(Hiroshi Watanabe/Getty Images)
Carlo Pereira
Publicado em 28 de janeiro de 2022 às 15h37.
Esses últimos 3 anos no Brasil provocaram uma revolução nos aspectos ambientais, sociais e de governança, pelo menos no discurso. Muito greenwashing por aí. Muito, mas muitas boas ações também. Precisamos separar o joio do trigo.
Veremos em 2022 maior consolidação do ESG no Brasil e no mundo, numa espiral positiva e poderosa com a crescente cobrança da sociedade.
Isso tem trazido uma série de novas regulações e autorregulações de devida diligência ao redor do mundo em direitos humanos, desmatamento, biodiversidade, diversidade etc.
Esse movimento trouxe ansiedade ao mercado que vem reagindo com discursos e promessas. E um contramovimento ainda mais forte e qualificado para separar o joio do trigo. Portanto, empresas terão que mostrar metas claras, baseadas na ciência e lastreadas por planejamento estruturado de longo prazo, mas, também, de curto e médio prazos. Não estou falando só em clima.
Além disso, num ano eleitoral a população vai cobrar posicionamento claro de líderes empresariais nos mais diversos temas. Não apenas temas relacionados ao negócio, mas ‘a sociedade em geral, incluindo nossa frágil democracia.
Temos que aumentar a ambição e a velocidade (much further and much faster), mas o trem da mitigação climática já saiu da estação. No entanto, os fóruns internacionais sempre separaram erroneamente a discussão entre mitigação e adaptação, com isso relegou a segundo plano o impacto dos eventos climáticos extremos desproporcional em populações vulneráveis, a dificuldade para a transição para uma economia de baixo carbono pelos países em desenvolvimento e o papel na mesa de negociação de povos originários, tradicionais, populações minorizadas e as juventudes.
E, como disseram as jovens lideranças na COP26, não querem que falem por eles e não querem um espaço de fala, querem assento na mesa de negociação.
Ao longo de 2022 e na COP27, veremos uma discussão menos carbonocêntrica, com foco na biodiversidade e nas pessoas, que estão sendo deixadas para trás.
O Brasil é o país mais ansioso do mundo e o segundo mais estressado. Além disso, a OMS também classifica o ambiente de trabalho como sendo insalubre mentalmente. Não bastasse essa situação crônica, uma pesquisa realizada pelo Movimento Mente Em Foco em parceria com o Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados (IBPAD) mostra que mais da metade dos brasileiros acredita que sua saúde mental piorou desde o início da pandemia. O que era péssimo, ficou ainda pior e sabemos que problemas emocionais decorrentes da pandemia terão uma calda longa. Este ano, burnout passa a ser uma doença ocupacional, doença que o Brasil ocupa a vexaminosa segunda posição em ocorrência. As pessoas não admitirão mais essa situação e as empresas perceberam isso. Pela moralidade em não adoecermos as pessoas nas nossas empresas ou pelo impacto financeiro que isso terá, veremos uma forte movimentação em prol ao bem-estar dos colaboradores nas organizações.
Percebemos que o tema pessoas nas organizações entrou na pauta de ESG, mas ainda há um longo caminho para oferta de oportunidades iguais e valorização das diferenças. Esta é uma pauta clara de Direito Humanos. Segundo dados publicados pelo CEERT 55,8% das pessoas negras ocupam apenas 4,7% dos cargos de liderança das 500 maiores empresas do país. A realidade para mulheres e Pessoas LGBTQIAP+ não é diferente. Ainda há muito espaço para ações afirmativas 2022, o resultado para organizações corajosas virá.
Como ficam desmatamento e biodiversidade? Fui questionado ao falar sobre tendências.
Trago de maneira mais ampla sem perder a importância individual dos temas.
Em 2021, A Cúpula de Sistemas Alimentares, cujo headline foi Um Novo Acordo para Pessoas, Planeta e Prosperidade teve pronunciamentos de mais de 90 chefes de estado, 183 países representados e mais de 22.000 delegados, números próximos ao da COP26. Apesar dessa dimensão e da importância do tema para o Brasil, governos, empresas, sociedade civil e a mídia deram baixíssima atenção ao evento. O que claramente foi um breakthrough e, levara a discussão para um outro patamar, pressionará ainda mais nosso país.
Nunca produzimos tanto alimentos como agora. No entanto, quase 1 bilhão de pessoas passam fome e 2 bilhões de pessoas tem sobrepeso ou são obesas no mundo. Quase metade da população mundial com algum tipo de insegurança alimentar. No Brasil não é diferente, 25 milhões de pessoas com fome e quase 50 milhões acima do peso.
Além disso o impacto dos sistemas alimentares é enorme:
Essa discussão ficara ainda mais forte em 2022 e estará refletida na segunda parte da COP15 de Biodiversidade, COP27, Cúpula de Oceanos da ONU e nas mais diversas discussões multilaterais. Além disso, será fator de pressão crescente na agenda de investidores e população em geral.:
O recado aqui: os setores relacionados a sistemas alimentares têm uma grande oportunidade, mas ao mesmo tempo, serão enormemente pressionados. Na cozinha da opinião pública não é apenas a batata do setor de combustíveis fosseis que está assando.
Nesse ano eleitoral ainda veremos baixo alinhamento entre os diferentes setores da sociedade na priorização dos temas para termos uma sociedade justa, integra e regenerativa. Será difícil romper a danosa polarização em que vivemos.
A desfriedmantacao da economia traz a oportunidade de darmos uma face mais humana ao mercado, como almejava Kofi Annan. Por consequência, maior humanização aos executivos e executivas. Uma ótima notícia a todos. Afinal, tenho dificuldade em acreditar que não queiramos que nosso trabalho diário não seja uma força para o bem da sociedade e do ambiente. Apesar de crescente, acho que ainda estaremos, em 2022, num baixo nível de auto responsabilização e protagonismo por parte de executivos e executivas nos diferentes temas. Ainda veremos um foco em metas financeiras e foco na competição em detrimento da cooperação. Uma pena, perde a sociedade e a liderança empresarial em dar maior sentido a suas carreiras.