O Forte Apache contra os smartphones
Somos a última geração que sabe como era a vida antes das redes — se antes sabíamos o valor do tempo, hoje somos iludidos por um mundo virtual infinito
Colunista
Publicado em 20 de novembro de 2024 às 08h00.
“Você já parou para pensar que somos a última geração que sabe como era a vida antes das redes sociais? Antes, sabíamos o valor do tempo e das pessoas, e hoje somos iludidos por um mundo virtual infinito que mostra a vida como se fosse um mar de rosas. Quanta saudade de passar horas na rua brincando com os amigos, de ter toda a família reunida para jantar…”
Recebi um vídeo com crianças brincando e cuja locução foi parcialmente transcrita acima. Tratava-se da divulgação de um novo complexo de atividades para crianças e adolescentes. Eles prometiam um ambiente e uma programação que irão resgatar muitas das experiências de antigamente.
Brincar na calçada, subir em árvores, pular muros ou andar de carrinho de rolimã. Éramos felizes e não sabíamos – ou será que sabíamos? Lembro de brincar na casa de vizinhos de rua sem precisar avisar onde estava. De ir caminhando sozinho para a escola com apenas 9 anos de idade. Era outro mundo!
A única tela disponível na casa era a da televisão – e com apenas quatro canais. Nada de Discovery Kids, Gloob, Cartoon Network ou Nickelodeon. Nada de YouTube, Fortnite ou Roblox. A criançada brincava de verdade.
Sempre é bom lembrar, especialmente em tempos em que quase tudo está digitalizado, que brincar é essencial para o desenvolvimento de habilidades psicomotoras, sociais, afetivas, cognitivas e emocionais das crianças.
Recentemente, li uma notícia sobre a recuperação judicial da empresa que produz o “Forte Apache”, brinquedo que fazia sucesso na minha época. Passava horas posicionando os soldadinhos que ficavam encastelados à espera do ataque dos índios. Confesso que fiquei esperançoso ao saber que o Forte Apache ainda é fabricado nos dias de hoje.
O brinquedo foi inspirado em um forte construído na segunda metade do século 18 no estado do Arizona, nos Estados Unidos. Ele servia de proteção contra os ataques das tribos indígenas da região, entre elas os Apaches. Vale registrar que os índios – que sempre foram vistos como vilões – estavam, na realidade, protegendo o seu território. Mas isso é assunto para outro texto.
Aparentemente, tal qual a cavalaria americana resistia bravamente aos ataques indígenas entrincheirada no Forte Apache, o forte de brinquedo também tem tentado resistir à força avassaladora dos tablets e dos smartphones. Tomara que consiga!
Não sou contra a tecnologia. Ela é essencial e indissociável da vida de todos nós, inclusive das crianças. Sou contra, sim, o seu uso indiscriminado e sem limites. Por maiores que sejam as inovações, elas nunca vão substituir a experiência e os benefícios de subir numa árvore, de chutar uma bola ou de brincar de Forte Apache.
Fernando Goldsztein
Fundador da The Medulloblastoma Initiative
Conselheiro da Children’s National Foundation
“Você já parou para pensar que somos a última geração que sabe como era a vida antes das redes sociais? Antes, sabíamos o valor do tempo e das pessoas, e hoje somos iludidos por um mundo virtual infinito que mostra a vida como se fosse um mar de rosas. Quanta saudade de passar horas na rua brincando com os amigos, de ter toda a família reunida para jantar…”
Recebi um vídeo com crianças brincando e cuja locução foi parcialmente transcrita acima. Tratava-se da divulgação de um novo complexo de atividades para crianças e adolescentes. Eles prometiam um ambiente e uma programação que irão resgatar muitas das experiências de antigamente.
Brincar na calçada, subir em árvores, pular muros ou andar de carrinho de rolimã. Éramos felizes e não sabíamos – ou será que sabíamos? Lembro de brincar na casa de vizinhos de rua sem precisar avisar onde estava. De ir caminhando sozinho para a escola com apenas 9 anos de idade. Era outro mundo!
A única tela disponível na casa era a da televisão – e com apenas quatro canais. Nada de Discovery Kids, Gloob, Cartoon Network ou Nickelodeon. Nada de YouTube, Fortnite ou Roblox. A criançada brincava de verdade.
Sempre é bom lembrar, especialmente em tempos em que quase tudo está digitalizado, que brincar é essencial para o desenvolvimento de habilidades psicomotoras, sociais, afetivas, cognitivas e emocionais das crianças.
Recentemente, li uma notícia sobre a recuperação judicial da empresa que produz o “Forte Apache”, brinquedo que fazia sucesso na minha época. Passava horas posicionando os soldadinhos que ficavam encastelados à espera do ataque dos índios. Confesso que fiquei esperançoso ao saber que o Forte Apache ainda é fabricado nos dias de hoje.
O brinquedo foi inspirado em um forte construído na segunda metade do século 18 no estado do Arizona, nos Estados Unidos. Ele servia de proteção contra os ataques das tribos indígenas da região, entre elas os Apaches. Vale registrar que os índios – que sempre foram vistos como vilões – estavam, na realidade, protegendo o seu território. Mas isso é assunto para outro texto.
Aparentemente, tal qual a cavalaria americana resistia bravamente aos ataques indígenas entrincheirada no Forte Apache, o forte de brinquedo também tem tentado resistir à força avassaladora dos tablets e dos smartphones. Tomara que consiga!
Não sou contra a tecnologia. Ela é essencial e indissociável da vida de todos nós, inclusive das crianças. Sou contra, sim, o seu uso indiscriminado e sem limites. Por maiores que sejam as inovações, elas nunca vão substituir a experiência e os benefícios de subir numa árvore, de chutar uma bola ou de brincar de Forte Apache.
Fernando Goldsztein
Fundador da The Medulloblastoma Initiative
Conselheiro da Children’s National Foundation