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Vantagens e desafios da cultura do combate à corrupção nas empresas

Os recursos perdidos para a corrupção anualmente seriam suficientes para acabar com a fome e prover educação para todas as crianças do mundo

O Pacto Global das Nações Unidas calcula que a corrupção adiciona 25% de custo em processos de compras e, em torno de 5% do PIB global desaparece com a corrupção (erhui1979/Getty Images)
O Pacto Global das Nações Unidas calcula que a corrupção adiciona 25% de custo em processos de compras e, em torno de 5% do PIB global desaparece com a corrupção (erhui1979/Getty Images)
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Carlo Pereira

Publicado em 9 de dezembro de 2020 às, 12h37.

Avançar na agenda anticorrupção é, na verdade, contribuir para o atingimento de todos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), um plano de ação para alcançar a prosperidade e fortalecer a paz. A corrupção precisa ser vista como um obstáculo para que todos estes objetivos sejam alcançados, desde a erradicação da pobreza até a igualdade de gênero e a luta contra a mudança climática. A palavra corrupção provém do latim corrompo, que significa decompor, estragar, e é exatamente isso que ela faz com nosso tecido social.

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O Pacto Global das Nações Unidas calcula que a corrupção adiciona 25% de custo em processos de compras e, em torno de 5% do PIB global desaparece com a corrupção. Além disso, ela exacerba a pobreza e a desigualdade, além de afetar as mulheres e os mais pobres desproporcionalmente. Relatório do Fórum Econômico Mundial, de 2017, aponta que todos os anos USD 2 trilhões são perdidos para a corrupção.

Isso significa dinheiro suficiente para acabar com a fome, erradicar a malária, fechar o gap de infraestrutura global e prover educação básica para todas as crianças do mundo. Os recursos, já escassos, são perdidos, desviados. Serviços públicos se tornam caros ou inacessíveis, a confiança no governo e no Estado de Direito é minada, além de desincentivar investimentos nacionais e internacionais e distorcer a competição.

Houve significativo avanço nas políticas públicas relacionadas ao combate à corrupção no Brasil, desde a adesão à Convenção Interamericana contra a Corrupção (OEA), de 1996, à Convenção sobre o Combate a Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, da OCDE, em 1997, passando pela criação da CGU, em 2003, e a promulgação da Lei Anticorrupção, em 2013.

Apesar disso, Índice de Percepção da Corrupção da Transparência Internacional mostra o Brasil na posição 106 entre 180 países, com apenas 35 pontos de 100. Obviamente, isso traz um desafio adicional para as empresas com atuação no país, onde há clara expansão dos fatores ESG como condicionantes de investimento. Hoje, 84% do valor das empresas vêm de ativos intangíveis, como propriedade intelectual e reputação, sendo que o segundo é muito maior nessa equação. Os riscos reputacionais de escândalos associados à corrupção são enormes.

Por isso, a Rede Brasil do Pacto Global acredita na integridade como diferencial competitivo do setor privado brasileiro, que se engaja cada vez mais por meio de ações de combate à corrupção. A importância do compliance e de políticas de combate à corrupção vem ganhando escala no país.

As vantagens são claras: empresas que promovem integridade conseguem reduzir o custo e os riscos do negócio, contribuem para um ambiente de negócios transparente e nivelado, melhoraram a confiança pública no setor privado e a reputação da marca. Além de manter uma vantagem competitiva, atraindo um número crescente de investidores que valorizam a ética. Ainda, conseguem chamar a atenção de talentos e reter funcionários e influenciar positivamente futuras leis e regulamentos.

A quarta edição da pesquisa Maturidade do Compliance no Brasil, da KPMG, mostra que o percentual de empresas brasileiras sem área de compliance ou equivalente diminuiu de 19% em 2015 para apenas 3% em 2019. No entanto, o nível de maturidade de 2,78 (total de 5) mostra que ainda temos muito a avançar na internalização da cultura de integridade. Um quadro na parede não muda o jogo.

O Relatório do Banco Mundial deste ano sobre reformas anticorrupção pelo mundo destaca que políticas e programas de compliance com certeza facilitam o combate à corrupção e são necessários, mas não suficientes. E, sobretudo, o relatório destaca a necessidade da colaboração entre múltiplos stakeholders em buscar do objetivo comum de combater a corrupção.

O Pacto Global, no mundo todo, traz como carro-chefe de sua atuação no combate à corrupção, há mais de 10 anos, a promoção de Ações Coletivas. Entende-se que em um contexto de corrupção generalizada, a ação de uma empresa sozinha, apesar de louvável, não é suficiente.

Ações coletivas são iniciativas multistakeholders, que engajam governos, organizações da sociedade civil e empresas para nivelar o campo anticorrupção, aumentar a transparência e melhorar o ambiente de negócios. Entre suas vantagens, tornam frequentes as práticas de negócios mais justas e aumentam a ação individual ou alcance de players mais vulneráveis, por meio de uma aliança de organizações com objetivos comuns.

São especialmente relevantes para países, regiões e setores com alto risco de corrupção. A Rede Brasil do Pacto Global participa da implementação do projeto global Escalando as Ações Coletivas Anticorrupção. Como o título sugere, essa iniciativa busca dar mais robustez às ações coletivas, utilizando ao máximo a experiência já acumulada no país.

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Frente aos múltiplos desafios enfrentados pela agenda anticorrupção no Brasil, há amplo espaço para que empresas desenvolvam iniciativas de promoção da integridade e da transparência, avançando até mesmo ao que a legislação atual do país exige. A inovação, por meio de ações coletivas anticorrupção no setor privado, tem o potencial de desencadear mudanças significativas, alcançando também o setor público e transformando a percepção sobre corrupção no Brasil.

Temos sido inundados por manchetes globais de escândalos de corrupção nas últimas décadas, e a situação atual de pandemia e crise econômica só exacerba o desafio de manter a integridade como referência nos negócios. Portanto, não se trata de ser mais realista que o rei, mas garantir a competitividades das empresas.

Carlo Pereira, diretor-executivo da Rede Brasil do Pacto Global
Ana Luiza Aranha, assessora de Anticorrupção da Rede Brasil do Pacto Global