Há uma onda favorável ao dólar se formando no mundo?
Enquanto houver o risco de vitória de um candidato populista, o dólar permanecerá caro, mesmo que haja alguma acomodação no curto prazo
Da Redação
Publicado em 21 de maio de 2018 às 17h46.
Dentre as economias relevantes que afundaram com a crise financeira a americana foi a primeira a colocar o nariz para fora d’água. Trump assumiu a presidência com a taxa de desemprego em queda e perto do limite usado para caracterizar um mercado de trabalho “apertado”. Apesar disso, iniciou o mandato prometendo pisar fundo no acelerador.
Os mercados anteciparam pressões inflacionárias e esse risco alçou o dólar à estratosfera. Contra uma cesta ampla de moedas, ele ascendeu a um pico mais de 10% acima do registrado no auge da crise financeira quando todos queriam um abrigo seguro. Em termos reais, o patamar registrado pelo dólar na largada do governo Trump foi o terceiro maior desde meados dos anos 70.
Com o passar do tempo, percebeu-se que a inflação continuava adormecida a despeito dos sinais de crescimento robusto, confiança elevada e pouca ociosidade. Isso permitiu que o FED conduzisse a política monetária com vagar, sem surpresas. Além disso, as economias de outros países reagiam na esteira da recuperação americana. Em abril do ano passado, o FMI traçou o primeiro panorama econômico global com viés esperançoso após dezenas de edições lúgubres.
Neste contexto caracterizado por dólar “caro” e um mundo com menos riscos, crescendo de forma acelerada e sincronizada, seria de se esperar uma normalização do valor da moeda americana frente aos pares principais, pois os estímulos monetários deveriam ser também retirados gradualmente nos outros lugares, particularmente na Europa, mas também no Japão. Foi o que aconteceu. A verdinha começou a escorregar consistentemente desde o início de 2017.
O Euro, por exemplo, que iniciou o ano passado valendo USD 1,05 chegou a ser cotado a USD 1,25 há poucas semanas. A perda real do dólar contra a média dos principais parceiros comerciais no período de 12 meses chegou a superar 8% no início do ano, fato que não ocorria há seis anos.
Cumpre perguntar se esse surto recente que fez o dólar disparar no Brasil reflete uma mudança nos fundamentos econômicos que explicam o enfraquecimento do dólar nos últimos meses ou se a causa do problema deve ser procurada aqui dentro.
No tocante ao crescimento econômico mundial, os dados parciais disponíveis revelam uma desaceleração no primeiro trimestre de 2018 em relação ao último de 2017. No entanto, o ritmo de expansão ainda pode ser considerado forte a julgar por informações mais recentes. Por exemplo, o FED de Atlanta projeta que o PIB americano está crescendo 4% ao ano no trimestre corrente. Os termômetros de confiança permanecem em região confortável na maioria dos países.
O ânimo esfriou na Europa, é verdade, mas isso não chega a ser surpreendente porque lá a economia virou o ano a todo vapor. Diga-se, a perda de fôlego não é independente dos movimentos cambiais: o fortalecimento do Euro encareceu os produtos europeus e explica parte da acomodação. O enfraquecimento mais recente tende a atenuar esse efeito, repetindo-se assim um ciclo que vem se materializando há um bom tempo. O ponto é que essas oscilações de curto prazo não necessariamente implicam mudança da tendência de longo prazo.
Pelas minhas contas, mesmo admitindo que o crescimento da produção industrial global se desacelere gradualmente para a média dos últimos anos, há 70% de chance de o crescimento do PIB mundial ser maior em 2018 do que foi em 2017 – se o passado for um bom guia, é claro.
No tocante à inflação, não houve nos EUA sinal de alerta suficiente para mudar o que já era amplamente conhecido. Não é novidade que a inflação esteja subindo, mas o movimento ocorre de forma lenta e razoavelmente previsível. A alta do preço do petróleo tende a empurrar os índices no curto prazo, mas a perspectiva para o preço do barril é de queda no médio prazo com a ampliação da infraestrutura de escoamento nos EUA. Na verdade, a média dos indicadores de tendência da inflação, que normalmente excluem energia, recuou em abril. O ritmo de aumento dos salários também está se acelerando lentamente, sem novidades.
Sendo assim, não parece haver razão que inspire o FED a mudar a sinalização que vem sendo dada a vários trimestres de que os juros subirão vagarosamente, em ritmo de três ou quatro altas por ano. Essa política está consolidada nos preços. É provável, portanto, que a tendência de retorno gradual do valor do dólar à média histórica tenha prosseguimento quando a poeira baixar. Isso não quer dizer que o dólar ficará mais barato para os brasileiros.
O forte impacto da mudança das condições do mercado sobre as moedas de alguns países emergentes incluindo o Brasil deveu-se mais às fraquezas dessas economias do que à perspectiva de um novo ciclo de “dólar forte”. Por exemplo, apesar da depreciação recente, as moedas do Chile, Colômbia e Peru estão abaixo do patamar em torno do qual oscilaram há um ano. O peso mexicano está um pouco mais depreciado, mas lá o câmbio também reflete o risco de vitória de um candidato populista na eleição presidencial de julho. As moedas que apanharam feio são de países problemáticos, como Argentina e Turquia. O Brasil está no clube por causa das eleições.
A maior parte da perda de valor do real frente ao dólar derivou do risco de o eleitor optar pelo retrocesso em outubro. Esse é o único tema que realmente interessa no debate econômico local. Enquanto houver o risco de vitória de um candidato populista, o dólar permanecerá caro, mesmo que haja alguma acomodação no curto prazo. Por outro lado, se uma candidatura moderada mostrar sinal de vida, a queda da cotação será forte e rápida. Apostar no dólar nos próximos meses é o mesmo que apostar no resultado da eleição.
Dentre as economias relevantes que afundaram com a crise financeira a americana foi a primeira a colocar o nariz para fora d’água. Trump assumiu a presidência com a taxa de desemprego em queda e perto do limite usado para caracterizar um mercado de trabalho “apertado”. Apesar disso, iniciou o mandato prometendo pisar fundo no acelerador.
Os mercados anteciparam pressões inflacionárias e esse risco alçou o dólar à estratosfera. Contra uma cesta ampla de moedas, ele ascendeu a um pico mais de 10% acima do registrado no auge da crise financeira quando todos queriam um abrigo seguro. Em termos reais, o patamar registrado pelo dólar na largada do governo Trump foi o terceiro maior desde meados dos anos 70.
Com o passar do tempo, percebeu-se que a inflação continuava adormecida a despeito dos sinais de crescimento robusto, confiança elevada e pouca ociosidade. Isso permitiu que o FED conduzisse a política monetária com vagar, sem surpresas. Além disso, as economias de outros países reagiam na esteira da recuperação americana. Em abril do ano passado, o FMI traçou o primeiro panorama econômico global com viés esperançoso após dezenas de edições lúgubres.
Neste contexto caracterizado por dólar “caro” e um mundo com menos riscos, crescendo de forma acelerada e sincronizada, seria de se esperar uma normalização do valor da moeda americana frente aos pares principais, pois os estímulos monetários deveriam ser também retirados gradualmente nos outros lugares, particularmente na Europa, mas também no Japão. Foi o que aconteceu. A verdinha começou a escorregar consistentemente desde o início de 2017.
O Euro, por exemplo, que iniciou o ano passado valendo USD 1,05 chegou a ser cotado a USD 1,25 há poucas semanas. A perda real do dólar contra a média dos principais parceiros comerciais no período de 12 meses chegou a superar 8% no início do ano, fato que não ocorria há seis anos.
Cumpre perguntar se esse surto recente que fez o dólar disparar no Brasil reflete uma mudança nos fundamentos econômicos que explicam o enfraquecimento do dólar nos últimos meses ou se a causa do problema deve ser procurada aqui dentro.
No tocante ao crescimento econômico mundial, os dados parciais disponíveis revelam uma desaceleração no primeiro trimestre de 2018 em relação ao último de 2017. No entanto, o ritmo de expansão ainda pode ser considerado forte a julgar por informações mais recentes. Por exemplo, o FED de Atlanta projeta que o PIB americano está crescendo 4% ao ano no trimestre corrente. Os termômetros de confiança permanecem em região confortável na maioria dos países.
O ânimo esfriou na Europa, é verdade, mas isso não chega a ser surpreendente porque lá a economia virou o ano a todo vapor. Diga-se, a perda de fôlego não é independente dos movimentos cambiais: o fortalecimento do Euro encareceu os produtos europeus e explica parte da acomodação. O enfraquecimento mais recente tende a atenuar esse efeito, repetindo-se assim um ciclo que vem se materializando há um bom tempo. O ponto é que essas oscilações de curto prazo não necessariamente implicam mudança da tendência de longo prazo.
Pelas minhas contas, mesmo admitindo que o crescimento da produção industrial global se desacelere gradualmente para a média dos últimos anos, há 70% de chance de o crescimento do PIB mundial ser maior em 2018 do que foi em 2017 – se o passado for um bom guia, é claro.
No tocante à inflação, não houve nos EUA sinal de alerta suficiente para mudar o que já era amplamente conhecido. Não é novidade que a inflação esteja subindo, mas o movimento ocorre de forma lenta e razoavelmente previsível. A alta do preço do petróleo tende a empurrar os índices no curto prazo, mas a perspectiva para o preço do barril é de queda no médio prazo com a ampliação da infraestrutura de escoamento nos EUA. Na verdade, a média dos indicadores de tendência da inflação, que normalmente excluem energia, recuou em abril. O ritmo de aumento dos salários também está se acelerando lentamente, sem novidades.
Sendo assim, não parece haver razão que inspire o FED a mudar a sinalização que vem sendo dada a vários trimestres de que os juros subirão vagarosamente, em ritmo de três ou quatro altas por ano. Essa política está consolidada nos preços. É provável, portanto, que a tendência de retorno gradual do valor do dólar à média histórica tenha prosseguimento quando a poeira baixar. Isso não quer dizer que o dólar ficará mais barato para os brasileiros.
O forte impacto da mudança das condições do mercado sobre as moedas de alguns países emergentes incluindo o Brasil deveu-se mais às fraquezas dessas economias do que à perspectiva de um novo ciclo de “dólar forte”. Por exemplo, apesar da depreciação recente, as moedas do Chile, Colômbia e Peru estão abaixo do patamar em torno do qual oscilaram há um ano. O peso mexicano está um pouco mais depreciado, mas lá o câmbio também reflete o risco de vitória de um candidato populista na eleição presidencial de julho. As moedas que apanharam feio são de países problemáticos, como Argentina e Turquia. O Brasil está no clube por causa das eleições.
A maior parte da perda de valor do real frente ao dólar derivou do risco de o eleitor optar pelo retrocesso em outubro. Esse é o único tema que realmente interessa no debate econômico local. Enquanto houver o risco de vitória de um candidato populista, o dólar permanecerá caro, mesmo que haja alguma acomodação no curto prazo. Por outro lado, se uma candidatura moderada mostrar sinal de vida, a queda da cotação será forte e rápida. Apostar no dólar nos próximos meses é o mesmo que apostar no resultado da eleição.