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Como a economia pode ajudar o mito?

Apesar dos pesares, há ventos favoráveis que, se aproveitados com competência (e um pouco de sorte), podem empurrar o país para frente

TEMER E BOLSONARO: o novo presidente pode conseguir o que o anterior não logrou, em grande medida, pelo episódio das gravações / REUTERS | Adriano Machado (Adriano Machado/Reuters)
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Da Redação

Publicado em 21 de novembro de 2018 às 16h59.

Última atualização em 21 de novembro de 2018 às 17h24.

Bolsonaro enfrentará um ambiente internacional mais desafiador no ano que vem, com riscos em várias frentes. Como se isso não bastasse, inícios de mandato tendem a ser bagunçados mesmo para os novatos com ideia clara do que farão. Que dirá então de quem se elege sem um plano bem definido, rejeitando a “velha política” e com a promessa de entregar ao povo mudanças que ele não quer? Não sou o único aflito, pois até pessoas próximas do presidente afirmaram durante a campanha que o projeto tinha tudo para dar errado.

Apesar dos pesares, há ventos favoráveis que, se aproveitados com competência (e um pouco de sorte), podem empurrar o país para frente. De início, o governo entra em tese com o diagnóstico correto e conta com a legitimidade das urnas. Em segundo lugar, o eleito tem demonstrado que sabe ouvir e já abandonou algumas más ideias. Presidentes que mudam de opinião o tempo todo geram insegurança, mas teimosia em excesso também pode ser ruim como se viu durante o mergulho recessivo de 2014 e 2015.

O time econômico contará com bons quadros. Não dá para saber se jogará bem, pois a qualidade do elenco é condição necessária, mas não suficiente para o sucesso. É preciso haver entrosamento, inclusive com o presidente, e ele só aparece jogando. De qualquer modo, não há uma sangria desatada ou, mantendo a analogia futebolística, o time tem algum tempo para ganhar “volume”. A inflação está controlada, os juros relativamente baixos e os mercados querendo acreditar. Há também uma agenda positiva na área de infraestrutura e uma avenida de concessões e privatizações.

Essa lista auspiciosa deve ser completada com um detalhe que faz toda diferença. Há um enorme potencial de crescimento no curto prazo. Esse é talvez o maior trunfo na manga do novo governo, pois uma coisa é anunciar maldades com a economia jogando contra e outra completamente diferente é pedir sacrifícios em meio a um clima de otimismo relativo, com as vendas subindo, o dinheiro fluindo e os empregos aparecendo. Não se trata aqui de dizer que a situação seja fácil, mas o crescimento é um ativo importante quando a tarefa é introduzir mudanças custosas. Bolsonaro tem, portanto, uma boa oportunidade para fazer o que é certo.

No longo prazo, será impossível crescer decentemente sem que reformas profundas sejam aprovadas, principalmente a previdenciária. Mas, no ano que vem e talvez no próximo, o crescimento depende apenas dos projetos que serão apresentados. Se forem bons, o crescimento aparecerá pela ocupação de recursos que estão ociosos. Bastará manter a disciplina e não desistir do objetivo e a economia descreverá um ciclo virtuoso em que a expectativa de avanço faz a confiança e o crescimento subirem, tornando menos difícil a tarefa de emplacar as reformas e assim por diante. Nessa altura ainda é cedo para ter segurança de que este é o cenário mais provável, mas ele é indubitavelmente plausível.

Ao contar essa história recentemente recebi três indagações. Primeiro, qual é o tamanho do potencial existente? Segundo, se é verdade que ele é grande, porque o preenchimento do buraco se deu de forma tão lenta durante a gestão de Meirelles e seu time de craques? Terceiro, porque acreditar que daqui para frente pode ser diferente? As respostas estão interligadas e, sendo sincero, ninguém é capaz de respondê-las de forma peremptória. Mas há argumentos que trazem alguma esperança no meio da incerteza.

Saber o tamanho exato da ociosidade é mais arte do que ciência, mas há sinais de que o chamado “hiato do produto” é expressivo, a começar, por exemplo, pelos 12,5 milhões de desempregados. O baixo nível de utilização da capacidade instalada na indústria (NUCI) é outro indicador do tamanho do buraco em que caímos e no qual não precisamos ficar. Em tempos normais, o NUCI oscila ao redor de 80% e, atualmente, encontra-se próximo de 76%. Ou seja, há gente e máquinas prontas para serem usadas, bastando que haja um mínimo de previsibilidade capaz de despertar os espíritos empreendedores.

Uma forma conveniente de medir a ociosidade olhando diretamente a evolução da produção é comparar seu nível atual com uma estimativa da tendência exibida no passado. Para que o cálculo seja justo, é importante levar em consideração alguns aspectos que mudam com o tempo, como o contexto internacional e o apetite do resto do mundo pelos produtos que vendemos. As contas confirmam que o crescimento potencial de longo prazo não é mesmo dos mais brilhantes e gira em torno de 2,5% (daí a necessidade de reformas para elevar a taxa).

No entanto, apesar desse potencial reduzido, o exercício quantifica também as oportunidades existentes para o curto prazo, menos dependentes das reformas e mais de fatores psicológicos, como a confiança dos agentes econômicos. Bolsonaro subirá a rampa pela primeira vez tendo ao alcance uma árvore com frutos que valem algo entre R$ 200 bilhões e R$ 500 bilhões. Para colhê-los precisará anunciar uma boa reforma da Previdência, demonstrar que é capaz de aprová-la e destravar a agenda da infraestrutura, atraindo o setor privado com projetos atraentes.

Porque Temer não se beneficiou? Ao aprovar medidas importantes como a Lei do Teto e a Reforma Trabalhista ele deveria ter recuperado uma parte dos bilhões que deixaram de ser produzidos com a recessão. Na verdade, estava quase lá quando veio o episódio das gravações. Não fosse pela derrapada, a Reforma da Previdência provavelmente teria sido aprovada. Com isso a retomada econômica teria se intensificado e hoje a história seria outra. Após o escândalo, Temer perdeu tempo e capital político, a economia tropeçou e a incerteza política entrou em cena.

A vitória de Bolsonaro desanuviou o horizonte. O militar chegou lá prometendo austeridade e, por isso, não deverá ser uma grande surpresa quando anunciar medidas duras. Na prática não é tão simples porque, espertamente, ele evitou entrar em detalhes na campanha porque intui que a teoria econômica que faz sucesso junto ao povão é a da Unicamp e não a da Universidade de Chicago – por isso centrou a plataforma nas questões de costumes, segurança e corrupção.

Mas a bola está aí, pronta para ser chutada. Se tiver o bom senso de saber para que lado chutar e boa pontaria, a retomada cíclica da economia deverá ajudar bastante e, por incrível que pareça, pode ser que o mito se torne realidade.

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Bolsonaro enfrentará um ambiente internacional mais desafiador no ano que vem, com riscos em várias frentes. Como se isso não bastasse, inícios de mandato tendem a ser bagunçados mesmo para os novatos com ideia clara do que farão. Que dirá então de quem se elege sem um plano bem definido, rejeitando a “velha política” e com a promessa de entregar ao povo mudanças que ele não quer? Não sou o único aflito, pois até pessoas próximas do presidente afirmaram durante a campanha que o projeto tinha tudo para dar errado.

Apesar dos pesares, há ventos favoráveis que, se aproveitados com competência (e um pouco de sorte), podem empurrar o país para frente. De início, o governo entra em tese com o diagnóstico correto e conta com a legitimidade das urnas. Em segundo lugar, o eleito tem demonstrado que sabe ouvir e já abandonou algumas más ideias. Presidentes que mudam de opinião o tempo todo geram insegurança, mas teimosia em excesso também pode ser ruim como se viu durante o mergulho recessivo de 2014 e 2015.

O time econômico contará com bons quadros. Não dá para saber se jogará bem, pois a qualidade do elenco é condição necessária, mas não suficiente para o sucesso. É preciso haver entrosamento, inclusive com o presidente, e ele só aparece jogando. De qualquer modo, não há uma sangria desatada ou, mantendo a analogia futebolística, o time tem algum tempo para ganhar “volume”. A inflação está controlada, os juros relativamente baixos e os mercados querendo acreditar. Há também uma agenda positiva na área de infraestrutura e uma avenida de concessões e privatizações.

Essa lista auspiciosa deve ser completada com um detalhe que faz toda diferença. Há um enorme potencial de crescimento no curto prazo. Esse é talvez o maior trunfo na manga do novo governo, pois uma coisa é anunciar maldades com a economia jogando contra e outra completamente diferente é pedir sacrifícios em meio a um clima de otimismo relativo, com as vendas subindo, o dinheiro fluindo e os empregos aparecendo. Não se trata aqui de dizer que a situação seja fácil, mas o crescimento é um ativo importante quando a tarefa é introduzir mudanças custosas. Bolsonaro tem, portanto, uma boa oportunidade para fazer o que é certo.

No longo prazo, será impossível crescer decentemente sem que reformas profundas sejam aprovadas, principalmente a previdenciária. Mas, no ano que vem e talvez no próximo, o crescimento depende apenas dos projetos que serão apresentados. Se forem bons, o crescimento aparecerá pela ocupação de recursos que estão ociosos. Bastará manter a disciplina e não desistir do objetivo e a economia descreverá um ciclo virtuoso em que a expectativa de avanço faz a confiança e o crescimento subirem, tornando menos difícil a tarefa de emplacar as reformas e assim por diante. Nessa altura ainda é cedo para ter segurança de que este é o cenário mais provável, mas ele é indubitavelmente plausível.

Ao contar essa história recentemente recebi três indagações. Primeiro, qual é o tamanho do potencial existente? Segundo, se é verdade que ele é grande, porque o preenchimento do buraco se deu de forma tão lenta durante a gestão de Meirelles e seu time de craques? Terceiro, porque acreditar que daqui para frente pode ser diferente? As respostas estão interligadas e, sendo sincero, ninguém é capaz de respondê-las de forma peremptória. Mas há argumentos que trazem alguma esperança no meio da incerteza.

Saber o tamanho exato da ociosidade é mais arte do que ciência, mas há sinais de que o chamado “hiato do produto” é expressivo, a começar, por exemplo, pelos 12,5 milhões de desempregados. O baixo nível de utilização da capacidade instalada na indústria (NUCI) é outro indicador do tamanho do buraco em que caímos e no qual não precisamos ficar. Em tempos normais, o NUCI oscila ao redor de 80% e, atualmente, encontra-se próximo de 76%. Ou seja, há gente e máquinas prontas para serem usadas, bastando que haja um mínimo de previsibilidade capaz de despertar os espíritos empreendedores.

Uma forma conveniente de medir a ociosidade olhando diretamente a evolução da produção é comparar seu nível atual com uma estimativa da tendência exibida no passado. Para que o cálculo seja justo, é importante levar em consideração alguns aspectos que mudam com o tempo, como o contexto internacional e o apetite do resto do mundo pelos produtos que vendemos. As contas confirmam que o crescimento potencial de longo prazo não é mesmo dos mais brilhantes e gira em torno de 2,5% (daí a necessidade de reformas para elevar a taxa).

No entanto, apesar desse potencial reduzido, o exercício quantifica também as oportunidades existentes para o curto prazo, menos dependentes das reformas e mais de fatores psicológicos, como a confiança dos agentes econômicos. Bolsonaro subirá a rampa pela primeira vez tendo ao alcance uma árvore com frutos que valem algo entre R$ 200 bilhões e R$ 500 bilhões. Para colhê-los precisará anunciar uma boa reforma da Previdência, demonstrar que é capaz de aprová-la e destravar a agenda da infraestrutura, atraindo o setor privado com projetos atraentes.

Porque Temer não se beneficiou? Ao aprovar medidas importantes como a Lei do Teto e a Reforma Trabalhista ele deveria ter recuperado uma parte dos bilhões que deixaram de ser produzidos com a recessão. Na verdade, estava quase lá quando veio o episódio das gravações. Não fosse pela derrapada, a Reforma da Previdência provavelmente teria sido aprovada. Com isso a retomada econômica teria se intensificado e hoje a história seria outra. Após o escândalo, Temer perdeu tempo e capital político, a economia tropeçou e a incerteza política entrou em cena.

A vitória de Bolsonaro desanuviou o horizonte. O militar chegou lá prometendo austeridade e, por isso, não deverá ser uma grande surpresa quando anunciar medidas duras. Na prática não é tão simples porque, espertamente, ele evitou entrar em detalhes na campanha porque intui que a teoria econômica que faz sucesso junto ao povão é a da Unicamp e não a da Universidade de Chicago – por isso centrou a plataforma nas questões de costumes, segurança e corrupção.

Mas a bola está aí, pronta para ser chutada. Se tiver o bom senso de saber para que lado chutar e boa pontaria, a retomada cíclica da economia deverá ajudar bastante e, por incrível que pareça, pode ser que o mito se torne realidade.

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