O Brasil está rico novamente?
Na semana passada, analisei o “valor justo” do dólar a partir da teoria da paridade do poder de compra (PPC). Grosso modo, ela prevê que produtos iguais devem ter preços iguais em todos os lugares, no longo prazo. Segundo a PPC, o Brasil é “caro”. Por exemplo, o preço do Big Mac é aqui um […]
Da Redação
Publicado em 6 de março de 2017 às 12h45.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h28.
Na semana passada, analisei o “valor justo” do dólar a partir da teoria da paridade do poder de compra (PPC). Grosso modo, ela prevê que produtos iguais devem ter preços iguais em todos os lugares, no longo prazo.
Segundo a PPC, o Brasil é “caro”. Por exemplo, o preço do Big Mac é aqui um dos mais altos do planeta. Ninguém paga mais do que os brasileiros por um IPAD em um painel de 57 países, de acordo com uma corretora australiana. Lembro-me de ter visto um blog com comparações de preços de imóveis mostrando que espeluncas custam mais aqui do que casas decentes em lugares badalados. O elevado “custo Brasil” é uma reclamação constante.
Se a partir da PPC o Brasil é caro, a noção de “um produto, um preço” não é o único ponto de partida para avaliar o valor “justo” de uma moeda. Uma forma alternativa é olhar para o poder de compra do país no comércio internacional, comparando os preços de exportações com os de importações – razão batizada de “termos de troca”.
Países “ricos” produzem aquilo que os outros topam pagar caro para ter. Da mesma forma que a riqueza de um país depende dos termos de troca, é razoável supor que o “valor justo” de sua moeda também seja. Se todos querem comprar o que um país tem para vender sua moeda passa a valer mais. Os dados mostram que, de fato, as duas coisas andam juntas.
Quando os produtos em questão são commodities, cujas cotações oscilam bastante ao sabor dos ciclos econômicos globais, quem é “pobre” pode ficar “rico” da noite para o dia e vice-versa. De fato, há períodos em que os termos de troca estão relativamente mais favoráveis como, por exemplo, em 1995 e 2010. Nos anos 80, a relação foi desfavorável. De modo geral, no entanto, tem havido uma tendência de melhora dos termos de troca no período. Contrariando uma tese famosa para explicar o subdesenvolvimento da América Latina, a razão de preços entre nossas exportações e importações encontra-se 35% acima da que prevalecia há 40 anos.
Mais recentemente, nos últimos 12 meses, os termos de troca melhoraram cerca de 20%, revertendo um ciclo de queda que vinha se materializando desde 2011 – os preços de café, soja e minério de ferro subiram, respectivamente, 14%, 19% e 112%.
É possível ajustar o cálculo do valor “justo” do dólar que fizemos na semana passada para levar em conta o poder de compra das exportações medido pelos termos de troca. Se eles estivessem na média, o valor “justo” do dólar seria parecido com o dado pela PPC histórica. No entanto, quando se leva em conta o valor atual dos termos de troca, ele cai para R$ 3,00. O xis da questão é adivinhar quando os preços retornarão para a média – tarefa para a saudosa Mãe Dinah.
Desde o começo do ano, escrevi colunas analisando a taxa de câmbio a partir de prismas distintos. Comentei sobre os contratempos do ofício de adivinhar seu comportamento futuro, sobre o fato de que, no curto prazo, o câmbio depende mais do risco e retorno de carregar ativos denominados em moedas distintas, sobre a propensão que as cotações têm de se desviar do que deveria ser o valor “justo” e sobre a existência de mais de um critério para encontrar este valor – nem sempre com conclusões semelhantes.
Considerando tudo, desconfio que a tendência do dólar seja a de se fortalecer contra o real, mais cedo ou mais tarde, seja por surtos de aversão ao risco em um contexto global ainda complicado, seja pelo fato de que a política econômica americana tem viés pró-dólar, seja pelo deserto que o governo frágil de Temer tem pela frente (apesar dos louváveis esforços para colocar a economia de novo nos trilhos).
O motivo mais forte que me leva a contestar a conclusão acima é esta tendência recente de fortalecimento dos termos de troca que, com o passar do tempo, tem mostrado a solidez de uma catedral. O consenso entre analistas de commodities é que os preços atuais estariam caros demais, particularmente os do minério de ferro, aço, açúcar e algodão. De qualquer forma, enquanto a realidade desafiar o consenso, o dólar não andará.
Será que o Temer ganhou na loteria como Lula?
Na semana passada, analisei o “valor justo” do dólar a partir da teoria da paridade do poder de compra (PPC). Grosso modo, ela prevê que produtos iguais devem ter preços iguais em todos os lugares, no longo prazo.
Segundo a PPC, o Brasil é “caro”. Por exemplo, o preço do Big Mac é aqui um dos mais altos do planeta. Ninguém paga mais do que os brasileiros por um IPAD em um painel de 57 países, de acordo com uma corretora australiana. Lembro-me de ter visto um blog com comparações de preços de imóveis mostrando que espeluncas custam mais aqui do que casas decentes em lugares badalados. O elevado “custo Brasil” é uma reclamação constante.
Se a partir da PPC o Brasil é caro, a noção de “um produto, um preço” não é o único ponto de partida para avaliar o valor “justo” de uma moeda. Uma forma alternativa é olhar para o poder de compra do país no comércio internacional, comparando os preços de exportações com os de importações – razão batizada de “termos de troca”.
Países “ricos” produzem aquilo que os outros topam pagar caro para ter. Da mesma forma que a riqueza de um país depende dos termos de troca, é razoável supor que o “valor justo” de sua moeda também seja. Se todos querem comprar o que um país tem para vender sua moeda passa a valer mais. Os dados mostram que, de fato, as duas coisas andam juntas.
Quando os produtos em questão são commodities, cujas cotações oscilam bastante ao sabor dos ciclos econômicos globais, quem é “pobre” pode ficar “rico” da noite para o dia e vice-versa. De fato, há períodos em que os termos de troca estão relativamente mais favoráveis como, por exemplo, em 1995 e 2010. Nos anos 80, a relação foi desfavorável. De modo geral, no entanto, tem havido uma tendência de melhora dos termos de troca no período. Contrariando uma tese famosa para explicar o subdesenvolvimento da América Latina, a razão de preços entre nossas exportações e importações encontra-se 35% acima da que prevalecia há 40 anos.
Mais recentemente, nos últimos 12 meses, os termos de troca melhoraram cerca de 20%, revertendo um ciclo de queda que vinha se materializando desde 2011 – os preços de café, soja e minério de ferro subiram, respectivamente, 14%, 19% e 112%.
É possível ajustar o cálculo do valor “justo” do dólar que fizemos na semana passada para levar em conta o poder de compra das exportações medido pelos termos de troca. Se eles estivessem na média, o valor “justo” do dólar seria parecido com o dado pela PPC histórica. No entanto, quando se leva em conta o valor atual dos termos de troca, ele cai para R$ 3,00. O xis da questão é adivinhar quando os preços retornarão para a média – tarefa para a saudosa Mãe Dinah.
Desde o começo do ano, escrevi colunas analisando a taxa de câmbio a partir de prismas distintos. Comentei sobre os contratempos do ofício de adivinhar seu comportamento futuro, sobre o fato de que, no curto prazo, o câmbio depende mais do risco e retorno de carregar ativos denominados em moedas distintas, sobre a propensão que as cotações têm de se desviar do que deveria ser o valor “justo” e sobre a existência de mais de um critério para encontrar este valor – nem sempre com conclusões semelhantes.
Considerando tudo, desconfio que a tendência do dólar seja a de se fortalecer contra o real, mais cedo ou mais tarde, seja por surtos de aversão ao risco em um contexto global ainda complicado, seja pelo fato de que a política econômica americana tem viés pró-dólar, seja pelo deserto que o governo frágil de Temer tem pela frente (apesar dos louváveis esforços para colocar a economia de novo nos trilhos).
O motivo mais forte que me leva a contestar a conclusão acima é esta tendência recente de fortalecimento dos termos de troca que, com o passar do tempo, tem mostrado a solidez de uma catedral. O consenso entre analistas de commodities é que os preços atuais estariam caros demais, particularmente os do minério de ferro, aço, açúcar e algodão. De qualquer forma, enquanto a realidade desafiar o consenso, o dólar não andará.
Será que o Temer ganhou na loteria como Lula?