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A “bananização” do dinheiro e o espetáculo da ostentação

Episódios como este nos convidam a refletir sobre os contrastes do mundo em que vivemos

 (Arte feita sob obra de Maurizio Cattelan)

(Arte feita sob obra de Maurizio Cattelan)

Publicado em 26 de julho de 2025 às 09h32.

Última atualização em 26 de julho de 2025 às 10h20.

O que você faria com 6,2 milhões de dólares — algo como 34,5 milhões de reais, pela cotação atual? Pediria demissão do emprego para viajar pelo mundo? Compraria uma casa nova? Abriria o próprio negócio? As possibilidades são infinitas, não é mesmo?

Pois o empresário chinês Justin Sun — um jovem bilionário que fez fortuna com criptomoedas — resolveu investir essa dinheirama toda em uma obra de arte. Ou melhor, em uma suposta obra de arte. Me refiro a polêmica “Comedian“, do artista italiano Maurizio Cattelan. Para quem, por acaso, ainda não ouviu falar, trata-se de uma tela branca onde o artista colou uma banana com fita adesiva. Sim, repito: uma tela branca com uma banana colada com fita adesiva.

A obra foi arrematada em um leilão no final do ano passado e amplamente noticiada pela mídia. Mas o assunto voltou a ser destaque nos últimos dias. A banana — digo, a obra de arte — que estava exposta no museu Pompidou, em Paris, foi comida por um turista. Isso mesmo: um visitante desavisado — e esfomeado — aproveitou a distração dos seguranças e tratou de devorar aquela apetitosa banana.

Não sei o que foi feito do turista, mas fiquei aqui pensando com os meus botões: o que leva um artista a grudar uma banana numa tela e achar que está fazendo arte? Aliás, o que define a arte? E talvez o mais enigmático: o que leva alguém a pagar 6 milhões de dólares por isso?

A arte é a forma como o artista comunica suas ideias, emoções, percepções e interpretações do mundo. Ela pode se expressar de diversas maneiras: pintura, escultura, música, literatura, teatro, entre tantas outras. Gostemos ou não, arte é arte — e não se discute.

Segundo algumas interpretações, não confirmadas pelo artista, a intenção de Cattelan seria justamente mostrar o espelho do mundo contemporâneo: o luxo de pagar caro por algo inútil, a histeria em torno de símbolos vazios, a fragilidade da existência — afinal, a banana apodrece — e, por fim, a superficialidade da viralização.

Só falta agora responder à pergunta que não quer calar: o que levou o empresário a pagar uma fortuna por essa banana? Pois essa talvez seja, ironicamente, a pergunta mais fácil de responder. Primeiro, porque para um bilionário, esse valor é troco. Depois, se contabilizarmos toda a exposição na mídia mundial que ele recebeu com a compra — somando, inclusive, este artigo — foi um belo investimento. E de quebra, ele pagou com criptomoeda, dando ainda mais visibilidade a esse meio de pagamento e ao seu próprio negócio, que está no setor de blockchain e criptomoedas.

Bem, polêmicas à parte, o fato é que episódios como este nos convidam a refletir sobre os contrastes do mundo em que vivemos. Enquanto muitos lutam pelo básico para sobreviver, outros protagonizam verdadeiros espetáculos de desperdício e ostentação - uma verdadeira banalização do dinheiro.

Fernando Goldsztein é fundador do The Medulloblastoma Initiative, conselheiro da Children’s National Foundation e tem MBA – MIT na Sloan School of Management

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