona e uma luminária em madeira freijó maciça com certificado de origem, revestidas com jeans 100% reciclado, o mesmo utilizado na calça e na jaqueta. Para essa linha o parceiro foi a Design Somma.

Um dos maiores problemas da indústria, como já se falou aqui, é o descarte.O diretor criativo Marcelo Barbosa constatou, depois de uma ampla pesquisa sobre a produção de colchas em estilo americano, o grande volume de desperdício de tecidos das grandes confecções. Ele decidiu então criar a Frank, marca que utiliza apenas tecidos não aproveitados e, dessa forma, reduzir o consumo de novas matérias.

As roupas são para mulheres que já investigam a origem dos produtos. A coleção estará na multimarcas Pinga, em São Paulo, a partir de novembro. “Nosso foco é estabelecer parcerias com marcas de médio e grande porte que trabalham com grande volume de descarte”, afirma Marcelo. “Queremos colaborar com essas marcas e assim diminuir o impacto desse lixo. Para a primeira coleção produzimos apenas peças de vestuário, mas queremos fazer acessórios também no futuro, como bolsas, cintos e sapatos.”

Para sua primeira coleção, ele utilizou material doado pela empresária Julia Lee, proprietária das marcas Cheroy e Insp. “Quando escolho os tecidos, tento me despir de preconceitos e usar tecidos que não seriam minha escolha natural. Para isso utilizo a técnica do patchwork.” A combinação de vários pedaços de tecidos numa mesma peça é a assinatura da Frank. “Dentro do nosso escopo de projetos, queremos criar coleções cápsulas para marcas parceiras usando apenas suas sobras.” A primeira coleção da Frank vem com peças únicas e preços que podem chegar a 2 250 reais, como o do vestido dessa foto.

Frank (Frank/Divulgação)

Marcas globais também vem se mexendo na produção de peças mais sustentáveis. Um exemplo é a alemã Hugo Boss. Na temporada passada, a Boss, linha mais jovem da grife,lançou um modelo de tênis feito de folhas de abacaxi. Este ano, inovou com dois novos produtos. Um deles é o Olivenleder®, couro criado com o uso de um agente de curtimento 100% natural e biodegradável, feito a partir das folhas das oliveiras, que normalmente são um resíduo da produção olivícola.

O outro novo material é o chamado traceable wool, uma lã merino rastreável, com a garantia de que todo o processo de fabricação seja meticulosamente supervisionado e possa ser acompanhando desde a origem do tecido até a criação da roupa final. Cada peça traz uma etiqueta para que o consumidor possa identifica-la facilmente. A coleção cápsula com a lã rastreável vem com seis looks, de costumes impecáveis. Afinal, as peças podem ser sustentáveis, mas sem perder a elegância.

Olivenleder: couro criado pela Hugo Boss (Hugo Boss/Divulgação)

Traceable wool: material criado pela Hugo Boss (Hugo Boss/Divulgação)


Esta coluna trará sempre novidades do universo dos negócios da moda. Sustentabilidade, certamente o maior desafio dessa indústria, será um tema recorrente. Conhece alguma marca, iniciativa ou empreitada para promover o consumo consciente de roupas? Escreva paraivan.padilla@abril.com.br.

Se você acompanha moda , ou acompanha pessoas que acompanham moda, já viu posts do Instagram com a hashtasg #QuemFezMinhasRoupas. A marcação está em mais de 40 000 fotos de brechós, de funcionários de empresas têxteis ou apenas de consumidores conscientes sobre a necessidade de um uso mais racional das roupas.

A hashtag é apenas uma das ações do movimento Fashion Revolution, que atua em mais de 100 países. O grupo incentiva atransparência, sustentabilidade e ética na indústria da moda por meio da conscientização, mobilização e educação. Sua missão é bem clara: eles querem mudar radicalmente a forma como as roupas são produzidas, consumidas e descartadas.

No Brasil, o movimento atua há cinco anos. Nesta próxima quinta-feira terá início o Fórum Fashion Revolution, em São Paulo, com palestras, cursos, rodas de conversa, exibições de filmes e workshops com consumidores, empresas e profissionais da moda. A programação completa do evento, que acontece nos dias 10 e 11 de outubro, está aqui.

Este ano foram selecionados 58 trabalhos para serem apresentados no Fórum, que será realizado na Unibes Cultural. A programação foi dividida em três vertentes: Mudanças na Indústria, Mudanças Culturais e Mudanças Políticas. Ao longo dos dois dias, serão apresentados temas como tecnologia aplicada à transparência, roupas modulares como alternativa para o consumo, inovação em tecidos e cases de negócios responsáveis.

O Fashion Revolution foi criado por um grupo de profissionais da moda depois do desabamento do edifício Rana Plaza, em Bangladesh, que causou a morte de 1 134 trabalhadores da indústria de confecção, além de 2 500 feridos. A tragédia aconteceu no dia 24 de abril de 2013, e as vítimas trabalhavam para marcas globais em condições para lá de precárias.

“O Fashion Revolution promete ser uma das poucas campanhas verdadeiramente globais a surgir neste século”, diz Lola Young, embaixadora da Ethical Fashion Forum, ONG que atua também na sustentabilidade na moda.

Co-fundadora do movimento, Orsola de Castro afirma: “Nós queremos que você se pergunte: ‘Quem fez minhas roupas?’. Essa ação irá incentivar as pessoas a imaginarem o fio condutor do vestuário, passando pelo costureiro até chegar ao agricultor que cultivou o algodão usado nos tecidos. Esperamos aumentar a conscientização de que a compra é apenas o último passo de uma longa jornada que envolve centenas de pessoas.”

Indústria poluente

A indústria da moda é considerada a segunda mais poluente do mundo, depois do petróleo. Os principais problemas são o descarte e os recursos necessários para produção das peças. A produção de poliéster, afibra sintética mais usada na indústria têxtil em todo o mundo, requer estimados 70 milhões de barris de petróleo por ano e demora dois séculos para se decompor, segundo reportagem da BBC. A viscose, fibra feita de celulose, leva à derrubada de 70 milhões de árvores todos os anos.

Apesar de natural, o algodão é a fibra que mais demanda o uso de substâncias tóxicas em seu cultivo no mundo - 24% de todos os inseticidas e 11% de todo os pesticidas, com impactos no solo e na água. Nem o algodão orgânico escapa: uma camiseta pode precisar de 2 700 litros de água para ser confeccionada.

Com todo esse impacto, esta é uma indústria que só cresce. Estima-se que até 2030 a produção global de roupas aumentará 81%, chegando a 102 milhões de toneladas.

Existe um indicador que mede o progresso em medidas sustentáveis adotadas pela indústria da moda chamado Pulse Score, elaborado pelos institutos Global Fashion Agenda, Boston Consulting Group e Sustainable Apparel Coalition. No relatório de 2019, essa medida cresceu quatro pontos em relação ao ano anterior, de 38 para 42 pontos,  de um total de 100.

Boa notícia, certo? Nem tanto. Na medição passada, esse aumento havia sido de seis pontos. Ou seja, o ritmo de melhoria diminuiu em um terço

Marcas locais - e sustentáveis

Movimentos globais são essenciais para dar visibilidade ao tema, criar uma consciência coletiva e, consequentemente, promover a melhoria desses índices, mas a verdadeira revolução depende da ponta do processo, ou seja, de consumidores conscientes e marcas locais engajadas na produção sustentável dos vestidos e das camisas que usamos no dia a dia. E, nisso, bons exemplos não faltam.

A Oriba é uma marca masculina criada em São Paulo. “Durante um ano trabalhamos apenas no e-commerce, mas as pessoas não acreditavam que nossas camisas, ‘mais baratas que marcas conhecidas’, eram feitas de nobre algodão pima peruano”, diz Paulinho Moreira, um dos sócios-fundadores. “Desde o começo trabalhamos apenas com tecidos certificados de diversas formas de redução do impacto ao planeta.”

Segundo Paulinho, 98% do portfólio da marca têm o selo Better Cotton Initiative (BCI), que garante práticas de produção mais justas a todos os envolvidos. Eles também trabalham com outras matérias-primas sustentáveis, como algodão e pet reciclados e algodão orgânico. “ O mais sustentável é escolher materiais naturais que tenham alta durabilidade para reduzir o descarte de produtos acabados, que é onde está o grande problema da geração de lixo na indústria da moda”, afirma.

Oriba (Henrique Resende/Divulgação)

Paulinho continua contando a evolução da marca. “Depois dosprimeiros meses no mercado, percebemos que, ao fazer apenas peças básicas de qualidade e praticar um valor justo a todos os envolvidos na cadeia de produção, conseguimos propor uma sustentabilidade mais ampla para combater o consumo desenfreado atual.”

Após a experiência com o comércio online, os sócios abriram uma loja pop-up em Moema, em troca de pagar o IPTU da propriedade. “Gerávamos fluxo de pessoas com eventos de arte e gastronomia. Vendemos muito bem, nos divertimos e enxergamos uma oportunidade nas antiquadas lojas físicas”, brinca Paulinho.

O passo seguinte foi abrir uma loja no bairro de Pinheiros com cafeteria e espaço colaborativo de experiências com yoga, exposições e workshops. Depois, vieram as outras duas, uma nos Jardins e outra no shopping Villa Lobos, também em São Paulo. No mês passado a Oriba vendeu 3 500 peças. O plano é abrir mais cinco lojas híbridas com cafeterias até o fim de 2020.

A Insider é uma marca de camisetas, undershirts (camisetas que absorvem o suor para usar debaixo das camisas) e cuecas que atua apenas no e-commerce. “Trabalhamos com tecidos brasileiros, porém a tecnologia e origem das fibras, chamada Lenzing, é austríaca”, contaYuri Gricheno, um dos dois sócios da marca. E explica: “São fibras de celulose muito superiores ao algodão em diferentes aspectos, como conforto, durabilidade e sustentabilidade. A Lenzing tem diversos tipos de certificados e prêmios em tecnologia e inovação. A fibra é rastreável, e assim é possível saber em qual fábrica foi produzida.”

“Meio ambiente e sustentabilidade são assuntos muito importantes para a Insider”, continuaCarol Matsuse, a outra sócia da marca e namorada de Yuri. “Buscamos uma forma sustentável de criar roupas funcionais, que ajudem na regulação da temperatura corporal e absorção do suor.Ser uma marca de moda e sustentabilidade está deixando de ser algo apenas cool. É uma necessidade do mundo atual.”

Os resultados por enquanto são promissores: a marca vendeu 10 000 unidades no último mês. A meta é fechar o ano com 100 000 itens vendidos e 300 000 em 2020.

Roupas e móveis

A VIHE se apresenta como um projeto comuma ideia de sustentabilidade aplicada ao design de produtos. O foco são itens atemporais, clássicos que nunca saem de moda. Na primeira etapa, apresentada em setembro, a produção ficou concentrada em roupas e móveis.

O principal desafio foi trabalhar com jeans, matéria prima que sempre foi taxada como grande vilã do ambiente. A parceira nessa empreitada foi a Vicunha, que recorre a um processo que utiliza menos água que o habitual no processo de fabricação. O resultado final foram peças que não precisam ser lavadas depois de prontas, com cor e aspecto final na origem.

Foram produzidas calças e jaquetas em quantidades limitadas, de apenas 25 peças de cada modelo, com preços médios de R$ 500. A linha de camisaria com tecido em viscose, produzida a partir de madeira de reflorestamento, que atende a altos padrões de proteção ambiental, também teve o apoio da Vicunha.

“Na medida em que consumimos produtos mais duráveis e atemporais, não precisamos consumir tanto”, afirma Henrique Bittencort, estilista por trás do projeto, responsável pela criação e também pela escolha dos principais materiais. “Não estamos falando apenas de moda, mas sim de consumo consciente. Hoje ainda é muito difícil fazer um produto 100% sustentável, mas o desafio foi chegar o mais perto disso.”

VIHE (VIHE/Divulgação)

Além de roupas, o projeto resultou em uma poltrona e uma luminária em madeira freijó maciça com certificado de origem, revestidas com jeans 100% reciclado, o mesmo utilizado na calça e na jaqueta. Para essa linha o parceiro foi a Design Somma.

Um dos maiores problemas da indústria, como já se falou aqui, é o descarte.O diretor criativo Marcelo Barbosa constatou, depois de uma ampla pesquisa sobre a produção de colchas em estilo americano, o grande volume de desperdício de tecidos das grandes confecções. Ele decidiu então criar a Frank, marca que utiliza apenas tecidos não aproveitados e, dessa forma, reduzir o consumo de novas matérias.

As roupas são para mulheres que já investigam a origem dos produtos. A coleção estará na multimarcas Pinga, em São Paulo, a partir de novembro. “Nosso foco é estabelecer parcerias com marcas de médio e grande porte que trabalham com grande volume de descarte”, afirma Marcelo. “Queremos colaborar com essas marcas e assim diminuir o impacto desse lixo. Para a primeira coleção produzimos apenas peças de vestuário, mas queremos fazer acessórios também no futuro, como bolsas, cintos e sapatos.”

Para sua primeira coleção, ele utilizou material doado pela empresária Julia Lee, proprietária das marcas Cheroy e Insp. “Quando escolho os tecidos, tento me despir de preconceitos e usar tecidos que não seriam minha escolha natural. Para isso utilizo a técnica do patchwork.” A combinação de vários pedaços de tecidos numa mesma peça é a assinatura da Frank. “Dentro do nosso escopo de projetos, queremos criar coleções cápsulas para marcas parceiras usando apenas suas sobras.” A primeira coleção da Frank vem com peças únicas e preços que podem chegar a 2 250 reais, como o do vestido dessa foto.

Frank (Frank/Divulgação)

Marcas globais também vem se mexendo na produção de peças mais sustentáveis. Um exemplo é a alemã Hugo Boss. Na temporada passada, a Boss, linha mais jovem da grife,lançou um modelo de tênis feito de folhas de abacaxi. Este ano, inovou com dois novos produtos. Um deles é o Olivenleder®, couro criado com o uso de um agente de curtimento 100% natural e biodegradável, feito a partir das folhas das oliveiras, que normalmente são um resíduo da produção olivícola.

O outro novo material é o chamado traceable wool, uma lã merino rastreável, com a garantia de que todo o processo de fabricação seja meticulosamente supervisionado e possa ser acompanhando desde a origem do tecido até a criação da roupa final. Cada peça traz uma etiqueta para que o consumidor possa identifica-la facilmente. A coleção cápsula com a lã rastreável vem com seis looks, de costumes impecáveis. Afinal, as peças podem ser sustentáveis, mas sem perder a elegância.

Olivenleder: couro criado pela Hugo Boss (Hugo Boss/Divulgação)

Traceable wool: material criado pela Hugo Boss (Hugo Boss/Divulgação)


Esta coluna trará sempre novidades do universo dos negócios da moda. Sustentabilidade, certamente o maior desafio dessa indústria, será um tema recorrente. Conhece alguma marca, iniciativa ou empreitada para promover o consumo consciente de roupas? Escreva paraivan.padilla@abril.com.br.

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