Gestão de crises no esporte: exagero ou realidade?
Há quem diga que o trabalho de gestão de crises está muito longe de ser necessário ao ambiente de profissionalização do esporte. O argumento é de que não há risco financeiro envolvido no mundo esportivo ou que, se há, é insuficiente para que seja instaurado um processo estruturado de gestão de crises em quaisquer modalidades esportivas, seja para atletas, seja para clubes. O blog poderia elencar aqui dezenas de fatos […] Leia mais
Publicado em 23 de abril de 2013 às, 13h30.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 09h03.
Há quem diga que o trabalho de gestão de crises está muito longe de ser necessário ao ambiente de profissionalização do esporte. O argumento é de que não há risco financeiro envolvido no mundo esportivo ou que, se há, é insuficiente para que seja instaurado um processo estruturado de gestão de crises em quaisquer modalidades esportivas, seja para atletas, seja para clubes.
O blog poderia elencar aqui dezenas de fatos ocorridos apenas no Brasil que eram nitidamente casos de crises. Mas poucos serão mencionados, apenas para que se refresque a memória e se lembre de situações ligadas ao esporte que, de forma clara, poderiam ter atrapalhado a história de um clube ou a trajetória de atletas: Queda de um pedaço de estrutura do novo estádio do Palmeiras, atletas de mais de um clube de futebol envolvidos em possível contrabando de carros, doping de atletas de diversas modalidades (Jobson e Carlos Alberto, jogadores de Botafogo e Vasco respectivamente, Cesar Cielo da natação, Maurren Maggi do atletismo, entre outros…), a tragédia na Bolívia envolvendo os torcedores do Corinthians, casos de racismo em campeonatos estaduais, a saída ríspida de Ricardinho da seleção brasileira de vôlei masculino. Poucos exemplos e o leitor certamente deve ter se lembrado de outros tantos não citados acima.
O mundo atualmente é fundamentado na comunicação. O que antes era restrito, hoje é exposto quase que instantaneamente a toda sociedade e a quem a compõe que, por sua vez, carece de sabedoria para administrar seus problemas e, consequentemente, sua reputação. No mundo ideal, a crise não acontece. Mas estamos longe de viver o mundo ideal. Se as crises aparecem em empresas multinacionais, com modelos de governança e controles de risco altamente desenvolvidos, como não apareceriam no esporte brasileiro atual, ainda pouco profissionalizado?
A competência na gestão diminui o risco de crises, mas não o elimina. A incompetência na gestão não significa que haverá crise, mas a propicia. O fato de termos uma comunicação esportiva ainda incipiente faz com que situações aparentemente inofensivas se transformem em incubadoras de crises. Que o diga a inabilidade de Wagner Ribeiro, empresário do jogador Neymar, do Santos, que declarou pelo Twitter em 2012, quando Cesar Cielo ganhou o prêmio Jovens Lideranças disputado justamente com o craque santista: “Infelizmente ganhou o doping. Neymar é uma jovem Liderança Mundial. Mas perdeu o prêmio para Cielo”, remetendo ao caso de doping vivido meses antes pelo nadador. Situação sob controle em um instante, transformada em outra fora de controle justamente por quem deveria viabilizar a melhor carreira para Neymar. A comunicação eficaz é parte da gestão qualificada e precisa ser constante, mesmo quando ainda não há crise, justamente para não gerá-la.
A habilidade em gerir uma crise pressupõe, inclusive, ser fonte de informações pra quem a busca. Antes ser o clube ou o atleta a fonte da informação, a tentar limitar a imprensa, e se transformar no alvo das informações que vem de outra fonte.
Há ainda um aspecto fundamental para o esporte que não é encontrado em outros mercados: a paixão. Um investidor tradicional analisa balanços e metas de uma empresa para decidir se nela investe ou não. É uma analise técnica e minimalista, que não ignora detalhe algum. Um torcedor de um clube, por exemplo, não analisa o desempenho da equipe no último ano como parte de sua decisão sobre para quem torcerá na temporada seguinte. Pelo contrário, chega a ter o elo com o clube ampliado quando resultados ruins aparecem. Além disso, ignora o quanto é negligenciado em questões elementares – ou o que explica estádios sem a menor condição de conforto e higiene continuarem recebendo milhares de pessoas semanalmente, se não a paixão? Ainda assim, continua comprando ingressos e uniformes (para citar o básico) e se mantém como importante fonte de renda para o clube.
O fato é que o esporte não está alheio a crises que ultrapassam questões técnicas. E quando elas acontecem, a comunicação dos clubes ou dos atletas não pode continuar contando com esse encantamento dos torcedores. Porque a paixão perdoa a ausência de capacidade técnica e pode até minimizar o desconforto, mas não ignora o descaso, a ignorância, a violência ou, em casos mais extremos, a morte. O encantamento e a paixão iludem tecnicamente, mas não dá aos clubes ou atletas a faculdade de errarem sem arcar com as consequências ou, minimamente, se desculparem. E pedir desculpas, quando necessárias, pode ser um dos caminhos… Mas tem muitos outros.
Se esse post falou sobre a necessidade da gestão de crises no esporte, o próximo trará hipóteses de como colocá-la em prática, além de outros caminhos além do pedido de desculpas. E claro, traremos exemplos bem sucedidos de crises geridas. Até!
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