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Clubes de futebol contratam influenciadores e apostam no marketing digital

Alvos de críticas e discussões, ‘Cartolouco’, no Resende, e Juninho Manella, no São Bento, são exemplos recentes

Futebol na internet: sem jogos, abril foi o pior mês em número de novos seguidores para os times brasileiros desde 2018 (Luis Diaz Devesa/Getty Images)
Futebol na internet: sem jogos, abril foi o pior mês em número de novos seguidores para os times brasileiros desde 2018 (Luis Diaz Devesa/Getty Images)
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Vinicius Lordello — Esporte Executivo

Publicado em 23 de abril de 2021 às, 11h43.

Pensando em alavancar o marketing digital e movimentar as redes sociais, alguns clubes brasileiros saíram do comum e contrataram celebridades da Internet, mais conhecidas como influencers, para fazer parte do elenco. O Resende, do Rio de Janeiro, contratou o jornalista Lucas Strabko, famosos como Cartolouco, para a disputa do Estadual. Além da equipe carioca, em dezembro de 2020, o São Bento anunciou Juninho Manella, que tem milhões de seguidores nas redes, na pré-temporada com o clube. Especialistas analisaram as “aquisições” dos times e a real relevância de suas contratações.

Desde que Cartolouco foi oficializado como atleta no Resende, aparecendo no BID, o influencer tem publicado vídeos de sua experiência no clube em seu canal oficial no Youtube, com média de visualizações ultrapassando 600 mil. Segundo o levantamento da plataforma Social Blade, que contabiliza dados de páginas de redes sociais, o Resende ganhou cerca de 15 mil seguidores no Instagram desde a chegada do jornalista, e atingiu a marca de 30 mil no total.

Em 21 de março, um dos maiores influencers de futebol da atualidade, o Youtuber Casimiro, fez uma live na plataforma Twitch jogando FIFA,  no modo carreira, com o Resende. Devido ao engajamento, visibilidade e repercussão, o clube abraçou a ideia, postando no Twitter. E mais uma vez teve seu nome comentado nas redes sociais. A transmissão ao vivo mobilizou milhares de internautas, tendo 30 mil pessoas assistindo simultaneamente.

Para Renê Salviano, ex-diretor comercial, marketing e novos negócios do Cruzeiro, e há mais de 20 anos com experiência no mercado, todo esse movimento se encaixa em uma verdadeira ação de marketing, que pode beneficiar tanto os clubes quanto os influenciadores. “É uma ato de conexão com determinado público através do perfil de cada influenciador e, por consequência, aumento da base de seguidores dos próprios e dos clubes”, explicou. Salviano compreende a importância dos clubes gerarem engajamento na web e pensarem no marketing, mas ainda vê com ressalvas este tipo de contratação. “Ao tratar de um departamento profissional, eu discordo deste tipo de ação, a não ser que seja primeiro avaliado pelo nível técnico do atleta. O fato dele ser um influenciador agrega, porém, dentro dos indicadores de avaliação, nunca pode ser o primeiro da lista”, analisou. Existem formas de usar esses influenciadores para aprimorar o marketing do clube, não apenas como atletas profissionais. “Eles possuem experiência comprovada em geração de conteúdo e podem criar em conjunto com o clube inúmeros projetos como webséries, ações nos bastidores de jogo, com fãs e até mesmo cuidar da rede do clube por um dia”, acrescenta Salviano.

Apesar dessas campanhas serem consideradas positivas, pensando no aspecto do marketing, é preciso olhar para o outro lado da história e para quem também está envolvido nisso. Aos que dependem do futebol para sobreviver, esse tipo de ação pode não ser vista com boas intenções, seja pelos jogadores, membros da comissão técnica ou até mesmo pela diretoria. Neste caso, é plausível cogitar que os atletas possam se sentir desrespeitados? Marcelo Segurado, diretor-executivo de futebol, com passagens por Goiás e Ceará, é mais conservador ao analisar os fatos e pede cuidado com essa nova iniciativa. “Isso precisa ser levado para o Sindicato dos Atletas Profissionais. Estão desrespeitando um mercado de quem está nessa luta desde seus dez, 11 anos de idade, muitas vezes saindo de casa para buscar um lugar ao sol”, declarou. O dirigente argumenta que esse tipo de ações de marketing precisam ser direcionadas aos jogadores. “Para mim, fracassa o departamento de marketing, o de futebol e a direção do clube”, completa.

Marcelo Palaia, especialista em marketing esportivo, pondera que essas ações de comunicação feitas pelos clubes ajudam a atrair mais seguidores para as redes sociais e impulsionam o lado digital. “Toda a repercussão e engajamento na Internet é importante para as marcas nos dias atuais. Isso é algo que mobiliza as pessoas e o nome dos clubes passam a estar em evidência. Estão sempre em busca de milhões de seguidores”.  Para as equipes de menor expressão, o desafio de aparecer com notoriedade, seja nas redes sociais ou na imprensa, é grande. Sendo assim, a Internet oferece uma possibilidade a mais para essas entidades pensarem em ações inovadoras e que chamem a atenção.

Na visão de Thiago Barros, gerente de conteúdo da Feng, os clubes que não têm tanto espaço, no quesito de visibilidade, precisam recorrer a outros caminhos. “Hoje você não precisa necessariamente ter seu jogo transmitido na TV aberta para fazer barulho. Viralizar na rede pode ser muito melhor em determinados casos”, argumenta. Barros entende que essas ações podem ser uma alternativa para enfrentar a crise provocada pela pandemia, uma vez que os clubes sofrem com ausência de bilheteria e redução de receitas. “Infelizmente, o cenário atual não é de muitos investimentos, devido à Covid-19. Uma marca pode optar por seguir investindo no esporte, mas com cifras menores, e olhar para cases de clubes que têm essa conexão com alguma celebridade e o público da Internet como alternativas mais viáveis”, opinou.

Ele cita a ação de marketing do Magnus Futsal, de Sorocaba, em conjunto com o Fred, do Desimpedidos, como a primeira bem sucedida que viu. “Foi um baita conteúdo audiovisual e, com certeza, a repercussão foi bem positiva para os dois lados. Assim como está sendo com o Cartolouco agora. O futebol é um esporte, e o aspecto esportivo sempre deve ser a prioridade, mas ele também é entretenimento”, recordou.  A produção lembrada pelo especialista, que pode ser vista no Youtube, mostra a experiência do Fred entre os profissionais do Magnus Futsal. Em formato de reality show, saíram oito episódios entre abril e junho de 2020. O conteúdo alcançou mais de 8,5 milhões de espectadores únicos e bateu 27 milhões de visualizações. Barros ainda conclui que, quanto mais esse lado for explorado pelos clubes, melhor para todos. “Seja trazendo celebridades para o dia a dia do clube ou para ações esporádicas, como nas TVs e mídias sociais oficiais, o torcedor cada vez mais consome esse tipo de conteúdo. Em casos como os citados, as ações fazem até quem não torce para os times passar a ter um certo apreço ou pelo menos acompanhar para ver no que vai dar”, finalizou.